quarta-feira, 13 de setembro de 2006

Who cares?

Do New York Times de hoje:
«At the end of this month, African Union forces, the only peacekeepers in Darfur [Sudão], are scheduled to go home. That will leave the field open to President Omar Hassan al-Bashir and his army to resume the killing, which they have given every indication of doing. That gives the rest of the world only three weeks to avoid a worsening tragedy
(Sublinhado acrescentado.)

A que propósito...

... é que continuam a intrometer-se actos religiosos (nomeadamente a benzedura católica) em cerimónias oficiais de inauguração de estabelecimentos públicos, como sucedeu agora com uma escola no Algarve (como a SIC mostrou)?
Em vez de se associar ilegitimamente a cerimónias religiosas em actos oficiais, o Primeiro-Ministro faria muito melhor em determinar o fim dessa violação qualificada da laicidade do Estado. Isto não é uma questão menor!

E se,...

... perante a manifesta pressão de Belém para condicionar o Governo, mediante acordos bilaterais com o PSD em várias áreas, aquele recordasse a Cavaco Silva uma antiga, e célebre, frase sua: «Deixem-nos governar!»?

Um pouco mais de ambição não fica mal

Com as novas perspectivas favoráveis quanto ao crescimento económico -- que poderá ultrapassar 1,5%, bem acima da previsão orçamental de 1,1% --, não são descabidas as expectativas de que também o défice das finanças públicas possa ficar abaixo do previsto (4,6%), o que seria um notável feito.
De facto, sendo o défice calculado em percentagem do PIB, o simples aumento deste fará diminuir automaticamente aquele, mesmo para igual volume de receitas e despesas públicas. Além disso, um maior crescimento económico induzirá ganhos na receita (mais IVA, por exemplo) e menos despesa (por exemplo, menos subsídios de desemprego).
Por isso, só não haverá menor défice, se o Governo aproveitar a situação de maior crescimento para alguma folga nas despesas públicas. O que seria um péssimo sinal. Com o que ainda tem de fazer para pôr as finanças públicas em ordem até 2009, o Governo estaria a dar uma indicação muito negativa, se aos primeiros sinais de alívio económico diminuísse a pressão para a redução da despesa.

Um pouco mais de seriedade, por favor!

Em matéria de crescimento económico -- área em que o desempenho do PSD foi o desastre que se sabe, na sua última passagem pelo Governo (2002-204) --, as metas do principal partido da oposição são, literalmente, uma vertiginosa "fuga para a frente". Começou por queixar-se da estagnação económica; depois, quando a economia deu sinais de retoma, exigiu um crescimento ao nível da média da UE; agora, que isso pode estar no horizonte, passou a exigir um crescimento de 3%. Isto tudo, em um ano e meio!
Se, porventura, o crescimento se vier a aproximar dessa meta, o que exigirá o PSD: o ritmo de crescimento da China, de dois dígitos!?

terça-feira, 12 de setembro de 2006

Intrigante....

Porque é que a CNN passa desde ontem uma reportagem sobre um «especialista em computadores» que se empenha em provar que houve mesmo um avião (voo 77) que chocou contra o Pentágono no 11 de Setembro?
Porquê esta via «artesanal» para tentar dissipar teorias da conspiração?

11 de Setembro

Há cinco anos calei-me.
De horror, dor, estupefacção, atordoamento. Diante da televisão, à hora do jantar em Jacarta, vi ruir as Torres, em directo.
Elas eram minhas, também eram minhas: tinham estado, dia e noite, durante dois anos diante de mim, do pequeno almoço ao deitar, a entrar-me pelas vidraças da minúscula cozinha, do quarto e da sala do meu apartamento da West 59th Street.
Eram pessoas. Saltavam, desesperadas, no abismo. Podiam ser meus amigos ou conhecidos. Tal como os que fugiam pelo Mall em Washington, ou se despenhavam no voo 93, ou emergiam ofegantes do furacão cinza no emaranhado de Down Town.
Depois de conseguir ligação para a Joana em Lisboa (Tiago OK), António em Brasília, Marta e João e a Missão em Nova Iorque, calei-me.
Impossível dormir.
Na embaixada, de manhã, não me saiam sons. Levei quase uma semana a recuperar a fala.
A primeira necessidade, ao sentar-me à secretária, foi escrever ao Bob, meu colega americano. Uma das cartas mais sentidas que escrevi na vida. Solidariedade total. «Ich bin ein New Yorker!».
Já eramos amigos, mas depois daquilo ainda ficámos mais.
E quando jantámos em minha casa, uma semana mais tarde, constatámos que tinhamos os três - eu, ele e a Aileen - ficado ofendidos (é a palavra) com aquele sujeito que naquela noite tratara displicentemente os vis terroristas de «folks»....
«Folks» a quem tem, objectivamente, feito o jogo. E por isso este mundo está hoje muito mais perigoso.
Já não estou só ofendida.
Estou na luta: contra o terrorismo e quem lhe faz o jogo!
Há cinco anos mudou o mundo. O que tenho para deixar aos netos. E por eles não me calo.

