quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

O fim do capitalismo laissez-faire

No seu discurso inaugural, Obama foi claro quanto à questão económica, rejeitando o fundamentalismo dos "mercados livres". Não há, disse ele, alternativa ao mercado, como instrumento de criação de riqueza e de liberdade; mas, como a actual crise mostra, o mercado não funciona sem um "olhar vigilante", que o mantenha sob controlo.
«(...) the crisis has reminded us that without a watchful eye, the market can spin out of control -- and that a nation cannot prosper long when it favors only the prosperous»
Impõe-se o "watchful eye" do Estado para controlar as falhas da "mão invisível" do mercado e corrigir as suas injustiças sociais.

A greve

Na greve dos professores de anteontem foram de novo encerradas muitas escolas (embora menos do que na greve anterior).
Ora o direito à greve, como recusa colectiva da prestação laboral, não inclui o direito de encerramento dos estabelecimentos públicos (nem aliás de empresas privadas), o que impede o pessoal que não está abrangido pela greve (pessoal auxiliar, pessoal técnico) de trabalhar e prejudica os utentes da escola (bibliotecas, refeitórios, recintos desportivos, etc.). Os conselhos directivos, e os seus membros, nessa qualidade, não gozam do direito à greve, incumbindo-lhes, pelo contrário, manter os estabelecimentos abertos e em funcionamento em tudo o que não dependa da greve.
O encerramento das escolas "à boleia" da greve constitui portanto um manifesto abuso de poderes, que os titulares de cargos públicos, como é o caso, não se deveriam permitir, nem lhes deveria ser consentido.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Era Obama - já é!

As expectativas na América e no mundo são elevadissímas, o desconcerto é global e os desafios revelam uma gravidade e complexidade sem precedentes.
Mas, ao discursar na tomada de posse hoje, Barack Hussein Obama deu sopro à esperança e sentido à acção. Incentivou audácia e confiança. Prometeu justiça, abertura ao diálogo e empenhamento pela paz. E pediu mobilização de todos e sentido de responsabilidade, ancorado no respeito pelos valores essenciais que estão na base do progresso dos EUA e de todos os avanços significativos da Humanidade.
Obama foi eleito para defender os interesses americanos, sem dúvida. Mas o que ele fizer ou não fizer na América, com a América e pela América, vai repercutir-se em todos os cantos do planeta. Por isso, a inauguração formal da Era Obama, esta tarde, não disse apenas respeito aos EUA. O Presidente Barack não interpelou apenas os americanos: falou à razão e ao coração de todos os homens e mulheres que não querem deixar a filhos e netos um mundo mais perigoso, inseguro e injusto do que aquele que herdaram.

O discurso (2)

Além de tudo o mais (Estado de Direito, direitos humanos, cooperação internacional, luta contra o aquecimento climático, respeito por todos os povos e nações, etc.), o discurso de Obama é uma excepcional reafirmação dos valores do republicanismo americano -- e universal ! --, assente nos valores da liberdade e da igualdade, da responsabilidade individual e colectiva, do trabalho e da virtude, da convicção e da tolerância, do patriotismo e do universalismo, e por último (mas mais importante) da cidadania, essa palavra-chave dos discurso republicano de todos os tempos.
Este discurso merece figurar doravante em qualquer antologia do republicanismo cívico. Que diferença abissal em relação ao discurso guerreiro, sectário e intolerante da direita religiosa e do pensamento neoconservador que prevaleceu na cultura política norte-americana nas últimas décadas e que Bush entronizou oficialmente !

O discurso

Por mais que os cínicos e os ressentidos queiram desvalorizar o peso das palavras e das convicções, o discurso inaugural de Obama [aqui o texto em Português, embora com erros] é uma notável peça de oratória política -- à altura dos históricos discursos de Lincoln, de Roosevelt, de Kennedy --, conjugando uma crítica severa ao passado recente (em especial à presidência de Bush) e o anúncio de uma nova era para os Estados Unidos e para o mundo.
Começa bem o novo Presidente dos Estados Unidos. Agora é preciso transformar as nobres palavras e os grandes desígnios em decisões e em resultados; "refazer a América" e tornar o Mundo melhor.

