quinta-feira, 4 de novembro de 2004

Impossível tarefa

É fácil culpar da derrota dos democratas nos Estados Unidos a manifesta falta de carisma e de apelo de John Kerry, bem como a excessiva versatilidade das suas posições em relação a alguns temas. Mas parece evidente que os obstáculos eram virtualmente insuperáveis, nomeadamente o sentimento de insegurança colectiva perante o terrorismo (que Bush explorou sem escrúpulos com a verdade) e o ambiente ultraconservador, de raiz religiosa, hoje dominante nos Estados Unidos.
Sucede simplesmente que actualmente as ideias liberais e as políticas progressistas dos democratas são minoritárias no conjunto da sociedade norte-americana. A América liberal de Nova York e da Califórnia perde para a outra América, visceralmente conservadora. É preciso esperar por outro ciclo político.

quarta-feira, 3 de novembro de 2004

Causa Aberta: Na baixa do Porto

«Causas não faltam. Falta tempo.
Uma dessas causas é a
reabilitação da Baixa do Porto. É ajudar a mobilizar os portuenses para se mostrarem à altura daquilo que a cidade lhes exige.
É conquistar os assuntos grandes ao "Portugal dos Pequeninos".»

Tiago Azevedo Fernandes

A(s) segurança(s) esquecidas


De acordo com os estudos de opinião, os americanos privilegiaram a segurança contra o terrorismo na sua votação de ontem. Mesmo que pudessem ter razão, com a escolha que fizeram para a garantir, não esqueçamos que esta é apenas uma das formas de (in)segurança. Entre as que não foram relevadas nesta votação estão a segurança da subsistência, que exige o desenvolvimento de África, a segurança do ambiente, que exige protocolos internacionais comuns, a segurança da saúde, que exige facilitar o acesso aos medicamentos, e a segurança da vida, que exige paz no mundo. Que outros se lembrem delas.

Um desejo no Day After

Nunca como desta vez o mundo esteve tão atento ao resultado das eleições americanas. Não me lembro de tantas sondagens em países e continentes que não votam. Não me lembro de tanto interesse, nem de tanta discussão sobre os efeitos da vitória de republicanos ou de democratas, de tanto tempo de televisão e de tanta atenção de todos nós.
Finalmente, o resultado esperado não foi o desejado por muitos de nós europeus e por bastantes americanos. Eu que gosto dos EUA (do lado dos EUA que eu conheço), que elogio muitas vezes a sua criatividade, o seu pragmatismo (que torna as suas instituições tão funcionais), um certo informalismo próprio das sociedades novas, a abertura de muitos dos seu investigadores e professores a ideias diferentes e a capacidade de as acolher nas suas próprias instituições só me resta desejar que a América mantenha estas suas características, que não ceda à intolerância, ao fanatismo religioso, que veja na diferença uma vantagem e não um obstáculo.

Bush-Putin, o mesmo combate

O aspirante a ditador russo (ou já ditador efectivo, conforme se queira), Vladimir Putin, apostou na vitória de Bush como a demonstração de que os americanos recusam ser intimidados pelo terrorismo internacional. Sendo Putin um consumado mestre da intimidação, percebe-se a sua cumplicidade com o reeleito Presidente americano. É a política do medo que junta agora, no mesmo lado da barricada, os antigos inimigos da Guerra Fria. O terrorismo tornou-se o argumento por excelência para justificar as derivas antidemocráticas legitimadas pelo voto popular. Onde é que já vimos isto?

Vicente Jorge Silva

Israel

Agora que Bush ganhou, como se esperava, vai ser interessante analisar o peso dos diferentes grupos sociais, étnicos, confessionais, etários, económicos e por aí adiante na sua reeleição. Estou particularmente curioso em saber se os votos da comunidade judaica se terão concentrado, como era hábito, no candidato democrata. Algo me diz que os tempos mudaram.