a páginas tantas

Ao acabar o enésimo livro de poesia, "The good neighbour" de John Burnside (este uma prenda de anos) dou-me conta - ao pô-lo na estante dos seus companheiros de género - de um hábito antigo: as páginas que deixo dobradas no interior destes livros, pequenas feridas em volumes novos, resultado dos poemas que mais me marcaram (por uma ou outra razão). Penso que não há livro entre todos aqueles que não tenha marcas semelhantes e constato que jamais reabri algum. Porquê?
Talvez porque os anos passam e dizem que, daqui a muito tempo, hei-de de perder a memória e até centímetros de altura ao chegar a velhice.
Nesse tempo precisarei de regras novas para a minha vida ou, pelo menos, de me inspirar outra vez. Será altura de retirar os livros de poesia da casa que habitam e, ao reparar-lhes as feridas infligidas ao longo dos anos, quem sabe recordar a feliz razão que levou aquelas páginas a serem dobradas da vez original (e rejuvenescer)?

histórias a meio

e depois há o caso do homem que, uma noite dentro na decadência do antigo Texas Bar, Cais do Sodré, dançava defronte do espelho uma balada xaroposa qualquer, envergando uma garrafa de vat69 na mão e uma pomba cinzenta no ombro esquerdo. O pássaro batia as asas de vez em quando, não sei se assustado com os bruscos tropeções da sua omoplata protectora se para tentar avisá-lo de que já eram horas de ir para casa.

O Presidente e os pactos politicos

Os media insistem em sugerir que o Presidente da República deveria pressionar o Governo no sentido de negociar acordos políticos com a oposição (leia-se: com o PSD) em várias áreas, cobrindo quase toda a geografia governativa. De facto, porém, embora no nosso sistema constitucional o Presidente da República disponha de um poder de "externalização" de posições políticas e, mesmo, de um poder de sugestão ou de aconselhamento -- poder que, embora simples "soft power", não é despiciendo --, a verdade é que ele não tem nnhum poder de superintendência sobre o Governo (no sentido de poder definir orientações, directivas ou recomendações).
Por isso, sob pena de se tornar em intrusão na competência alheia, o referido poder presidencial deve ser marcado pelo "self-restraint", sobretudo na sua expressão pública, não devendo aparecer como pressão ilegítima sobre o primeiro-ministro e a maioria parlamentar. Quando de trata de matérias governativas, o protagonismo presidencial não é virtuoso para a separação e equilíbrio constitucional dos poderes.

Precisa-se treinador

Clube com longa história e tradição, número de sócios superior ao do Manchester ou Barcelona, e plantel cheio de internacionais de grandes potências neste desporto, procura estrangeiro qualificado mas sem título a anteceder o nome (do género "Eng" ou Prof") para ocupar lugar no banco como líder da sua equipa de futebol. Oferece casa e carro ou, em alternativa ao segundo, estacionamento junto ao Colombo. Fortes perspectivas de ganhar algum título ou sair do clube com choruda indemnização. Por favor.

segunda-feira, 11 de setembro de 2006

back with a sentence

Assinalando o regresso em grande forma do Melancomico, propriedade do Nuno Costa Santos - que ontem fez anos - e insiste no enriquecimento da blogosfera com os seus aforismos. Um dos veteranos destas lides, a mostrar como se faz. Como dizem os antigos, bem-haja pois.

Outro 11/9, mais longínquo

O golpe de Estado de Pinochet, o assassínio do Presidente Allende, a repressão sangrenta, o início de uma longa ditadura. A morte do sonho do "socialismo democrático", às mãos da direita.
Foi em 11 de Setembro de 1973. Os da minha geração não esquecem!

