sexta-feira, 14 de janeiro de 2005

Incontinência

O Governo cessante continua a anunciar medidas políticas e legislativas a todo o vapor, como se não estivesse demitido. Ontem, por exemplo, eram as providências antitabagistas, hoje são as apostas de corridas de cavalos. Manifestamente nada disso cabe no conceito constitucional de "medidas estritamente necessárias", que delimita a competência essencialmente diminuída de um governo demitido.
A um mês das eleições, já que o Governo não mostra ter escrúpulos nesta matéria, não é altura de o Presidente da República sinalizar de uma vez por todas que as coisas não podem continuar assim e anunciar que esses diplomas não serão promulgados?

Quando a realidade ultrapassa a anedota

Há quem descubra as ocorrências mais mirabolantes, por exemplo esta: um juiz dado como incapaz por razões psiquiátricas foi nomeado director nacional da PSP!? Será que houve entretanto um milagroso restabelecimento do cavalheiro, ou será que este Governo apostou decididamente numa concorrência desleal com os melhores humoristas da nossa praça?

quinta-feira, 13 de janeiro de 2005

Confusão

É conveniente não confundir "hospitais SA" com hospitais privados, nem sequer com hospitais públicos sob gestão privada (caso do Amadora-Sintra). Trata-se, sim, de uma das duas modalidades de gestão pública de hospitais públicos, sob forma empresarial, sendo a outra a forma de "ente público empresarial" (EPE), que foi preterida pelo actual Governo a favor daquela. A empresarialização, que é uma mudança da forma de gestão pública, não se confunde com privatização, ou seja, entrega ao sector privado.

Lições a tirar pela UE do tsunami no Índico

A catástrofe no Índico afectou-nos a todos globalmente e desencadeou solidariedade global. A segurança global falhou e aqui não podem apontar-se culpas a terroristas - a Natureza e a impreparação global estiveram na origem desta imensa tragédia.
A ONU, como é devido, está a coordenar a assistência aos sobreviventes. A UE está a actuar nesse sentido, mas tem também de tirar já lições para o futuro.
Precisamos de tornar global um sistema de detecção e aviso atempado de catástrofes, como o que já existe, e que teria permitido salvar milhares de vidas. A tecnologia europeia Galileu pode ajudar.
Precisamos de investir num sistema de protecção civil da União Europeia que coordene e reforce capacidades de prevenção e resposta rápida de todos os Estados Membros.
Precisamos de fazer uso da logística militar da UE - não apenas a de alguns dos seus membros - para dar assistência às áreas afectadas de mais difícil acesso. E investir nessas capacidades e na sua rápida projecção em futuras emergências semelhantes.
Precisamos de seguir de perto, políticamente, a reconstrução no Aceh/Indonesia e no Sri Lanka para impedir a retomada da guerra e do conflito nessas zonas.
A União Europeia e os seus membros precisam, finalmente, de honrar os compromissos que assumiram na Declaração do Milénio e envolver todos os outros países ricos na luta contra os "tsunamis da pobreza" que todos os meses matam centenas de milhar de pessoas vítimas da fome, da doença e da guerra, em especial em África.
Cabe-nos não deixar que os mortos tenham morrido em vão: esta tragédia deve ser o ponto de viragem pela boa governação global, por uma globalização mais justa para todos.

Intervenção no Plenário do Parlamento Europeu, Estrasburgo, 12.1.05

Plágio democrata-cristão (2)

O caso do monumental plágio do dirigente da juventude do CDS na Madeira -- agravado pela miserável tentativa posterior de passar de acusado a acusador -- não pode dar-se por encerrado com a nota de desculpas hoje publicada pela direcção do Diário de Notícias do Funchal.
Há, por um lado, o infractor, que ainda não se retractou publicamente do seu acto criminoso, nem apresentou desculpas a quem tentou vilipendiar.
E há também que saber se depois disto ele vai manter-se à frente da juventude partidária a que pertence e também qual vai ser a reacção do CDS madeirense e do CDS nacional. Será que um partido pode permitir-se contar com um tratante deste jaez entre os seus dirigentes? É admissível pensar que um sujeito capaz desta canalhice pode vir a ser dirigente nacional do CDS e eventualmente titular de um cargo público (quiçá ministro)?
Estas perguntas não podem ficar sem resposta. E há silêncios e inércias que comprometem...

