sábado, 31 de maio de 2025

Laicidade (16): Incabimento

[Do Jornal de Notícias de hoje]

O Presidente da CMP não devia ter feito tal promessa, nem devia deixá-la para o próximo executivo, pela simples razão de que, ao abrigo da separação constitucional entre o Estado e as religiões, não cabe nas atribuições das entidades públicas tratar de disponibilizar templos religiosos (sejam igrejas, mesquitas, sinagogas, ou quaisquer outras.). Entre os serviços públicos municipais não cabe o de cuidar das necessidades religiosas dos munícipes.

Existindo a possibilidade, que o Estado dá a todos os contribuintes, de oferecerem uma parte do seu IRS a instituições sociais da sua escolha, os crentes podem usar essa via para financiar as suas igrejas. Coisa bem diferente é gastar dinheiro público - ou seja, dinheiro de todos os contribuintes (incluindo os não-crentes e os crentes de outras igrejas) - para esse efeito.

Quando é que as câmaras municipais se convencem de que não lhes compete fazer aquilo que é do foro próprio das igrejas e dos seus crentes? 

Adenda
Um leitor comenta: «o que está em causa é obter para ela [a comunidade islâmica] um terreno no qual construir o seu templo. Ora, qualquer pessoa pode fazer uma doação de um terreno (...). Não é à Câmara Municipal que cabe oferecer os seus terrenos, é aos munícipes que cabe fazê-lo.» Certo!.

sexta-feira, 30 de maio de 2025

Alma mater (5): Uma luta de décadas

Décadas depois da sua conceção, vai finalmente avançar a construção da biblioteca da FDUC, segundo o projeto originário do arquiteto Siza Vieira e no local desde o início escolhido, junto ao Palácio dos Melos (já afeto à Faculdade) e sobranceiro ao claustro da Sé Velha. 

Vencendo a atávica inércia institucional e a resistência centralista, o excecional acervo da biblioteca, de que me orgulho de ter sido beneficiário durante décadas e seu diretor durante alguns anos, vai finalmente ter acolhimento e condições de utilização condignas, deixando de estar caoticamente dispersa por inúmeras salas, corredores e gabinetes (e casas) dos professores.

Sem deixar de felicitar a direção da Faculdade e a reitoria da UC em funções por este impulso final, seria injusto esquecer os antigos professores (como J. J. Gomes Canotilho e  A. J. Avelãs Nunes) e prestigiosos alumni (como Artur Santos Silva) que nunca desistiram, como foi devidamente lembrado pelo atual diretor Jónatas Machado. Sem eles, a ideia teria ficado certamente pelo caminho das "obras de Santa Engrácia". 

Obrigado!

quinta-feira, 29 de maio de 2025

Eleições presidenciais 2026 (16): O PS deveria ficar de fora

1. No dia em que o almirante Gouveia e Melo se apresenta como candidato, deliberadamente sem apoios partidários, e que Marques Mendes recebe a benção política do PSD, concordo com esta posição de A. Correia de Campos, hoje no Público, segundo a qual o PS deveria abster-se de apoiar candidato próprio nas eleições presidenciais, descartando obviamente o apoio a Seguro (que o não merece, por manifesta falta de estatuto de estadista) e prescindindo de pressionar Vitorino para avançar.

Considero principalmente duas razões. Primeiro, depois do desastre eleitoral do PS e face à óbvia atração de Gouveia e Melo sobre uma parte dos eleitores socialistas, mesmo um candidato de elevado gabarito para a função presidencial, como Vitorino (que eu não teria dúvidas em apoiar), arrisca uma votacão menor, indigna dele e do PS. Em segundo lugar, depois da deriva presidencialista do PR cessante (que tenho repetidamente denunciado), nestas eleições vai estar em causa também o perfil presidencial e os seus poderes; ora, um mau resultado de um candidato, como Vitorino, que defende uma visão moderada dos poderes presidenciais (que ele ajudou a definir na revisão constitucional de 1982), seria interpretado como derrota dessa visão, a favor de interpretações mais intervencionistas do inquilino de Belém.

Duas derrotas simultâneas, portanto

2. As coisas são o que são. Dada a sua natureza pessoal, as eleições presidenciais não envolvem uma competição partidária, e o PS arrisca-se a sair mal-ferido, se se envolver desnecessariamente nelas. Entre entrar e ficar de fora, a prudência política aconselha a continência.

Se o dossiê das presidenciais já não era fácil para os socialistas antes da pesada derrota eleitoral nas eleições parlamentares, tornou-se intratável depois do miserável legado político deixado pela imprudência e o egocentrismo de Pedro Nuno Santos, ao arrastar o Partido para a armadilha laboriosamente montada por Montenegro. 

A meu ver, o PS não tem de entrar em mais uma batalha eleitoral perdida à partida, nem tem de imolar nenhum militante qualificado ingloriamente nela.


Gostaria de ter escrito isto (38): Bombas contra pensões

«Eu, pelo menos, não consegui descortinar, na campanha [eleitoral], como é que Portugal vai fazer para passar a gastar 5% do PIB em defesa, ao mesmo tempo que tem um desafio gigante nomeadamente numa área importantíssima do Estado social, que é a segurança social. O nossos partidos limitam-se todos a dizer que vão aumentar as pensões e que isso é um pilar, mas, como sempre, ninguém explica como».

[Isabel Vaz, gestora do grupo Hospital da Luz, em entrevista ao Jornal de Negócios, AQUI; sublinhado acrescentado.]

SNS em questão (29): Inquérito parlamentar, já!

1. O escândalo no Hospital de Santa Maria, em que um médico contratado conseguiu cobrar mais de 400 000 euros por dez dias de trabalho, põe em causa frontalmente o controlo de gestão sobre contratos de prestação de serviços e sobre a contabilidade nos estabelecimentos do SNS, senbo óbvio que casos destes nunca aconteriam num estabelecimento de saúde privado ou sob gestão privada. E, se acontecessem, a administração não duraria mais de uma hora no lugar.

Inacreditavelmente, porém, a improvável Ministra da Saúde, em vez de pedir imediatamente responsabilidades, veio reiterar a sua confiança na administração. Como contribuinte pagador do SNS (que, porém, alivio de encargos, usando a ADSE e pagando a respetiva contribuição), não possso deixar de protestar contra este descontrolo da despesa. Isto é gozar com os contribuintes.

2. Face à gravidade dos casos asinalados - que não podem ter incorrido sem complacência ou negligência grosseira da direção dos serviços envolvidos -, julgo que se justifica plenamente um inquérito parlamentar, incluindo para saber se estes casos são isolados ou se não passam da ponta de um iceberg de descontrolo e de falta de avaliação e de prestação de contas da gestão do sistema hospitalar público.  

O SNS não pode continaur a ser vítima da sacanice de alguns prestadores de serviços e da incompetência e irresponsabilidade das cadeias de controlo, direção e gestão.

terça-feira, 27 de maio de 2025

Assim, não vale (11): Candidaturas parlamentares a fingir

1. Afinal, o grande trunfo eleitoral do PS no círculo eleitoral do Porto, representado pelo prestigioso médico e gestor hospitalar Prof. Fernando Araújo, era uma candidatura a fingir, pois, como se suspeitava, não tardou a anunciar que não vai exercer o mandato, repetindo o triste precedente do diretor da FEUP do Porto, o Prof. Óscar Afonso, que, nas eleições do ano passado, também liderou a lista do PSD, igualmente para renunciar logo a seguir.

