Na próxima terça-feira vou intervir neste colóquio da Universidade Lusíada-Norte sobre o impacto do Brexit na União Europeia. Vou abordar o tema da política de comércio internacional, especialmente quanto às alternativas possíveis para as futuras relações económicas entre o Reino Unido e a União.
Importa referir que um dos meus encargos atuais na ULN consiste em lecionar direito económico internacional no mestrado de Relações Internacionais.
Blogue fundado em 22 de Novembro de 2003 por Ana Gomes, Jorge Wemans, Luís Filipe Borges, Luís Nazaré, Luís Osório, Maria Manuel Leitão Marques, Vicente Jorge Silva e Vital Moreira
sexta-feira, 10 de maio de 2019
"Dinheiro Vivo" (14): Tribunais internacionais de investimento
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Vital Moreira
Eis a abertura do meu artigo da semana passada no Dinheiro Vivo (suplemento de economia do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias), desta vez sobre a validação pelo Tribunal de Justiça da UE da constitucionalidade dos tribunais internacionais de investimento (investment court system), que a União introduziu nos seus últimos acordos internacionais de comércio e investimento (por exemplo, com o Canadá e com Singapura), a fim de substituir o tradicional sistema de arbitrem internacional ad hoc de cada litígio de investimento (conhecido como ISDS - investor-to-state dispute settlement).
Trata-se de um notável avanço na sujeição das relações económicas internacionais às regras do Estado de direito, incluindo a resolução de litígios por meio de tribunais internacionais permanentes de jurisdição obrigatória.
Trata-se de um notável avanço na sujeição das relações económicas internacionais às regras do Estado de direito, incluindo a resolução de litígios por meio de tribunais internacionais permanentes de jurisdição obrigatória.
Ainda bem! (4): Contra o elitismo profissional
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Vital Moreira
1. A propósito da rejeição parlamentar da contagem integral do tempo de serviço congelado, o líder (vitalício?) da federação sindical dos professores veio queixar-se de que "a Geringonça não funcionou para os professores".
Mas não tem nenhuma razão, pois os professores compartilham as mesmas mudanças favoráveis que a demais função pública, nomeadamente o regresso às 35 horas de trabalho semanal e a retoma da progressão nas carreiras, incluindo o bónus da recuperação de uma parte do tempo congelado durante a crise (que não estava prevista em nenhum programa eleitoral, nem no programa do Governo, nem nos entendimentos que constituíram a Geringonça).
O que os professores não obtiveram foi o que também não foi dado a ninguém, nem nunca lhes foi, nem podia ser, prometido nem reconhecido pelo Governo, ou seja, a recuperação integral do tempo de serviço congelado para efeitos de progressão na carreira (os tais 9 anos, 4 meses e 2 dias). Todavia, tal como toda a função pública, também os professores estão hoje bem melhor do que há quatro anos.
2. O que essa declaração do dirigente sindical revela, para além de ingratidão política, é que os professores, numa típica arrogância elitista, se consideram com direito a tratamento privilegiado dentro da função pública, para além do pouco exigente regime de progressão de que já gozam.
Ainda bem que o Governo não cedeu nesse ponto, quer por uma questão de justiça distributiva, quer por razões de sustentabilidade orçamental. Sem igualdade teríamos privilégio para uns e iniquidade para outros; sem sustentabilidade financeira, o que se ganhasse hoje poderia voltar a perder-se numa próxima crise.
Quem não quer perceber isto não merece nenhuma complacência política.
Adenda
Um leitor pergunta quando é que a lei estabelece limites aos mandatos sindicais. Em princípio, a autonomia associativa privada impede uma tal imposição sem cobertura constitucional, mas nada impede que os estatutos sindicais estabeleçam regras sobre isso. Aparentemente, porém, as benesses do poder sindical dificultam tal limitação...
Mas não tem nenhuma razão, pois os professores compartilham as mesmas mudanças favoráveis que a demais função pública, nomeadamente o regresso às 35 horas de trabalho semanal e a retoma da progressão nas carreiras, incluindo o bónus da recuperação de uma parte do tempo congelado durante a crise (que não estava prevista em nenhum programa eleitoral, nem no programa do Governo, nem nos entendimentos que constituíram a Geringonça).
O que os professores não obtiveram foi o que também não foi dado a ninguém, nem nunca lhes foi, nem podia ser, prometido nem reconhecido pelo Governo, ou seja, a recuperação integral do tempo de serviço congelado para efeitos de progressão na carreira (os tais 9 anos, 4 meses e 2 dias). Todavia, tal como toda a função pública, também os professores estão hoje bem melhor do que há quatro anos.
