O que é que justifica a manutenção em funcionamento, com os elevados custos que isso implica - material circulante, pessoal, combustível, sinalização, etc. - de uma linha férrea decrépita, onde o comboio marcha (?) a 10km/hora, quase sem utentes nem nenhuma função de serviço público, como é o caso do troço que resta da linha do Vouga, entre Sernada e Espinho, tal como a descreve o jornal Público?
Como forma de desperdício de recursos públicos, não está mal. Pelos vistos, a CP abunda em dinheiro! Seguramente, uma solução de minibus (preferivelmente elétrico) serviria em muito melhores condições e com custos muito inferiores os ocasionais utentes da linha.
Por muito menos foram encerradas muitas outros linhas, por esse país fora. Será por esta linha ficar situada no litoral e não no interior, onde já teria sido obviamente fechada?...
Blogue fundado em 22 de Novembro de 2003 por Ana Gomes, Jorge Wemans, Luís Filipe Borges, Luís Nazaré, Luís Osório, Maria Manuel Leitão Marques, Vicente Jorge Silva e Vital Moreira
terça-feira, 12 de junho de 2018
Portucaliptal (29): "Os arquitetos da eucaliptização"
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Vital Moreira
Promete dar que falar - se os novos "donos dito tudo" não impuserem o silêncio mediático -, este livro de João Camargo e Pulo Pimenta de Castro, Portugal em Chamas: Como Resgatar as Florestas - de que o Público prepublicou uma amostra -, sobre os "arquitetos" do projeto político-económico que nas últimas três décadas levou a transformar o país num imenso eucaliptal - e por vezes num braseiro assassino, como no ano passado -, incluindo a "porta giratória" entre o poder político, a academia e os interesses empresariais da celulose.
É tempo de pôr fim a uma escandalosa situação em que a hiperlucrativa fileira agro-industrial da celulose não somente não paga as enormes "externalidades negativas" que descarrega sobre a coletividade - em custos ambientais, incêndios, proteção covil, etc. - como ainda recebe nutridas ajudas financeiras do Estado, de todos os governos.
É tempo de pôr fim a uma escandalosa situação em que a hiperlucrativa fileira agro-industrial da celulose não somente não paga as enormes "externalidades negativas" que descarrega sobre a coletividade - em custos ambientais, incêndios, proteção covil, etc. - como ainda recebe nutridas ajudas financeiras do Estado, de todos os governos.
segunda-feira, 11 de junho de 2018
Gostaria de ter escrito isto (22): "República de funcionários"
Publicado por
Vital Moreira
«(...) Manter uma república pletórica de funcionários, sempre insuficientes à luz das necessidades definidas por uma insaciável lógica burocrática – e muitos deles mal pagos, é certo –, tem custos exorbitantes que nenhum Orçamento poderá pagar se quisermos ter recursos para investir em tudo aquilo que se exige, justamente, do Estado. Faz cada vez mais falta um discurso pedagógico que mobilize a nossa consciência colectiva e nos liberte das fixações corporativas em que, para além das justas expectativas do funcionalismo, nos deixamos enredar.»(Vicente Jorge Silva, "A insustentável república de funcionários", no Público de ontem)
Fundações não são empresas
Publicado por
Vital Moreira
1. A nova Presidente do Centro Português das Fundações tem razão, nesta entrevista ao Diário de Notícias, quando critica implicitamente a Lei-quadro das fundações de 2012, por colocar no mesmo pé, sob o ponto de vista legal, as fundações privadas, instituídas por afetação de um património pelos fundadores, e as fundações públicas, que no seu entender (e no meu), não são verdadeiras fundações, por não terem por substrato, na maior parte dos casos, nenhum património de cujo rendimento possam viver, pelo que não passam, em geral, de uma modalidade de institutos públicos.
De resto, acrescento eu, ao abolir injustificadamente as fundações públicas de direito privado, a referida Lei não se limitou a reduzir as fundações públicas a uma modalidade de institutos públicos; também enjeitou a principal vantagem da figura das fundações no âmbito da Administração pública. Se há empresas públicas e associações públicas de direito privado, não se compreende porque é que a lei haveria de excluir as fundações públicas de direito privado, existentes desde há muito. Mistérios insondáveis do legislador...
2. Já não tem razão a presidente do CPF, porém, quando defende o reconhecimento automático das fundações, sem intervenção administrativa prévia, à imagem de que sucede com as empresas (e, já agora, as associações).
Não é, manifestamente, a mesma coisa. Primeiro, enquanto a liberdade de iniciativa e de investimento privado está constitucionalmente reconhecida como direito fundamental (tal como sucede com a liberdade de associação), o mesmo não sucede com as fundações, que são instituídas nos termos da lei. Segundo, a instituição de fundações depende legalmente de requisitos específicos (nomeadamente, o património e os fins da fundação), cuja verificação importa verificar previamente, a fim de garantir a segurança jurídica, que seria abalada se o preenchimento desses requisitos só viesse a ser verificado posteriormente, em processo de anulação do ato fundacional. Por último, tratando-se no essencial de um controlo de legalidade, o reconhecimento governamental não põe em causa a vontade do instituidor, se conforme à lei.
Por conseguinte nada justifica, pelo contrário, a dispensa do reconhecimento individual das fundações, como aliás sucede nos países que nos são mais próximos quanto à cultura jurídica e fundacional.
De resto, acrescento eu, ao abolir injustificadamente as fundações públicas de direito privado, a referida Lei não se limitou a reduzir as fundações públicas a uma modalidade de institutos públicos; também enjeitou a principal vantagem da figura das fundações no âmbito da Administração pública. Se há empresas públicas e associações públicas de direito privado, não se compreende porque é que a lei haveria de excluir as fundações públicas de direito privado, existentes desde há muito. Mistérios insondáveis do legislador...
2. Já não tem razão a presidente do CPF, porém, quando defende o reconhecimento automático das fundações, sem intervenção administrativa prévia, à imagem de que sucede com as empresas (e, já agora, as associações).
Não é, manifestamente, a mesma coisa. Primeiro, enquanto a liberdade de iniciativa e de investimento privado está constitucionalmente reconhecida como direito fundamental (tal como sucede com a liberdade de associação), o mesmo não sucede com as fundações, que são instituídas nos termos da lei. Segundo, a instituição de fundações depende legalmente de requisitos específicos (nomeadamente, o património e os fins da fundação), cuja verificação importa verificar previamente, a fim de garantir a segurança jurídica, que seria abalada se o preenchimento desses requisitos só viesse a ser verificado posteriormente, em processo de anulação do ato fundacional. Por último, tratando-se no essencial de um controlo de legalidade, o reconhecimento governamental não põe em causa a vontade do instituidor, se conforme à lei.
Por conseguinte nada justifica, pelo contrário, a dispensa do reconhecimento individual das fundações, como aliás sucede nos países que nos são mais próximos quanto à cultura jurídica e fundacional.
domingo, 10 de junho de 2018
Antologia do oportunismo político
Publicado por
Vital Moreira
Em entrevista ao DN, o dirigente do PSD, Castro Almeida, veio dizer que «Cumprir a promessa aos professores [quanto às progressões] vale mais do que umas décimas do PIB».
Ora, para além de não ter havido nenhuma promessa governamental de recuperar inteiramente o tempo de congelamento das progressões dos professores, ou de quaisquer outros funcionários públicos, a referida declaração revela uma inadmissível leviandade política em matéria de consolidação orçamental por parte do dirigente de um partido de vocação governativa que teve a seu cargo a parte mais dura do saneamento das contas públicas (incluindo o congelamento das progressões na função pública), mas que agora, estando na oposição e à vista de eleições, por razões de puro oportunismo político, passa a alinhar com a extrema-esquerda na defesa de insustentáveis privilégios profissionais e na irresponsável desvalorização da disciplina orçamental que tantos sacrifícios custou ao País.