As duas Américas

Disse-se que a América estava mais dividida do que nunca -- ou que nunca ninguém a dividira tanto como Bush. Embora a vitória de Bush tivesse correspondido ao cenário mais provável, as manchas a vermelho e azul do mapa dos resultados eleitorais recortaram essa evidência de uma forma particularmente dramática, talvez inesperada.
Até há uma década atrás, a divisão entre republicanos e democratas não correspondia exactamente às fronteiras entre dois mundos: o cosmopolitismo de Nova Iorque, Nova Inglaterra ou Califórnia e o isolacionismo da América profunda (recorde-se a antiga implantação dos democratas no sul segregacionista). Bush exacerbou a polarização cultural da América em dois universos estanques. E é esse isolacionismo da América fechada sobre si mesma, temerosa do mundo e dos seus perigos reais ou imaginários, prisioneira do complexo de cerco mas, ao mesmo tempo, empenhada num missionarismo redentor dos pecados alheios, que emerge da reeleição de Bush.
Agora se verá até onde pode chegar a aliança do fundamentalismo evangélico com a «corporate América» que Bush e Cheney representam face a um mundo que, em geral, os rejeita (o mundo para além da América e o mundo da América moderna que votou Kerry). Detendo a totalidade do poder executivo e legislativo e com a oposição democrata lançada numa nova crise de identidade, a reeleita Administração republicana vê reconfortada a sua legitimidade e absolvidas todas as «aventuras» (ocupação do Iraque, Patriot Act, Guantanamo e Abu Ghraib, baixas de impostos para os mais ricos, défice astronómico...) através das quais foi revelando a sua verdadeira face. Ninguém sente um arrepio pela espinha abaixo?

Vicente Jorge Silva

Direita evangélica

Juntamente com as eleições presidenciais (e outras), disputaram-se também vários referendos estaduais, designadamente sobre a proibição de casamentos homossexuais e mesmo de uniões de facto entre pessoas do mesmo sexo. Foi uma das estratégias dos republicanos para atrair os eleitores à votação em Bush, aproveitando a onda conservadora-religiosa que varre a América. Além de vencer esses referendos, a estratégia de atracção eleitoral resultou em cheio. Calcula-se que desta vez Bush conseguiu mobilizar plenamente voto da "direita evangélica".
A introdução de temas radicais num ambiente conservador ajuda a mobilizar e reforçar a reacção conservadora.

Causa aberta (reed.)

Comemorando a primeira vela de aniversário próximo deste blogue (primeiro post em 22 de Novembro de 2003), durante as semanas que se seguem o CAUSA NOSSA transforma-se em CAUSA ABERTA às causas de cada um. Escreva sobre a sua, sobre aquela que hoje o tem cativo: uma linha, dez, uma imagem, mas nunca mais de 1000 caracteres. Mande a sua "causa" para aqui (mencione a expressão "a minha causa" no assunto do mail ou no próprio texto). Nós publicamos.
Causas todas diferentes ou afinal muitas causas comuns? Só no fim o saberemos.

Baixas

Entre as pesadas baixas dos democratas na vaga de direita das eleições norte-americanas de ontem -- que incluíam também eleições de senadores e deputados federais, de governadores de Estados, de deputados estaduais, de cargos públicos locais, além de vários referendos -- conta-se a derrota do veterano líder democrata no Senado, Tom Daschle, no Dakota do Sul, em favor de um neófito "conservador cristão". Sinais dos tempos nos Estados Unidos.

Como um Democrata

Sem surpresa, mas de forma mais clara do que as sondagens de opinião deixavam admitir, Bush ganhou a reeleição presidencial. A maioria dos cidadãos norte-americanos sufragou as suas orientações e políticas, sobretudo no plano da segurança e da luta contra o terrorismo internacional. Infelizmente, dada a supremacia mundial dos Estados Unidos, a vitória de Bush não é somente a derrota da alternativa democrata no plano interno, mas também de todos os que, sobretudo na Europa, temem a deriva imperial e uniteralista de Washington na política externa. Neste momento há muita gente por esse mundo fora que partilha a derrota com os democratas norte-americanos. Eu sou um deles.

terça-feira, 2 de novembro de 2004

Causa Aberta: «A minha causa é não ter causa visível»

«A minha causa é não ter causa - visível, palpável, objectiva - esse é o meu problema e, presumo, da esmagadora maioria dos portugueses. Os partidos têm uma causa por que lutar, as religiões também, outros grupos organizados com certeza. Mas os indivíduos que não se agrupam, dificilmente encontram uma causa; por egoísmo, por comodismo, por falta de atenção simplesmente. E essa é a fronteira que é preciso ultrapassar, pois todos os dias, na rua, no metro, no emprego, em casa, haverá causas para ter uma causa. E melhor ainda se não for só a minha causa mas a causa nossa, colectiva. Falta esse espírito em Portugal e essa devia ser também uma preocupação dos políticos - mobilizar os sem causa para uma causa.»
Teresa Ferreira

