quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Orçamento (VI): "Lisbon first"

1. Pode o SNS ou o sistema de investigação científica revelar um óbvio défice de financiamento, tendo em conta desde logo os novos encargos com pessoal? Pode faltar dinheiro suficiente para avançar celeremente com infraestruturas essenciais por esse país fora, no domínio ferroviário ou até rodoviário (como a substituição do infame IP3 entre Coimbra e Viseu)? Pode! O que não falta nunca no orçamento é uma pingue dotação para a expansão da rede de metro de Lisboa e do Porto.
Continuo a não me conformar com esta situação, como tenho defendido ao longo de muitos anos! É tempo de libertar o orçamento de Estado desse nutrido encargo espúrio!

2. De facto, num país decentemente ordenado os transportes urbanos não devem ser responsabilidade do Estado central mas sim responsabilidade municipal ou intermunicipal (como, aliás, sucedia até 1975), ao abrigo dos princípios constitucionais da descentralização e da subsidiariedade. O argumento que serviu (e bem!) para remunicipalizar os transportes rodoviários de Lisboa e do Porto (Carris e SNTP) - ou seja, o de que a gestão municipal é mais apropriada e mais consentânea com os referidos princípios - vale inteiramente para a rede de metropolitano.
De resto, não se percebe como é que se podem coordenar efetivamente os dois modos de transporte numa cidade, se a gestão e a responsabilidade pelos investimentos estiver separada!

3. Não existe nenhuma razão para que os contribuintes do resto do país, desde Caminha a V. Real de Sto. António, que já pagam os seus próprios transportes urbanos (quando os têm!) como responsabilidade dos seus municípios, tenham de subsidiar também os de Lisboa e do Porto, dispensando os seus beneficiários desse encargo. Trata-se de uma verdadeira espoliação dos pobres pelos ricos!
Agora, que está na agenda política um ambicioso pacote da descentralização territorial, considero um escândalo que o Estado continue a assumir o investimento desse modo de transporte urbano das duas principais e mais ricas cidades do País.
Contradições que o atavismo centralista tece!...

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Responsabilidade política

A primeira e prioritária obrigação do Estado constitucional na garantia dos direitos fundamentais é assegurar o direito à vida e à propriedade dos cidadãos contra agressões de terceiros ou de fenómenos naturais. Quando o Estado falha rotundamente essa obrigação em duas situações idênticas próximas no tempo, como a perda de muitas vidas humanas e de um incalculável património às mãos dos fogos florestais, algo correu muito mal e alguém tem de assumir responsabilidades.
A responsabilidade do poder político e dos seus titulares não se resume à indemnização pública aos lesados pelos danos sofridos ("responsabilidade civil" do Estado), estendendo-se naturalmente à responsabilidade política - que em última instância se traduz na perda do cargo -, quer diretamente pelos atos próprios, quer pelas falhas dos serviços sob sua direção ou tutela, por culpa na escolha dos subordinados (culpa in eligendo) ou na sua direção ou superintendência (culpa in vigilando).
Como sói dizer-se (apropriadamente, aliás), em casos desta gravidade, "a culpa não pode morrer solteira", nem a responsabilidade pode ficar sem dono.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Floresta assassina (bis)

1. Utilizei esta expressão "floresta assassina", com algum eco público, aquando dos trágicos incêndios de Pedrógão no verão passado. Agora, depois do inimaginável dia de ontem, já em pleno outono, é caso para dizer que a assassina virou serial killer perante os nossos olhos incrédulos.
Com a devastadora perda de tantas vidas humanas no mesmo ano, o problema dos fogos florestais já não é apenas de ordenamento, limpeza e vigilância das florestas. Com a mudança climática a somar-se à inexoravel desertificação humana das zonas rurais, o que começa a tornar-se claro é que deixámos de ter condições logísticas para manter o país transformado numa extensa mata quase contínua de pinheiro bravo e de eucalipto ao serviço da indústria da celulose (na imagem a inquietante carta de risco de incêndio já em 2005).

2. Chegou o momento de questionar se queremos pagar um preço tão alto em vidas humanas e em inglório investimento na prevenção e combate aos incêndios, para tentar manter, com insucesso crescente, uma floresta industrial cada vez mais inadequada às condições orográficas, climáticas e humanas do País, em vez de equacionar corajosamente o regresso ao antigo coberto florestal de espécies autóctones, como o carvalho, o castanheiro, o sobreiro, a azinheira e outras, muito menos vulneráveis aos fogos florestais.
Os interesses identificados com a floresta industrial são poderosos e não são dados a escrúpulos na pressão sobre o poder político. Mas até quando é que estamos preparados para assistir sem revolta a dias de desespero como o de ontem?!

Sorte trocada

Bafejado pela fortuna no campo económico e financeiro, o País viu-se desesperadamente desamparado pela sorte no campo da meteorologia e dos incêndios florestais.
Houvesse opção, e os portugueses trocariam de bom grado...

Orçamento (V): Impostos virtuosos

1. Tirando a redução do IRS e a ideia de agravamento do IRC, referidas em posts anteriores, as restantes modificações fiscais anunciadas no projeto de orçamento para o ano que vem são em geral virtuosas quanto aos seus efeitos extrafiscais.