Lamentável!
Ora, para além de não ter havido nenhuma promessa governamental de recuperar inteiramente o tempo de congelamento das progressões dos professores, ou de quaisquer outros funcionários públicos, a referida declaração revela uma inadmissível leviandade política em matéria de consolidação orçamental por parte do dirigente de um partido de vocação governativa que teve a seu cargo a parte mais dura do saneamento das contas públicas (incluindo o congelamento das progressões na função pública), mas que agora, estando na oposição e à vista de eleições, por razões de puro oportunismo político, passa a alinhar com a extrema-esquerda na defesa de insustentáveis privilégios profissionais e na irresponsável desvalorização da disciplina orçamental que tantos sacrifícios custou ao País.
Lamentável!
Quatro décadas da Constituição de 1976
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Vital Moreira
No próximo dia 21 vou apresentar o livro coordenado por Marina Costa Lobo, nome cimeiro da ciência política entre nós, sobre a evolução CRP ao longo das suas primeiras quatro décadas, numa perspetiva comparada com a evolução de sistemas políticos próximos de nós.
sábado, 9 de junho de 2018
"Livres e Iguais": Comemorações dos 70 anos da DUDH e dos 40 anos da adesão de Portugal à CEDH (1)
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Vital Moreira
Eis o primeiro ato público depois da minha nomeação como comissário destas comemorações, como referi AQUI. Só podia ser na sede por excelência da representação política nacional.
sexta-feira, 8 de junho de 2018
Privilégios ilhéus
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Vital Moreira
Eis o cabeçalho da minha coluna de opinião da semana passada no Dinheiro Vivo - o suplemento económico do DN e do JN -, sobre o bodo dos contribuintes do Continente à Madeira. Como é fácil governar com dinheiro dos outros!
Adenda
O Jornal da Madeira noticiou que eu critiquei a Madeira por beneficiar das ajudas do orçamento da República, mas não tem razão. Quem eu critiquei foram os governos de Lisboa que não hesitam em instrumentalizar o orçamento nacional para obterem ganhos políticos na Madeira. Os governos regionais limitam-se a explorar em seu benefício a prodigalidade oportunista de Lisboa, à custa dos contribuintes do Continente. Seja como for, ninguém ousou contestar os dados em que assentou a minha análise critica.
domingo, 3 de junho de 2018
O "Código de Seabra"
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Vital Moreira
1. No próximo dia 6, quarta-feira, vou apresentar na Biblioteca da Assembleia da República a biografia do Visconde de Seabra (António Luís de Seabra, 1798 - 1895), um dos mais notáveis homens públicos do século XIX e do constitucionalismo liberal, da autoria de Manuel Maria Cardoso Leal. Magistrado judicial (tendo chegado a juiz-conselheiro do STJ), deputado em muitas legislaturas e par do reino, duas vezes ministro, reitor da Universidade de Coimbra, Seabra ficou porém a dever a sua fama histórica à elaboração do nosso primeiro Código Civil, de 1867, que esteve em vigor quase um século (até ser substituído pelo Código Civil de 1966, no final da Ditadura do "Estado Novo"). Por isso, o Código ficou conhecido por "Código de Seabra".
2. Quanto ao Autor da biografia, M. M. Cardoso Leal, depois de uma licenciatura em Economia, obteve o doutoramento em História Moderna, sendo investigador em especial do nosso liberalismo oitocentista.
Antes de biografia do Visconde de Seabra já tinha publicado, em 2013, a biografia de José Luciano de Castro (1834-1914), outro importante político e homem de Estado da monarquia constitucional, tendo sido líder do Partido Progressista, a esquerda liberal no sistema da Carta Constitucional.
De comum aos dois ilustres biografados a sua ligação à Bairrada e a Anadia, condição de que também compartilham tanto o biógrafo como o autor destas linhas. Bairradinos somos!
2. Quanto ao Autor da biografia, M. M. Cardoso Leal, depois de uma licenciatura em Economia, obteve o doutoramento em História Moderna, sendo investigador em especial do nosso liberalismo oitocentista.
Antes de biografia do Visconde de Seabra já tinha publicado, em 2013, a biografia de José Luciano de Castro (1834-1914), outro importante político e homem de Estado da monarquia constitucional, tendo sido líder do Partido Progressista, a esquerda liberal no sistema da Carta Constitucional.
De comum aos dois ilustres biografados a sua ligação à Bairrada e a Anadia, condição de que também compartilham tanto o biógrafo como o autor destas linhas. Bairradinos somos!
sábado, 2 de junho de 2018
Contra a barbárie tauromáquica (6): Dinheiro tingido de sangue
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Vital Moreira
Fica a saber-se por esta notícia que várias Misericórdias são donas de praças de touros e que se associaram a organizações tauromáquicas para melhor explorar o cruel negócio.
É lastimável saber que as obras de beneficência das Misericórdias são financiadas com dinheiro resultante da bárbara tortura sangrenta de animais para gáudio público, assim lhe conferindo um arremedo de justificação moral. Seguramente que há destinos mais rendosos e menos condenáveis para os investimentos das Misericórdias.
Benemerência com dinheiro tingido de sangue de seres inocentes é uma contradição nos termos!
É lastimável saber que as obras de beneficência das Misericórdias são financiadas com dinheiro resultante da bárbara tortura sangrenta de animais para gáudio público, assim lhe conferindo um arremedo de justificação moral. Seguramente que há destinos mais rendosos e menos condenáveis para os investimentos das Misericórdias.
Benemerência com dinheiro tingido de sangue de seres inocentes é uma contradição nos termos!
sexta-feira, 1 de junho de 2018
Albergue espanhol
Publicado por
Vital Moreira
1. O novo Governo de Madrid, resultante da "moção de censura construtiva" do PSOE contra o primeiro-ministro Mariano Rajoy - a primeira a ser aprovada em 40 anos de democracia espanhola - é uma "geringonça" política ainda mais insólita do que a de Lisboa.
De comum o facto de se tratar de um Governo minoritário do segundo partido mais votado nas últimas eleições, com apoio parlamentar de vários outros que lhe asseguraram o afastamento do Governo em funções e lhe proporcionam uma maioria absoluta no Congresso dos Deputados. Mas é um Governo monopartidário ainda mais minoritário - pois o PSOE conta menos de 1/4 dos deputados -, ficando dependente do apoio de nada menos de 8-oito-8 partidos, onde se contam, além do Podemos, quase todos os partidos autonomistas, desde o País Basco às Canárias, passando pela Catalunha e por Valência, incluindo alguns partidos de direita. Um verdadeiro "albergue espanhol".
Além disso, não tendo havido nenhuma negociação do programa do novo Governo, também não há sequer "posições conjuntas" separadas, como houve entre nós.
2. Como é que este Governo vai aguentar-se em bases políticas tão frágeis e tão heteróclitas, é o que resta saber, tendo em conta os custos orçamentais em favor de tantos parceiros, nomeadamente o Podemos, e os custos políticos do apoio dos separatistas catalães.
Com a economia a crescer robustamente, nos 3%, não deve faltar margem orçamental para "comprar" o necessário apoio parlamentar, mesmo à custa do ritmo da consolidação orçamental. Mais complicadas vão ser seguramente as inevitáveis concessões políticas aos partidos separatistas catalães, ameaçando romper a "frente constitucionalista" até agora mantida pelo PSOE em relação à Catalunha, com o PP e com o Ciudadanos, tanto mais que a maioria dos partidos que oportunisticamente apoiaram o repto de Sánchez são a favor das teses referendárias sobre a independência da Catalunha.