2. O que essa declaração do dirigente sindical revela, para além de ingratidão política, é que os professores, numa típica arrogância elitista, se consideram com direito a tratamento privilegiado dentro da função pública, para além do pouco exigente regime de progressão de que já gozam.
Ainda bem que o Governo não cedeu nesse ponto, quer por uma questão de justiça distributiva, quer por razões de sustentabilidade orçamental. Sem igualdade teríamos privilégio para uns e iniquidade para outros; sem sustentabilidade financeira, o que se ganhasse hoje poderia voltar a perder-se numa próxima crise.
Quem não quer perceber isto não merece nenhuma complacência política.
Adenda
Um leitor pergunta quando é que a lei estabelece limites aos mandatos sindicais. Em princípio, a autonomia associativa privada impede uma tal imposição sem cobertura constitucional, mas nada impede que os estatutos sindicais estabeleçam regras sobre isso. Aparentemente, porém, as benesses do poder sindical dificultam tal limitação...
terça-feira, 7 de maio de 2019
Conferências & colóquios (4): Migrações e direitos humanos
Publicado por
Vital Moreira
Amanhã de manhã vou intervir numa das sessões de um curso breve sobre "Os direitos humanos e as migrações", ministrado nestes tês dias (6 a 9 de maio), na Universidade Lusiada-Norte (Porto), onde ensino desde 2015.
Vou tratar do tema "As organizações internacionais e as migrações", ocupando-me em especial das convenções internacionais sobre as migrações (da OIT e das Nações Unidas), assim como das organizações internacionais que se ocupam das migrações, nomeadamente a OIM. Não esquecerei também a legislação e as políticas da União Europeia sobre as migrações.
Adenda
Notícia do curso aqui: http://www.por.ulusiada.pt/noticias/artigo.php?news_id=3022&print=1
Vou tratar do tema "As organizações internacionais e as migrações", ocupando-me em especial das convenções internacionais sobre as migrações (da OIT e das Nações Unidas), assim como das organizações internacionais que se ocupam das migrações, nomeadamente a OIM. Não esquecerei também a legislação e as políticas da União Europeia sobre as migrações.
Adenda
Notícia do curso aqui: http://www.por.ulusiada.pt/noticias/artigo.php?news_id=3022&print=1
segunda-feira, 6 de maio de 2019
Conferências & colóquios (3): A "Constituição da segurança" em Portugal
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Vital Moreira
Na próxima quarta-feira, da 8 de maio, vou participar neste seminário da Academia Militar (na Amadora) sobre a "constituição da segurança" na CRP e perspetivas da sua revisão, cujo programa inclui, nos dois painéis de debate, os principais especialistas desta área do direito constitucional, provenientes de várias universidades nacionais.
Embora a revisão constitucional não esteja na atual agenda política - apesar de a CRP não ser revista há quase década e meia (desde 2005), o que é uma notável demonstração de estabilidade constitucional -, não é descabido refletir atempadamente sobre o seu possível aperfeiçoamento, quando a próxima revisão da CRP se proporcionar.
Adenda
Notícia do evento aqui: https://academiamilitar.pt/vii-seminario-sobre-direito-militar.html
Memórias acidentais (7): Ainda a crise académica de 1969
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Vital Moreira
1. Neste livro de Gualberto Freitas (cuja apresentação pode ser lida aqui: https://1969revolucaoressaca.blogspot.com/2019/05/texto-de-apresentacao-do-livro-o.html) são publicados vários documentos inéditos da história da crise académica de 1969, entre os quais o documento de defesa coletiva dos 40 estudantes acusados no processo disciplinar instaurado pelo então Ministro da Educação, Hermano Saraiva.
Suponho que também pela primeira vez são identificados, embora com duas imprecisões pontuais, os autores desse documento, nomeadamente, A. J. Avelãs Nunes, Aníbal Almeida, Mário de Araújo Torres e eu próprio, todos assistentes da Faculdade de Direito (salvo Mário Torres, que frequentava o então mestrado em Direito).
2. A nossa solidariedade com luta estudantil era pública, desde o manifesto coletivo dos assistentes de Direito, lido logo na assembleia magna de 18 de abril (no pátio dos Gerais), até à nossa comparência na de 22 de abril (no ginásio da AAC), que aprovou o "luto académico" e a greve às aulas. Por isso, foi para nós uma honra participar na defesa do referido processo disciplinar, que nos ocupou várias reuniões de trabalho (e muito trabalho de investigação) ao longo de junho (em plena greve a exames) numa discreta sala da biblioteca da AAC, com vista para o jardim interior.