Era Bush

Uff! Acabou finalmente!
O pesadelo. Um dos capítulos mais sórdidos da história da América e do mundo em que vivemos.
Vamos ainda sentir-lhe os desastrosos efeitos, por muito tempo - desde logo na crise económica sem precedentes que deixa em legado, a acrescer aos conflitos sangrentos que semeou ou agravou e ao descrédito moral e político em que fez atolar os EUA e não só.
O que vale é que a escolha é clara e impele a agir: entre varrer-lhe todos os dejectos ou submergir no lodaçal.

Good luck, Mr President!

Provavelmente, nunca na história um Presidente norte-americano iniciou funções com tanto apoio e tanta esperança nos Estados Unidos -- e em todo o Mundo!
Para além do feito histórico de ser o primeiro afro-americano a chegar à Casa Branca, Obama traz consigo a promessa de mudar quase tudo para melhor, incluindo na resolução dos conflitos internacionais, no respeito do Direito internacional e dos direitos humanos, na cooperação e na solidariedade internacional, na luta contra as mudanças climáticas, na regulação da globalização financeira.
A primeira grande tarefa do novo Presidente consiste em restaurar a autoridade e a credibilidade política e moral dos Estados Unidos no mundo, que o seu antecessor desbaratou no unilateralismo, na guerra do Iraque, em Guantánamo, no desprezo pelas questões ambientais, na crise financeira e mesmo, porque não dizê-lo, na irrisão.
Para além das expectativas demasiado elevadas, Obama toma posse do cargo no meio de uma gravíssima recessão económica, que limitará enormemente a realização dos seus ambiciosos objectivos de política interna, bem como de política internacional.
Por isso, o novo Presidente não vai precisar somente de fidelidade aos seus princípios, de talento e de determinação, de uma boa equipa --, mas também de muita sorte. Oxalá ela não falte.

Notícias da crise

Embora apoiante das medidas keynesianas de ataque à crise económica, tenho várias vezes sublinhado que o esforço não pode ser levado ao ponto de sacrificar demasiadamente as finanças públicas, pondo em risco a estabilidade e a credibilidade financeira do País, com os custos inerentes, em termos de disparo do endividamento público, de degradação do rating do crédito e do enorme aumento dos custos futuros da dívida, quando os juros subirem, a acompanhar a retoma económica.
Os perigos podem ser ilustrados com o caso da Espanha, que acaba de ser desgraduada por uma das agências de rating, em consequência da gravidade da recessão e de um défice previsto para este ano, de quase 6%. Depois da Grécia e da Espanha, chegará também a vez de Portugal, apesar de as previsões da recessão e do défice serem menos negativas do que as espanholas?

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Disparar sobre a segurança social

Sob o comando de Marques Mendes, o PSD propôs a eliminação do sistema público de segurança social, baseado numa lógica de contribuição-repartição, em favor de um sistema de capitalização individual das pensões. Falhado esse objectivo, o PSD de Manuela Ferreira Leite vem agora, a pretexto da recessão, propor uma redução geral das contribuições para a segurança social. Como não conseguiu destruir o sistema, há que pôr em causa a sua sustentabilidade financeira...
Sem dúvida que uma redução temporária e selectiva das contribuições para a segurança social pode constituir uma medida virtuosa para manter/criar emprego em sectores bem específicos ou para categorias específicas de trabalhadores mais expostas ao risco de desemprego (como aliás o Governo já fez, podendo essa medida ser ampliada a outras situações especiais). Mas uma redução indiscriminada da TSU é uma proposta tão demagógica e irresponsável como a proposta de baixa do IRS. Uma coisa é ajudar a debelar a recessão, outra coisa é lesar a sério o financiamento da segurança social, cuja auto-sustentação financeira deve ser mantida.