Imprevisíveis, e preocupantes, vão ser os próximos tempos políticos em Espanha. O melhor seria mesmo devolver a palavra aos eleitores, em eleições antecipadas, coisa que, porém, Sánchez não fará.
De comum o facto de se tratar de um Governo minoritário do segundo partido mais votado nas últimas eleições, com apoio parlamentar de vários outros que lhe asseguraram o afastamento do Governo em funções e lhe proporcionam uma maioria absoluta no Congresso dos Deputados. Mas é um Governo monopartidário ainda mais minoritário - pois o PSOE conta menos de 1/4 dos deputados -, ficando dependente do apoio de nada menos de 8-oito-8 partidos, onde se contam, além do Podemos, quase todos os partidos autonomistas, desde o País Basco às Canárias, passando pela Catalunha e por Valência, incluindo alguns partidos de direita. Um verdadeiro "albergue espanhol".
Além disso, não tendo havido nenhuma negociação do programa do novo Governo, também não há sequer "posições conjuntas" separadas, como houve entre nós.
2. Como é que este Governo vai aguentar-se em bases políticas tão frágeis e tão heteróclitas, é o que resta saber, tendo em conta os custos orçamentais em favor de tantos parceiros, nomeadamente o Podemos, e os custos políticos do apoio dos separatistas catalães.
Com a economia a crescer robustamente, nos 3%, não deve faltar margem orçamental para "comprar" o necessário apoio parlamentar, mesmo à custa do ritmo da consolidação orçamental. Mais complicadas vão ser seguramente as inevitáveis concessões políticas aos partidos separatistas catalães, ameaçando romper a "frente constitucionalista" até agora mantida pelo PSOE em relação à Catalunha, com o PP e com o Ciudadanos, tanto mais que a maioria dos partidos que oportunisticamente apoiaram o repto de Sánchez são a favor das teses referendárias sobre a independência da Catalunha.
Imprevisíveis, e preocupantes, vão ser os próximos tempos políticos em Espanha. O melhor seria mesmo devolver a palavra aos eleitores, em eleições antecipadas, coisa que, porém, Sánchez não fará.
Capital predador
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Vital Moreira
Aqui fica notícia da minha coluna no Dinheiro Vivo do fim de semana passado, acerca das empresas que distribuem dividendos em montante superior aos resultados e dos acionistas que tiram proveito dessa generosidade e logo a seguir reduzem a sua participação no capital da empresa.
Imprevisível Itália
Publicado por
Vital Moreira
Tenho sérias dúvidas não apenas sobre a prudência política mas também sobre a conformidade constitucional da decisão do Presidente da República italiana de rejeitar o ministro das finanças e da economia do Governo inicialmente proposto pela coligação Liga + 5 Estrelas, que levou à renúncia do indigitado primeiro-ministro e à nomeação de um "governo técnico" pelo Presidente, que seria obviamente rejeitado pelo Parlamento, onde aqueles dois partidos dispõem de maioria absoluta.
A Itália é uma democracia parlamentar típica, em que a legitimidade e a sustentação dos governos dependem exclusivamente do Parlamento e em que o Presidente não é diretamente eleito e não tem nenhuma função constitucional autónoma. Num tal sistema de governo, os partidos que têm maioria parlamentar têm o direito de governar, não competindo ao chefe o Estado julgar o seu mérito ou sobrepor a sua posição à vontade dessa maioria, por mais bem-intencionada que seja a sua intervenção.
A Itália não é seguramente um sistema "semipresidencialista", em que a nomeação e a subsistência dos governos dependam da confiança presidencial.Quando muito, em caso de fundamental discordância com o Governo proposto, o Presidente poderia dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, poder de que dispõe segundo a Constituição italiana. Coisa bem diferente é a nomeação de um governo de "iniciativa presidencial", em confronto com a maioria parlamentar, como o Presidente ensaiou.
Adenda
Afinal, a exótica fórmula de "governo técnico" de iniciativa presidencial não avançou e os dois partidos que ganharam as eleições apresentaram uma nova solução de governo, com a polémico ministro eurófobo na pasta... dos Assuntos Europeus! Decididamente, só na Itália!
Adenda 2
Um leitor mostra-se surpreendido por eu criticar o Presidente Matarela por ter tentado impedir a formação do Governo de coligação entre a extrema-direita da Liga e o populismo do 5 Estrelas. Mas é fácil explicar: (i) numa democracia parlamentar, quem tem maioria tem o direito de formar governo; (ii) a recusa do Governo levaria a novas eleições imediatas, que só reforçariam os dois partidos; (iii) é melhor deixá-los governar e falhar (porque obviamente vão falhar!) do que dar-lhes capital de queixa contra a democracia representativa. Neste ponto estou de acordo com este editorial do New York Times.
A Itália é uma democracia parlamentar típica, em que a legitimidade e a sustentação dos governos dependem exclusivamente do Parlamento e em que o Presidente não é diretamente eleito e não tem nenhuma função constitucional autónoma. Num tal sistema de governo, os partidos que têm maioria parlamentar têm o direito de governar, não competindo ao chefe o Estado julgar o seu mérito ou sobrepor a sua posição à vontade dessa maioria, por mais bem-intencionada que seja a sua intervenção.
A Itália não é seguramente um sistema "semipresidencialista", em que a nomeação e a subsistência dos governos dependam da confiança presidencial.Quando muito, em caso de fundamental discordância com o Governo proposto, o Presidente poderia dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, poder de que dispõe segundo a Constituição italiana. Coisa bem diferente é a nomeação de um governo de "iniciativa presidencial", em confronto com a maioria parlamentar, como o Presidente ensaiou.
Adenda
Afinal, a exótica fórmula de "governo técnico" de iniciativa presidencial não avançou e os dois partidos que ganharam as eleições apresentaram uma nova solução de governo, com a polémico ministro eurófobo na pasta... dos Assuntos Europeus! Decididamente, só na Itália!
Adenda 2
Um leitor mostra-se surpreendido por eu criticar o Presidente Matarela por ter tentado impedir a formação do Governo de coligação entre a extrema-direita da Liga e o populismo do 5 Estrelas. Mas é fácil explicar: (i) numa democracia parlamentar, quem tem maioria tem o direito de formar governo; (ii) a recusa do Governo levaria a novas eleições imediatas, que só reforçariam os dois partidos; (iii) é melhor deixá-los governar e falhar (porque obviamente vão falhar!) do que dar-lhes capital de queixa contra a democracia representativa. Neste ponto estou de acordo com este editorial do New York Times.
segunda-feira, 28 de maio de 2018
+ Europa: Tratado UE-Canadá
Publicado por
Vital Moreira
Hoje estive aqui, na Associação Empresarial de Portugal (AEP), em Leça, a falar do Acordo Económico e Comercial entre a União Europeia e o Canadá, que já está em aplicação provisória desde setembro do ano passado, e que representa o "estado da arte" dos acordos comerciais da União, quer quanto à sua amplitude quer quanto à sua profundidade..
Num registo pessoal, importa deixar exarado que o Acordo foi negociado entre 2009 e 2014, justamente nos anos em que eu presidi à Comissão de Comércio Internacional do Parlamento Europeu, tendo acompanhado todos os passos no progresso das negociações. É bom fazer parte de uma história bem-sucedida!