Lido essse documento à distância de meio século, apraz-me dizer que valeu a pena.
Corrigenda
Se o texto da parte geral da defesa é agra publicado pela primeira vez, o mesmo não sucede com a identidade da equipa que o preparou, que já tinha sido indentificada há mais de vinte anos num livro de Celso Cruzeiro sobre a crise.
Suponho que também pela primeira vez são identificados, embora com duas imprecisões pontuais, os autores desse documento, nomeadamente, A. J. Avelãs Nunes, Aníbal Almeida, Mário de Araújo Torres e eu próprio, todos assistentes da Faculdade de Direito (salvo Mário Torres, que frequentava o então mestrado em Direito).
2. A nossa solidariedade com luta estudantil era pública, desde o manifesto coletivo dos assistentes de Direito, lido logo na assembleia magna de 18 de abril (no pátio dos Gerais), até à nossa comparência na de 22 de abril (no ginásio da AAC), que aprovou o "luto académico" e a greve às aulas. Por isso, foi para nós uma honra participar na defesa do referido processo disciplinar, que nos ocupou várias reuniões de trabalho (e muito trabalho de investigação) ao longo de junho (em plena greve a exames) numa discreta sala da biblioteca da AAC, com vista para o jardim interior.
Lido essse documento à distância de meio século, apraz-me dizer que valeu a pena.
Corrigenda
Se o texto da parte geral da defesa é agra publicado pela primeira vez, o mesmo não sucede com a identidade da equipa que o preparou, que já tinha sido indentificada há mais de vinte anos num livro de Celso Cruzeiro sobre a crise.
domingo, 5 de maio de 2019
Eleições no horizonte (9): Inevitável recuo
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Vital Moreira
1. Não se compreende como é que Rui Rio levou dois dias para reconhecer o óbvio: que o PSD incorreu numa enorme irresponsabilidade ao aprovar a devolução retroativa integral do tempo de serviço aos professores nos termos em que foi votada e festejada pelos seus deputados na comissão parlamentar competente na quinta-feira passada.
Se na comissão o PSD tivesse condicionado a sua aprovação à aceitação das condições que estavam na sua proposta, como agora faz, então a disparatada decisão não teria sido aprovada (pois essas condições foram rejeitadas na comissão) e não teria havido crise política nenhuma.
Mas o PSD e o CDS quiseram deliberadamente aprovar aquela decisão mesmo sem qualquer condição que a pudesse esvaziar, sujeitando-se à humilhação de agora voltar atrás, depois do ultimatum do Primeiro-Ministro, que assim se verifica plenamente justificado. Uma enorme derrota política!
2. Diga-se, de resto, que a condição da sustentabilidade financeira da medida que o líder do PSD agora ressuscita (depois de ter sido abandonada na comissão) não tem pés nem cabeça em termos orçamentais, tratando-se como se trata de uma despesa permanente.
Primeiro, saber se uma despesa adicional é comportável orçamentalmente depende do uso alternativo que se pretenda dar ao dinheiro necessário para a pagar, pois, mesmo que as receitas públicas subam, é sempre possível dizer que há destinos mais urgentes para elas do que para cobrir aquele despesa condicionada. Em segundo lugar, se uma nova despesa pode ser eventualmente comportável num período de crescimento das receitas públicas, como atualmente, já pode deixar de o ser num período de contração económica e de redução de recursos orçamentais. O que se faria então: cortar nas remunerações antes aumentadas?!
Perfeito nonsense!
3. O líder do PSD também não respondeu à segunda grande objeção contra a medida que o seu grupo parlamentar aprovou, a saber, a da sua enorme injustiça, em termos de privilégio de uma certa categoria profissional da função pública, quer face às demais categorias especiais, quer face às categorias gerais da função pública (cuja progressão não depende essencialmente do tempo), quer, por último, em relação aos trabalhadores do setor privado, que durante a crise foram muito mais afetados, já que muitos viram perdido o seu emprego e reduzidos os seus salários, sem que tenham recuperado retroativamente nenhuma dessas perdas.
É estranha essa omissão, num partido que ostenta a sigla PSD, que invoca a social-democracia, que tem entre os seus valores básicos a igualdade e a interdição de privilégios de classe.