Plágio democrata-cristão

Na sequência do escandaloso plágio cometido por um dirigente da juventude do CDS da Madeira no Diário de Notícias do Funchal, copiando textos publicados no Causa Nossa, a direcção do DN publica na edição de hoje uma nota cujos pontos decisivos são os seguintes:
«3 - A propósito de um escrito de opinião do Sr. Roberto Rodrigues (publicado na edição de 5 de Janeiro de 2005, com o título "O fim do ano político de 2004") fomos alertados pelos senhores Vicente Jorge Silva e professor Vital Moreira que textos deles anteriormente publicados haviam sido copiados pelo Sr. Roberto Rodrigues naquele seu escrito.
4 - Tendo a oportunidade de poder reconhecer e rectificar o seu erro, o Sr. Roberto Rodrigues não o fez, e, em resposta a uma carta de Vicente Jorge Silva (publicada no DIÁRIO a 8 de Janeiro de 2005), sugeriu que não plagiou mas que teria sido plagiado.
5 - Feitas averiguações, o DIÁRIO concluiu que os senhores Vicente Jorge Silva e professor Vital Moreira foram efectivamente plagiados pelo Sr. Roberto Rodrigues.
6 - O DIÁRIO, como qualquer jornal sério e credível, não pode tolerar, nem tolerará que, com o seu conhecimento, as suas páginas sejam utilizadas para actos de plágio.
7 - Face à situação descrita, o DIÁRIO apresenta pedido de desculpas aos seus leitores e, em especial, aos senhores Vicente Jorge Silva e professor Vital Moreira.
8 - Finalmente, o DIÁRIO informa que o Sr. Roberto Rodrigues foi excluído do seu painel de colaboradores.»
Só posso dar-me por satisfeito pela justa decisão que o diário funchalense tomou (depois de inadvertidamente ter dado guarida a uma canhestra tentativa de desmentido do criminoso, ainda por cima a tentar virar a acusação contra as vítimas), denunciando o malfeitor e punindo com a expulsão a aleivosia cometida nas suas páginas. Era também o seu bom nome e reputação e o respeito para com os seus leitores que estavam em causa. A nota hoje publicada só o prestigia.

Governo demitido

«Sobre o governo estar demitido, note a notícia de ontem sobre a continuação da preparação de uma lei contra o fumar em locais de trabalho, lei que evidentemente não cabe nas tarefas de gestão de que o governo está incumbido.
Note-se que eu sou claramente favorável à introdução de uma tal lei, aliás sem os recuos que o governo está a congeminar em matéria de estabelecimentos do setor HoReCa. Mas não penso que a feitura de uma tal lei caiba a um governo em gestão. Deveria aliás, de facto, caber à Assembleia da República. Mas está mais que visto que, numa democracia, é impossível a assembleia legislativa cumprir a sua função em matérias polémicas com esta.»

(Luís Lavoura)

Entre aspas

«Bragança, essa, tem já a sua Ópera mas os esgotos correm para as ribeiras sem tratamento adequado» (Pedro Serra).

A grande ausente

O Parlamento Europeu aprovou ontem por esmagadora maioria o projecto de Constituição europeia, recomendando a sua ratificação a todos os Estados-membros. Entretanto a Hungria tornou-se o segundo País a ratificar o tratado constitucional (aprovação parlamentar). O primeiro referendo terá lugar dentro de pouco mais de um mês na Espanha, estando em curso um grande esforço de esclarecimento sobre a Constituição. Na França decorre a revisão constitucional necessária para permitir a ratificação, e o prometido referendo ocorrerá antes do Verão.
Também aqui continuamos a divergir da média comunitária. De facto, a Constituição europeia vai ser a grande ausente deste intenso ano político em Portugal. O previsto referendo, que chegou a ter uma data indicativa, ficou irremediavelmente adiado por efeito da dissolução da AR e do chumbo da pergunta referendária pelo Tribunal Constitucional. Tudo indica que a questão só voltará à agenda política nacional depois de terminado o ciclo eleitoral com a eleição do Presidente da República em Janeiro de 2006. Não é provável que se torne uma questão central nos debates eleitorais, a começar no que está já a decorrer.