Num registo pessoal, importa deixar exarado que o Acordo foi negociado entre 2009 e 2014, justamente nos anos em que eu presidi à Comissão de Comércio Internacional do Parlamento Europeu, tendo acompanhado todos os passos no progresso das negociações. É bom fazer parte de uma história bem-sucedida!
sexta-feira, 25 de maio de 2018
Porque não sobem mais os salários e os preços?
Publicado por
Vital Moreira
Com quase uma semana de atraso, aqui fica notícia e link (AQUI) para a minha coluna do fim-de-semana passado no Dinheiro Vivo, suplemento económico do DN e do JN.
Tento responder à seguinte pergunta: apesar do robusto crescimento da economia, incluindo forte aumento do emprego e do consumo privado, porque não estão a subir mais os salários e a inflação, como seria de esperar?
quarta-feira, 23 de maio de 2018
+ Europa: A política económica externa da União Europeia
Publicado por
Vital Moreira
No próximo sábado, dia 26, vou inaugurar na FDUC mais um curso breve sobre a política económica externa da União Europeia, que constitui uma competência exclusiva da União, impulsionada pela Comissão Europeia, e que é um dos mais dinâmicos e bem-sucedidos domínios da ação externa de Bruxelas.
Informações e inscrição AQUI.
Informações e inscrição AQUI.
segunda-feira, 21 de maio de 2018
António Arnaut, 1936-2018
Publicado por
Vital Moreira
Encontrámo-nos pela primeira vez nas lides da oposição democrática à ditadura do Estado Novo nos anos 60 do século passado e fomo-nos encontrando ao longo da vida, desde a Assembleia Constituinte (1975-76) até às eleições europeias de 2009, em que tive a honra de o ter como mandatário da minha candidatura como cabeça de lista do PS.
Para além da criação do SNS, devemos-lhe uma atitude de intransigente integridade pessoal, profissional e política e, em especial, uma conceção ética e humanista da social-democracia na sua dedicação à causa pública e ao combate sem desfalecimento pela dignidade humana e pelos direitos sociais.
Obrigado, António Arnaut!
terça-feira, 15 de maio de 2018
Vantagens ilusórias
Publicado por
Vital Moreira
Eis a minha coluna no Dinheiro Vivo de sábado passado, sobre o possivel impacto da proposta de redução do tempo de trabalho semanal para 35 horas na economia privada.
segunda-feira, 14 de maio de 2018
Impunidade
Publicado por
Vital Moreira
(Imagem colhida aqui)
1. Não vejo grandes argumentos contra a publicidade dos grandes devedores à banca em incumprimento há mais tempo. O sigilo bancário não é um valor absoluto, nem sequer tendo proteção constitucional específica. Aliás, a divulgação dos devedores em mora já é utilizada há muito pelo próprio Estado, em relação às dívidas tributárias e à segurança social, o que lamentavelmente não tem merecido a devida atenção da imprensa.Tendo em conta os custos públicos do saneamento da banca e o peso ainda significativo do crédito mal-parado, a sua divulgação pública seria um contributo para responsabilizar tanto os "caloteiros" como a imprudência da política de crédito dos bancos, podendo, por isso, ser um antídoto contra situações semelhantes no futuro. A impunidade de situações destas não ajuda a aumentar a confiança nas instituições nem na economia de mercado.
2. A banca não é um negócio como os outros, envolvendo importantes "falhas de mercado", como a assimetria de informação e bens públicos (estabilidade financeira). Por isso, esse mercado deve ser sujeito a especial responsabilidade dos seus agentes.
Só não vejo razão para selecionar apenas a CGD, como faz o PSD. A Caixa não foi o único banco com políticas de crédito imprudentes, nem é o único que tem créditos mal-parados, pelo que, além de discriminatória, a seletividade contra o banco público só pode ser politicamente motivada.
[Revisto]
domingo, 13 de maio de 2018
Praça da República (3): Assim não há ambiente que resista
Publicado por
Vital Moreira
1. Mais um caso em que um tribunal judicial - neste caso a Relação de Coimbra - reduziu drasticamente o montante de uma sanção pecuniária aplicada pela Administração para punir uma contraordenação ambiental grave, tendo reduzido em 2/3 a coima aplicada, de 720 000 euros para 240 000, o mínimo legal no caso.
Com esta sistemática leniência dos tribunais, os prevaricadores ambientais recorrem quase sempre das sanções, fazendo adiar a efetivação das sanções e sabendo que têm grandes hipóteses de as ver substancialmente reduzidas pelos tribunais. Assim não há ambiente que resista.
2. A questão tem a ver com uma errada opção legislativa, que vem desde há décadas, de entregar aos tribunais judiciais em matéria criminal a competência para apreciar os recursos das sanções administrativas, que uma vez recorridas passam a seguir o processo penal. Nessa época, os tribunais administrativos careciam de independência e o processo administrativo não oferecia suficientes garantias.
Ora, as sanções contraordenacionais são sanções administrativas, instruídas e punidas pela Administração, pelo que, de acordo com uma regra constitucional expressa, os tribunais competentes para julgar os recursos contra elas deveriam ser os tribunais administrativos. Os tribunais penais carecem de "expertise" e de sensibilidade em matéria de sanções administrativas, tendendo a encará-las como sanções penais, sujeitas aos exigentes requisitos constitucionais da punição penal. Mas as sanções administrativas não são sanções penais, pelo que não devem ser julgadas em tribunais penais, nem segundo o processo penal. De resto, muitas contraordenações passaram entretanto a ser apreciadas pelos tribunais administrativos (contraodenações tributárias e urbanísticas), sem qualquer diminuição dos garantias de defesa dos interessados.
É tempo de rever a lei-quadro das contraordenações de 1982 e de confiar aos tribunais administrativos a apreciação das sanções administrativas em geral, incluindo as contraordenações ambientais.
Com esta sistemática leniência dos tribunais, os prevaricadores ambientais recorrem quase sempre das sanções, fazendo adiar a efetivação das sanções e sabendo que têm grandes hipóteses de as ver substancialmente reduzidas pelos tribunais. Assim não há ambiente que resista.
2. A questão tem a ver com uma errada opção legislativa, que vem desde há décadas, de entregar aos tribunais judiciais em matéria criminal a competência para apreciar os recursos das sanções administrativas, que uma vez recorridas passam a seguir o processo penal. Nessa época, os tribunais administrativos careciam de independência e o processo administrativo não oferecia suficientes garantias.
Ora, as sanções contraordenacionais são sanções administrativas, instruídas e punidas pela Administração, pelo que, de acordo com uma regra constitucional expressa, os tribunais competentes para julgar os recursos contra elas deveriam ser os tribunais administrativos. Os tribunais penais carecem de "expertise" e de sensibilidade em matéria de sanções administrativas, tendendo a encará-las como sanções penais, sujeitas aos exigentes requisitos constitucionais da punição penal. Mas as sanções administrativas não são sanções penais, pelo que não devem ser julgadas em tribunais penais, nem segundo o processo penal. De resto, muitas contraordenações passaram entretanto a ser apreciadas pelos tribunais administrativos (contraodenações tributárias e urbanísticas), sem qualquer diminuição dos garantias de defesa dos interessados.
É tempo de rever a lei-quadro das contraordenações de 1982 e de confiar aos tribunais administrativos a apreciação das sanções administrativas em geral, incluindo as contraordenações ambientais.
Lisbon first (10): Duplicar vantagens
Publicado por
Vital Moreira
Segundo esta notícia, os municípios vão passar a receber, no quadro das novas tarefas resultantes do processo de descentralização em curso, 5% da receita do IVA cobrado no seu território na aquisição de um conjunto de serviços, entre os quais se contam os de alojamento e restauração.