Esta encenação de candidaturas de personalidades de renome que afinal não são para valer, só para enganar eleitores, lesam a confiança dos cidadãos nos partidos e na democracia, e não dignificam as personalidades que se deixam irresponsavelmente instrumentalizar. Situações destas só alimentam o discurso populista contra as elites e o sistema parlamentar.

2. É tempo de evitar a repetição destas verdadeiras fraudes eleitorais e políticas. Quem aceita ser candidato em lugar elegível, especialmente no topo da lista, como é o caso, não pode fazê-lo com reserva mental, antecipadamente decidido a não exercer o mandato. Os eleitores merecem mais.

Julgo que é tempo de parar o processo de crescente desqualificação política do mandato parlamentar e do cargo de deputado, a qual, num círculo vicioso, dificulta o recrutamento de académicos e de profissionais prestigiados, e que acaba por se traduzir crescentemente numa desqualificação das próprias eleições e da nobreza da representação política parlamentar.

Proponho, por isso, que o estatuto legal dos deputados seja alterado, de modo a não consentir a renúncia ao mandato parlamentar, nem a sua suspensão (salvo por doença prolongada), pelo menos no 1º ano da legislatura.

3. Como é próprio de um sistema de governo de base parlamentar, a Constituiação admite que os deputados possam integrar o Governo sem perder o seu mandato parlamentar - o qual é suspenso, sendo recuperado no fim das funções governamentais -, mas penso que se deve ir mais longe, de modo a reforçar o recrutamento dos membros do Governo na sua base parlamentar. 

Por isso, no projeto de revisão constitucional pessoal que estou a preparar, proponho que o primeiro-ministro e pelo menos metade dos ministros sejam nomeados de entre deputados, desde logo porque a legitimidade política do Governo vem das eleições parlamentares e a sua subssistência depende da confiança (ou melhor, da não-desconfiança) parlamentar. 

Ao contrário do que sucede hoje, quem quiser ser ministro deve estar preparado para ser eleito deputado e exercer o mandato, em prol do reforço do crédito público no parlamento.

Adenda
Um leitor comenta que faltas de respeito dos partidos pelos eleitores como estas são uma «ajuda ao voto anti-sistema no Chega». Tem razão.

Adenda 2
Quanto ao nº 3 (Primeiro-Ministro saído da AR), um leitor objeta que «o Estado italiano foi parcialmente salvo por Mario Draghi como primeiro-ministro, ele que não era de partido nenhum, e que o Estado francês é encabeçado por Emmanuel Macron, que também não veio (que me recorde) de nenhum dos principais partidos». Mas o argumento não é concludente: a França é um protopresidencialismo (onde o PR é, aliás, proposto por partidos) e a Itália é uma democracia parlamentar disfuncional (aliás, em vias de adotar a eleição direta do primeiro-ministro, junto com o parlamento...), enquanto Portugal é uma democracia parlamentar baseada na competição eleitoral dos partidos pelo Governo, via parlamento.

domingo, 25 de maio de 2025

Não concordo (51): Fetichismo constitucional

1. Na sua coluna de hoje no Diário de Notícias, Pedro Tadeu vem defender que o preâmbulo da Constituição, incluindo a menção do objetivo socialista, não é suscetível de revisão, apesar de ser evidente que tal referência se tornou manifestamente vazia de sentido, começando logo com a 1ª revisão, em 1982, quando a ordem económica passou a ser deixada no essencial à maioria política de cada legislatura, com alguns limites, mas sem um objetivo constitucionalmente imposto, e sem ter posto em causa os direitos sociais e o Estado social, que, como mostra a história, nossa e alheia, não dependem de uma ordem económica mais ou menos estatizada e coletivizada. 

A tese da irrevisiblidade não é inédita nem disparatada, mas não é incontornável. Tratando-se efetivamente do decreto da Assembleia Constituinte que há meio século aprovou a versão originária da Constituição, ele não seria suscetível de revisão enquanto tal. Mas, sob pena de estéril fetichismo político, nada obsta a que o texto possa ser reformulado, deixando a sua função originária e passando a ser uma apresentação da história da Constituição e dos seus atuais traços essenciais.

2. No meu projeto pessoal de revisão constitucional, que estou a preparar para ser publicado no próximo ano, no cinquentenário da CRP, visando modernizá-la e prepará-la para mais meio século de vigência, proponho a seguinte redação do Preâmbulo, a que junto uma sumária nota explicativa:

 «A 25 de Abril de 1974, o Movimento das Forças Armadas, coroando a longa resistência do povo português e interpretando os seus sentimentos profundos, derrubou o regime fascista. 
Libertar Portugal da ditadura, da opressão e do colonialismo representou uma transformação revolucionária e o início de uma viragem histórica da sociedade portuguesa. 
A Revolução restituiu aos Portugueses os direitos e liberdades fundamentais. No exercício destes direitos e liberdades, os legítimos representantes do povo reúnem-se para aprovar aprovaram uma Constituição que para corresponder às aspirações do país. 
A Assembleia Constituinte afirma afirmou a decisão do povo português de defender a independência nacional, de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, de estabelecer os princípios basilares da democracia, de assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma socidade socialista no respeito da vontade do povo português, com vista a um país mais livre, mais justo e mais fraterno.
A Assembleia Constituinte, reunida na sessão plenária de 2 de Abril de 1976, aprova e decreta a seguinte aprovou e decretou a Constituição da República Portuguesa, a qual, após as revisões constitucionais aprovadas de acordo com o procedimento nela previsto, tem o seguinte texto: »
«Nota explicativa: 
O Preâmbulo deixa de ser o decreto da Assembleia Constituinte de 1976, autonomizando-se como evocação da origem da Constituição e como introdução ao texto constitucional vigente. Quanto ao conteúdo, retira-se a referência ao “socialismo”, claramente tornada caduca pelas sucessivas reformas do texto constitucional.»

Penso que, nesta nova versão (de que não cobro direitos de autor...), o preâmbulo da CRP só perde um incómodo "galho seco", que os seus adversários agitam como espantalho, enquanto ganha consistência e autoridade política.

Adenda
Um leitor defende a eliminação do Preâmbulo, «para evitar mais polémicas inúteis». Discordo, em absoluto: primeiro, porque ele faz a necessária ligação entre a CRP e a revolução política que lhe deu origem, ou seja, o 25A74, sendo a sua tradução jurídica -, o que alguns querem esquecer; segundo, porque ele continua a sintetizar muito bem, e em formulações textuais lapidares, o essencial da decisão constituinte de 1975-76, dando corpo às conquistas da Revolução, e que, com a ressalva agora proposta, continua plenamente válida, desmentindo os ignorantes ataques de que por vezes ela é alvo. A propósito da qualidade e da mensagem do texto, importa revelar o que pode ser desconhecido por muitos: como se pode ver AQUIo preâmbulo foi o último texto a ser fixado, numa comissão presidida por Sophia de Melo Breyner (PS) e cujo relator foi Manuel Alegre (PS), autor do texto, tendo sido adotado por consenso

sexta-feira, 23 de maio de 2025

Era o que faltava (15): Insegurança constitucional

1. Nos assomos anti-PS do PSD só faltava mesmo a infâmia de compartilhar com o Chega a revisão da Constituição e o acesso ao Tribunal Constitucional à margem do PS, como defendem despudoradamente, por estes dias, alguns dos seus opinadores.