Causa aberta: As minhas causas

«Os olhos orgulhosos do meu pai.
A saúde do meu avô.
Aprender a ser melhor médico, melhor namorado, melhor amigo.
A música que oiço e amo, a música que faço e escondo.
A (utópica?) esperança de poder ainda ver uma Angola melhor, um Portugal melhor, uma Lusófonia melhor num Mundo mais justo e mais fraterno.
(Ah, e Parabéns ao Causa Nossa)»
Sachondel Joffre

A Constituição Europeia

Enquanto os cidadãos norte-americanos elegem o seu presidente -- e com isso escolhem também o destino do mundo inteiro nos próximos anos -- o melhor é reflectirmos, nós europeus, sobre o reforço e autonomia da Europa face à hegemonia dos Estados Unidos. O meu artigo de hoje no Público versa justamente sobre «a ideia da constituição europeia» (também reproduzido no Aba da Causa, com link na lista de blogues, ao lado).

Estúpidos europeus

Um "bushista" convicto entre os convictos, A. Ribeiro Ferreira, publica hoje no Diário de Notícias, um artigo intitulado "É a América, estúpidos!", em que invectiva os que na Europa desejam a derrota de Bush e a vitória do candidato democrata nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, pois não passam de representantes da «Velha Europa» que «odeia a América e inveja a sua democracia»; que «foi obrigada pelos americanos a libertar-se do nazismo e a ser democrática»; que «largou umas lágrimas de crocodilo no 11 de Setembro, sonhou com um novo Vietname no Afeganistão, tentou tudo para travar a libertação do Iraque, amplifica os erros dos aliados e compreende o terrorismo bárbaro que mata milhares de inocentes»; da «Velha Europa anti-semita, [que] odeia o apoio dos EUA a Israel e está de alma e coração ao lado dos terroristas palestinianos»; enfim, da «Velha Europa falsamente pacifista, anti-americana sempre, (...) cobarde e capitulacionista, que olha com desprezo para a América e mostra, sempre que pode e não pode, uma estúpida superioridade intelectual». Uff!
Como é evidente, esses perigosos abencerragens da Velha Europa que odeiam Bush -- que por acaso constituem uma esmagadora maioria -- são chefiados por esses expoentes do anti-americanismo primário, antidemocrata e anti-semita, que são, por exemplo, o Financial Times e o Economist, e que vêem em John Kerry um supremo exemplo da compreensão pelo terrorismo e da cobardia capitulacionista (sendo mesmo de suspeitar se não terá entendimentos secretos com a AlQaeda...). Haverá limites para o despautério?!
Perante este texto não é de admirar: (a) Que Portugal seja um dos países europeus onde Bush tem menos apoiantes (com apoios destes...); (b) Que a credibilidade e a audiência do Diário de Notícias estejam pelas ruas da amargura (com comentários destes...).

Que os coices não cessem

A escoicear certeiramente desde há um ano, anonimamente, o Jumento tornou-se um blogue de culto na crítica acerada e bem informada do poder político, das benesses do grande capital e em especial da administração fiscal. Não podemos passar sem ele.
Parabéns!

A parceria liberticida

José António Barreiros, no seu inquietante artigo de despedida de colunista do Diário de Notícias, em protesto contra o controlo económico-político do jornal:
«É patente o que está actualmente em causa na comunicação social portuguesa: o domínio dos media pelo grande capital, a entente cordiale entre esse grande capital e o actual Governo.»
A vida de comentador independente tornou-se insalubre no Diário de Notícias. É necessário velar por que a fatídica aliança entre o grande capital mediática e o santanismo, que também já vitimou Marcelo R. de Sousa na TVI, não se espalhe a outros órgãos de comunicação social. A liberdade de opinião divergente do poder está em perigo.

PS - Claro, Barreiros já tem substituto nas colunas do DN, um obscuro valete "santanista", como explica, dados em evidência, o Grande Loja. Definitivamente o Diário de Notícias foi transformado numa folha oficial do actual Governo. Assim se assassina a credibilidade de um jornal que já foi de referência...