Adenda
A sustentatibilidade financeira de uma nova despesa permanente de centenas de milhões de euros (como seria o caso) depende obviamente o nível dos impostos, pelo que, subindo os impostos, é sempre possível acomodá-la. Sendo o PSD militantemente favorável à descida de impostos, como é que se conciliam as duas coisas?
Adenda 2
Um dos aspetos surpreendentes da comunicação de Rui Rio foi o tom agastado e a animosidade em relação ao Primeiro-Ministro, como se tivesse sido objeto de um ataque pessoal. Mas um líder partidário não ganha nada, pelo contrário, em tentar cobrir uma derrota política, aliás autoinfligida, com supostos agravos pessoais. Isso tem o nome de mau perder.
Se na comissão o PSD tivesse condicionado a sua aprovação à aceitação das condições que estavam na sua proposta, como agora faz, então a disparatada decisão não teria sido aprovada (pois essas condições foram rejeitadas na comissão) e não teria havido crise política nenhuma.
Mas o PSD e o CDS quiseram deliberadamente aprovar aquela decisão mesmo sem qualquer condição que a pudesse esvaziar, sujeitando-se à humilhação de agora voltar atrás, depois do ultimatum do Primeiro-Ministro, que assim se verifica plenamente justificado. Uma enorme derrota política!
2. Diga-se, de resto, que a condição da sustentabilidade financeira da medida que o líder do PSD agora ressuscita (depois de ter sido abandonada na comissão) não tem pés nem cabeça em termos orçamentais, tratando-se como se trata de uma despesa permanente.
Primeiro, saber se uma despesa adicional é comportável orçamentalmente depende do uso alternativo que se pretenda dar ao dinheiro necessário para a pagar, pois, mesmo que as receitas públicas subam, é sempre possível dizer que há destinos mais urgentes para elas do que para cobrir aquele despesa condicionada. Em segundo lugar, se uma nova despesa pode ser eventualmente comportável num período de crescimento das receitas públicas, como atualmente, já pode deixar de o ser num período de contração económica e de redução de recursos orçamentais. O que se faria então: cortar nas remunerações antes aumentadas?!
Perfeito nonsense!
3. O líder do PSD também não respondeu à segunda grande objeção contra a medida que o seu grupo parlamentar aprovou, a saber, a da sua enorme injustiça, em termos de privilégio de uma certa categoria profissional da função pública, quer face às demais categorias especiais, quer face às categorias gerais da função pública (cuja progressão não depende essencialmente do tempo), quer, por último, em relação aos trabalhadores do setor privado, que durante a crise foram muito mais afetados, já que muitos viram perdido o seu emprego e reduzidos os seus salários, sem que tenham recuperado retroativamente nenhuma dessas perdas.
É estranha essa omissão, num partido que ostenta a sigla PSD, que invoca a social-democracia, que tem entre os seus valores básicos a igualdade e a interdição de privilégios de classe.
Adenda
A sustentatibilidade financeira de uma nova despesa permanente de centenas de milhões de euros (como seria o caso) depende obviamente o nível dos impostos, pelo que, subindo os impostos, é sempre possível acomodá-la. Sendo o PSD militantemente favorável à descida de impostos, como é que se conciliam as duas coisas?
Adenda 2
Um dos aspetos surpreendentes da comunicação de Rui Rio foi o tom agastado e a animosidade em relação ao Primeiro-Ministro, como se tivesse sido objeto de um ataque pessoal. Mas um líder partidário não ganha nada, pelo contrário, em tentar cobrir uma derrota política, aliás autoinfligida, com supostos agravos pessoais. Isso tem o nome de mau perder.
Praça da República (21): E se houver dissolução parlamentar?
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Vital Moreira
Há quem pense que, caso se concretize a demissão do Governo ontem pré-anunciada pelo Primeiro-Ministro, o Presidente da República poderia adiar a dissolução da AR para mais tarde, de modo a realizar eleições somente depois das férias de verão, mantendo entretanto o Governo em "funções de gestão".
Mas não é assim. Concretizada a demissão de um Governo, o PR só tem teoricamente duas alternativas; (i) tentar a formação de novo governo no quadro parlamentar existente, ou (ii) dissolver o parlamento (ouvido o Conselho de Estado) e convocar eleições, que têm de se realizar dentro de dois meses a contar da dissolução.