Não se trata somente de mandar às urtigas o compromisso "não-é-não" de Montenegro, visto que seria um "sim" muito mais grave do que um eventual acordo de governo. O que estaria em causa seria a aliança de um partido fundador da democracia constitucional (na sua versão orginária e em todas as suas revisões), nascida de um revolução política e constitucional contra a ditadura do "Estado Novo", com um partido assumidadamente contrário ao atual regime constitucional e que não esconde assumir alguns dos traços doutrinários do antigo regime.

Resta saber se se trata somente de uma provocação política gratuita ou de uma intenção assumida de enveredar por essa afronta, não apenas ao PS, mas também à história e identidade política do próprio PSD. Urge que o seu líder clarifique a situação.

2. A revisão constitucional não ocupou nenhum lugar de relevo no temário das recentes eleições parlamentares e não se vê que obstáculo é que a Constituição oferece ao programa eleitoral da AD.

Sem dúvida que a CRP, que não é revista há 20 anos, ganharia em ser revista para efeito de "poda" de alguns "galhos secos", de melhoria de algumas soluções que o tempo provou menos consistentes e de modernização de linguagem e de conceitos. Mas não se vê como é que tal pode ser feito com um partido caracterizadamente antirregime constitucional, em vez de ser conseguido por negociação entre os partidos democráticos, nomeadamente entre os dois que sempre têm protagonizado todas as anteriores revisões cosntitucionais (o PS e o PSD ) e que, no atual quadro parlamentar, podem fazer a necessária maioria de 2/3 tanto com a IL, como com o Livre (bastando que o PSD venha a somar mais um deputado nos círculos da emigração).

Acresce que, segundo um prática constante, as alterações constitucionais precisam de um votação final global pela mesma maioria de 2/3, o que quer dizer que nenhuma alteração constitucional é viável se não tiver a concordância de todos os partidos que a vão aprovar no final, em conjunto. Isto significa que, a ser aberto o processo de revisão constitucional, o PSD tem de decidir à partida e anunciar com quem a vai fazer: com o Chega (e a IL) ou com o PS (e a IL ou o Livre). 

Sendo certo que o PS não pode deixar de anunciar à partida que não votará nenhuma revisão que contenha uma alteração votada pelo Chega contra o voto socialista, vai a direção do PSD deixar essa questão crucial em aberto até quando?

3.  A questão do Tribunal Constitucional é ainda mais grave, visto que ele é autoridade que interpreta e aplica em última instância a Constituição, pelo que esta poderia mudar sem nenhuma revisão constitucional, por efeito da modificação da composição do Tribunal e da sua jurisprudência.

Ora, a arquitetura do TC foi desenhada na revisão constitucional de 1982 pelo PS e o PSD, de modo a garantir, quando aos dez juizes eleitos na AR (por maioria de 2/3), um equilíbrio essencial entre as sensibilidades constitucionais representadas por um e por outro. Um acordo adicional entre ambos os partidos, até agora nunca desrespeitado, assegura que as vagas quanto a juízes eleitos (por fim de mandato ou por renúncia) são preenchidas por novos juízes da mesma sensibilidade, comprometendo-se cada partido a apoiar os candidatos do outro (sem prejuízo de veto individual).

Não é preciso estudar direito constitucional para saber que, numa democracia liberal, os partidos e as instituições políticas não estão vinculados somente aos preceitos constitucionais, mas também por "convenções constitucionais" resultantes de acordos explíticos ou de práticas continuadas comummente aceites.

É certo que, também nesta questão, os dois partidos deixaram de somar 2/3 dos deputados, maioria que, no campo parlamentar democrático, só se perfaz com um terceiro partido (IL ou Livre), pelo que deixaram de poder eleger sozinhos os juízes do TC. Também aqui, porém, a questão é saber se o PSD admite abrir o Tribunal Constitucional ao Chega, abandonando desavergonhadamente o referido pacto estabelecido com o PS em 1982.

4. As sucessivas crises políticas dos últimos anos, com as repetidas dissoluções parlamentares e  governos de curta duração, trouxeram para a ribalta o valor da estabilidade política em geral e da estabilidade governativa em particular.

Mas a dramática mudança da composição parlamentar decorrente das eleições de domingo passado e o flirt sem escrúpulos da área do PSD com a admissão do Chega na revisão constitucional e no Tribunal Constitucional suscita uma instabilidade mais funda, a da insegurança constitucional, com a qual nenhuma estabilidade política é compatível. Não se pode "brincar" assim com a segurança constitucional do País.

Parece óbvio que o PSD não pode pedir ao PS que não se junte ao Chega para pôr em causa a viabilidade do seu Governo minoriário e, ao mesmo tempo, ameaçar o PS com a hipótese de rever a Constituição e de eleger juízes do TC com o Chega, à margem daquele e contra ele.

Há jogadas políticas rasteiras que a mais elementar moralidade política exclui na luta política leal numa democracia constitucional.  O PS não pode deixar de exigir uma pronta clarificação oficial do PSD quanto à sua fidelidade às regras do jogo democrático de que é coautor, e que estão em vigor desde a origem do regime constitucional.

Adenda
Um leitor acrescenta que o referido acordo político entre PSD e PS quanto à composição do TC abrange também a alternância das duas "sensibilidades" na ocupação do cargo de presidente do Tribunal. Tem razão, e também nesse aspeto ele tem sido respeitado por ambas as partes.


quarta-feira, 21 de maio de 2025

Conferências & colóquios (10): O papel dos parlamentos locais


Quando se aproxima a renovação eleitoral quadrienal dos órgãos do poder local, lá para finais de setembro, este colóquio, em boa hora promovido pela prestigiada AEDREL, propõe-se revisitar e debater o estado da nossa democracia local.

Pela minha parte, proponho-me abordar a situação das assembleias municipais, suscitando a questão do seu quadro jurídico-institucional, que vem desde 1976, e que limita o seu papel como verdadeiros parlamentos municipais, que deveriam ser.

terça-feira, 20 de maio de 2025

Manifesto dos 50 (13): Apresentação do livro, desta vez em Guimarães

Depois do lançamento em Lisboa e no Porto, eis mais uma sessão de apresentação pública das ideias do «Manifesto dos 50 pela Reforma da Justiça» e do livro entretanto publicado, desta vez em Guimarães, no Tribunal da Relação, numa iniciativa do Professor António Cândido de Oliveira e do Dr. André Coelho Lima, ambos subscritores do Manifesto, a que tenho a oportunidade e o gosto em me associar.

Esperamos não ficar por aqui!

segunda-feira, 19 de maio de 2025

Eleições parlamentares 2025 (16): E agora, PS?

1. Depois deste desastre eleitoral, numas eleições que podia e devia ter evitado, e que só surpreendeu pelos números, o que deve fazer o PS, além de lamber as feridas e preparar o processo de seleção de nova liderança?