2. Começando pelos agravamentos fiscais, o aumento dos impostos sobre bebidas alcoólicas e sobre alimentos com excesso de componentes nocivos para a saúde (sal, etc.) têm um efeito dissuasor sobre o seu consumo, que já se mostrou eficaz no caso das bebidas excessivamente açucaradas. Só não se percebe a não inclusão do vinho, tanto mais que o setor vai bem e se recomenda.
O aumento do imposto de selo sobre o crédito ao consumo e dos impostos sobre o automóvel visam travar a bolha de compras a crédito, que afeta negativamente a balança comercial externa, como aqui se notou. Só é de estranhar não haver medidas para restringir o excesso do crédito à habitação.
O agravamento da taxa sobre o carvão das centrais elétricas sistémicas visa dissuadir o seu uso, dados os seus custos ambientais. Mas o melhor mesmo era encerrá-las!

3. Quanto a incentivos fiscais, a redução do IRC nos casos de investimento de lucros e de aumentos de capital corrigem uma distorção que favorecia o financiamento empresarial com recurso ao crédito e pode ajudar a minorar o défice de reinvestimento e de capitalização das empresas nacionais.
Ao invés, a eliminação da isenção dos "vales-educação" no IRC faz todo o sentido, não cabendo ao Estado incentivar o ensino privado.

Orçamento (IV): Condenados ao défice e à dívida?

O "Pacto Orçamental" de 2012, a que Portugal está vinculado, determina que «a posição orçamental (...) deve estar em equilíbrio ou em excedente orçamental», ressalvadas as situações nele admitidas. Consequentemente, sem défice orçamental o stock da dívida pública, no mínimo, não pode aumentar.
Ora, se o País não consegue nem uma coisa nem outra com um crescimento económico excecionalmente acima dos 2,5%, quando é que o vai conseguir!?

Orçamento (III): A "marca do PCP"

1. Em matéria de impostos, e em contraponto com a redução do IRS para os rendimentos baixos e médios, não deixa de ser preocupante manter-se em aberto a hipótese de agravar o IRC através de uma derrama sobre as empresas mais bem sucedidas, muitas vezes estrangeiras.
Com efeito, Portugal não precisa apenas de investimento mas especialmente de atrair investimento direto estrangeiro, dado o défice de poupança e de capital nacional e tendo em conta os demais efeitos virtuosos do IDE em matéria de emprego, inovação, exportações e balança de pagamentos. Ora, contraditoriamente com essa necessidade, Portugal mantém um IRC acima dos 20%, cerca do dobro de alguns dos países que competem connosco dentro da UE na atração de IDE, como a Irlanda (12,5%) ou a Hungria e outros países do leste (10% ou menos).

2. Neste contexto, mais do que no caso do IRS, o que se justifica em termos económicos é descer o IRC! O que não faz nenhum sentido é pensar em agravar ainda mais o imposto adicional sobre IRC, como quer o PCP, na sua obsessão contra o "grande capital" e as "multinacionais".
Como disse Jerónimo de Sousa, o projeto de orçamento já tem a «marca do PCP», sendo evidente que os comunistas se fizeram pagar bem pelo revés eleitoral nas autárquicas. Mas convém não exagerar...

domingo, 15 de outubro de 2017

Orçamento (II): Passo trocado

1. A segunda grande dúvida que o projeto de orçamento para o próximo ano suscita consiste em saber se faz muito sentido uma política orçamental expansionista quando a economia está a crescer acima do esperado, mesmo acima da média da União Europeia, e que manifestamente não precisa de nenhum empurrão orçamental, muito menos do lado da procura interna. A política de crédito do BCE, a robusta retoma económica da zona euro e o extraordinário surto turístico têm feito o seu trabalho de puxar pela economia. Pouco acrescenta "esturrar" mais umas centenas de milhões de euros em aumento da despesa pública.
Ora o estímulo da procura interna, no valor de muitas centenas de milhões de euros, vai refletir-se presumivelmente num aumento significativo das importações, agravando o défice de balança comercial de mercadorias e podendo mesmo pôr em risco o saldo comercial geral conseguido nos últimos anos.

2. Entre 2011 e 2014, o país viu-se obrigado, ao abrigo o "programa de ajustamento", a seguir uma política orçamental dolorosamente pró-cíclica, cortando rendimentos e aumentando impostos com uma recessão instalada pela crise da dívida externa, desse modo agravando a recessão. Agora, ao invés, opta-se politicamente por estimular orçamentalmente a economia quando ela está em plena expansão. 
Os efeitos da austeridade e da prodigalidade orçamental não são seguramente os mesmos para os que aguentaram a primeira e beneficiam da segunda. Mas se a primeira foi imposta pelo estado de necessidade financeira, a segunda é uma opção política. Em qualquer caso, em matéria de políticas orçamentais pró-cíclicas, continuamos de passo trocado.

sábado, 14 de outubro de 2017

Orçamento (I): Prodigalidade a crédito

1. O crescimento económico acima do esperado e a considerável folga orçamental que ele propicia (mais receita e menos despesa), que alguns calculam em mais de 1000 milhões, podem justificar toda a generosidade orçamental patente no projeto de orçamento para 2018, traduzida em aumento de remunerações e de transferências sociais (beneficiando como sempre o funcionalismo público e os pensionistas, não por acaso os dois mais extensos grupos eleitorais...) e em diminuição do imposto sobre o rendimento (IRS).
Mas, como já deixei escrito anteriormente, entendo que, numa perspetiva de médio prazo, e enquanto a dívida pública mantiver um nível estratosférico, o que se deveria fazer era aproveitar a excecional "safra orçamental" que o período de "vacas gordas" proporciona para acabar decididamente com o défice orçamental (incluindo o défice estrutural!) e para dar um corte a sério no rácio da dívida pública. Uma empresa não distribui dividendos enquanto tem perdas e mantém uma enorme dívida!