Mais seriedade, precisa-se

Alguns municípios estão a realizar receita extraordinária, vendendo aos bancos o direito a receitas futuras (por exemplo, as rendas das habitações sociais do município), o que comprometerá o seu equilíbrio financeiro no futuro, quando não puderem contar com essas receitas, tanto mais que a nova lei das finanças locais vai proibir esse expediente.
Perante a condenação governamental desta "habilidade" de última hora, a Associação Nacional dos Municípios veio dizer que o Governo não tem autoridade moral para condenar os municípios, porque faz o mesmo no caso das SCUT (ou seja, as auto-estradas "sem custos para o utente", em que o orçamento do Estado suporta o pagamento das portagens).
Todavia, será que existe alguma equiparação entre as duas coisas? Eu até condeno as SCUT, mas não por elas anteciparem receitas futuras (como é manifesto), mas sim por elas fazerem pagar aos contribuintes em geral as vantagens individuais de quem tira proveito das referidas auto-estradas. Um pouco mais de seriedade, p. f.

Cinco anos depois

Passados estes anos, não diminui a revolta pelo massacre terrorista de 11 de Setembro. Mas a melhor maneira de prestar homenagem às vítimas e de combater o terrorismo islâmico não é restringir desmesuradamente as liberdades individuais, violar os princípios mais elementares do Estado de direito (ver Guantánamo), lançar guerras mal avisadas que só alimentam o terrorismo (ver Iraque) e manter situações de opressão que nutrem o sentimento anti-ocidental no mundo árabe (como a questão palestiniana).
Mesmo nas suas guerras justas, a civilização democrática deve ser fiel aos seus próprios valores.

domingo, 10 de setembro de 2006

Homenagem ao Douro

Há 250 anos o Marquês de Pombal, por iniciativa local, aprovou a criação da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro (CGAVAD), acompanhada da demarcação geográfica da região e dos instrumentos de defesa dos respectivos vinhos.
Investi vários anos da minha vida de investigador a estudar a história e a regulação da região vitivinícola e do vinho do Porto. Foi uma das tarefas mais apaixonantes da minha vida de universitário.
Obrigado ao Douro!

Mais seriedade, precisa-se! (2)

Respondendo ao disparate com outro disparate (abyssus abyssum...), o presidente do sindicato dos juízes (ASJP) veio contestar as afirmações do presidente do SQE (ver post precedente), dizendo que as remunerações dos juízes até estão «congeladas desde 1993».
De facto, não estão nada "congeladas", tendo as remunerações dos juízes sido regularmente aumentados na mesmíssima proporção dos demais dependentes do Estado (titulares de cargos públicos e funcionários públicos).
O que o dirigente sindical queria dizer com aquele termo despropositado é que desde a referida data as remunerações dos juízes não foram "valorizadas", que é o eufemismo sindical corrente para dizer que não foram especialmente aumentadas acima das demais, como eles reivindicam (o que, aliás, também não é verdade, pois foi aumentado o chamado "subsídio de habitação", que não passa de um suplemento de vencimento encapuçado). Descontando o facto de as remunerações dos demais titulares de cargos públicos também estarem "congeladas" há muito mais tempo, não se vê nenhuma razão para que as remunerações dos juízes sejam "descongeladas", visto que os juízes portugueses já estão comparativamente entre os mais bem pagos na Europa...
(revisto)

Mais seriedade, precisa-se!

O presidente do Sindicato dos Quadros do Estado (SQE) veio denunciar que "a austeridade não é para todos", argumentando que de 2004 para 2005 a despesa pública com remunerações do Governo, dos deputados e dos juízes cresceu muito mais do que a dos funcionários do Estado.
Ora, que se saiba, não houve nenhum aumento diferencial de remuneração dos titulares de cargos políticos nem dos juízes. O referido aumento da despesa só pode dever-se ao aumento do número de juízes (para além, porventura, dos subsídios de reintegração dos membros do Governo e dos deputados que cessaram funções em 2005, regalia essa que, aliás, já foi extinta pelo actual Governo).
A denúncia não tem portanto nenhuma razão. Aos dirigentes sindicais é de exigir um pouco mais de seriedade...

E queixam-se!

«Professores portugueses são terceiros mais bem pagos da OCDE.»

sábado, 9 de setembro de 2006

Correio dos leitores: "Azambuja" (2)

«[Numa carta de um leitor, lê-se:] "também sei que tratar investidores à canelada não ajuda - a GM não pensará em voltar tão cedo e os outros pensarão duas vezes antes de investir em Portugal(...)".
Pois é, os patrões da GM podem quebrar contratos com os trabalhadores e até com os governos. A esses, trabalhadores e governos, só lhes resta ir pôr uma velinha a nossa senhora de Fátima e esperar as boas graças dos patrões.
É o discurso da subserviência e do miserabilismo, Salazar também daria esse conselho.
Pois é (...), o mundo não se divide só em explorados e exploradores, também se divide entre aqueles para quem a dignidade é um valor e aqueles para quem isso não conta na sua conta bancária. (...)»

