1. O Governo prepara-se para lançar na próxima segunda-feira um programa no valor de 2 000 milhões de euros, alegadamente para compensar a perda de poder de compra resultante da elevada inflação, incluindo medidas socialmente transversais, como a descida de impostos (IRS e IVA de alguns produtos).
Mas é de duvidar da bondade de injetar tanto dinheiro na economia, não no investimento mas sim no consumo, quando a economia está a crescer e o emprego e os salários continuam a aumentar, o que corre o risco sério de alimentar a espiral inflacionista, que neste momento é o principal perigo. Em vez de favorecerem a necessária redução no consumo, estas medidas aumentam-no. Mais dinheiro no consumo é mais inflação; e mais inflação "puxa" por juros mais elevados, ameaçando uma contração económica mais à frente.
Por isso, tendo a alinhar com aqueles que defendem que o Estado deveria focar-se somente em aliviar a situação das pessoas de menores rendimentos e destinar a folga proporcionada pelo aumento da receita fiscal (cortesia da inflação e do crescimento da economia) à redução do défice e da excessiva dívida pública, cujos encargos vão aumentar com a subida dos juros.
2. Não se sabe se o referido pacote também vai incluir alguma medida quanto às rendas habitacionais, que a inflação vai fazer subir significativamente no ano que vem, por aplicação dos critérios previstos na lei.
Também aqui o Governo não deve ceder à tentação da solução mais fácil, ou seja, a limitação legal da subida das rendas, à custa dos senhorios, como alguns defendem. Primeiro, porque é o Estado, e não os particulares, que deve financiar as medidas de política social; segundo, porque a contenção artificial das rendas levará necessariamente ao retraimento do investimento privado em habitação, agravando ainda mais o défice de casas para arrendamento e fazendo subir as rendas; por último, porque, sendo uma medida transversal, viria a beneficiar desnecessariamente também os arrendatários com rendimentos mais elevados.
A solução política e socialmente correta é, por isso, recorrer ao mecanismo do subsídio público da renda às famílias de menores rendimentos.
Adenda
Concordando com este post, um leitor argumenta que «a redução de impostos é socialmente regressiva». As pessoas de menor rendimento não pagam IRS, pelo que a diminuição deste não as favorece; e a redução dos impostos indiretos sobre certos produtos beneficia sobretudo quem mais os consome, que são as pessoas com maiores rendimentos, como sucedeu com a redução do ISP.
Adenda (2)
De um
artigo do The Economist:
«segundo o FMI, medidas que proporcionam descontos e transferências para os 40% mais pobres ficaria mais barata do que a mistura de medidas atual, que inclui em grande parte corte nos impostos sobre os combustíveis ou máximos nos preços de retalho» [according to the IMF, policies that offer rebates and cash transfers to the poorest 40% of people would be cheaper than the policy mix today, which largely includes tax cuts on fuel, or retail-price caps].
Além de mais barata, essa opção é socialmente mais justa.