Diário eleitoral (10) - "Ruído" desnecessário

Não é preciso grande poder de observação para ver que a pré-campanha eleitoral do PS está a ser excessivamente condicionada pelo facto de ainda não estar aprovado o programa eleitoral, agravado pela grande pressão dos "media" e da opinião pública sobre ele, como provável vencedor das eleições. Primeiro, a falta de definição das propostas eleitorais não permite adiantar respostas claras para alguns problemas determinantes. Segundo, há demasiado "ruído" nos "media" provocado por sucessivas especulações, vindas não se sabe de onde, acerca de alegadas intenções, em geral improváveis, do PS em diversas áreas politicamente mais sensíveis (impostos, estatuto empresarial dos hospitais, calendário do referendo da despenalização do aborto, arquitectura do futuro governo, etc.).
Isso tem obrigado José Sócrates, por um lado, a evitar tomar posições precisas sobre vários temas (o que não condiz com o seu estilo) e, por outro lado, a consumir demasiado tempo e esforços a desmentir ou a esclarecer as referidas especulações (o que é um desperdício).
É de admitir que estes factores desapareçam com a próxima aprovação pública do programa eleitoral. Mas até lá bem se poderia evitar alguma agitação contraproducente.

Argumentos pouco católicos

Para tentar desqualificar o veredicto da Comissão de Avaliação dos cursos de Direito, que colocou à frente as faculdades de Direito das Universidades de Coimbra e de Lisboa ("Clássica"), o director da Faculdade de Direito da Universidade Católica não se inibiu de argumentar que a sua faculdade terá sido prejudicada devido à composição da Comissão de Avaliação, em virtude da presença de muitos professores das duas referidas universidades públicas. Mas, como aqui já se mostrou, o argumento é insustentável, visto que a maior parte deles são ou foram também professores da Católica. Provavelmente era a UCP que tinha mais professores seus na Comissão...

PS - O Diário Económico dedica uma página inteira, com chamada de primeira página, não a dar conta dos resultados da avaliação (que provavelmente nem sequer seria noticiada), mas sim da contestação da Universidade Católica. Há quem, perdendo em jogo, ganhe depois nos jornais...

quarta-feira, 12 de janeiro de 2005

Guerra justa

«Abel Mateus [o presidente da Autoridade Nacional da Concorrência] declara guerra aos cartéis».
Que não esmoreça!

Mas este Governo não está demitido?

Parece que não. Todos os dias se anunciam decisões governamentais ou até projectos (!?) de todo o género, desde os negócios de São Tomé e Príncipe até à privatizaçãop da TAP, que não cabem obviamente a um "governo de gestão" e que portanto poderão ser sempe impugnados no futuro por incompetência.
O que mais choca é o ostensivo abuso de poder. Escrúpulos democráticos é coisa que não existe neste Governo.

No amor e na guerra

É sempre dramático quando uma relação termina e surge a obrigatória contabilidade das partilhas. Os CD's e livros que ficaram nas mãos do outro, por exemplo, em empréstimos que não estavam preocupados com prazos - certos ou incertos. E é curioso constatar ainda que, se "no amor e na guerra vale tudo", não é só essa condição a unir os dois conceitos. No amor e na guerra ficam também, sempre, despojos por dividir.

Quarto com vista sobre a cidade

Um dos meus melhores amigos e antigo companheiro do Desejo Casar, o Hugo Rosa, resolveu voltar às lides blogosféricas com a escritura pública que o torna proprietário absoluto do blogue do título.
O Hugo é meu amigo desde que me conheço e se, no tempo do DC, era o "nosso correspondente" na Horta, Faial, onde realizava o estágio de advocacia, agora escreve-nos desde Angra do Heroísmo, recém-advogado, em vésperas de consumar o desejo que titulávamos no nosso anterior blogue.
Direi apenas duas coisas mais: o HR ainda é, hoje, o maior talento literário bruto que alguma vez conheci e conseguiu, há poucas semanas, fazer com que voltasse a comprar o Independente, graças a um artigo onde era destacado por ter atingido a mais alta média entre todos os que concluíram estágios de advocacia no ano passado (o que não é nada despiciendo nem de somenos - quer a média, quer o facto de me ter levado a comprar o Indy; coisa que já não acontecia desde os tempos idos do MEC).

Para aguçar o apetite, deixo um post do novíssimo blogue. Bem-vindo de volta!