A. Olaio

sexta-feira, 8 de setembro de 2006

Impressões pessoais: O banqueiro humanista

A notável entrevista de Artur Santos Silva ao Jornal de Negócios de hoje (é pena não estar online): a dimensão humana de um banqueiro.

O acordo (7): O que falta

Resta sublinhar o que não está explícito no acordo, mas que tem de resultar dele, sob pena de a reforma da justiça não responder às expectativas dos cidadãos, ou seja, tornar a justiça mais pronta e mais económica, para que não triunfe a impunidade (com os frequentes casos de prescrição em matéria penal) e para que não prevaleça o incumprimento das obrigações (com as demoras intoleráveis em coisas tão básicas como aa cobrança de uma dívida ou o despejo de um prédio).
O nível de satisfação com a justiça é um dos principais elementos na confiança dos cidadãos no Estado; e a eficência da justiça é uma importante variável no desempenhpo económico de um país. Por isso, uma reforma da justiça bem sucedida reforça a democracia e promove o desenvolvimento eonómico. É por isso que a reforma da justiça não pode falhar.

O acordo (6): Os juízes

Por último, no que respeita ao estatuto dos juízes, também há mudanças que desde há muito se impunham, incluindo quanto à famigerada subvenção substitutiva da "casa de função" (que continuava a ser paga mesmo depois da cessação de funções activas!) e quanto ao regime de aposentação e de reforma, que passa a ser o dos demais "servidores do Estado" (o qual, de resto, para os novos entrantes desde o início do corrente ano, é o regime geral da segurança social).
Cessam assim os privilégios da magistratura neste capítulo. Só não se compreende por que é que se há-de manter o direito à "casa de função" (ou ao seu generosíssimo sucedâneo financeiro), quando os outros titulares de cargos públicos só têm direito a subsídio de habitação se exerçerem funções fora do seu local de residência e quando as razões para aquela regalia (associada à antiga obrigação de mobilidade territorial dos magistrados todos os seis anos) deixaram de existir.

O acordo (5): O Conselho Superior da Magistratura

No que respeita ao Conselho Superior da Magistratura as mudanças também vão no bom sentido: (i) reconhecer-lhe autonomia administrativa e financeira, tornand-o portanto mais responsável; (ii) viabilizar o exerício a título pleno do cargo pelos membros leigos do CSM, tornando-o um órgão efectivamente misto e não essencialmente um órgão de autogestão da magistratura, como na prática é.
Penso, porém, que estas reformas devem ser acompanhadas pela expressa institucionalização da responsabilidade "política" do CSM, designadamente pela apresentação de um relatório anual à Assembleia da República. Como órgão de governo da magistratura, o CSM não está imune ao dever geral de "accountability" pública pelo exercício das suas funções, que é própria de um Estado democrático.

O acordo (4): Acesso à magistratura e aos tribunais superiores

No acesso à magistratura e aos tribunais superiores também há subtanciais novidades dignas de aplauso, sendo de destacar quatro: (i) o acesso à magistratura passa a ser aberto, em pé de igualdade, a jovens graduados em direito (com valorização específica dos mestrados e doutoramentos) e a profissionais (não necessariamente juristas) com currículo profissional adequado para a magistratura (acabou-se a ideia do juiz "formado para juiz desde a origem"); (ii) o acesso aos tribunais superiores passa a ter em conta somente o mérito, incluindo uma prova pública de apreciação do currículo dos candidatos (acabou-se a promoção por antiguidade, totalmente descabido no acesso a cargos públicos); (iii) o acesso aos tribunais supremos passa a incluir uma quota obrigatória de 1/5 de juristas de mérito alheios à magistratura (acabou o boicote à entrada de leigos no STJ); (iv) vai ser reduzido o número de juízes no STJ, acabando com o manifesto excesso hoje existente.
No segundo e no terceiro caso trata-se, aliás, de dar execução a normas contituicionais persistentemente desrespeitadas até agora. Só é pena que não se tenha sido mais ambicioso no acesso de não juízes ao STJ...

Aditamento: O acordo só fala nos tribunais judiciais. Mas não se vê razão para não aplicar os memos princípios oas tribunais administrativos e fiscais.

O acordo (3): A divisão judicial do território

Uma das mais inovatórias -- e mais positivas -- reformas é a que diz respeito ao mapa judiciário, passando a organização judiciária a corresponder à divisão administrativa do território, com base nas NUT III (agrupamentos de municípios) e das NUT II (as 5 regiões-plano do continente), o que lhe confere muito maior clareza e racionalidade. Na base haverá portanto "macrocomarcas", com a agregação das actuais comarcas da mesma NUT III, o que permitirá enormes ganhos de eficiências em termos de quadros de magistrados e de pessoal, bem como de gestão de recursos materiais e humanos.
Quanto aos tribunais de relação, a correspondências às NUTs II implicará a criação de um TR no Algarve (e nos Açores e na Madeira?) e a extinção do TR de Guimarães (cuja racionalidade nunca compreendi).