Ora, é fácil ver que esse critério vai favorecer as cidades com mais visitantes, nomeadamente Lisboa, por três razões: (i) como capital do País, acolhe as instituições e os serviços centrais do Estado, a que se dirigem muitos milhares de portugueses por semana; (ii) tem no quintal o principal aeroporto do País, por onde saem e entram multidões; (iii) e beneficia, no plano turístico, de um enorme acervo inigualável de património histórico do Estado (como a Torre de Belém e os Jerónimos).
Por isso, os milhões de pessoas de fora que pagam IVA no fornecimento dos referidos serviços em Lisboa, vão contribuir duas vezes para o orçamento da capital: primeiro, através dos impostos e das taxas municipais que incidem diretamente sobre esses serviços, entre as quais a chamada "taxa turística" sobre o alojamento; segundo, vão contribuir agora para avolumar a receita da quota de IVA sobre esses serviços que passa reverter a favor de Lisboa. É o que se chama acumular vantagens!
Há métodos bem engenhosos de beneficiar Lisboa, parecendo que há igualdade de tratamento. Mas não há, como aqui se prova!
Ora, é fácil ver que esse critério vai favorecer as cidades com mais visitantes, nomeadamente Lisboa, por três razões: (i) como capital do País, acolhe as instituições e os serviços centrais do Estado, a que se dirigem muitos milhares de portugueses por semana; (ii) tem no quintal o principal aeroporto do País, por onde saem e entram multidões; (iii) e beneficia, no plano turístico, de um enorme acervo inigualável de património histórico do Estado (como a Torre de Belém e os Jerónimos).
Por isso, os milhões de pessoas de fora que pagam IVA no fornecimento dos referidos serviços em Lisboa, vão contribuir duas vezes para o orçamento da capital: primeiro, através dos impostos e das taxas municipais que incidem diretamente sobre esses serviços, entre as quais a chamada "taxa turística" sobre o alojamento; segundo, vão contribuir agora para avolumar a receita da quota de IVA sobre esses serviços que passa reverter a favor de Lisboa. É o que se chama acumular vantagens!
Há métodos bem engenhosos de beneficiar Lisboa, parecendo que há igualdade de tratamento. Mas não há, como aqui se prova!
sábado, 12 de maio de 2018
Congresso Internacional de Direito Eleitoral
Publicado por
Vital Moreira
Na semana que vem, vou participar neste Congresso Internacional de Direito Eleitoral, que se realiza em Campo Grande, capital do estado de Mato Grosso do Sul, Brasil.
Os sistemas eleitorais são, desde há muito, um dos temas eletivos da minha investigação e do meu ensino universitário. Vou abordar o tema do "O 'voto personalizado' em sistemas proporcionais - O caso das eleições do Parlamento Europeu". De facto, ao contrário de Portugal, onde os eleitores votam apenas em listas partidárias, em muitos outros Estados-membros da UE, os eleitores têm a possibilidade de manifestar também a sua preferência por um (ou mais) candidatos da lista em que votam.
Os sistemas eleitorais são, desde há muito, um dos temas eletivos da minha investigação e do meu ensino universitário. Vou abordar o tema do "O 'voto personalizado' em sistemas proporcionais - O caso das eleições do Parlamento Europeu". De facto, ao contrário de Portugal, onde os eleitores votam apenas em listas partidárias, em muitos outros Estados-membros da UE, os eleitores têm a possibilidade de manifestar também a sua preferência por um (ou mais) candidatos da lista em que votam.
Lá vai mais uma
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Vital Moreira
1. O OPA chinesa sobre a EDP, incluindo a EDP Renováveis, consuma a passagem da grande empresa elétrica nacional para controlo externo, aliás exterior à UE, consolidando a crescente influência chinesa na economia nacional.
Esta transferência do controlo da empresa que domina a produção elétrica nacional - além de ser concessionária da rede de distribuição elétrica em baixa tensão (EDP-Distribuição) - resulta do processo de privatização iniciado há duas décadas e concluído em 2013, em que o Estado deixou de ter qualquer participação acionista e foi sendo substituído por investidores estrangeiros, com prevalência dos chineses na última fase.
Mais uma das grandes empresas resultantes da consolidação empresarial subsequente as nacionalizações de 1975 segue o caminho da alienação a investidores estrangeiros. Tal como a Cimpor, a PT, os CTT, a TAP. Assim emigram os famosos "centros de decisão nacional"...
Qual será a próxima?
2. A pulsão das privatizações, para tentar travar o endividamento público, e a falta de capital nacional, resultado da ausência de poupança, ditaram este desfecho. Quando o Estado precisa de vender para gastar, os capitalistas nacionais são uma espécie rara e os cidadãos em geral se endividam em vez de aforrar, só resta esperar a ajuda do capital externo.
Ainda bem que Portugal o atrai.
Adenda
Um leitor culpa a política de privatizações dos sucessivos governos nas últimas três décadas. Mas a verdade é que o Estado viu-se obrigado a privatizar por duas razões: (i) por não ter dinheiro para investir nas empresa públicas; (ii) precisar de dinheiro para conter o défice e atenuar o crescimento da dívida pública. Quando o Estado e os particulares vivem acima das suas possibilidades, o resultado só pode ser a alienação de património ao exterior.
Esta transferência do controlo da empresa que domina a produção elétrica nacional - além de ser concessionária da rede de distribuição elétrica em baixa tensão (EDP-Distribuição) - resulta do processo de privatização iniciado há duas décadas e concluído em 2013, em que o Estado deixou de ter qualquer participação acionista e foi sendo substituído por investidores estrangeiros, com prevalência dos chineses na última fase.
Mais uma das grandes empresas resultantes da consolidação empresarial subsequente as nacionalizações de 1975 segue o caminho da alienação a investidores estrangeiros. Tal como a Cimpor, a PT, os CTT, a TAP. Assim emigram os famosos "centros de decisão nacional"...
Qual será a próxima?
2. A pulsão das privatizações, para tentar travar o endividamento público, e a falta de capital nacional, resultado da ausência de poupança, ditaram este desfecho. Quando o Estado precisa de vender para gastar, os capitalistas nacionais são uma espécie rara e os cidadãos em geral se endividam em vez de aforrar, só resta esperar a ajuda do capital externo.
Ainda bem que Portugal o atrai.
Adenda
Um leitor culpa a política de privatizações dos sucessivos governos nas últimas três décadas. Mas a verdade é que o Estado viu-se obrigado a privatizar por duas razões: (i) por não ter dinheiro para investir nas empresa públicas; (ii) precisar de dinheiro para conter o défice e atenuar o crescimento da dívida pública. Quando o Estado e os particulares vivem acima das suas possibilidades, o resultado só pode ser a alienação de património ao exterior.
quinta-feira, 10 de maio de 2018
Geringonça (12): O teste ao PS
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Vital Moreira
1. Em reação a um anterior post, perguntam-me se não reconheço nenhum mérito à própria Geringonça. Ora, apesar de não ser fã da dita, tenho de reconhecer alguns importantes méritos à sua existência, para além de ter sido condição e requisito imprescindível para a rejeição do segundo Governo de Passos Coelho e para a formação do atual Governo do PS (pois a alternativa teria sido um governo minoritário da direita, com o PS a liderar a oposição de esquerda).
Fora isso, o primeiro mérito está no facto de a Geringonça se reduzir a um acordo de incidência parlamentar limitado a algumas políticas governativas - no essencial à política de rendimentos -, o que mostra que não há condições para uma coligação governamental entre o PS e os partidos à sua esquerda, desde logo por não ser viável um programa comum de governo, muito menos um governo conjunto, dadas as enormes diferenças doutrinais e políticas entre eles.