Ocorre-me recordar o que escrevi num post há tempos:

«(...) estando excluída entre nós, pelo menos por agora, a hipótese de governos de grande coligação ao centro (à alemã), não é impossível, porém, equacionar um pacto estável entre os dois tradicionais partidos de governo , no sentido de, em caso de vitória eleitoral sem maioria absoluta, cada um deles deixar governar o outro salvo coligação governamental maioritária alternativa -, viabilizando a constituição do Governo e prescindindo de votar moções de censura, a troco da negociação dos orçamentos (...).

Parecendo-me excluída a repetição de maiorias absolutas monopartidárias - por causa fragmentação da representação parlamentar - e também pouco provável a hipótese de coligações maioritárias, quer do PSD com a sua direita (excluindo obviamente o Chega), quer do PS com a sua esquerda (excluindo o Bloco e o PCP), este acordo entre os dois partidos de governo faz todo o sentido, para ambos, agora e no futuro.

Um acordo desta natureza era obviamente inviável para o PS sob a liderança de PNS - refém daquilo que eu chamo há muito a "ala bloquista" do PS -, mas não vejo como pode deixar de ser equacionado por uma nova direção, necessariamente menos radical e mais racional.

2. Julgo que, além da estabilidade governativa que um acordo destes geraria, bem como do quadro favorável aos necessários "acordos de regime" entre ambos os partidos (na reforma da justiça, da lei eleitoral, do SNS, etc.), ele torna-se neste momento essencial para assegurar ao PS um seguro contra o risco de tentação do PSD de utilizar a maioria de 2/3 dos deputados que a nova AR confere ao conjunto dos partidos de direita, para fazer aprovar contra o PS, não somente alterações às leis que carecem daquela maioria (entre as quais a lei eleitoral) e a designação de cargos públicos de topo (como os juízes do Tribunal Constitucional), mas também a própria revisão constitucional.

Ou seja, além da estabilidade governativa, o que está em causa é também a própria estabilidade do regime constitucional vigente, o que, nas vésperas da celebração dos seus 50 anos, devia estar entre as prioridades políticas de ambos os partidos, e em especial do PS.

Adenda
Um leitor acusa-me de propor a «reedição do bloco central» (que foi o nome dado ao governo de coligação entre PS e PSD em 1983-85), mas sem nenhuma razão, pois essa solução está explicitamente afastado no meu texto. Nem sequer proponho a negociação do programa de governo nem um compromisso sobre políticas públicas. Penso que o PS deve assumir-se como oposição. Como digo acima, entendo que pode e deve haver entendimentos para os chamados "acordos de regime", desde logo porque a Constituição exige maioria de 2/3 para as respetivas leis. E, embora possa haver espaço para entendimentos com o Governo quanto a algumas políticas sectoriais, penso que o espaço para isso é limitado. O que proponho, desde há muito, é um pacto entre PS e PSD quanto à sustentação recíproca dos seus governos minoritários, e penso que tal pacto é essencial no atual quadro parlamentar, pelas razões que indico no final do meu post. Sem um compromisso como o que proponho, que consolide o afastamento a do PSD em relação ao Chega, ficaremos sempre sob a chantagem de ver posto em causa o próprio regime constitucional vigente, que assenta, desde a origem, num compromisso do PS e do PSD quanto aos seus pilares.


domingo, 18 de maio de 2025

Eleições parlamentares 2025 (15): PS: uma derrota histórica

 1. O grande derrotado destas eleições é indubitavelmente o PS, que conseguiu fazer muito pior do que no ano passado, com a maior derrota desde há 38 anos (1ª maioria absoluta de Cavaco Silva, em 1987), agora, porém, politicamente agravada pelo comprometedor empate com o Chega (ainda sem os deputados da emigração...). 

Entre as razões por que defendi que o PS devia ter evitado estes eleições, não caindo na armadilha montada por Montenegro, esteve o alerta para um novo resultado desfavorável. No post de 17 de março, escrevi:

«A seu favor o PS tem o golpe na credibilidade do líder do PSD, por causa do caso Spinumviva e da fuga para eleições, bem como as dificuldades governamentais em várias áreas, como a saúde e a cultura. Contra ele, porém, tem a boa situação económica e social, que favorece o Governo, e a distribuição de benesses prodigalizadas, ao longo destes meses, a várias constituencies eleitorais importantes, mercê do excedente orçamental que recebeu dos governos do PS. Ora, não há memória de a oposição ganhar eleições quando a economia e as finanças correm bem ao Governo...

Acresce que, apesar do louvável exercício de moderação e responsabilidade de que deu provas ao viabilizar o Governo da AD e, depois, ao recusar-se a derrubá-lo, mediante a abstenção na votação de moções de censura, a liderança de PNS continua sem se conseguir afirmar para fora do Partido (o que os projetados Estados gerais poderiam ter permitido) e sem que o seu estilo de comunicação política consiga gerar a necessária adesão e empatia no eleitor comum. Ora, nas eleições parlamentares, a disputa também envolve os líderes dos partidos candidatos ao Governo, como potenciais primeiros-ministros, o que estabelece especiais exigências ao challenger... 

Em suma, nada indica que vá ser fácil a aposta do PS nestas eleições, que poderia ter travado.»

O líder e a direção do PS preferiram ignorar este alerta, que não fui o único a exprimir, e o PS pagou cara a imprudência, com o desastre eleitoral de hoje

2. De facto, a derrota do PS só surpreende pelos números, muito mais gravosos do que o antecipado. 

Pela primeira vez, o PS repete duas derrotas consecutivas com menos, bastante menos, de 30%, o que só tinha ocorrido em 1985 e 1987, com o nascimento do PRD e ascenção do cavaquismo. Para agravar a dimensão da derrota, as esquerdas no seu conjunto, apesar da subida do Livre, não chegam aos 35%, ainda menos do que no ano passado - um resultado calamitoso.

Creio que PNS e a atual direção socialista devem assumir, sem demora, a inteira responsabilidade por este severo desenlace, gerado pelo seu leviano caprichismo político, apesar dos riscos óbvios e dos avisos recebidos, a que se seguiu um processo em que nada correu bem: o programa eleitoral, as listas, a campanha. 

O PS não deve enfrentar as próximas batalhas políticas - eleições autárquicas e presidenciais - com uma liderança claramente desautorizada nas urnas e que mostrou não estar à altura dos desafios. Impõe-se abrir imediatamente o processo de renovação, para alimentar a esperança da recuperação, que não vai ser fácil, nem rápida.

Adenda
O SG do PS acaba de anunciar a sua demissão, como devia. Penso que nunca devia ter chegado a ocupar o cargo, para o qual não estava devidamente apetrechado.

Adenda 2
Para agravar profundamente a derrota do PS e das esquerdas, os partidos de direita somados têm mais de 2/3 dos deputados (AD-89+Chega-58+IL -9), mesmo sem contar os da emigração, o que dá para alterar, sem o PS, as leis que requerem tal maioria qualificada (como as leis eleitorais) e proceder à revisão da Consttituição - o que até gora nunca tinha sucedido.

quinta-feira, 15 de maio de 2025

Eleições parlamentares 2025 (14): Irresponsabilidade da AD

 

Este gráfico do jornal Público, baseado num estudo do Iscte sobre os custos dos programas eleitorais, mostra que, para além da tradicional incontinência e falta de seriedade política do PCP e do Chega, a AD também revela uma inaceitável demagogia política, sobretudo quando comparado com a responsável contenção do programa do PS, o que, em partidos que pretendem a renovação do mandato governativo, é de uma supina irresponsabilidade orçamental. 