O acordo (2): O processo penal

No que respeita ao processo penal, merecem destaque as soluções para o segredo de justiça, as escutas telefónicas e a prisão preventiva. O âmbito do segredo de justiça é drasticamente reduzido, mas em contrapartida torna-se vinculativo para toda a gente (acabando a peregrina tese que isentava dele os jornalistas, que sempre critiquei); as escutas telefónicas são também restringidas, passando o seu procedimento a estar mais salvaguardado; o mesmo sucede com a prisão preventiva.
Para além da bondade das soluções em si mesmas, incluindo em termos de garantias dos direitos individuais, elas vão contribuir seguramente para a diminuição da conflitualidade jurídica em matéria processual-penal.

O acordo (1): A justiça como questão de Estado

O acordo político entre o PS e o PSD sobre a reforma da justiça é um excelente acordo em todos os aspectos. Primeiro, pelo seu conteúdo, permitindo uma profunda reforma da justiça, num bom sentido (se algumas soluções pecam por alguma coisa é por defeito, não por serem erradas). Segundo, o acordo dá à reforma um apoio político alargado, o que diminui a possiblidade da sua contestação, sobretudo por parte dos juízes. Terceiro, trata-se de um acordo win-win, em que ambos as partes ganham: o PS, porque leva a cabo o seu programa de reforma da justiça, sem grandes transigências, com o apoio do principal partido da oposição; o PSD, porque se torna corresponsável por uma grande reforma e faz valer a sua posição sobre a consensualização das reformas que têm a ver com a construção do Estado. Por outro lado, nada impede os demais partidos de, na fase parlamentar, contribuir para a implementação concreta das reformas (muitas das soluções deixam um margem de livre decisão legislativa) e propor soluções adicionais.
Há um outro aspecto digno de destaque. Este acordo é um compromisso entre partidos, e não um pacto misto entre Estado e as profissões jurídicas, como muitos propunham, numa promiscuidade negocial que só podia reverter em favor das segundas. Pelo contrário: como disse um dos protagonistas, este acordo é o triunfo do Estado sobre as corporações.

"Sobrevivências corporativas"

Pode agora ler-se na Aba da Causa o meu artigo desta semana no Público, com o título em epígrafe, onde retomo a "provocação" de extinguir a ADSE, o subsistema de saúde privativo dos funcionários públicos.
Na minha caixa de correio há quem me chame nomes feios por causa dele. Mas já estou habituado: ainda está para ocorrer o milagre em que, denunciado um privilégio, os seus beneficiários não venham protestar que se trata, afinal, de um direito justíssimo!

Correio dos leitores: Azambuja

«Assisti ao telejornal da RTP1 e à reportagem em directo da fábrica da General Motors na Azambuja. Daquilo a que assisti, retive que:
- a GM propôs uma indemnização de 1,75 x salário mensal por cada ano de trabalho (para além do exigido na lei que, creio, para o caso dos despedimentos colectivos obrigar a uma indemnização de 1 salário mensal por cada ano de trabalho);
- os trabalhadores acham a proposta "insultuosa", e, aparentemente, querem os salários por inteiro até 2009, que era a data prevista de fim de produção do actual modelo Combo. E enquanto a GM não vergar às exigências deles, paralisam a fábrica e bloqueiam-lhe os acessos.
Não conheço as razões do encerramento nem as motivações dos trabalhadores da GM para tomar a atitude "Verão quente de 75" que tomaram, e como tal não posso apoiar ninguém (se os trabalhadores da GM têm a minha simpatia natural porque eu também trabalho por conta de outrem, também sei que tratar investidores à canelada não ajuda - a GM não pensará em voltar tão cedo e os outros pensarão duas vezes antes de investir em Portugal, e a nossa indústria é essencialmente subcontratada). (...)
Curioso é ninguém aparecer associado ao protesto na Azambuja... nem sindicatos, nem partidos políticos da oposição, nem advogados a querer negócio, ninguém. Se percebo bem que o PSD não queira aparecer (mesmo tendo oportunidade para reclamar com o governo PS), já a ausência da CGTP, do PCP ou do BE não deixa de ser curiosa.
Mudança dos tempos? Ou falta de fé na vitória final?»

Luís Malheiro