Em segundo lugar, na prática destes dois anos, a Geringonça mostrou que só é possível num ambiente económico de "vacas gordas", suscetível de gerar o edge orçamental suficiente para pagar a pródiga política de rendimentos que ele exige, sendo impraticável fora desse quadro económico.
2. Resta o mérito mais importante.
A Geringonça foi um notável teste quando à resistência do PS à tentação esquerdista de pôr em causa o compromisso com o rigor orçamental e o equilíbrio das contas públicas, no quadro da união económica e monetária da União Europeia, e com uma "economia social de mercado", em que o papel do Estado consiste em garantir a concorrência, regular as "falhas de mercado" e assegurar o acesso universal aos "serviços de interesse geral", mesmo quando fornecidos no mercado.
Embora considerasse disparatados os alertas de "perigo vermelho" lançados por algum imprensa internacional, confesso que a minha oposição à solução de governo negociada em 2015, para além de uma questão de princípio contra alianças de governo com a extrema-esquerda, tinha a ver com fortes receios de que, dependendo de tais aliados, o PS não ia resistir à tentação esquerdista, abandonando o seu tradicional posicionamento de centro-esquerda. Ainda bem que assim não foi, em geral.
Fora isso, o primeiro mérito está no facto de a Geringonça se reduzir a um acordo de incidência parlamentar limitado a algumas políticas governativas - no essencial à política de rendimentos -, o que mostra que não há condições para uma coligação governamental entre o PS e os partidos à sua esquerda, desde logo por não ser viável um programa comum de governo, muito menos um governo conjunto, dadas as enormes diferenças doutrinais e políticas entre eles.
Em segundo lugar, na prática destes dois anos, a Geringonça mostrou que só é possível num ambiente económico de "vacas gordas", suscetível de gerar o edge orçamental suficiente para pagar a pródiga política de rendimentos que ele exige, sendo impraticável fora desse quadro económico.
2. Resta o mérito mais importante.
A Geringonça foi um notável teste quando à resistência do PS à tentação esquerdista de pôr em causa o compromisso com o rigor orçamental e o equilíbrio das contas públicas, no quadro da união económica e monetária da União Europeia, e com uma "economia social de mercado", em que o papel do Estado consiste em garantir a concorrência, regular as "falhas de mercado" e assegurar o acesso universal aos "serviços de interesse geral", mesmo quando fornecidos no mercado.
Embora considerasse disparatados os alertas de "perigo vermelho" lançados por algum imprensa internacional, confesso que a minha oposição à solução de governo negociada em 2015, para além de uma questão de princípio contra alianças de governo com a extrema-esquerda, tinha a ver com fortes receios de que, dependendo de tais aliados, o PS não ia resistir à tentação esquerdista, abandonando o seu tradicional posicionamento de centro-esquerda. Ainda bem que assim não foi, em geral.
quarta-feira, 9 de maio de 2018
Gostaria de ter escrito isto (21): "O meu maior orgulho..."
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Vital Moreira
«O meu maior orgulho [como português] é esta mixórdia de povos e de raças que nós somos. O mundo inteiro deveria ser assim».
(Miguel Gonçalves Mendes, realizador, a propósito do seu filme "Labirinto da Saudade", sobre Eduardo Lourenço, no mais recente número do Jornal de Letras).
Resposta a um crítico
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Vital Moreira
1. Só uma grande dose de imaginação política e de animosidade pessoal é que poderia levar alguém a acusar-me de "alimentar o ódio à esquerda", como faz Alfredo Barroso. É uma acusação inteiramente infundada e, mesmo, despropositada.
2. Primeiro, eu sou de esquerda e peço meças (Estado social e direitos sociais, escola pública, SNS, universalidade dos serviços essenciais, laicidade, progressividade fiscal, etc.), pelo que ser acusado de "alimentar ódio à esquerda" é um contrassenso.
O que entendo é que a esquerda se conjuga no plural e que existe uma profunda diferença entre a esquerda representada pelo PS e a dos partidos à sua esquerda, entre a esquerda social-democrata e a esquerda comunista ou aparentada, entre a esquerda moderada e a esquerda radical, entre a esquerda que valoriza a economia de mercado (regulado) e a esquerda anticapitalista, entre a esquerda de governo e a esquerda de protesto.
Para além de um fundo comum - direitos dos trabalhadores, direitos sociais, igualdade e solidariedade, ainda assim com entendimentos diferentes -, há enormes diferenças doutrinárias e políticas entre essas duas famílias da esquerda - democracia liberal, economia de mercado, integração europeia, comércio internacional, disciplina orçamental -, que inviabilizam qualquer entendimento entre elas, que não seja parcial e conjuntural (como entendo que a própria Geringonça mostra).
3. Em segundo lugar, como evidencia a minha intensa produção neste blogue ao longo de 15 anos, nunca coloco nas minhas divergências com as outras esquerdas nenhum desprezo político, muito menos pessoal. Tenho adversários, não tenho inimigos. Não participo no debate político como se fosse uma guerra. Argumento contra ideias e posições políticas e não considero as preferências políticas como questões de credo ou de caráter, nem pessoalizo divergências políticas ou ideológicas.
Obviamente, quando critico as ideias e propostas das esquerdas à esquerda do PS sublinho frequentemente a sua impraticabilidade e a sua irresponsabilidade. Mas faço-o com argumentos, não com anátemas nem ataques pessoais. Chamar a isto "alimentar o ódio" é pelo menos descabido.
4. Depois de vários anos de divergência, deixei o PCP no final dos anos 80, num processo público - protagonizado pelo "grupo dos seis" - que evidenciou as razões da rutura. Tal como outros, saí sem ressentimento nem vindictas. Desde então, tenho-me identificado continuadamente com o PS, embora sem filiação, tendo sido candidato às eleições parlamentares em 1995 (AR) e em 2009 (Parlamento Europeu), mas tendo declinado duas vezes ir para o Governo. Já lá vão três décadas, o dobro da minha filiação anterior no PCP, pelo que me considero socialista por convicção e por "usucapião".
Entretanto, mais tarde, outras pessoas com notoriedade política, como A. Barroso (que foi membro de um Governo), deixaram o PS, passando a identificar-se com o BE, por razões que expuseram publicamente. Nunca os critiquei, muito menos condenei, por isso (tendo manifestado mesmo a minha compreensão...), o que mostra a diferença de atitude. Em princípio, todos os que mudaram de partido ao longo deste anos tiveram boas razões para o fazer.
O que é difícil de entender é por que razão a minha transição política de há três décadas é maldita e outras, em sentido inverso, há três anos, são virtuosas!
2. Primeiro, eu sou de esquerda e peço meças (Estado social e direitos sociais, escola pública, SNS, universalidade dos serviços essenciais, laicidade, progressividade fiscal, etc.), pelo que ser acusado de "alimentar ódio à esquerda" é um contrassenso.
O que entendo é que a esquerda se conjuga no plural e que existe uma profunda diferença entre a esquerda representada pelo PS e a dos partidos à sua esquerda, entre a esquerda social-democrata e a esquerda comunista ou aparentada, entre a esquerda moderada e a esquerda radical, entre a esquerda que valoriza a economia de mercado (regulado) e a esquerda anticapitalista, entre a esquerda de governo e a esquerda de protesto.
Para além de um fundo comum - direitos dos trabalhadores, direitos sociais, igualdade e solidariedade, ainda assim com entendimentos diferentes -, há enormes diferenças doutrinárias e políticas entre essas duas famílias da esquerda - democracia liberal, economia de mercado, integração europeia, comércio internacional, disciplina orçamental -, que inviabilizam qualquer entendimento entre elas, que não seja parcial e conjuntural (como entendo que a própria Geringonça mostra).