2. Os encargos com a dívida pública constituem o principal risco de previsível instabilidade financeira, quando o BCE descontinuar a sua atual política de baixos juros e quando a economia moderar o seu crescimento ou mesmo entrar em contração. Quando isso chegar, não é o mesmo continuar com uma dívida acima de 120% ou ela ter sido reduzida para baixo de 100%. E também não é o mesmo ter uma despesa pública empolada ou um nível mais sustentável de gastos públicos.
Por isso, a prioridade deveria ser colocar o país fora da zona de risco que a 3ª maior dívida pública necessariamente encerra. É altura de - e há condições financeiras para - mudar definitivamente de "liga" no campeonato europeu e mundial do endividamento público e do nível da taxa de juros. Os contribuintes agradecerão!
[revisto]

A política de comércio externo da União Europeia entre a globalização e o protecionismo



Eis o meu artigo sobre a política de comércio externo da UE publicado na revista "Cadernos de Economia", da Ordem dos Economistas (ano XXX, nº 120, jul/set. 2017), por ocasião do 7º Congresso Nacional dos Economistas, que ocorreu nos dias 12 e 13 deste mês, em Lisboa, para o qual fui convidado para intervir num dos debates sobre o atual quadro institucional da globalização e do protecionismo.
Note-se que desde o início da minha carreira universitária sempre me interessei, e continuo a interessar, pela interface entre o direito e o economia (ou seja, a regulação jurídica das relações económicas), tendo lecionado (e escrito sobre) direito público da economia, direito da regulação económica e, mais recentemente, direito económico internacional (comércio internacional e investimento direto estrangeiro).

terça-feira, 10 de outubro de 2017

Vinte anos a ensinar direitos humanos (2)

Eis o programa de amanhã de comemoração dos 20º aniversário do Ius Gentium Conimbrigae / Centro de Direitos Humanos (IGC/CDH) da Universidade de Coimbra, referida no post precedente. A sessão é pública.
Há momentos gratificantes assim na nossa vida profissional e académica.

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

20 anos de ensino de direitos humanos


Na próxima quarta-feira, dia 11, a abrir o II Congresso Luso-Brasileiro de Direito Público (dedicado ao tema da Justiça e Efetivação dos Direitos Humanos), vão celebrar-se na Universidade de Coimbra os vinte anos do Ius Gentium Conimbrigae / Centro de Direitos Humanos, o primeiro centro universitário de ensino, investigação e formação em direitos humanos entre nós, do qual fui cofundador e de cuja direção sou presidente.
Mesmo na vida de uma instituição duas décadas não é coisa despicienda, especialmente para quem contribuiu empenhadamente para ela.

sábado, 7 de outubro de 2017

Geringonça (5): Demasiado cedo para lhe rezar o responso

1. O "Expresso curto" de ontem especulava logo no título com «O fim da Geringonça», em consequência do pesado revés eleitoral do PCP em favor do PS nas eleições locais.
Já expliquei anteriormente porque me parece uma inferência errada. Por mais que sinta a tentação de "atirar com os burrinhos na água", o PCP tem de aguentar a situação, por duas razões: (i) primeiro, quem romper a aliança parlamentar e fizer cair o Governo será severamente punido nas eleições daí resultantes, abrindo caminho a uma maioria absoluta PS, um pesadelo para os comunistas (e bloquistas); (ii) segundo, o PCP ainda espera obter nas negociações orçamentais alguns ganhos substanciais que permitam "dourar a pílula", tanto mais que o atual crescimento económico, acima do previsto, permite ao Governo uma maior margem de manobra.
Por conseguinte, parece manifestamente exagerada a notícia da morte prematura da Geringonça enquanto a economia continuar a "bombar" emprego e receita fiscal.