"Na América de que eu gosto

Na América de que eu gosto não existe George W. Bush, nem Donald Rumsfeld, nem Collin Powell, nem os outros falcões.
Na América de que eu gosto não se pensa nos habitantes das margens do Mississipi como pessoas encapuçadas que se vestiam de branco. Aliás, na América de que que gosto sempre se pescou no Mississipi.
Na América de que eu gosto podemos imitar Jack Kerouac e apanhar a Route 66 e tentar sair de Nova Iorque para chegar a Los Angeles.
Na América de que eu gosto Kennedy é vivo e dá conferências à volta do mundo com Carter. E também com Clinton.
Na América de que eu gosto Clinton não respondeu em público sobre questões da vida privada. E traiu a mulher com Monica Lewinski, e a mulher esbofeteou-o mas, eventualmente, perdoou-o. Ou não. Mas Clinton esteve sempre calado e nunca cometeu nenhum perjúrio para com o povo norte-americano.
Na América de que eu gosto vivia Stuart Blazer, que agora vive em Angra do Heroísmo, onde possui uma albergaria e um restaurante, "Ondas de Bruma". O nome é piroso, mas Stuart não. Stuart não gosta de Kerouac, mas adora Lobo Antunes e Pessoa, lidos em inglês.
Na América de que eu gosto gostava eu de viver.

posted by Hugo Rosa at 7:56 AM"

Ruibrancos Anónimos

Para todos aqueles que estavam preocupados com a longa ausência de rasgados elogios a Rui Branco e seus camaradas, aqui ficam as minhas embevecidas felicitações pelas primeiras 40.000 visitas do ESPLANAR.

Dilema eleitoral

«A propósito do seu post sobre os "riscos" da vitória antecipada do PS, seria bom que o próprio PS e os seus mais destacados dirigentes, não se deixassem embalar na onda de euforia e deslumbramento que parece existir, mesmo que não assumida publicamente. Uma coisa é o desagrado existente, actualmente, em relação ao actual Governo, outra coisa é o eleitorado estar "desejoso" para que o PS volte a ser governo. São coisas diferentes. Por outro lado ainda não são conhecidas, e muito menos debatidas, as propostas concretas do PS para os próximos anos.
Para falar verdade aos portugueses o PS vai ter que dizer coisas que não serão muito agradáveis aos bolsos de muito eleitores. Se não o fizer arrisca-se a ser acusado de "eleitoralista" e pouco realista, logo pouco credível. Perante este dilema - falar verdade e perder votos - qual será a opção do PS?»

(Nelson Henriques)

Diário eleitoral (9) - A idade da reforma

O Jornal de Negócios anunciava ontem (link indisponível) que o projecto de programa eleitoral do PSD -- ainda pendente de aprovação política -- vai prever a elevação da idade da reforma e a equiparação das condições de reforma da função pública. Se não houver recuo nesta matéria, trata-se de duas medidas justificadas (pena é que só sejam propostas justamente quando o partido se prepara para deixar o Governo...).
Descontado o seu previsível efeito na menor criação de emprego, a elevação da idade da reforma pode constituir um factor importante de sustentabilidade da segurança social, tendo em conta a diminuição relativa da população activa e o prolongamento da vida média das pessoas. De resto, não tem sentido que uma idade da reforma estabelecida quando a esperança média de vida era inferior a 60 anos se mantenha inalterada quando a esperança de vida em Portugal é hoje superior a 70 anos (quase 80 para as mulheres). Também não se justifica o diferencial em favor dos funcionários públicos, até porque hoje no sector público o regime da função pública coexiste cada vez mais com o contrato de trabalho, sendo inaceitável a discriminação dos regimes da reforma e da segurança social.

"O caminho para a maioria absoluta"

«Não tenho a certeza que o PS vá fazer uma campanha aberta, pela verdade e pela frontalidade. Ao ver a listas para deputados, ao vermos as "novas figuras" que rodeiam José Sócrates, fica-se com a sensação que a "mudança" é mais superficial do que o que seria de esperar. Por fim e não menos importante, a mesma imprensa que até agora tem "derrubado" o actual governo e P. Santana Lopes, como se vai comportar durante a campanha eleitoral? (...) Por todas estas razões, tenho para mim que a maioria absoluta, não está, ao contrário do que as sondagens do Rui Oliveira e Costa mostram, tão perto. Receio mesmo que as sondagens possam ter um efeito desmobilizador, para muitos que pensam que a vitória está certa. Para os indecisos, para os que não estão motivados (ou desmotivados) para votar, quais são as figuras nacionais de referência, galvanizadoras e mobilizadoras desse eleitorado (por vezes decisivo) que o PS, neste momento dispõe? Quem serão os ministros - nomeadamente das Finanças, da Economia, da Saúde, etc. - que irão executar as políticas propostas? Penso que o caminho para a maioria absoluta não vai ser fácil, mas depende mais do próprio PS e de José Sócrates em particular do que de Paulo Portas e P. Santana Lopes.»
(Nelson Henriques)

terça-feira, 11 de janeiro de 2005

"O parlamento de Lisboa"