É evidente que eles não contam cumprir as promessas que fazem e que incorrem numa operação não séria de compra de votos.

terça-feira, 13 de maio de 2025

Free and fair trade (23): O acordo UE-Mercosul

Amanhã, quarta-feira, vou estar aqui, para falar do Acordo comercial UE-Mercosul, cuja demorada e difícil negociação segui desde que fui presidente da Comissão de Comércio Internacional do Parlamento Europeu, no mandato 2009-2014, que incluiu a visita de uma delegação oficial a Brasília (Câmara dos Deputados e Itamaraty) e a São Paulo (FIESP).

Celebrando a feliz conclusão do Acordo no ano passado, resta-me agora confiar que ele vai ser ratificado pelas duas partes sem mais demora, para vantagem mútua, e como resposta positiva à saída dos EUA da ordem económica internacional sujeita a regras - as da OMC e as dos acordos preferenciais livremente celebrados, como este.

segunda-feira, 12 de maio de 2025

Eleições parlamentares 2025 (14): Não a partidos regionais na AR

Parece que um partido apenas radicado na Madeira, o Juntos pelo Povo (JPP), e que só apresentou candidaturas em metade dos círculos eleitorais (onde, aliás, é invisível), pode vir a obter um mandato na AR por aquele círculo eleitoral, mesmo sendo ínfima a sua votação a nível nacional.

No entanto, a Constituição proíbe a existência de «partidos regionais» e determina que «os deputados representam todo o País, e não os círculos por que são eleitos». Ora, como pode representar todo o País o deputado de um partido que só goza de apoio eleitoral significativo num círculo eleitoral (que representa 2,5% da população do País) e cuja votação a nível nacional vai ser irrisória? E como se respeita a regra constitucional da igualdade do valor dos votos e da representação parlamentar («sufrágio igual», diz a Constituição), se tal partido vai muito provavelmente obter, a nível ancional, votação inferior à de outros partidos nacionais que não vão eleger deputados?

Além de manifesta "regionalização" da representação política nacional, trata-se de um situação politicamente iníqua, que não não condiz nem com a letra nem com o espírito da Constituição.

Adenda
Um leitor objeta que seria «antidemocrático» impedir a representação parlamentar de tal partido, por limitar a sua expressão política. Mas o que me parece pouco ou nada democrático é que um partido de expressão política localizada obtenha representação na AR, que visa representar todo o País, sem votação relevante a nível nacional, quando outros partidos com maior votação o não conseguem.  

Adenda 2
Outro leitor observa que o único modo de impedir situações dessas seria a adoção de uma "cláusula-barreira" eleitoral (ou seja, um limiar de votação a nível nacional como condição para obter representação parlamentar), tal como existe em vários países (Espanha, Alemanha, etc.), mas que a nossa Constituição exclui expressamente. É verdade, mas, mesmo sem remover esse preceito constitucional, não é impossível obter um efeito semelhante, exigindo que os partidos obtenham uma votação mínima num certo número de círculos eleitorais, como prova de que não têm expressão exclusivamente regional.

domingo, 11 de maio de 2025

História constitucional (13): As assembleias constituintes de 1911 e de 1975-76

 


Neste número da JN História, que acaba de sair, é publicado o 2º artigo da minha coautoria como Prof. José Domingues, que conclui o que foi publicado no nº anterior, completando um breve panorama histórico sobre as quatro assembleias constituintes nacionais, correspondentes a outras tantas revoluções políticas e constitucionais (1820-22, 1836-38, 1910-11 e 1974-76.

Neste segundo artigo, abordamos as duas assembleias constituintes do século XX - ou seja, as de 1911 e de 1975-76, que aprovaram respetivamente a Constituição de 1911 e a CRP de 1976 - e concluimos com uma breve síntese comparativa das quatro constituintes, destacando as principais semelhanças e diferenças entre elas (modo de eleição, poderes, duração, procedimento constituinte, etc.).

Assinalando o 50º aniversário das eleições constituintes de 1975 - as mais democráticas de sempre -, o nosso objetivo é facultar a um público mais vasto do que os círculos académicos uma introdução às experiências de poder constituinte democrático em Portugal.

Corrigenda
Por lapso de paginação da revista, o 1º parágrafo da peça impressa, acima reproduzida, não pertence ao nosso texto, que, portanto, só começa no 2º parágrafo. As nossas desculpas.

quinta-feira, 8 de maio de 2025

Não é bem assim (20): Podem os naturalizados ser candidatos a PR?

Neste comentário do Polígrafo do Sapo, corrigindo o disparate de um candidato de extrema-direita, sobre a pretensa possibilidade de um imigrante naturalizado ser candidato a PR, lê-se o seguinte: 
«É absolutamente falso que um cidadão com dupla nacionalidade possa ser Presidente da República em Portugal. Na Parte III da Constituição, relativa à organização do poder político, o artigo 122.º, sobre a elegibilidade do Presidente da República, dita que só são elegíveis os cidadãos eleitores, portugueses de origem, maiores de 35 anos.»

Há aqui uma confusão: os imigrantes naturalizados não podem efetivamente ser candidatos a PR, não por terem dupla nacionalidade, como se escreve no comentário transcrito (que até podem não ter), mas sim por não serem portugueses de origem, como diz a referida norma constitucional. Com efeito, a Constituição não impede que um cidadão português de origem que tenha outra nacionalidade - por exemplo, filho de portugueses nascido no Brasil - possa ser candidato a PR.

O que se pode discutir é se esta solução não devia ser corrigida, como defendo, mudando a norma constitucional, para impedir a candidatura de cidadãos binacionais a PR (e a outros cargos políticos, como PM), por risco de conflito de interesses entre as duas nacionalidades.

[texto revisto]

segunda-feira, 5 de maio de 2025

Stars & Stripes (21): Tiro pela culatra

Boas notícias: economia dos EUA no negativo, apesar do aumento do consumo e do investimento, devido à redução da despesa pública e ao agravamento da balança comercial, por efeito do aumento das importações, por antecipação dos consumidores e das empresas à subida das tarifas aduaneiras. 
Bem feito! A únicas coisas que podem virar os cidadãos americanos contra Trump são os anunciados cortes orçamentais nos programas sociais e a degradação da economia, que, pelos vistos, já começa a fazer o seu serviço.

sábado, 3 de maio de 2025

Rasto no tempo (3): Uma homenagem devida


Aplauso para esta homenagem de uma prestigiosa instituição de Coimbra a um ilustríssimo cidadão da cidade - o Professor J. J. Gomes Canotilho -, uma pessoa de caráter e integridade moral sem mácula, um académico prestigiado que honra a Universidade de Coimba, um constitucionalista de topo, dentro e fora de portas, um intelectual inquieto e um homem culto (honrado pelo prémio Pessoa), um humanista solidário com as causas da humanidade e um conimbricense adotivo que não tem perdido ocasião para prestigiar a cidade. 