Causa Aberta

A minha causa é a qualidade da água que bebo, do ar que respiro, do chão que piso. São as aves migratórias, as orquídeas cor de púrpura, as árvores centenárias.
Só que a guerra, a guerra leva-nos tudo isso, incluindo a própria vida. A paz, só ela pode ser a grande causa.
E o meu vizinho que sofre de sida, apanhada num descuido de prazer? Ir tão longe para quê, se a minha causa, afinal, está aqui tão próxima? A sida, isso mesmo, o flagelo que devora África, esse continente menor no shopping das causas.
Eu tenho África aqui em casa, no n.º 7 do bairro da Musgueira. Cinco filhos, um marido que bebe e me afaga com calor, mas muito de vez em quando. Chegam-me como causa.
Causas, de facto tenho só uma: a música que toco, os alunos que ensino, a terra que semeio, os posts que escrevo, os doentes que trato, os vidros que moldo, os golos que marco, os quadros que pinto. A minha causa é vermelha, laranja, azul e branca. É o Benfica, o partido, o kitesurf, um mar com ondas e vento, muito vento.
A minha causa és tu país antigo na periferia da Europa, és tu velho continente envolvido em sonho novo, és tu, só tu que te sentas ao meu lado e a quem eu amo tanto. E eu mesmo/a, claro. A elegância do meu corpo, a lucidez do meu espírito e o prazer de ambos.
Comemorando a primeira vela de aniversário próximo deste blogue (primeiro post em 22 de Novembro de 2003), durante as semanas que se seguem o CAUSA NOSSA transforma-se em CAUSA ABERTA às causas de cada um. Escreva sobre a sua, sobre aquela que hoje o tem cativo: uma linha, dez, uma imagem, mas nunca mais de 1000 caracteres. Mande a sua "causa" para aqui (mencione a expressão "a minha causa" no assunto do mail ou no próprio texto). Nós publicamos.
Causas todas diferentes ou afinal muitas causas comuns? Só no fim o saberemos.

Os da Causa Nossa

Confusões referendárias

Criticando um provável referendo sobre o Tratado constitucional da UE cuja(s) pergunta(s) não verse(m) directamente sobre o tratado globalmente considerado (por a Constituição o não permitir, salvo revisão constitucional), mas sim sobre determinadas opções de fundo concretas do mesmo tratado (por exemplo as sugeridas pelo Deputado Vitalino Canas no Correio da Manhã de ontem, ou outras semelhantes) Gabriel Silva escreve o seguinte no Blasfémias:
«E se o Tribunal Constitucional for sério [na fiscalização preventiva obrigatória do referendo], nem sequer deixará passar essa pergunta (qualquer que ela seja), pois que as consequências da vitória do não sempre implicarão a recusa de todo o Tratado (já não se está em tempo de renegociação), funcionando portanto o referendo como processo de ratificação, o que é proibido pela CRP.»
Trata-se de uma confusão sem sentido. A Constituição não proíbe tal coisa, pelo contrário. Uma coisa é o objecto dos referendos (o que se pode perguntar), outra coisa são as suas consequências. Seguramente que em caso de um eventual "não" a uma ou mais perguntas sobre o Tratado, a AR ficaria impedida de o aprovar. Tal resulta directamente do carácter vinculativo do referendo na CRP. A AR não pode aprovar convenções internacionais nem leis (o regime é o mesmo) que contenham soluções rejeitadas em referendo.

segunda-feira, 1 de novembro de 2004

A ira de Clara

Clara Ferreira Alves (CFA) ficou muito zangada com o que se disse e escreveu sobre a sua passagem pela novela do DN. Na sua Pluma Caprichosa de sábado, no Expresso, descarrega a sua irritação sobre meio mundo. A mim, que escrevi na segunda-feira passada um post humorístico sobre o assunto (ver abaixo), coube-me um pacote de qualificativos digno de respeito - machista, misógino, debochado e palhaço.

Vamos lá a ter calma. Bem sei que a hiper-susceptibilidade é uma das características distintivas da condição lusitana, mas não é preciso disparatar. Para que fique claro, sem ironias, nada me move contra a cor ou o corte do cabelo de CFA, nem contra a sua roupa ou o tom do baton. Vou até revelar uma fraqueza - gosto de a ver de todas as cores. E gosto de ler os seus textos, da sua atitude fresca e da sua postura universalista. Mas nada disso a furta à apreciação crítica dos seus comportamentos quando é a figura pública que está em causa. Ora, o papel de CFA na novela do DN não me convenceu, nem à generalidade do público. Continuo sem perceber o que fez CFA dar o dito por não dito. Ao que parece, teremos de esperar pelas suas Memórias.

Descontraia, CFA. E trate dos fantasmas.