O meu provocativo artigo no Público de hoje, com o título em epígrafe, começa assim:
«Há momentos em que Lisboa descobre de bom grado o resto do país. É quando o seu pessoal político excedentário, que não cabe nas listas eleitorais da capital, invade "a província" à procura de um lugar que lhes garanta uma cadeira em São Bento. Lisboa elege só por si 48 dos 230 deputados da Assembleia da República. No final, provavelmente mais de uma centena dos parlamentares são de Lisboa.»
A continuação pode ser vista no jornal (ou também no Aba da Causa, como habitualmente).

o futuro é um lugar estranho

É fim de dia e estou saudavelmente perdido na redacção. Os poucos jornalistas que sobram ultimam as suas tarefas próprias de um diário. Escreve-se a metro, fazem-se telefonemas, fecham-se páginas em programas de computador que nunca compreenderei.
E eu observo. Refugiado num computador que não me pertence olho o mundo dos outros onde estou, por momentos, hospedado. Sinto-me estrangeiro mas estou bem. Habituei-me a este padrão - o hábito de não pertencer a lado nenhum. De viver em Lisboa com os Açores no coração, de trabalhar no guionismo após cursar Direito, de colaborar num jornal sem ser jornalista, de nunca saber o que colocar ao certo no espaço em branco que os formulários reservam à "profissão".
Prometi a mim mesmo, por ocasião das resoluções de Ano Novo, que doravante viveria um dia de cada vez, sem pensar no ontem, sem perspectivar o amanhã. Sobretudo sem perspectivar o amanhã.
Hoje, dia 11 de Janeiro, creio que o consegui fazer pela primeira vez na vida. Sinto-me estrangeiro mas estou bem. Acometido por um súbito desejo de ser hóspede no mundo dos outros para sempre, canto baixinho - antes de arrumar as coisas e sair - as palavras de Variações pela voz de Camané:

"Vou viver / Até quando eu não sei / Que me importa o que serei / Quero é viver. / Amanhã / Espero sempre um amanhã / E acredito que será / Mais um prazer."

Plágio!

Os seguintes dois textos são literalmente iguais.
1. «Se o PSD, para mostrar uma suposta ampliação do seu espaço eleitoral, resolveu dar quatro deputados aos microscópicos PPM e MPT, que eleitoralmente valem pouco mais que nada, também o PS parece que vai reeditar o acordo com o "Movimento Humanismo e Democracia" (MHD), constituído nos anos 90 por um pequeno número de católicos oriundos do CDS, acordo que vem desde 1995 (Guterres) e que garante àquele vários deputados. Só que enquanto os parceiros do PSD ao menos são partidos oficialmente estabelecidos e não têm divergências com o PSD na generalidade dos temas (ressalvado o folclore monárquico do PPM), o tal MHD é um pequeno grupo praticamente desconhecido e tem divergências de fundo com as posições do PS em questões essenciais (despenalização do aborto, sistema de ensino, etc.). Ademais, não é provável que acrescente um voto ao PS (se é que não retira...).
Há negócios políticos cuja racionalidade escapa aos simples mortais...»
2. «(...) O PSD, para mostrar uma suposta ampliação do seu espaço eleitoral, resolveu fazer ao dar quatro deputados aos microscópicos PPM e MPT, que eleitoralmente valem pouco mais que nada, também o PS parece que vai reeditar o acordo com o "Movimento Humanismo e Democracia" (MHD), constituído nos anos 90 por um pequeno número de católicos, acordo que vem desde 1995 (Guterres) e que garante àquele vários deputados. Só que enquanto os parceiros do PSD ao menos são partidos oficialmente estabelecidos e não têm divergências com o PSD na generalidade dos temas (ressalvado o folclore monárquico do PPM), o tal MHD é um pequeno grupo praticamente desconhecido e tem divergências de fundo com as posições do PS em questões essenciais (despenalização do aborto, sistema de ensino, etc.). Ademais, não é provável que acrescente um voto ao PS (se é que não retira...).
Há negócios políticos cuja racionalidade escapa aos simples mortais...»
Trata-se de um rotundo plágio. Na verdade, o primeiro texto é meu e foi publicado aqui no Causa Nossa no dia 3 de Janeiro. O segundo "pertence" a um tal Roberto Rodrigues, tendo sido publicado no Diário de Notícias do Funchal no dia 5 de Janeiro.
O jornal já foi alertado para o flagrante "copianço" por Vicente Jorge Silva (também ele vítima do mesma apropriação furtiva do alheio) em texto publicado no mesmo jornal no dia 8 (sábado). Logo veremos se o rapinador de textos continua a fruir das páginas do DN madeirense. O DN não pode refugir-se na farisaica nota que apôs ao artigo de Vicente, segundo a qual «todos os textos insertos na página de Opinião são da inteira responsabilidade dos seus autores». Obviamente o jornal é inocente na cópia, mas se mantiver ao seu serviço um plagiador torna-se conivente com o mais grave delito contra a propriedade intelectual. Os leitores (e se for caso disso os tribunais) julgarão se o DN pactua com a mais lapuz desonestidade intelectual.
Se o fizer, que confiança poderão doravante os seus leitores ter no jornal?