Não pondendo estar pessoalmente presente, por motivo de ausência de Coimbra, não quero de deixar de me associar a esta justíssima homenagem. Aqui ficam o meu testemunho e as minhas felicitações pessoais: parabéns, Joaquim!

sexta-feira, 2 de maio de 2025

Eleições parlamentares 2025 (15): Montenegro "apanhado"

1. Esta estória da correção da declaração de interesses de Montenegro, por intimação da Entidade da Transparência, contada AQUI, mostra duas coisas muito importantes: (i) que ele faltava à verdade ao garantir que tinha declarado tudo o que era legalmente necessário, quando afinal tinha omitido vários clientes da sua empresa pessoal de prestação de serviços, a Spinumviva;  (ii) que o PS tinha toda a razão, ao incluir no seu requerimento de inquérito parlamentar justamente o controlo da veracidade da declaração de interesses do Primeiro-Ministro. 

Mas esta estória mostra mais: que Montenegro optou por esgotar o prazo de 30 dias dado pela Entidade da Transparência para a correção da falta, a fim de adiar ao máximo o seu conhecimento público, como é devido, quiçá para depois das eleições. Não é propriamente uma conduta digna de um líder partidário que se propõe renovar o seu mandato na chefia do Governo.

2. Todavia, a notícia da correção que lhe foi exigida veio destruir a sua laboriosa tentativa de meter o caso da sua empresa pessoal "debaixo do tapete" durante a campanha eleitoral e reavivar a suspeita, bem mais grave, sobre a violação da exclusividade como governante, que também era objeto do inquérito parlamentar do PS, e cujo esclarecimento Montenegro persiste em recusar, não exibindo os documentos que provem que não continuou a ser o verdadeiro responsável pela prestação de serviços da sua empresa, nem a beneficiar das respetivas avenças.

É de novo a dúvida sobre o cumprimento das obrigações legais (e não somente éticas) quanto a transparência e a incompatibilidades do PM cessante que está de novo na praça pública.

segunda-feira, 28 de abril de 2025

Amanhã vou estar aqui (21): Nos 199 anos da Carta Constitucional de 1826

Para melhor compreender uma peça essencial da nossa história constitucional - que amanhã perfaz 199 anos e que, até agora, foi a mais duradoura das nossas seis constituições -, que tambem é uma fonte importante para o entendimento do sistema político na CRP de 1976.

sábado, 26 de abril de 2025

Memórias acidentais (27): Deputado constituinte (1975-76)

1. A passagem, ontem assinalada, dos 50 anos das eleições constituintes de 25/4/1975 trouxe-me à memória alguns aspetos da minha atividade como deputado constituinte, em 1975-76, que culminou na aprovação da Constituição de 1976.

Ainda não tinha 30 anos, era assistente da Faculdade de Direito da UC e, por causa da revolução, interrompera a preparação do doutoramento em teoria da Constituição que estava a preparar em Londres, tendo regressado logo a Portugal, envolvendo-me em pleno na atividade política.

Comecei por não ser diretamente eleito, pois o PCP só elegeu um deputado no círculo eleitoral de Coimbra, e eu era o 2º candidato, a seguir ao dirigente nacional do partido, Blanqui Teixeira. Mas não tardei a rumar para Lisboa, pois logo no início dos trabalhos da Constituinte ele pediu a renúncia ao mandato para me fazer entrar, desde logo porque só havia outro jurista no grupo de deputados (o advogado José Lopes de Almeida) e eu era o único que tinha algum conhecimento de direito constitucional, tendo defendido a minha tese de pós-graduação nessa área, pelo que integrava o grupo de trabalho encarregado da elaboração do projeto de Constituição do partido, juntamente com os meus amigos e colegas da FDUC, J. J. Gomes Canotilho e Aníbal Almeida.

Por essa razão, e por poder suspender a atividade profissional e não ter responsabilidades partidárias, como muitos outros deputados, pude entregar-me em dedicação plena à minha nova tarefa, com a consciência de que era para mim uma oportunidade histórica de participar no desenho de uma nova Constituição do País.

2. Acresce que no chamado "verão quente" de 1975, o PCP estava mais empenhado na revolução do que na Constituição, o que se refletia no relativo desinteresse que os dirigentes do partido, incluindo o presidente do grupo parlamentar, Otávio Pato, dedicavam ao Palácio de São Bento, em especial no que se referia à preparação da Constituição.

Nessas circunsbtâncias, acabei por assumir informalmente o papel de principal porta-voz do partido na Constituinte, quer nos debates no plenário, quer no trabalho de várias comissões, nomeadamente na principal delas, a V Comissão, encarregada da organização do poder político, ou seja, de grande parte da Constituição, mas também nas comissões de princípios fundamentais, do poder local, das disposições finais e transitórias e na comissão de redação final (de que tive a honra de ser relator perante o plenário da Constituinte). Durante grande parte do tempo, não recebia e raramente pedia instruções à direção do partido sobre as questões constituintes, limitando-me a enviar um relatório semanal sobre o andamento dos trabalhos e sobre as posições por nós adotadas (relatórios que ainda devo ter guardados algures). 

Não admira, por isso, que, como mostra a figura abaixo (colhida num livro sobre a Assembleia Constituinte referido em post anterior), eu tenha sido o deputado mais interventivo, o que, ressalvados alguns dispensáveis excessos oratórios, revela o meu profundo empenho e a minha dedicação absoluta à tarefa constituinte.

3. Entre as minhas preocupações políticas em São Bento avultava uma, que era a de manter o PCP efetivamente comprometido com a elaboração da Constituição, de modo a não alimentar a impressão de que ele era hostil à Constituinte, como podia resultar de alguma imprensa que lhe era afeta, pois essa perceção contrariava a genuína preocupação partidária de garantir proteção constitucional para as chamadas "conquistas revolucionárias" (descolonização, democracia, liberdades públicas e direitos dos trabalhadores, "organizações populares de base", nacionalizações e reforma agrária). Julgo que tive alguma responsabilidade em «encostar a Constituição à esquerda», como alguém já escreveu.

Não foi por acaso que, depois do fim do ciclo revolucionário, com o Termidor do 25 de novembro de 1975, o PCP tivesse passado a dar uma nova atenção à Constituinte, acabando por saudar e votar de bom-grado a Constituição, justamente por esta ter salvaguardado o acquis revolucionário e, em alguns casos, ter ido além dele (por exemplo, nos direitos sociais, como o SNS, e até no capítulo da organização económica). 

Sem falsa modéstia, julgo ter contribuído para essa relação de amizade constitucional do PCP, que foi decisiva para manter o compromisso do partido com o regime democrático-constitucional, sem quebras ao longo dos anos.

sexta-feira, 25 de abril de 2025

História política (4): As eleições constituintes de há 50 anos


1. Duas exposições assinalam em Lisboa as eleições constituintes de 25 de abril de 1975: uma na Fundação Gulbenkian, inaugurada há dias, que é uma iniciativa da Comissão de comemoração dos 50 anos do 25A, e outra na AR, hoje inaugurada, logo após a sessão comemorativa do 25 de Abril, este ano também comemorativa dos 50 anos das eleições, com a presença de vários deputados constituintes, convidados para o efeito.