2. Em contrapartida, também não têm razão os que, ainda há pouco tempo, consideravam a atual fórmula governativa como a melhor solução de governo, destinada a perdurar enquanto as esquerdas forem eleitoralmente maioritárias. Houve mesmo quem, na área socialista, dissesse preferir que o PS não obtenha maioria absoluta nas próximas eleições, para ter de repetir a mesma aliança com o BE e o PCP.
Parece-me ousada essa vocação de continuidade da Geringonça.
Por um lado, a sua longevidade depende de continuar a haver os meios financeiros suficientes para "pagar" as crescentes exigências orçamentais dos parceiros de aliança parlamentar; ora, a atual solução governativa é orçamentalmente dispendiosa e a receita fiscal e a despesa pública não vão continuar a crescer indefinidamente a este ritmo.
Por outro lado, por mais que o BE e o PCP mantenham verbalmente o seus "mantras" ideológicos (contra o capitalismo e a globalização, contra a integração europeia, contra a disciplina orçamental, contra o neoliberalismo, etc.), há de chegar o dia em que se torna intolerável a contradição entre essa retórica esquerdista e as opções políticas do Governo que eles sustentam, auto-constrangidos a ajudar a uma missa de cujo missal não são devotos, longe disso!
Por último, chegará o momento em que o próprio PS chegue à conclusão que a aliança com a extrema-esquerda é demasiado cara, quer em termos financeiros, quer em termos políticos, pelo cancelamento que implica de alguns pontos centrais do programa eleitoral do PS.
[Corrigido]

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Um Estado federal espanhol?

1. A propósito deste meu post sobre uma possível transformação federal da Espanha, um leitor pede-me que esclareça que modificações constitucionais e políticas é que isso implicaria no atual "Estado de comunidades autónomas" espanhol, ao abrigo da Constituição de 1978.
três requisitos essenciais de um Estado federal, que um Estado unitário não preenche, por mais descentralizado que seja, como é o "Estado autonómico" espanhol. São diferenças qualitativas, e não somente de quantidade ou grau.

2. Primeiro, num Estado federal, as entidades federadas gozam de autonomia constitucional, aprovando a sua própria constituição sem interferência do Estado, com respeito somente da constituição federal. O federalismo implica um constitucionalismo em dois níveis.
Ora, em Espanha, tal como em Portugal, os estatutos político-institucionais das comunidades autónomas são aprovados pelo Parlamento nacional, como "leis orgânicas" do Estado. Isso faz toda a diferença.

3. Em segundo lugar, num Estado federal, o parlamento federal é necessariamente bicamaral, sendo a segunda câmara destinada à representação exclusiva das entidades federadas (conselho interfederal), que assim participam, enquanto tais, na reforma constitucional e na função legislativa e na aprovação do orçamento do próprio Estado federal. Num Estado federal, o próprio poder federal é compartilhado pelas unidades federadas.
Ora, na Espanha existe um parlamento bicamaral, mas o Senado não representa especificamente, nem sequer maioritariamente (longe disso!), as comunidades autónomas, mas também as províncias, que são entidades de descentralização administrativa do Estado.

4. Por último, em matéria de repartição de competências entre a federação e as unidades federadas, a regra federal é que de que cabem por defeito às segundas todas as competências que a constituição não atribua à federação (em exclusivo ou em concorrência com entidades federadas).
Ora, no caso espanhol, a Constituição enuncia um conjunto de competências que podem ser conferidas às comunidades autónomas e acrescenta que também podem assumir outras que não estejam constitucionalmente atribuídas ao Estado, mas remata com a regra de que as competências não conferidas pelos estatutos às Comunidades ficam a pertencer ao Estado (recordemos que os estatutos são leis do Estado).

5. A minha tese é a de que mais vale uma Espanha unida sob forma federal do que uma Espanha desagregada em vários países. Não compartilho do regozijo de alguns portugueses com a possível desagregação e enfraquecimento da Espanha.
Infelizmente, tudo indica que a Catalunha já não tem uma solução espanhola. Penso que ninguém (nem a própria Catalunha) ganha com isso.

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

Globalização, protecionismo e Europa

No próximo dia 12 vou estar aqui, no Congresso Nacional dos Economistas como orador convidado no painel sobre "enquadramento institucional" das relações económicas internacionais.
O meu tema é posição da UE no atual quadro do comércio internacional, tendo em conta nomeadamente a deriva nacionalista a protecionista dos Estados Unidos, sob a presidência de Trump.

Catalunha

"Respeito pelo Estado de Direito e Democracia implica dialogar e negociar para resolver problemas políticos e preservar os direitos fundamentais dos cidadãos. Não foi o que vimos entre Madrid e a Catalunha desde que o estatuto autonómico de 2006 foi suspenso em 2010. 

O referendo de 1 de Outubro foi unilateral, não permitindo que parte significativa da população da Catalunha votasse:  mas só aconteceu  porque não houve negociação sobre um estatuto autonómico num quadro constitucional em que a entidade nacional catalã se possa afirmar. 

Eu sou europeista e federalista, logo contra a fragmentação de Estados e nacionalismos na UE. Mas ninguém fez e está a fazer mais pela causa independentista da Catalunha do que o governo do Sr. Rajoy, somando à recusa de negociar a repressão de pacíficos cidadãos que queriam votar, a que todo o mundo assistiu horrorizado no passado dia 1. 

 A tragédia do franquismo que conduziu à guerra civil em Espanha está na nossa memória colectiva. Como portuguesa, não posso deixar que resvalemos para mais enfrentamento violento. A UE não pode ficar à margem, a coberto do argumento estéril da legalidade: este problema não é apenas espanhol, é de toda a UE: afetados seremos todos se a Espanha se partir ou explodir em mais violência. É premente que a UE intervenha e facilite o diálogo e a negociação, contramedidas unilaterais que só farão escalar a violência."