Adenda
Soube entretanto que o sujeito é dirigente da juventude do CDS na Madeira e que fez publicar uma carta no DN no dia 9, a defender-se da acusação de plágio que Vicente Jorge Silva já lhe fizera pelo mesmo artigo, dizendo que o "seu" texto já tinha sido publicado muito antes num blogue da dita juventude, pelo que afinal foi ele o copiado (por mim e pelo Vicente, claro!?) . Grotesco, se não fosse muito grave. Para além de pedestre plagiador, a criatura não hesita em ir a correr inserir um post com uma data falsa para tentar esconder o plágio, como se alguém pudesse ser levado por uma vigarice tão elementar! O que espanta é que um partido sério possa ter tal "carácter" como dirigente. A começar assim, o rapaz vai longe!

"Margens de erro"

Eis um blogue que faltava e que não podia surgir num momento mais oportuno, pois o Margens de Erro, assim se chama ele, tem por objecto o comentário de sondagens eleitorais e a análise da opinião política. Além disso, ninguém melhor do que o seu autor, Pedro Magalhães, podia abordar esses temas com o saber que a sua indiscutível qualidade académica avaliza e com a clareza e independência que a sua frequente colaboração na imprensa (sobretudo no Público, infelizmente descontinuada há algum tempo) desde há muito testemunha. A sua visita deve passar a ser obrigatória desde já para quem queira acompanhar seriamente os estudos de opinião política que vão marcar a campanha eleitoral em curso.

Um cartel na Saúde

Cartéis são acordos ou práticas concertadas entre empresas independentes com o objectivo de limitar a concorrência através da fixação de preços, quotas de produção, repartição de mercados ou manipulação de propostas no âmbito de concursos. Eliminando a concorrência, deles não resultam quaisquer vantagens para a economia ou para os consumidores e, por esse motivo, são quase sempre proibidos. «Na prática e de um ponto de vista ético, não há uma grande diferença entre um cartel para fixar preços e um roubo» - sustenta, por isso, Richard Wish especialista na matéria em questão (Competition Law, 2001).
O número de cartéis detectados tem crescido significativamente em todo o mundo industrializado a partir da década de noventa. Desta vez foi a nossa Autoridade da Concorrência que condenou uma prática cartelizada entre a Abbott Laboratórios, Bayer Diagnostics Europe, Johnson & Johnson, Menarini Diagnósticos e Roche Farmacêutica Química, num concurso público para o fornecimento de medicamentos aos Hospitais Centrais de Coimbra. Trata-se de situações que não são simples de provar mas que, particularmente em concursos públicos no sector da saúde, é urgente investigar e se possível condenar. Esperemos agora que a decisão venha a ser confirmada no tribunal de recurso.