Justifica-se plenamente esta atenção a essas eleições, por várias razões:
    - por a sua realização ter representado o cumprimento de um dos principais compromissos do MFA, logo anunciado no seu primeiro comunicado público, no próprio dia 25 de abril de 1974;
    - por elas terem sido eleições sem precedente nossa história política em diversos aspetos: primeiras eleições por sufrágio universal, pela primeira vez por voto genuinamente pessoal e secreto (expresso pelos próprio eleitores em cabine na própria assembleia eleitoral), em competição pluripartidária, com atribuição proporcional de mandatos (que em 1911 só tinha sido aplicada nos círculos eleitorais de Lisboa e do Porto) e com representação dos residentes no estrangeiro (embora só com um deputado);
    - pela excecional afluência de mais de 90% dos eleitores, nunca antes nem depois repetida;
    - por terem sido fundadoras ao atual regime constitucional, ao elegerem os partidos e os deputados que fizeram a Constituição de 1976, em tantos aspetos também uma Lei Fundamental sem precedentes, mesmo quanto às três constituições anteriores também saídas de revoluções populares (1822, 1838, 1911).

As mais democráticas eleições, portanto, que deram origem também à mais democrática Constituição.

2. A mais ambiciosa das duas referidas exposições, a da Gulbenkian, começa por recordar a ficção das eleições (presidenciais e legislativas) durante a ditadura do chamado "Estado Novo" e as tentativas da oposição democrática, na sua diversidade, de as aproveitar para denunciar o regime e mobilizar o combate contra ele, com destaque para a épica campanha presidencial de Humberto Delgado em 1958 e a animada campanha das eleições legislativas de 1969. 

Quanto às eleições de 1975, a exposição fornece notável informação histórica, quer documental quer visual, sobre a sua preparação e a sua realização, incluindo profusa ilustração da campanha eleitoral e sobre a noite eleitoral e os resultados, com recurso a registos televisivos da época. Uma notável evocação!

Lamentavelmente, a exposição não é acompanhada de catálogo que perpetue o grande acervo informativo nela disponibilizado.

3. No entanto, nesta exposição não sufrago três aspetos históricos
     - primeiro, é de estranhar a simples referência de passagem à grave tentativa de violar o programa do MFA quanto às eleições constituintes, que foi a proposta de Spínola e de Palma Carlos - respetivamente, o primeiro PR e e o primeiro PM a seguir à Revolução -, logo em julho de 1974, para a convocação imediata de eleições presidenciais e de plebiscito de uma "Constituição provisória", o que teria matado a revolução à nascença;
     - segundo, não compartilho a ideia de que em 1975, a seguir ao 11 de março, as eleições estiveram em sério risco de não se realizarem ou de serem indefinidamente adiadas, pois só estavam contra elas os micropartidos de extrema-esquerda, com escasso peso político, apesar da sua visibilidade política nas ruas de Lisboa e em alguns jornais, e uma pequena fação radical do MFA, sem eco, porém, na direção do movimento;
     - por último, considero excessiva a ideia de ter sido uma "campanha eleitoral violenta", pois, além de isso não se sentir no terreno na época (eu estive lá, e até tive uma "sessão de esclarecimento" boicotada), os casos de violência foram pontuais entre os milhares de iniciativas de campanha, e raramente envolveram militantes dos principais partidos.

A história deste período fundador do atual regime democrático não beneficia com a veiculação de perceções que, embora tendo existido em alguns círculos políticos da época, não tinham substrato suficiente para vingar. 


terça-feira, 22 de abril de 2025

Manifesto dos 50 pela Reforma da Justiça (12): Um livro para agitar as águas


Amanhã vou estar aqui, na minha qualidade de copromotor do Manifesto (que pode ser lido AQUI, bem como a lista dos seus signatários) e de coautor deste livro. Todos são bem-vindos!

segunda-feira, 21 de abril de 2025

História política (3): Meio século depois do 25A


Participei hoje na conferência organizada pelo Banco de Portugal, sob o lema "Falar em Liberdade", para comemorar os 50 anos do 25 de Abril (programa AQUI). Sendo ele próprio um "filho da Revolução" enquanto banco nacional, pois lhe deve a nacionalização logo em setembro de 1974, bem como o relevo público e a legitimidade de que hoje goza, justifica-se plenamente este iniciativa institucional.

Acompanhada pelo livro cuja capa se reproduz acima, notavelmente ilustrado com fotos e gráficos, onde se podem verificar os avanços económicos e sociais alcançadas ao fim deste meio século da história nacional (que também se podem consultar on-line AQUI), a conferência, aberta pelo Governador do Banco, Mário Centeno, seguido de Paul Krugman, e encerrada pela escritora Lídia Jorge, foi dedicada, nos seus vários painéis, à leitura histórico-política das principais motivos da Revolução, nomeadamente a liberdade (em cujo painel intervim), a democracia e a descolonização. 

Se é possível retirar uma conclusão geral desta conferência e do livro que a acompanhou, podemos dizer que, depois de várias experiências revolucionárias falhadas ao longo de século e meio, desde 1820 (o vintismo, o setembrismo e o republicanismo), desta vez conseguimos ser bem-sucedidos na construção de um Estado constitucional solidamente baseado na liberdade, na democracia e na solidariedade social, e capaz de vencer o teste do tempo e das adversidades do mundo de hoje.


sexta-feira, 18 de abril de 2025

Este País não tem emenda (37): Grau zero de civismo


1. Estas duas fotos no mesmo local da minha rua - a de cima foi tirada hoje e a de baixo tem poucas semanas - revelam, mais uma vez, o aberrante défice de civismo que impera entre nós, em que as pessoas deitam para a rua e os passeios os "monos" lá de casa, que lá ficam dias e dias a ocupar os passeios e a poluir o ambiente visual, em vez de utilizarem, com uma simples chamada telefónica, o serviço que o município disponibiliza para o efeito.

O facto de se tratar de uma zona de considerável status social, onde uma grande maioria deve ter educação superior - e, logo, devia ser mais zelosa em matéria de responsabilidade cívica -, torna este flagrante desprezo pela qualidade do espaço público ainda mais censurável.

2. Não se tratando, infelizmente, de atos isolados - pois vejo que se verificam com relativa frequência na cidade -, estas situações suscitam duas questões: (i) saber se estamos a levar a sério a educação cívica, na escola e fora dela, quanto ao respeito pelo patrimómio comum, e (ii) saber se estas infrações devem continuar impunes, ou se os municípios não devem começar a identificar os responsáveis, criando para o efeito uma linha de denúncia semelhante à que existe para estacionamentos irregulares, e aplicar-lhe as devidas coimas.

Passado meio século de sermos um país livre, conseguimos alcançar elevada classsificação quanto à qualidade da nossa democracia, como mostram os rankings internacionais - que nos colocam a par com os países escandinavos -, mas evoluímos muito pouco em matéria de responsabilidade cívica e de respeito pelos outros, onde devemos estar nos últimos lugares, a léguas deles. 

quarta-feira, 16 de abril de 2025

Manifesto dos 50 pela reforma da Justiça (11): O Ministério Público não tem emenda

Será que basta um denúncia anónima, sem nenhum indício conhecido, para que o Ministério Público inicie uma suposta "averiguação preventiva" contra o líder de um partido (neste caso, o líder do PS) e a anuncie publicamente em pleno debate eleitoral, sabendo que isso vai causar automaticamente especulações sobre a integridade do visado e prejudicar a sua campanha?