Ora, no caso concreto, sendo evidente à partida que não há condições para um novo governo até ao fim da legislatura, dentro de poucos meses, só restariam as eleições, as quais devem ser convocadas sem demora, quer para solucionar rapidamente a crise política, quer para reduzir o período em que o País ficaria em governo de gestão, ou seja, desde a demissão até a nomeação de novo governo depois de eleições (o que pode levar o seu tempo).
Adenda
A possibilidade de adiamento da dissolução, mantendo o Governo demitido em "funções de gestão", só se coloca eventualmente no caso dos "períodos de defeso" da dissolução parlamentar, nos termos do art. 172º da CRP.
Mas não é assim. Concretizada a demissão de um Governo, o PR só tem teoricamente duas alternativas; (i) tentar a formação de novo governo no quadro parlamentar existente, ou (ii) dissolver o parlamento (ouvido o Conselho de Estado) e convocar eleições, que têm de se realizar dentro de dois meses a contar da dissolução.
Ora, no caso concreto, sendo evidente à partida que não há condições para um novo governo até ao fim da legislatura, dentro de poucos meses, só restariam as eleições, as quais devem ser convocadas sem demora, quer para solucionar rapidamente a crise política, quer para reduzir o período em que o País ficaria em governo de gestão, ou seja, desde a demissão até a nomeação de novo governo depois de eleições (o que pode levar o seu tempo).
Adenda
A possibilidade de adiamento da dissolução, mantendo o Governo demitido em "funções de gestão", só se coloca eventualmente no caso dos "períodos de defeso" da dissolução parlamentar, nos termos do art. 172º da CRP.
sábado, 4 de maio de 2019
Debates: Duas visões da América
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Vital Moreira
Bem imaginados estes "encontros imaginários" na Barraca, em Lisboa, desta vez reconstruindo um encontro entre dois representantes de duas famílias que marcaram a vida política dos Estados Unidos no século passado, a saber, Robert Kennedy (representado por Luís Nazaré, cofundador do Causa Nossa) e Prescott Bush (interpretado por Ricardo Sá Fernandes), com "moderação" da jornalista Hedda Hopper (interpretada por Maria José Albuquerque). É na próxima segunda-feira.
Infelizmente, não poderei estar presente, como gostaria, por causa de um compromisso académico no Porto. Mas deixo aqui o registo para os interessados.
Bicentenário do constitucionalismo (1820-2020): O funcionamento das Cortes Constituintes
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Vital Moreira
Eleições no horizonte (8): O PSD nas teias que o oportunismo tece
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Vital Moreira
1. Colocado entre a espada do ultimato do Governo e a parede da sua incompreensível "argolada" política, que a opinião pública não compreende, o PSD vai provavelmente ensaiar uma saída lateral, propondo a avocação da votação no plenário da AR e adiantando uma qualquer variante da solução que irresponsavelmente aprovou em comissão parlamentar.
Só que, além de se sujeitar a ser acusado pelos seus aliados da extrema-esquerda de cobardia política e de "troca-tintismo", essa tentativa de saída não pode obter qualquer compreensão por parte do PS, que não pode admitir nenhum tratamento especial para os professores, nem nenhum agravamento da verba orçamental destinada ao descongelamento de carreiras, nem, muitos menos, enviar legislativamente a "batata quente" para os próximos governos - o que, além do mais, seria democraticamente ilegítimo.
2. O PSD continua a não querer perceber que o seu erro fatal foi ter concordado com o princípio da recuperação retroativa de todo o tempo de serviço dos professores, deixando em aberto somente o modo de o fazer, sem se dar conta de que qualquer solução para os professores teria de ser extensível aos demais "corpos especiais" da função pública (com os incomportáveis custos orçamentais) e que, em última instância, tal solução sempre seria profundamente injusta em relação, quer às carreiras gerais da função pública, quer aos portugueses em geral, que não podem recuperar de nenhum modo as perdas que sofreram durante a crise.
A perplexidade que sobra disto é como é que um partido responsável, de vocação governamental, de centro-direita, empenhado na sustentabilidade das finanças públicas, como o PSD, pôde imaginar que podia impunemente aliar-se à extrema-esquerda parlamentar para alimentar uma reivindicação sindical radical, seletiva e financeiramente incomportável.
Há alianças que comprometem. O oportunismo e o aventureirismo político pagam-se.
Adenda
Só que, além de se sujeitar a ser acusado pelos seus aliados da extrema-esquerda de cobardia política e de "troca-tintismo", essa tentativa de saída não pode obter qualquer compreensão por parte do PS, que não pode admitir nenhum tratamento especial para os professores, nem nenhum agravamento da verba orçamental destinada ao descongelamento de carreiras, nem, muitos menos, enviar legislativamente a "batata quente" para os próximos governos - o que, além do mais, seria democraticamente ilegítimo.