Luís Nazaré

Resistir à rotação

«Aconteceu-me o mesmo com o telemóvel. Partiu-se uma peça do carregador que já não se fabricava. Era o único compatível. Tive que comprar um telemóvel novo (comprei um Nokia, que tem sempre os mesmos carregadores seja qual for o modelo).
Com a varinha mágica, que já se tinha avariado 3 vezes, por culpa de uma borracha milimétrica que, por sua vez, estragava o pé da varinha. Das três vezes tive que comprar um pé novo,quase tão caro como uma varinha nova, tentando não fazer lixo (...). À quarta avaria desisti de tanta preocupação com o ambiente e comprei mesmo uma nova. (...) E com o ferro de engomar, aí com uns seis anos, cujo conserto custava muito mais (e demorava uma eternidade) do que um novo. (...)
Até quando? Bom... havendo um deputado a preocupar-se com o problema, talvez não esteja tudo perdido...»

Inês Forjaz

PS - Espero que haja até mais do que um, ainda que esta questão não deva ser endossada!

Os efeitos da atitude de D. B.

«Após variadíssimas trocas de impressões sobre a indicação de Durão Barroso para Presidente da Comissão Europeia, continuo a pensar que ela não favorece este pequeno país. D.B. não tem ética política, nem perfil profissional para o cargo. Parece que alguns partidos com assento no PE também dizem o mesmo. No entanto, sem querer, conseguiu o reforço do PE.
Referindo a Bloguítica, "Devo dizer que não regozijo absolutamente nada com a sua derrota. O que está aqui em causa vai muito para além do actual contexto. Neste momento jogam-se e decidem-se equilíbrios de poder entre o Parlamento Europeu e a Comissão. Ora, a um pequeno Estado como Portugal interessa uma Comissão forte, na medida em que, por tradição, é a Comissão que tem salvaguardado os interesses dos pequenos Estados. Qualquer estratégia que pretenda enfraquecer a Comissao - como acontece no presente caso - automaticamente joga contra os interesses de Portugal. Em suma, por diversas razões, o que se está a passar é péssimo para Durão Barroso. Mas, pior do que isso, poderá ser muito mau para Portugal".«

(M. Dores Ribeiro)

Mais uma história de consumo

«Uma amiga minha, construtora de pianos, demitiu-se da loja de instrumentos musicais onde trabalhava, porque o patrão a obrigava a dizer aos clientes que deviam deitar fora o piano antigo e comprar um moderno barateco. Ele preferia ganhar o dinheiro a vender novo, em vez de consertar o velho».
(Helena Araújo)

PS. Engraçado que me lembrei de contar a minha história (Até Quando?) precisamente no dia da poupança. A Helena conta outras em Dois Dedos de Conversa. Vale a pena ir ler.

«Eles precisam um do outro»

Enquanto nos Estados Unidos a imprensa republicana explora a favor de Bush a mensagem do chefe da AlQaeda (o que não é difícil...), na imprensa internacional há jornais que não têm dúvidas sobre o voto de Bin Laden. Via Le Monde fui ter a este link do Tageszeitung ("O Diário") de Berlim. Depois de um antetítulo a dizer que «com a sua mensagem televisiva Bin Laden apoia Bush», o jornal alemão titula: «Eles precisam um do outro» ("Sie brauchen einander").
Não se poderia ser mais conciso e certeiro.

A rotação sustentável

João Miranda no Blasfémias sustenta uma posição diferente da que exprimi no meu post «Até quando?». Estou de acordo com JM que a concorrência exige às empresas a constante introdução de novos produtos no mercado. Mas entendo que devemos reflectir sobre alguns dos efeitos que podem resultar desta exigência.
É certo que o ritmo da inovação é hoje muito mais rápido. E que é bom para todos nós que essa inovação chegue depressa ao mercado. Ora, a concorrência ajuda a que isso ocorra. Mas também sabemos que nem sempre os novos produtos trazem de facto grandes novidades. Muitas vezes são muito menos novos do que aquilo que parecem. Enfia-se-lhes outra roupagem, diferenciam-se artificialmente e convence-se o consumidor que o que tem em casa é já muito obsoleto. São estas falsas inovações que acho discutíveis (e talvez não sustentáveis) e não aquelas que trazem algum valor acrescentado.
Fica ainda por saber se, do ponto de vista ambiental, mesmo alguns dos ganhos obtidos com os novos electrodomésticos em poupança de água e de energia compensam o lixo que se provoca com uma rotação de equipamentos cada vez mais acelerada a que somos forçados e/ou sobretudo muito incentivados. À cautela, eu só troco quando é mesmo indispensável!