Manchete enganadora

O Diário Económico titula hoje em manchete de primeira página que o «PS estuda fim dos hospitais-empresa», dando a entender deliberadamente uma intenção que depois a notícia do mesmo jornal não confirma, pelo contrário. De facto, logo abaixo se esclarece que «o objectivo é que todos os hospitais venham a ter o mesmo modelo de gestão - Entidade Pública Empresarial». Portanto, não só não "findam" os hospitais-empresa como todos os hospitais passarão a sê-lo, o que é o contrário da manchete. Ou seja, o PS mantém -- e pretende mesmo generalizar -- a empresarialização dos hospitais, só que adoptando, entre as duas formas de empresa pública, a modalidade da "entidade pública empresarial" (EPE) em vez da forma societária (sociedade por acções, SA). O PS limita-se a ser coerente consigo mesmo, visto que foi o ministro Correia de Campos que adoptou em 2001 a estratégia de empresarialização hospitalar, já então na modalidade da EPE.
De resto, as diferenças entre as duas modalidades de empresa pública têm a ver sobretudo com a forma de controlo administrativo e financeiro, não tendo efeitos sobre a forma de gestão propriamente dita.
Nesta matéria era de esperar do Diário Económico maior rigor informativo.

A reforma da justiça

Uma opinião muito crítica à atribuição de prioridade à reforma da justiça, acima de todas as restantes reformas (ver Painel do Jornal de Negócios), encontra-se no Editorial de Eduardo Dâmaso, ontem no Público.

Os riscos da vitória antecipada

A nova sondagem eleitoral do Correio da Manhã e do Jornal de Negócios é praticamente convergente com do Expresso de há dias, colocando o PS na área da maioria absoluta, agora com o PSD abaixo dos 30%. Elemento adicional ainda mais favorável aos socialistas é que, perguntados sobre quem pensam que vai ganhar as eleições, mais 80% dos inquiridos apontaram o PS, opinião essa compartilhada mesmo por dois em cada três dos que tencionam votar no PSD!
O risco óbvio deste "arranque" tão elevado pode ser um excesso de confiança no campo socialista. Acresce que a sensação de vitória antecipada pode convidar à abstenção dos eleitores menos mobilizados ou favorecer o desvio do voto para outras forças de esquerda, na convicção de estar garantida à partida uma folgada vitória do PS.

Vital Moreira

Irresponsabilidade orçamental

«O orçamento de 2005 prevê um aumento de despesa do pessoal de 1,6%; e o aumento da tabela dos funcionários públicos [já negociada] é de 2,2%. Vamos ver o resultado desta questão» - palavras do governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio, na associação de Amizade Portugal - Estados Unidos, segundo a imprensa.
É evidente a impossibilidade financeira de tal exercício. Não estando prevista uma razia na função pública, se as remunerações sobem mais de 2%, então a factura global, incluindo reclassificações, promoções, etc., vai ficar bem acima do acréscimo previsto, provavelmente mais do dobro. Por estas e por outras é que o défice orçamental previsto só pode ser uma ficção...

Vital Moreira

BE versus PS

«(...) Mesmo que o Bloco de Esquerda não dissesse uma coisa destas agora, era previsível que o "gritasse" todos os dias aos ouvidos do PS depois das eleições. Eu nunca confiaria num apoio do BE fosse para o que fosse.
Devo dizer, no entanto, que uma declaração destas acaba por facilitar a campanha do PS neste campo, podendo ser contraproducente para o BE. Teriam muitas vantagens em deixar claro que não abririam o caminho à direita, mas eles é que sabem o que querem. (...)»

(Henrique Jorge)

segunda-feira, 10 de janeiro de 2005

O painel do Jornal de Negócios (3) - As omissões

O que me parece negativo nos resultados deste painel de qualificados "decisores económicos" (ver posts antecedentes) é não aparecerem entre as oito prioridades de reforma nem a inovação, nem a educação e a formação profissional, incluindo o fomento do empreendedorismo e do espírito de risco. Só quem ainda não experimentou comparar a qualidade do trabalho doméstico de uma moldava com ensino secundário concluído com o de uma portuguesa com quatro anos de escolaridade (para ficar nas conversas de mulheres) pode desvalorizar este factor de não competitividade.
Enfim, neste painel é prestada muita atenção à reforma do Estado, seguida, ainda que a uma louvável distância, da habitual redução dos impostos e outras questões fiscais, e pouca a outros factores que exigem mobilização do Estado, mas também da sociedade e dos próprios empresários, incluindo o fomento de uma cultura de rigor, qualidade e concorrência (que não exclui as formas de cooperação).
A brincar, juro que a brincar, apetece-me mesmo concluir: ai estes homens que andam mesmo sem imaginação!