Separar as águas

Os defensores da taxa única no imposto sobre o rendimento pessoal insistem em tentar provar que ela, afinal, até é progressiva.
Mas a demonstração não procede. Com efeito, se se tiver em conta somente o rendimento efectivamente sujeito a imposto, não há progressividade nenhuma com uma taxa única, por definição, ao contrário do que sucede num verdadeiro imposto progressivo. Segundo, mesmo que se entre em conta com a parte de rendimento isenta de imposto -- o que faz com que em relação ao rendimento global a taxa do imposto aumente com a subida do rendimento --, a verdade é que essa "progressividade" decresce à medida que o rendimento sobe (e não o contrário) e à medida que a "taxa efectiva" se aproxima da taxa única. Por último, e mais importante, o valor da taxa única nominal (que aliás nunca é atingida) é por princípio muito mais baixa do que a taxa mais elevada de um imposto progressivo (que frequentemente excede os 40%).
Ou seja, comparativamente com um genuíno imposto progressivo, a taxa única (proporcional) favorece sempre os rendimentos mais elevados. Aliás, é exactamente por isso que ela é defendida pela direita liberal, e em especial pela direita ultraliberal. Coerentemente, sem dúvida. Só não se percebe a insistência em defender a sua alegada "progressividade", esse valor característico de uma fiscalidade de esquerda.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Desatino

Insistindo na sua falsa acusação à Lusa, o PSD vem argumentar agora que a questão do TGV «apenas diz respeito à política interna portuguesa» não tendo os espanhóis nada a ver com isso.
Lê-se e não se acredita! Então a rede do TGV não inclui várias linhas comuns, que foram acordadas oficialmente entre os dois países, incluindo quanto ao calendário (ainda por cima com o PSD no Governo)? E a parte espanhola das linhas Vigo-Porto e Madrid-Lisboa, que já foram lançadas, não pressupõe a construção da parte portuguesa, cumprindo a nossa parte no acordo? O que não diria o PSD se a situação fosse a inversa, recusando-se os espanhóis a avançar com essas linhas?
Em vez de se retractar pela acusação injustificada que fez à Lusa (e ao Governo), como devia, o PSD prefere fazer uma "fuga para a frente" absolutamente desatinada e irresponsável. Decididamente, o PSD persiste em se confirmar como um partido não fiável, ousando mesmo rasgar os acordos internacionais que firmou em nome do Estado português.

Deixe a verdade vir ao de cima!

I'm an economist, but I'm also an American citizen - and like many citizens, I spent the past eight years watching in horror as the Bush administration betrayed the nation's ideals. And I don't believe we can put those terrible years behind us unless we have a full accounting of what really happened. (...)
That's why this time we need a full accounting. Not a witch hunt, maybe not even prosecutions, but something like the Truth and Reconciliation Commission that helped South Africa come to terms with what happened under apartheid. We need to know how America ended up fighting a war to eliminate nonexistent weapons, how torture became a routine instrument of U.S. policy, how the Justice Department became an instrument of political persecution, how brazen corruption flourished not only in Iraq, but throughout Congress and the administration. We know that these evils were not, whatever the apologists say, the result of honest error or a few bad apples: The White House created a climate in which abuse became commonplace, and in many cases probably took the lead in instigating these abuses. But it's not enough to leave this reality in the realm of things "everybody knows" - because soon enough they'll be denied or forgotten, and the cycle of abuse will begin again. The whole sordid tale needs to be brought out into the sunlight.
(...) let the truth be told.


O economista americano que escreve isto 'e Paul Krugman. Numa carta ao proximo Presidente, Obama.
Uma carta que vale a pena nao apenas ler, mas estudar a fundo. Pelos conselhos que da para os EUA vencerem a crise, retirando os ensinamentos da historia e reconhecendo o que esta crise tem de diferente de todas as outras.
Uma carta que eu recomendo ao Primeiro Ministro e a todos os ministros e dirigentes do PS.
Uma carta que eu recomendaria a Dra Manuela Ferreira Leite e ao PSD, se tivesse a esperanca de que ainda aprendessem alguma coisa...