 

(Intervenção que escrevi para debate agora em curso no plenário do Parlamento Europeu sobre "Constituição, Estado de Direito e direitos fundamentais em Espanha à luz dos acontecimentos na Catalunha")

Não dá para entender (2)

1. Em reação ao veto presidencial contra a exclusão legal da possibilidade de futura concessão da Carris pelo município de Lisboa, a coligação da esquerda parlamentar decidiu admitir a concessão, mas somente a empresas públicas, continuando a excluir a possibilidade de concessão a empresas privadas!
Esta solução, porém, não é séria, sendo uma verdadeira provocação ao veto presidencial!
Primeiro, a nova formulação não altera o fundo da questão, pois a concessão a empresa pública (à própria Carris?!) é uma simples forma alternativa técnico-jurídica de gestão pública. A única forma de concessão em sentido substantivo é a concessão a empresas privada, conjugando a titularidade pública do serviço público e as respetivas obrigações de serviço público com as vantagens da sua exploração empresarial privada.
Em segundo lugar, é evidente que se mantêm contra esta nova pseudossolução todos os argumentos políticos e constitucionais levantados contra a anterior, nomeadamente a ingerência do legislador na esfera decisão própria da administração, a restrição da autonomia municipal quanto à gestão dos serviços públicos a seu cargo e a discriminação contra o município de Lisboa, visto que tal restrição não existe para os demais municípios em relação às suas empresas de transporte público.

2. Que a extrema-esquerda parlamentar insista na sua obsessão ideológica pela exploração pública (sobretudo por razões laborais), compreende-se. Que o PS alinhe nessa doutrina, ainda por cima para contrariar um veto residencial inteiramente justificado, já não dá para entender, tanto mais que, em qualquer caso, uma eventual concessão privada da Carris dependeria de uma decisão do município de Lisboa, o que claramente não está na agenda num futuro previsível. Deve haver limites para as cedências político-doutrinárias aos parceiros de aliança parlamentar.
Resta saber se Belém "engole" esta "esperteza saloia"...

segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Geringonça (4)

(Fonte: Expresso online)
1. O "excesso" da vitória do PS nas eleições locais (que o "mapa cor de rosa" acima exibe) só pode deixar os parceiros da extrema-esquerda parlamentar à beira de um ataque de nervos, por verificarem que só os socialistas ganham eleitoralmente com o êxito da solução governativa conjunta.
No caso do PCP o amargo de boca é especialmente pronunciado, dado que é também pesadamente sacrificado pela enorme vitória eleitoral do partido governante, sendo um dos dois grandes derrotados da noite. Mas o BE dificilmente pode cantar vitória, tendo falhado vários dos seu objetivos eleitorais e continuando com uma expressão marginal no poder autárquico.
Em todo o caso, o que nenhum dos parceiros pode tolerar é a ideia de que estão afinal a trabalhar para levar o PS ao alcance de uma maioria absoluta nas próximas eleições legislativas, o que os tornaria politicamente dispensáveis.

2. Ao contrário do que entendem alguns analistas políticos, não é nada provável que os parceiros de maioria parlamentar caiam na tentação de sair intempestivamente do barco governativo, abrindo uma crise política, porque sabem que seriam fortemente penalizados em eleições antecipadas por eles provocadas. Mas não se vê como é que a suspeição de que a solução governativa favorece exclusivamente a hegemonia do PS, incluindo à custa deles, possa deixar de criar atritos adicionais no relacionamento interpartidário da "Geringonça".
Sempre me pareceu que a voluntarista fórmula governativa depende da capacidade de encontrar recursos orçamentais suficientes para pagar as vultosas exigências anuais do BE e do PCP, sem deixar de ir cumprindo os compromissos de consolidação orçamental no seio da zona euro. Tudo indica que essas exigências se vão tornar agora mais onerosas, tornando mais difícil a equação orçamental. A começar pela que está em curso até dezembro...

Divórcio



1. É evidente que o intentado referendo catalão era inconstitucional e que foi convocado sem o mínimo respeito pelas mais elementares regras da democracia parlamentar, o que lhe retira legitimidade. É também óbvio que os líderes do separatismo catalão revelaram um intolerável sectarismo demagógico e provocatório das instituições, o que lhes retira capacidade de mobilização de simpatias externas.
Mas o facto de o Governo de Madrid ter precisado de recorrer à violência policial em larga escala para travar o desafio de Barcelona só vai provocar profundas feridas na relação entre o Estado e a Comunidade Autónoma, alienando ainda mais uma parte substancial dos catalães. A demonstração de "músculo" repressivo de Madrid só pode gerar mais independentistas "enragés".
O divórcio pretendido pelo Governo catalão não pode ser por mútuo consentimento nem oficialmente declarado de forma unilateral, mas não se vê como é que, depois da jornada de 1/10 e da clivagem que ela revelou, a coesão política de Espanha possa ser restabelecida. O separatismo catalão não tem solução pacífica no quadro do atual Estado espanhol. Muito provavelmente, a Espanha não vai voltar a ser a mesma.