3. Em segundo lugar, como evidencia a minha intensa produção neste blogue ao longo de 15 anos, nunca coloco nas minhas divergências com as outras esquerdas nenhum desprezo político, muito menos pessoal. Tenho adversários, não tenho inimigos. Não participo no debate político como se fosse uma guerra. Argumento contra ideias e posições políticas e não considero as preferências políticas como questões de credo ou de caráter, nem pessoalizo divergências políticas ou ideológicas.
Obviamente, quando critico as ideias e propostas das esquerdas à esquerda do PS sublinho frequentemente a sua impraticabilidade e a sua irresponsabilidade. Mas faço-o com argumentos, não com anátemas nem ataques pessoais. Chamar a isto "alimentar o ódio" é pelo menos descabido.
4. Depois de vários anos de divergência, deixei o PCP no final dos anos 80, num processo público - protagonizado pelo "grupo dos seis" - que evidenciou as razões da rutura. Tal como outros, saí sem ressentimento nem vindictas. Desde então, tenho-me identificado continuadamente com o PS, embora sem filiação, tendo sido candidato às eleições parlamentares em 1995 (AR) e em 2009 (Parlamento Europeu), mas tendo declinado duas vezes ir para o Governo. Já lá vão três décadas, o dobro da minha filiação anterior no PCP, pelo que me considero socialista por convicção e por "usucapião".
Entretanto, mais tarde, outras pessoas com notoriedade política, como A. Barroso (que foi membro de um Governo), deixaram o PS, passando a identificar-se com o BE, por razões que expuseram publicamente. Nunca os critiquei, muito menos condenei, por isso (tendo manifestado mesmo a minha compreensão...), o que mostra a diferença de atitude. Em princípio, todos os que mudaram de partido ao longo deste anos tiveram boas razões para o fazer.
O que é difícil de entender é por que razão a minha transição política de há três décadas é maldita e outras, em sentido inverso, há três anos, são virtuosas!
Voltar ao mesmo (20): Privilégios corporativos
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Vital Moreira
1. Só agora me dei conta de um relatório de um grupo de trabalho ad hoc sobre a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS), noticiado AQUI, que propõe o regresso do seu financiamento através de uma participação nas taxas de justiça, contribuição que foi extinta, e bem, em 2008.
Tendo o referido grupo de trabalho representantes das profissões interessadas, não admira tal proposta, mesmo tratando-se de decisão em causa própria e em benefício próprio. Mas, tal como antes, continuo a considerar inaceitável tal solução. O sistema de segurança social privativo dos advogados e solicitadores deve ser financiado exclusivamente pelas contribuições dos seus beneficiários, não existindo nenhuma razão para que os cidadãos comuns, que têm de utilizar o sistema de justiça sejam financiadores daquele sistema de segurança social profissional. Por definição, as taxas de justiça servem para financiar o sistema de justiça, que bem precisa dessa fonte de financiamento.
Espero obviamente que o Governo, e em especial os ministros da Justiça e das Finanças, vete esta interesseira proposta. Mais uma vez se prova que as corporações profissionais são insaciáveis quando se trata de abancar à mesa do orçamento.
2. Há muito que defendo que a CPAS - oriunda da regime corporativo do "Estado Novo" -, não tem base constitucional, pois a CRP prevê um sistema público unificado de segurança social, para toda a gente, sem prejuízo naturalmente de sistemas complementares voluntários e autofinanciados. O que não pode haver, desde logo por exigência do princípio da igualdade, é um subsistema público de base profissional, à maneira corporativista, à margem do sistema geral de segurança social, que é universal.
Seja como for, se os advogados e solicitadores pretendem manter esse sistema privativo em regime de autogoverno e autoadministração, com as vantagens inerentes, têm de assegurar também o autofinanciamento e a sustentabilidade financeira das suas pensões e outras prestações sociais, como é próprio dos sistemas contributivos, sem beneficiarem de financiamento público externo, desviado das taxas de justiça. Autogoverno profissional com heterofinanciamento é privilégio. Ubi commoda, ibi incommoda!
Não pode haver lugar, nesta matéria (nem em qualquer outra), para privilégios corporativos, que nenhuma outra profissão tem, nem pode ter.
Tendo o referido grupo de trabalho representantes das profissões interessadas, não admira tal proposta, mesmo tratando-se de decisão em causa própria e em benefício próprio. Mas, tal como antes, continuo a considerar inaceitável tal solução. O sistema de segurança social privativo dos advogados e solicitadores deve ser financiado exclusivamente pelas contribuições dos seus beneficiários, não existindo nenhuma razão para que os cidadãos comuns, que têm de utilizar o sistema de justiça sejam financiadores daquele sistema de segurança social profissional. Por definição, as taxas de justiça servem para financiar o sistema de justiça, que bem precisa dessa fonte de financiamento.
Espero obviamente que o Governo, e em especial os ministros da Justiça e das Finanças, vete esta interesseira proposta. Mais uma vez se prova que as corporações profissionais são insaciáveis quando se trata de abancar à mesa do orçamento.
2. Há muito que defendo que a CPAS - oriunda da regime corporativo do "Estado Novo" -, não tem base constitucional, pois a CRP prevê um sistema público unificado de segurança social, para toda a gente, sem prejuízo naturalmente de sistemas complementares voluntários e autofinanciados. O que não pode haver, desde logo por exigência do princípio da igualdade, é um subsistema público de base profissional, à maneira corporativista, à margem do sistema geral de segurança social, que é universal.
Seja como for, se os advogados e solicitadores pretendem manter esse sistema privativo em regime de autogoverno e autoadministração, com as vantagens inerentes, têm de assegurar também o autofinanciamento e a sustentabilidade financeira das suas pensões e outras prestações sociais, como é próprio dos sistemas contributivos, sem beneficiarem de financiamento público externo, desviado das taxas de justiça. Autogoverno profissional com heterofinanciamento é privilégio. Ubi commoda, ibi incommoda!
Não pode haver lugar, nesta matéria (nem em qualquer outra), para privilégios corporativos, que nenhuma outra profissão tem, nem pode ter.
terça-feira, 8 de maio de 2018
35 anos de Tribunal Constitucional
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Vital Moreira
Vou regressar ao Palácio Ratton para intervir nesta conferência internacional comemorativa dos 35 anos do TC (1983-2018), recordando a história de que fiz parte.
O que o Presidente não deve fazer (14): Ruído institucional
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Vital Moreira
1. A declaração do PR, nesta entrevista, de que, no caso de uma (improvável) repetição da tragédia dos fogos florestais do ano passado, consideraria isso como impedimento à sua eventual recandidatura presidencial, não deixa de ser surpreendente, por desproporcionada, visto que que o Presidente não tem responsabilidades governativas e teve o cuidado de, alto e bom som, exigir prestação de contas ao País pelo sucedido.
A declaração é suficientemente inesperada e equívoca para ter duas interpretações, uma benévola e outra, nem tanto. Na primeira, o Presidente encontrou um meio ínvio para anunciar, a esta distância, que está a considerar a sua recandidatura, salvo eventos excecionais, que não espera; na segunda, o Presidente quis desafiar o Primeiro-Ministro a encarar a mesma situação, como quem diz: "se eu, que não tenho responsabilidades governativas, assumo plena responsabilidade por uma eventual repetição da tragédia, tu, que és chefe do Governo e responsável político pelo que acontecer, o que respondes?"