Desnorte

O que é que deu à presidente do PSD para condenar, falsa e injustamente, a Lusa, por esta, no exercício do mais elementar dever de informar, ter ouvido a reacção dos principais partidos espanhóis à insólita proposta de cancelamento da rede ferroviária em bitola europeia, que Portugal negociou com Espanha, nomeadamente através de governos do PSD? Não era mais do que evidente o interesse da questão para o lado espanhol, caso Portugal rompesse o acordo?!
Será esta reacção passional representativa de uma nova posição do PSD em matéria de liberdade de informação?
Aditamento
Se um ataque destes a um órgão de informação partisse do Governo, quem duvida que o PSD, aliás com toda a razão, não deixaria de fazer dele um caso político sério?!

Ignorância e preconceito (2)

O argumento da líder do PSD para anunciar a sua oposição à rede do TGV -- ela que validou o projecto TGV quando foi ministra das Finanças, num governo que acordou as ligações com Espanha!... -- revela muita ignorância e maior preconceito.
Dizer que o número de passageiros previsíveis na viagem Lisboa-Madrid, por referência ao actual tráfego aéreo, não garante a sustentabilidade financeira do investimento, esquece os seguintes dados: (i) a linha Lisboa-Madrid não servirá somente para as viagens entre as duas capitais, mas também para as viagens de Évora, de Elvas/Badajoz e mesmo de Cáceres para Lisboa, e em especial para o novo aeroporto de Lisboa; (ii) a mesma linha terá valência para transporte de mercadorias, o que constitui outra fonte de receita, ao mesmo tempo que fomenta a utilização espanhola dos portos de Lisboa, Setúbal e Sines; (iii) na equação financeira do TGV terá de entrar necessariamente a enorme vantagem ambiental, traduzida na poupança de milhões de toneladas de gases com efeito de estufa, cujo valor financeiro é cada vez mais elevado.
Aditamento
Ferreira Leite omitiu qualquer justificação para oposição à ligação Lisboa-Porto (que é obrigatória, por causa da saturação da actual linha do Norte e da deslocação do aeroporto de Lisboa para Alcochete) e à ligação Porto-Vigo (porventura a mais problemática em termos de custos e de vantagens), que também fazem parte do pacote aprovado pelo Governo Durão Barroso, de que ela fez parte.

Ignorância e preconceito

Para além da sua dimensão económica, os transportes colectivos têm desde sempre uma dimensão de serviço público, pelas suas vantagens sociais e ambientais (esta especialmente no caso dos transportes ferroviários). É por isso que os transportes colectivos beneficiam em geral de um financiamento público, a título de "indemnização de serviço público".
Essa dimensão de serviço público não pode ser ignorada no caso do transporte ferroviário, incluindo a nova rede de TGV em bitola europeia. De outro modo, se se contabilizassem somente as despesas e as receitas efectivas, teriam de ser encerradas várias das actuais ligações ferroviárias no activo, bem como os transportes colectivos de Lisboa e do Porto, que vivem em grande parte à conta do orçamento do Estado...

Notícias da crise

Eu sei que o mal dos outros não deve servir de lenitivo para o nosso, mas eu espero bem que em Portugal a recessão não atinja a dimensão catastrófica da Irlanda, o primeiro país da zona euro a entrar em recessão em 2008 e onde para 2009 se prevê uma contracção do produto de -4,5%, um défice orçamental de cerca de 9,5% (mais do triplo do limite do PEC!) e uma taxa de desemprego de 10%!
O afundamento irlandês é ainda mais calamitoso, se se tiver em conta que ainda em 2007 o "tigre celta" apresentava um robusto crescimento económico (mais de 5%), uma reduzida taxa de desemprego (à volta de 4,5%) e um superavit orçamental. O "milagre irlandês" ameaça acabar em pesadelo.
Não fora a protecção da zona euro, e a Irlanda poderia seguir o caminho da falência da Islândia...