2. Regresso a uma tese que várias vezes defendi ao longo dos anos. Numa comunidade política plurinacional sujeita a tensões centrífugas, como a Espanha, o melhor modo de manter a coesão do Estado e respeitar a pluralidade nacional não é o Estado unitário (mesmo com "comunidades autónomas") imposto pela força, mas sim o federalismo. A Bélgica e a Bósnia-Herzegovina são bons exemplos recentes.
Infelizmente, em Espanha, a solução federal, há muito defendida pelo PSOE, foi reiteradamente rejeitada pela direita do PP e pela cultura dominante do centralismo castelhano. Agora, tudo indica que já é tarde para uma solução federal. Mas ainda vale a pena tentar.

domingo, 1 de outubro de 2017

Chicotada psicológica

A ter em conta as projeções e os primeiros resultados eleitorais conhecidos, as eleições locais deste domingo podem resumir-se assim: todos ganham de alguma maneira (PS, PCP, CDS, BE, independentes) à custa de um único derrotado, o PSD.
No caso do PS, trata-se de uma notável demonstração de força eleitoral, confortando o desempenho governativo. Quanto ao PSD, depois dos péssimos resultados nos grandes centros urbanos (verdadeiramente humilhantes em Lisboa e no Porto), a antecipar uma grande derrota numas eventuais eleições legislativas, não se vê como é que o partido pode passar sem uma "chicotada psicológica" na sua liderança. Tudo indica que a partir de amanhã, na ressaca deste choque eleitoral, vai iniciar-se a disputa política dentro do principal partido da oposição.

Adenda
Afinal há um segundo derrotado inequívoco nas eleições locais de hoje, que é o PCP, com uma pesada perda de cerca de 10 municípios, o que é tanto mais surpreendente quanto é certo que na campanha eleitoral o PS adotou um estilo low profile nos feudos do PCP. O espetro do "abraço do urso" deve perturbar o sono dos dirigentes do PCP esta noite...

Adenda 2
No fim do dia, a derrota eleitoral do PSD é ainda mais pronunciada do que a que inicialmente se apresentava. Reduzido a metade das presidências municipais do PS, o PSD quase desapareceu da metade sul do país, deixando de ter cobertura nacional no poder autárquico. Devastador!

sábado, 30 de setembro de 2017

Muito honrada pela Légion d' Honneur

Senhor Embaixador


Senhor Presidente da Assembleia da República

Senhor Presidente António Ramalho Eanes 

Senhora Ministro e Senhores Ministros

Senhora Secretária de Estado

Cara Margarida,

Minhas amigas e meus amigos,


Monsieur l'Ambassadeur,


C'est avec grand honneur et plaisir et que je reçois l' insigne de l' Ordre National de la Légion d' Honneur que vous avez eu la gentillesse de me décerner, en tant que représentant de la République Française en ce si ancient et loyal allié et partennaire de la France, qui est le Portugal.

 

Seja-me consentido supor, Senhor Embaixador, que, mais do que da intensa colaboração que ao longo da minha carreira diplomática estabeleci com colegas franceses, esta distinção resulta da cumplicidade crítica que sempre cultivei no Parlamento Europeu com todos os eleitos pelo povo francês que se empenham na construção da nossa União Europeia, e em particular com aqueles que integram a família socialista.

 

Sempre compartilhámos, os deputados europeístas e progressistas franceses e portugueses, objetivos e perspetivas de atuação convergentes quanto à indispensabilidade de aprofundar e fazer avançar o projecto político europeu. Mesmo quando nos impacientámos, não o escondo, pela persistência de uma visão neo-liberal economicista, financista e tecnocrática, inibidora da consolidação estratégica da União Europeia. Que ou é progressista e democrática, respondendo aos anseios, necessidades e sentido de justiça dos nossos povos, ou não será nem união, nem europeia. 


Para os riscos que a UE corre alertam as derivas nacionalistas, populistas e xenófobas que por aí grassam. Cabe a cada um de nós fazer mais do que ficar alarmado - cabe-nos tudo fazer para impedir que o pior da nossa história colectiva volte a repetir-se. 


Na era da mundialização desregulada, da desordem global com demasiados loucos em posições de poder, só nos salvamos - e preservamos a Humanidade - relançando a Europa que protege, defende e nos dá poder, como há dias sublinhou o Presidente Juncker. 


É justamente o caminho apontado pelo grande discurso,  por mais e melhor Europa, que  o Presidente Emmanuel Macron acaba de fazer, compelindo-nos a reflectir e a agir.

  

Monsieur l'Ambassadeur, 


L' Union Européenne, autant revée par les pères fondateurs, que donnée par acquerie par nos petits-enfants Erasmusiens, pourtant, n' y est pas encore, pleinement. Les grands dangers et les grands défis nous obligent de réinventer l'espoir et miser sur la confiance, y compris notre auto-confiance. On a su, quand même, le faire ici au Portugal, grace à l'alliance de forces progressistes ces deux dernières années. On peut donc aussi le faire au niveau européen. C'est pourquoi, plus que jamais, on se tourne vers la France, la sommant d' assumer son role à l'avant-garde de la relance de l'Union de nos peuples.


Merci pour cette distinction que je saurai porter et restera haut placée dans mon patrimoine civique et politique.