Para além da falta de base legal - que criminalistas credenciados contestam (como se pode ver convincentemente AQUI) -, será que o PGR não se dá conta de que, ao entrar por aí, utilizando seletivamente esse mecanismo, abre a porta a denúncias oportunistas, sem nenhuma relevância penal, como arma letal de combate eleitoral, hoje contra o líder do PS, e amanhã contra qualquer outro? 

Decididamente, o MP não tem emenda, nem um módico de prudência, na sua tentação de instrumentalização da investigação penal para efeitos de perseguição política.

segunda-feira, 14 de abril de 2025

A teimosia dos factos (2): O século chinês?


Vale a pena ver esta entrevista de Jeffrey Sachs, sobre a notória ascensão económica e tecnológica da China, para antecipar que a guerra comercial desencadeada pelos EUA contra Pequim (e não só) está condenada a falhar, e que o isolacionismo protecionista de Washington, sob a liderança de Trump, só vai contribuir para acelerar a perda de posições norte-americanas na economia internacional, em favor da China.

Tal como o século XX foi norte-americano, quanto ao poder económico e político; o século XIX, britânico; o século XVIII, francês; o século XVII, espanhol -, tudo indica que o século XXI vai ser chinês!

sábado, 12 de abril de 2025

Eleições presidenciais 2026 (15): O Presidente mediador

1. Na sua recente entrevista ao Diário de Notícias, o candidato presidencial Marques Mendes, veio defender para o PR um papel de mediador entre o Governo e a oposição (ou seja, por princípio, entre o PS e o PSD, que são os principais partidos de governo), quanto aos temas que dependem politicamente de um acordo entre ambos, como é o caso da justiça.

Embora a noção de mediação presidencial não seja inédita, e seja compreendida na noção genérica corrente de "Presidente-árbitro", não deixa de ser interessante vê-la coerentemente utilizada e defendida por um candidato presidencial que, até agora, se tem distanciado das visões "semipresidencialistas" da cotitularidade do PR no poder executivo ou de tutela presidencial sobre o Governo. Bem compreendida, a ideia de mediação presidencial cabe perfeitamente na noção do PR como "quarto poder", exterior ao poder legislativo e ao poder executivo, titular de um "poder moderador" de supervisão do regular funcionamento do sistema político, da separação de poderes entre a AR e o Governo, de garantia dos direitos da oposição, de arbitragem de conflitos político-institucionais e de promotor da estabilidade política.

2. A ideia de mediação presidencial entre o(s) partido(s) de Governo e o(s) de oposição é especialmente interessante entre nós, por três razões: (i) porque ele quadra bem com o estatuto do PR no nosso sistema constitucional, como "poder neutro", independente e imparcial, entre ambos; (ii) porque o nosso sistema eleitoral não favorece maiorias parlamentares e, além disso, a Constituição exige maioria de 2/3 para a legislação sobre certos temas politicamente mais sensíveis, designadamente a legislação eleitoral, o sistema de governo das autarquais locais ou a competência legislativa das regiões autónomas e (iii) porque os dois partidos de governo têm revelado nas últimas décadas pouca propensão para a negociação e o compromisso entre eles, mesmo quando ambos estão de acordo na necesidade de reformas.

Mas para que a ideia de mediação não seja pervertida em ingerência, é necessário que o PR respeite duas condições básicas: (i) que ela seja solicitada pelas duas partes políticas intessadas sobre temas em que ambos estejam de acordo sobre a necessidade de reforma, e não "imposta" pelo PR sobre reformas acerca das quais não existe tal consenso mínimo de partida; (ii) que as duas partes se mantenham como "donos" da negociação, à margem de qualquer tentativa do PR para impor a sua própria agenda quanto às soluções.

O que nada tem a ver com mediação são os "pactos" indevidamente promovidos pelo PR entre os "stakeholders" institucionais ou profissionais, à margem dos decisores políticos, como sucedeu com o chamado Pacto da Justiça, indevidamente citado por Mendes. Pressionar Governo e oposição com pactos intercorporativos, usualmente em benefício próprio, é o contrário de mediação.

3.  O risco de uma mediação presidencial mal-entendida fica patente do exemplo da justiça mencionado pelo candidato, em que ele próprio avança com as soluções que tem por óbvias, mas que podem ser deveras controversas, como sucede com certas medidas para a celeridade processual no processo-crime, quando seja à custa das garantias de defesa, e que num caso é manifestamente inconstitucional, como é a proposta de cumprimento de pena criminal ainda na pendência de recurso para o STJ, quando a CRP é clara sobre a presunção de inocência «até ao trânsito em julgado da sentença de condenação».

As boas intenções não bastam para acautelar contra a atávica tentação de intervencionismo político por parte dos inquilinos do Palácio de Belém, ou dos candidatos a irem para lá, mesmo sabendo bem que não são eleitos para legislar nem para governar, nem têm legitimidade para tal... 

sexta-feira, 11 de abril de 2025

Nos 50 anos da CRP (2): Recordando a Assembleia Constituinte

1. Foi muito agradável e proveitoso participar hoje na sessão pública de lançamento de um número da Revista do IDL (o instituto de estudos do CDS) dedicado ao cinquentenário da Assembleia Constituinte de 1975-76, onde se inclui, entre numerosas outras reflexões, uma conversa entre o Professor Jorge Miranda e eu próprio, sobre a nossa experiência de deputados constituintes, por sinal entre os mais ativos e empenhados. A revista está on-line AQUI.

Presidida pelo Presidente da República, ele próprio deputado constituinte, a numerosa assistência incluiu alguns outros deputados constituintes de vários partidos, que tive a alegria de rever. Além da fala de Marcelo Rebelo de Sousa, que recordou com vivacidade o ambiente político da época, a sessão contou também com uma intervenção de Jorge Miranda, que descreveu o labor da Constituinte e os traços da Constituição que dela resultou, e outra minha, onde procurei explicar porque é que a Constituição de 1976 escapou à "maldição" das anteriores constituições revolucionárias e democráticas portuguesas (1822, 1838 e 1911), que falharam todas o teste do tempo.

2. Apraz-me felicitar publicamente o diretor do IDL, Professor Manuel Monteiro, por esta iniciativa de memória e reflexão plural sobre a formação da nossa Lei Fundamental, o que é tanto mais de elogiar quanto o CDS foi o único partido da Constituinte que votou contra a CRP em 1976, por não poder subscrever o compromisso socialista da versão originária da Constituição, vindo depois a alinhar no "arco constitucional" após a 1ª revisão, em 1982, que removeu essa barreira política e doutrinária.

Mas a verdade é que era de esperar que, por maioria de razão, também as fundações e institutos dos partidos que desde o início se identificam com a Constituição (PS, PSD e PCP) aproveitassem a oportunidade para celebrar as eleições constituintes - democráticas e participadas como nenhumas outras antes -, que há meio século legitimaram a Revolução democrática e deram início à tarefa histórica de a traduzir em letra de Lei Fundamental.