A herança de Bush

Além das desgraças mais conhecidas, a herança de Bush inclui o maior défice orçamental nos Estados Unidos desde a II Guerra Mundial, a qual deve atingir no fim do actual ano orçamental (30 de Setembro de 2009) cerca de 8,3% do PIB (ainda sem contar com o custo do plano anti-recessão de Obama), mercê sobretudo do corte de impostos (sobretudo para os ricos) e das despesas da guerra do Iraque.
Contrariando a percepção tradicional da política financeira da Direita conservadora, Bush bem merece ficar na história como o campeão da irresponsabilidade orçamental.

"Desperdiçar dinheiro"

Num artigo justamente intitulado "Não desperdicemos os estímulos em baixa de impostos", o conhecido economista Joseph Stiglitz explica porque é que a redução de impostos não pode constituir uma instrumento do pacote de estímulo à economia contra a recessão. Ao contrário do investimento público.
Como aqui se tem defendido, desde o princípio.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Notícias da crise (2)

Se o nosso vizinho e principal parceiro económico, a Espanha, está assim -- défice orçamental de quase 6% e previsão de desemprego nos 16% ! --, como é que nós poderíamos escapar ao desastre económico!?

O que o PSD quer recusar

«TGV: Bruxelas confirma atribuição de 383,38 milhões de euros ao projecto português».

Notícias da crise

Mais lúgubre não pode ser a previsão da Economist sobre a recessão económica em Portugal no corrente ano e em 2010. Decréscimo de 2% no produto, desemprego a disparar para perto dos 9%, défice orçamental nos 4,5%, deflação efectiva, dívida pública a atingir os 70% do PIB.
Por menos credível que seja o registo histórico das previsões do Economist em relação a Portugal, ainda assim são perspectivas muito preocupantes.
Neste contexto de encurralamento das finanças públicas, limitando a margem de manobra do Estado para apoiar a economia, falar em redução do IRS, como ontem insistiu a líder do PSD, não é politicamente sério nem, muito menos, responsável.

Welcome back UK!

Agora que a sanidade está a voltar aos Estados Unidos, também o Reino Unido demonstra que aprendeu as lições do passado recente e declara que o conceito da 'guerra contra o terror' "está errada e induz em erro". Mais vale tarde que nunca. Bem-vindos de volta!

Política fiscal de esquerda

É de aplaudir a aposta política do PS na utilização do sistema fiscal como instrumento de combate à desigualdade social. Nem outra coisa seria de esperar, apesar da erosão da função social dos impostos, por efeito da globalização económica e da competição fiscal internacional, que levou à redução geral dos impostos sobre rendimentos do capital e sobre os lucros das empresas.
Todavia, a política fiscal continua a ser um dos principais temas divisórios entre a Esquerda e a Direita. Um partido de esquerda não pode, desde logo, alinhar com as as teses da "fiscalidade mínima", que a Direita preconiza, porque isso privaria o Estado dos recursos necessários para as políticas sociais (educação, saúde, protecção social), nem ceder às modas neoliberais da "flat rate" (taxa única) no imposto sobre o rendimento, porque isso colide com um princípio essencial de uma fiscalidade justa, que é a progressividade desse imposto.

Retribuir a protecção pública

«Sarkozy pede aos banqueiros que renunciem à "parte variável" das remunerações».
De facto, se o Estado, através de dinheiro e avales públicos, assegurou a estabilidade do sistema financeiro, imunizando os bancos contra o risco de falência, é justo que estes se auto-contenham na remuneração dos seus gestores e na distribuição de dividendos -- que poderiam não existir se o Estado não tivesse intervindo --, aproveitando para os reinvestir e recorrer menos ao financiamento externo. Além do mais, seria uma boa atitude simbólica em época de recessão, tendo em conta fama de ganância da banca e dos banqueiros.
Se os destinatários não entenderem voluntariamente esta "mensagem", será de considerar um aumento do imposto sobre os valores das remunerações excessivas e sobre os dividendos distribuídos...
De resto, esta política de moderação de remunerações e de dividendos deveria ser estendida a todas as empresas beneficiárias das ajudas anti-recessivas do Estado.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Justo elogio

«Sócrates elogia papel de Correia de Campos em reforma do SNS».

Missão naval da UE na Somália: e Portugal?