E se usássemos a imaginação?

Um comentário ao meu post Até quando?

A questão não é nova: já há mais de 20 anos me contaram alguns truques inventados por empresas "espertas" para vender mais: reduzir a vida dos produtos, alargar o orifício do tubo da pasta de dentes, etc.
Problemas estão aí para ser resolvidos. Este, por exemplo, está a pedir uma empresa especializada em sucata de electrodomésticos, usando a internet para vender as peças em toda a Europa.
E depois, às vezes há milagres. Quando residia em Estugarda, pediram-me para ir à sede da Siemens encomendar uma placa não-sei-quê para a central telefónica de uma empresa em Portugal. Na Siemens disseram-me que aquela peça já estava fora do mercado há anos, mas foram procurar aos monos do armazém e encontraram uma placa, que me deram de graça.


Helena Araújo
Weimar, Alemanha

Pois é. A questão não é nova. O problema é que não temos usado a imaginação para encontrar alternativas, como aquela que sugere, por exemplo.

Os tories votam Kerry

Afinal, a grande surpresa britânica sobre as eleições americanas não é a preferência (embora reservada e relutante) do «Financial Times» e do «Economist» por John Kerry. Uma sondagem publicada na bíblia do pensamento «tory» mais radical e snobe, o «Spectator», revela que 45 por cento do eleitorado conservador britânico votaria em Kerry e apenas 19 por cento em Bush. Curiosamente, os conservadores são ainda mais pró-Kerry (ou anti-Bush) do que os próprios trabalhistas (43 por cento a favor do candidato democrata e 21 por cento a favor do actual Presidente, o que parece reflectir as clivagens dentro do Labour e o peso das preferências de Blair relativamente a Bush por causa do envolvimento anglo-americano no Iraque).

Ainda mais esmagador, porém, é o resultado global da sondagem: apenas 11 por cento do eleitorado britânico e só 13 por cento dos membros do Parlamento votariam em Bush. Ora, sendo a Grã-Bretanha o mais incondicional aliado dos Estados Unidos e conhecendo-se o peso histórico dessa relação e da doutrina atlantista de que os dois países são máximos expoentes, os resultados da sondagem do insuspeitíssimo "Spectator" correspondem a um abalo sísmico, sejam quais forem os resultados da eleição presidencial de terça-feira. Em todo o caso, se Bush ganhar, como infelizmente parece mais provável, que futuro estará reservado às relações anglo-americanas (para não falar, claro, da Europa)?

Até quando?

A minha máquina de lavar louça tinha 20 anos. Parecia nova. Mas falhou uma peça no seu interior. Coisa pequena, uma simples racha, contudo suficiente para deixar sair a água.
«Não há mais peças, é muito antiga a sua máquina», foi o que me disseram quando a mandei arranjar. Mas está tão boa, respondi. «Bastante, é certo, porém a marca só assegura peças sobresselentes durante os 10 anos seguintes à saída do modelo», informaram-me.
E assim, por causa de uma pequena peça, a minha máquina viu-se de repente toda transformada em lixo. E lá comprei uma nova. Até quando aguentará o planeta esta economia orientada para o desperdício?

Sobre o dinheiro

No dia da poupança deveríamos aproveitar para falar mais sobre dinheiro. Se perdêssemos alguns dos complexos tão típicos da nossa cultura e religião na sua relação com o dinheiro («o dinheiro é sujo»; «o dinheiro não traz a felicidade»), talvez isso nos ajudasse a saber utilizá-lo de forma mais produtiva. Promover a educação financeira seria, aliás, bem mais útil para a sociedade e para a economia que a choradeira habitual sobre o excesso de endividamento.

O revés do PT

Na 2ª volta das eleições municipais brasileiras, o PT do Presidente de Lula da Silva sofre um considerável revés político nas grandes cidades. Entre outras, perde São Paulo e Porto Alegre (Rio Grande do Sul), bem como Belém do Pará. É derrotado também na disputa em Curitiba (Paraná) e em Santos (SP). Um balde de água fria, que esmorece o entusiasmo do triunfo na 1ª volta. O PSDB de Fernando Henriques Cardoso, que triunfa em São Paulo com José Serra (que perdeu a eleição presidencial para Lula), reforça o seu estatuto de grande rival nacional do PT. A vida política brasileira revela uma assinalável polarização nos dois partidos. O grande embate de 2006 (eleições presidenciais, governadores dos Estados, deputados federais e uma parte dos senadores) promete!