 


(Meu discurso de agradecimento por ser condecorada com a Légion d'Honneur (grau de "chevalier", ontem na Embaixada de França em Lisboa. Condecoração que me foi atribuída pelo Presidente François Hollande, por proposta do seu Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Harlem Désir)

quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Europa + (3): Um marco


O discurso do Presidente Macron na Sorbonne sobre a União Europeia é um ousado e coerente projeto de aprofundamento da integração política europeia.
E um daqueles discursos que, mesmo que venha a ter escasso efeito prático no curto prazo, ficará a constituir uma referência histórica, quer pela sua visão a ambição, quer pela autoridade e responsabilidade política do seu autor. Após a provação por que passou com a crise financeira, que ameaçou o euro, a União precisava de um choque destes. Depois dele dificilmente as coisas poderão ficar como estão.

Na gaveta

Perguntado pelo Jornal de Negócios sobre as propostas mais apropriadas para reduzir as desigualdades de rendimento - que estão a crescer -, o especialista servo-norte-americano Branko Milanovic (na imagem um dos seus livros sobre o assunto) mencionou três medidas: a educação, a desconcentração do capital financeiro e a tributação das heranças.
Concordo! Quanto à última, em especial, defendo há muito a restauração do imposto sobre as doações e heranças de elevado montante. Eliminado pelo Governo PDS/CDE em 2004, voltou ao  programa eleitoral do PS nas eleições de 2015, mas foi surpreendentemente afastado nas negociações que levaram ao apoio do PCP e do BE à formação do Governo. Conta-se entre os custos da "Geringonça"!
Metida "na gaveta", resta saber se alguma vez a proposta voltará a sair de lá. Em política, os temas retirados da agenda político-doutrinária dos partidos poucas vezes lá regressam...

terça-feira, 26 de setembro de 2017

Concordo

Parece que o Ministério da Saúde equaciona a imposição um «período mínimo de fidelização ao SNS para os médicos que terminam a especialidade», só depois podendo ir para a atividade privada.
Considero justíssima uma tal solução, que eu próprio defendi há pouco tempo. Além de pôr fim à parasitação do SNS pelo setor privado, trata-se, além do mais, de uma questão de igualdade: o Estado não toma (nem deve tomar) a seu cargo, à custa dos contribuintes, a especialização de outras profissões destinadas ao setor privado.

Adenda
Como era de esperar, a Ordem dos Médicos veio logo protestar. A Ordem costuma invocar recorrentemente a defesa do SNS, quando se trata de reivindicar maior financiamento, o recrutamento de mais médicos, etc. Mas quanto estão em causa questões gritantes, como esta, a Ordem assume imediatamente a sua vocação corporativa...

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

No 20º aniversário do Mestrado Europeu em Direitos Humanos e Democracia

Publiquei no Aba da Causa  o discurso que proferi como "guest speaker" na cerimónia comemorativa dos vinte anos do início do Mestrado Europeu de Direitos Humanos  e Democracia (de que fui cofundador e de continuo a ser diretor nacional), que teve lugar ontem, em Veneza na grandiosa Escola Grande de San Rocco (na imagem).

sábado, 23 de setembro de 2017

Amanhã vou estar aqui


Passa este ano o 20º aniversário da fundação do European Masters Degreee in Human Rights and Democratisation, o primeiro mestrado criado sob os auspícios da UE e por ela financiado.
Tendo sido um dos dez fundadores, em 1997, em representação da UC, e sendo agora o decano do programa, entretanto compartilhado por 41 universidades europeias, vou fazer uma saudação amanhã, como "guest speaker", na inauguração do novo ano letivo em Veneza (no topo, o mosteiro de San Niccolò, no Lido, sede da instituição).
Duas décadas de dedicação em prol dos direitos humanos na UE e no mundo, no ensino e na formação de especialistas. Um grande orgulho pessoal e institucional neste evento.

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Voltar ao mesmo (14)


1. Os últimos dados do Banco de Portugal confirmam o disparo do crédito à habitação e ao consumo, enquanto prevalece uma redução do crédito às empresas.
Apesar do aumento do poder de compra trazido pela aceleração da retoma económica e pelo aumento de emprego, muitos portugueses voltaram a gastar mais do que ganham, mercê do recurso ao crédito, aproveitando os juros baixos e o novo ambiente de confiança económica. O aumento do endividamento dos particulares reduz a taxa de poupança (num país que tem uma enorme falta de capital) e faz aumentar as importações de bens de consumo (automóveis, eletrodomésticos, etc.), agravando o défice da balança comercial de mercadorias.

2. Na entrevista ao Diário de Notícias no fim de semana passado, o Primeiro-Ministro voltou a censurar as opções de crédito da banca. Mas os bancos optam racionalmente pelo crédito à habitação, por causa da garantia hipotecária, e pelo crédito ao consumo, por causa dos seus juros mais elevados do que o crédito às empresas.
Já o Governo tem meios de restringir o recurso ao crédito, que, porém, não usa obviamente para não perturbar o clima de "fim da austeridade" e para não dificultar a vida aos bancos, ainda a braços com as consequências da crise.
Resta saber se este empolamento do crédito ao consumo é sustentável no médio prazo.