Portugal não contribui nem com meios navais nem com meios aéreos para esta missão (que está longe de resolver a questão de fundo, mas que tem a sua utilidade). Ainda vamos a tempo!

Um tremendo tiro no pé

Susan Crawford, a procuradora do Pentágono encarregada pela Administração Bush (felizmente a cessar dentro de dias) de conduzir as acusações dos presos em Guantánamo no contexto das famigeradas "comissões militares" - meio-termo bizarro entre tribunais civis e militares - veio a público dizer aquilo que muitos de nós sempre temeram: a tortura de suspeitos de terrorismo inquina fatalmente qualquer tipo de processo judicial. Mais, num caso em particular, o de Muhammad al-Qahtani, em que há fortes suspeitas de que se trata de um dos elementos da equipa que levou cabo a atrocidade do 11 de Setembro, as autoridades americanas ficam sem saber o que fazer.
A tortura não é só ilegal, moralmente abjecta e inútil, por levar as pessoas a confessar tudo e mais alguma coisa para se subtraírem ao sofrimento. A tortura é também totalmente contraproducente.
Ou como dizia a senhora Susan Crawford sobre Muhammad al-Qahtani perante a herança de oito anos de um combate ao terrorismo que incluiu métodos medievais:
"Ele é um homem muito perigoso. O que é que se faz com ele agora se não o podemos acusar e julgar? Eu hesitaria em dizer 'soltem-no' ".

E agora?

O Corno de África e a miséria na Somália

Já estão disponíveis na Aba da Causa a minha intervenção de ontem em Estrasburgo sobre a situação no Corno de África e o meu último artigo no Jornal de Leiria sobre a situação catastrófica na Somália em particular.

Notícias da crise

É certo que muitos países da zona euro (para não falar fora dela!), incluindo a super-ortodoxa Alemanha, se preparam para ultrapassar o limite dos 3% de défice orçamental, o qual em alguns países (Irlanda, Espanha, etc.) disparará para o dobro, ou mais. Tudo com a complacência da Comissão Europeia.
Isso, porém, não deveria ser de grande conforto para Portugal, dado o nível de endividamento público já elevado e o historial pouco abonatório de indisciplina financeira entre nós. Mais défice significa mais endividamento, o qual implica aumento dos encargos com a dívida, que se poderão tornar bem pesados, logo que, passada a recessão, os juros tiverem de começar a subir de novo. Por isso, importa ponderar se as vantagens da crescente despesa pública no combate à recessão (indispensável, mas sempre de efeitos limitados) compensam os pesados custos num futuro próximo.
Seja como for, em termos de sustentabilidade financeira, seria verdadeiramente aventureiro juntar ao aumento da despesa pública uma redução indiscriminada de impostos, como propõe a oposição de Direita. Decididamente, por puro oportunismo político, a Direita sacrifica os mais elementares princípios da prudência orçamental.

O oportunismo do PSD

«(...) O PSD, longe de propor alternativas verdadeiramente sustentadas às políticas do actual executivo, tem-se largamente limitado a cavalgar de forma oportunista ondas de insatisfação ou de pânico irracional que, ocasionalmente, foram rebentando na sociedade portuguesa (estou a pensar, por exemplo, na «onda de violência» do Verão passado e na crise da avaliação dos professores).»
Como manifestações do actual "oportunismo sistémico" do PSD (a expressão é minha), Pedro Norton poderia ter acrescentado a sua conduta no caso do veto presidencial do Estatuto dos Açores ou a proposta de redução indiscriminada de impostos em plena recessão económica. Já só falta ver o PSD defender uma subida substancial dos salários, ao lado do PCP e do BE!...
Aditamento
Na sua entrevista de hoje à RTP (como Judite de Sousa muda de tom de acordo com os entrevistados!...), Manuela Ferreira Leite sustentou que com ela o PSD reconquistou a "credibilidade política". A ter em conta as sondagens e as opiniões correntes, deve ser a única a crer nisso...
Aditamento 2
Sobre os dados do PSD nas sondagens ver a análise informada de Pedro Magalhães.