No entanto, nenhuma dessas versões deixa de suscitar perplexidade. Qualquer que tenha sido, deveria ter sido assumida explicitamente.
2. Mesmo em declarações de circunstância - o que não é propriamente o caso de uma entrevista, normalmente preparada ao pormenor -, o Presidente só diz o que quer dizer, estando fora de causa declarações precipitadas ou impensadas. Por conseguinte, tem de admitir-se que MRS quis propositadamente alimentar o equívoco sobre o que quis dizer com a referida frase.
Embora seja de admitir que o papel constitucional do Presidente lhe confere uma larga margem de discricionariedade quanto à frequência e ao conteúdo das suas opiniões e tomadas de posição públicas - desde que não afetem diretamente a competência governativa -, não parece, porém, curial que, a propósito de uma matéria tão delicada, ele tenha deixado margem para legítima especulação política. A última coisa que se deve esperar de Belém é a criação de "ruído institucional" na esfera pública.
Adenda
Perguntado sobre a declaração presidencial, António Costa retorquiu que «o Presidente não manda recados ao Governo pelos jornais». Muito bem, mas nesta declaração fica por saber se o PM não se sente destinatário de recado nenhum ou se critica o PR por utilizar um meio inapropriado para o efeito. O PM também tem direito a ser equívoco...
A declaração é suficientemente inesperada e equívoca para ter duas interpretações, uma benévola e outra, nem tanto. Na primeira, o Presidente encontrou um meio ínvio para anunciar, a esta distância, que está a considerar a sua recandidatura, salvo eventos excecionais, que não espera; na segunda, o Presidente quis desafiar o Primeiro-Ministro a encarar a mesma situação, como quem diz: "se eu, que não tenho responsabilidades governativas, assumo plena responsabilidade por uma eventual repetição da tragédia, tu, que és chefe do Governo e responsável político pelo que acontecer, o que respondes?"
No entanto, nenhuma dessas versões deixa de suscitar perplexidade. Qualquer que tenha sido, deveria ter sido assumida explicitamente.
2. Mesmo em declarações de circunstância - o que não é propriamente o caso de uma entrevista, normalmente preparada ao pormenor -, o Presidente só diz o que quer dizer, estando fora de causa declarações precipitadas ou impensadas. Por conseguinte, tem de admitir-se que MRS quis propositadamente alimentar o equívoco sobre o que quis dizer com a referida frase.
Embora seja de admitir que o papel constitucional do Presidente lhe confere uma larga margem de discricionariedade quanto à frequência e ao conteúdo das suas opiniões e tomadas de posição públicas - desde que não afetem diretamente a competência governativa -, não parece, porém, curial que, a propósito de uma matéria tão delicada, ele tenha deixado margem para legítima especulação política. A última coisa que se deve esperar de Belém é a criação de "ruído institucional" na esfera pública.
Adenda
Perguntado sobre a declaração presidencial, António Costa retorquiu que «o Presidente não manda recados ao Governo pelos jornais». Muito bem, mas nesta declaração fica por saber se o PM não se sente destinatário de recado nenhum ou se critica o PR por utilizar um meio inapropriado para o efeito. O PM também tem direito a ser equívoco...
Geringonça (11): Os méritos do Governo
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Vital Moreira
1. Houve quem me censurasse pelo meu anterior post sobre a Geringonça, por causa da omissão dos méritos do Governo no bom desempenho económico e financeiro do País. Mas é uma acusação infundada: primeiro, não era isso que estava em causa; segundo, várias vezes os destaquei ao longo destes anos.
O que sustento é que, em geral, tais méritos não existem por causa da Geringonça, mas apesar dela.
2. Vejamos os principais méritos.
O primeiro grande mérito foi a preservação da linha de rigor orçamental, cumprindo e até superando as metas de consolidação orçamental acordadas com Bruxelas (salvo quanto ao défice estrutural), depois de um primeiro aviso sério da Comissão Europeia, aquando da rejeição do draft do primeiro orçamento (2016), embora beneficiando depois de um crescimento económico na União Europeia superior ao esperado. Essa opção decisiva deu confiança aos mercados e às agências de rating, o que ajudou a descer os custos do financiamento público.
O segundo grande mérito foi não pôr em causa, no essencial, as principais reformas adotadas pelo anterior Governo durante o período de assistência financeira externa (aliás previstas no respetivo programa, negociado pelo PS), nomeadamente quanto às relações laborais, ao arrendamento urbano, às falência e recuperação de empresas, à "lei dos compromissos", ao setor empresarial do Estado, à reorganização dos tribunais, etc..
O terceiro grande mérito (last but not the least), foi a resoluta política de saneamento do setor financeiro, incluindo a decisiva recapitalização da Caixa, corrigindo porventura o pior fator remanescente de desconfiança externa em relação à solidez da retoma económica e das finanças públicas portuguesas.
Com exceção do último, tratou-se no fundamental de não mudar de rumo e não desperdiçar o que tinha sido atingido com tanto sacrifício.
3. Ora, é fácil verificar que, com exceção da recapitalização da Caixa, todas essas opções centrais do Governo do PS, que foram capitais para o seu êxito, foram tomadas e postas em execução contra a oposição dos parceiros da Geringonça, que repetidamente condenaram a preferência pela redução do défice em vez do aumento da despesa pública, propuseram reiteradamente a reversão das referidas reformas e se demarcaram das medidas de saneamento do setor bancário, salvo a Caixa (por ser pública).
Por conseguinte, os inegáveis méritos do Governo foram conseguidos apesar dos parceiros da Geringonça, e quase sempre contra eles.
O que sustento é que, em geral, tais méritos não existem por causa da Geringonça, mas apesar dela.
2. Vejamos os principais méritos.
O primeiro grande mérito foi a preservação da linha de rigor orçamental, cumprindo e até superando as metas de consolidação orçamental acordadas com Bruxelas (salvo quanto ao défice estrutural), depois de um primeiro aviso sério da Comissão Europeia, aquando da rejeição do draft do primeiro orçamento (2016), embora beneficiando depois de um crescimento económico na União Europeia superior ao esperado. Essa opção decisiva deu confiança aos mercados e às agências de rating, o que ajudou a descer os custos do financiamento público.
O segundo grande mérito foi não pôr em causa, no essencial, as principais reformas adotadas pelo anterior Governo durante o período de assistência financeira externa (aliás previstas no respetivo programa, negociado pelo PS), nomeadamente quanto às relações laborais, ao arrendamento urbano, às falência e recuperação de empresas, à "lei dos compromissos", ao setor empresarial do Estado, à reorganização dos tribunais, etc..
O terceiro grande mérito (last but not the least), foi a resoluta política de saneamento do setor financeiro, incluindo a decisiva recapitalização da Caixa, corrigindo porventura o pior fator remanescente de desconfiança externa em relação à solidez da retoma económica e das finanças públicas portuguesas.
Com exceção do último, tratou-se no fundamental de não mudar de rumo e não desperdiçar o que tinha sido atingido com tanto sacrifício.
3. Ora, é fácil verificar que, com exceção da recapitalização da Caixa, todas essas opções centrais do Governo do PS, que foram capitais para o seu êxito, foram tomadas e postas em execução contra a oposição dos parceiros da Geringonça, que repetidamente condenaram a preferência pela redução do défice em vez do aumento da despesa pública, propuseram reiteradamente a reversão das referidas reformas e se demarcaram das medidas de saneamento do setor bancário, salvo a Caixa (por ser pública).
Por conseguinte, os inegáveis méritos do Governo foram conseguidos apesar dos parceiros da Geringonça, e quase sempre contra eles.
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