Adenda
Sem surpresa, fica a saber-se que a poupança baixou para níveis de há 18 anos!

terça-feira, 19 de setembro de 2017

Não dá para entender

1. A proposta de nomeação do Governador do Banco de Portugal pelo Presidente da República é constitucional e politicamente desassisada.
É constitucionalmente inepta porque os poderes do Presidente da República (de nomeação e outros) são apenas os enunciados na Constituição, onde não consta este. Ai do sistema constitucional, se os poderes constitucionais do PR pudessem ser precipitadamente ampliados por via de lei! É politicamente despropositada, porque não existe nenhuma razão séria para dar ao Presidente da República um poder de veto sobre a nomeação do órgão executivo de uma entidade pública administrativa como o banco central.
Não valem neste caso as razões especiais que justificam a nomeação presidencial (sob proposta do Governo) do PGR, das chefias militares e dos embaixadores (todas elas previstas na Constituição). A legitimidade do governador do BP deve resultar da vontade política do Governo, sob controlo da AR, como é próprio de um sistema de base parlamentar como o nosso, e não do PR, que não é eleito para governar. Ao contrário do Governo, o PR não é sancionável politicamente pelos seus atos.

2. Essa proposta já tinha sido adiantada anteriormente, sem ter vingado. O que seria estranho era vê-la agora perfilhada e aprovada por um Governo do PS, ao arrepio da sua tradicional rejeição firme de modificar o sistema de governo em favor de Belém.
Mesmo que fosse de equacionar essa solução numa futura revisão constitucional, isso só seria de aceitar no quadro de um "trade-off" com outros poderes do PR, de modo a preservar o atual equilíbrio político-constitucional. Dar esse novo poder ao PR de forma "gratuita" envolve uma concessão presidencialista que não se espera do PS. Mário Soares e Nunes de Almeida (que em 1982 negociou a revisão constitucional que definiu meticulosamente o quadro institucional do poder político que perdurou até agora) devem mexer-se no túmulo, de surpresa e incómodo, se esta imprudente solução for para a frente.
Não dá para entender! Questões deste gabarito deveriam estar imunes a manobras de oportunismo político conjuntural sem princípios, reveladoras de um preocupante défice de cultura política e de conhecimento da história constitucional nacional.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Voltar ao mesmo (13)

1. Ninguém quer ficar para trás. Uma depois da outra, as categorias de pessoal do setor público nas áreas mais sensíveis - justiça, saúde, segurança e agora os inspetores da ASAE - posicionam-se para o assalto ao orçamento. Os sindicatos querem sempre duas coisas: mais gente nos quadros e mais dinheiro. Em qualquer caso, mais despesa pública.
Ao contrário do que sucede no setor privado, sabem que as suas reivindicações excessivas não põem em causa o próprio emprego. Não há despedimentos no setor público por falta de recursos. Os "acionistas" do Estado não podem declarar a sua falência nem determinar o despedimento coletivo ou o lay-off do pessoal. É por isso que as greves na função pública não envolvem riscos.

2. Certos do automático apoio do PCP e do BE e da esperada benevolência do Governo, todos os funcionários públicos querem ver traduzidos em beneficios imediatos a proclamação oficial do "fim da austeridade" (que foi apressadamente interpretada como o fim das restrições orçamentais) e o crescimento da economia acima do esperado. A anunciada retoma das progressões na função pública (por onde, aliás, se deveria ter começado na reposição de direitos na função pública) não chega.
E como parece que todos os que fazem greve levam alguma coisa, nem que seja de forma faseada, sobrecarregando desde já os orçamentos seguintes, não há razão para os demais ficarem quietos. O congelamento de remunerações, que continua formalmente em vigor, só vale para quem não tem poder de paralisar o funcionamento dos serviços públicos. É o triunfo "darwinista" dos mais fortes.
Resta saber até onde pode ser esticada a pretensa "folga orçamental" derivada do crescimento acima do previsto sem pôr em causa a imperiosa consolidação orçamental em que o Governo se acha empenhado (e bem!).

domingo, 17 de setembro de 2017

Um pouco menos de euforia, sff

É positivo saber que nos últimos trimestres a economia portuguesa cresce acima da média da União, o que já não sucedia há muito tempo, com a consequente degradação da posição do país no ranking dos Estados-membros.
Todavia, não existem razões para a euforia política criada, por duas razões. Em primeiro lugar, dado o pequeno diferencial, a este ritmo Portugal vai precisar de muitos anos para recuperar o atraso acumulado ao longo destes anos. Em segundo lugar, e principalmente, apesar de crescer mais do que a média da União (devido ao menor crescimento das grandes economias), a economia portuguesa está a crescer menos do que quase todos os demais países da segunda metade da lista da União (exceto a Grécia), como mostra a tabela acima, retirada do Expresso/Economia de hoje), pelo que continua a descer no ranking, estando agora em vias de ser ultrapassado pela Lituânia!
Por isso, apesar de bom, o ritmo de crescimento da economia portuguesa não é suficiente para impedir a continuação da descida na classificação da liga económica europeia. Quando todos crescem, Portugal precisa de crescer mais do que todos os outros, incluindo a Espanha e as economias mais dinâmicas do Leste, sendo com essas que nos devemos bater. Decididamente, é preciso fazer consistentemente melhor no capítulo da produtividade e da competitividade da economia portuguesa.