2. O PSD continua a não querer perceber que o seu erro fatal foi ter concordado com o princípio da recuperação retroativa de todo o tempo de serviço dos professores, deixando em aberto somente o modo de o fazer, sem se dar conta de que qualquer solução para os professores teria de ser extensível aos demais "corpos especiais" da função pública (com os incomportáveis custos orçamentais) e que, em última instância, tal solução sempre seria profundamente injusta em relação, quer às carreiras gerais da função pública, quer aos portugueses em geral, que não podem recuperar de nenhum modo as perdas que sofreram durante a crise.
A perplexidade que sobra disto é como é que um partido responsável, de vocação governamental, de centro-direita, empenhado na sustentabilidade das finanças públicas, como o PSD, pôde imaginar que podia impunemente aliar-se à extrema-esquerda parlamentar para alimentar uma reivindicação sindical radical, seletiva e financeiramente incomportável.
Há alianças que comprometem. O oportunismo e o aventureirismo político pagam-se.
Adenda
Em declarações feitas ontem, ainda antes de se conhecer a decisão de António Costa, Rui Rio justificou a hipótese de abertura de uma crise política com o facto de a campanha eleitoral do PS para as europeias "estar a correr mal". Ora, numa sondagem hoje publicada no semanário Sol, o PS aparece com nada menos de sete pontos à frente do PSD. Imagine-se que a campanha não estava a correr mal...
Adenda 2
O eurodeputado Paulo Rangel (Rui Rio mantém-se em silêncio) veio afirmar hoje que «a proposta do PSD “é responsável” e “tem condicionalidades”, como o crescimento económico ou a consolidação financeira (....)». Mas, qualquer que tenha sido tal proposta e qualquer que fosse o seu alcance, o texto efetivamente aprovado pelo PSD não faz nenhuma referência a tais "condicionalidades"...
Adenda 3
Uma das propostas políticas mais coerentes e insistentes do PSD é a descida de impostos. Como é que se propõe conseguir esse alívio fiscal, acrecentando mais umas centenas de milhões de euros à despesa pública permanente? Uma gritante contradição!
Adenda 4
Parece óbvio que, embora metendo os pés pelas mãos, o CDS se prepara para "roer a corda", não ratificando em plenário a decisão da comissão parlamentar, tal como votada. Vai o PSD manter-se como tábua de salvação do maximalismo da Fenprof e da extrema-esquerda parlamentar?
Adenda 2
O eurodeputado Paulo Rangel (Rui Rio mantém-se em silêncio) veio afirmar hoje que «a proposta do PSD “é responsável” e “tem condicionalidades”, como o crescimento económico ou a consolidação financeira (....)». Mas, qualquer que tenha sido tal proposta e qualquer que fosse o seu alcance, o texto efetivamente aprovado pelo PSD não faz nenhuma referência a tais "condicionalidades"...
Adenda 3
Uma das propostas políticas mais coerentes e insistentes do PSD é a descida de impostos. Como é que se propõe conseguir esse alívio fiscal, acrecentando mais umas centenas de milhões de euros à despesa pública permanente? Uma gritante contradição!
Adenda 4
Parece óbvio que, embora metendo os pés pelas mãos, o CDS se prepara para "roer a corda", não ratificando em plenário a decisão da comissão parlamentar, tal como votada. Vai o PSD manter-se como tábua de salvação do maximalismo da Fenprof e da extrema-esquerda parlamentar?
sexta-feira, 3 de maio de 2019
Eleições no horizonte (7): A roleta russa do PSD
Publicado por
Vital Moreira
Como é que é possível que, com todo o seu discurso de partido moderado, contrário ao despesismo do Estado e favorável ao equilíbrio orçamental, o PSD tenha caído na tentação de alinhar com a extrema-esquerda, que despreza todos esses valores, na aprovação de uma medida política e financeiramente insustentável, só para tentar dividir com esses partidos nas próximas eleições os despojos de uns milhares de votos de uma categoria profissional privilegiada?
E como é que é possível que Rio não tenha antecipado que a reação de Costa poderia mesmo ser a que foi, forte e firme (como aqui se tinha defendido já ontem), lançando sobre o PSD, com toda a credibilidade pública, o principal ónus da crise política, por ter querido ignorar que há alianças espúrias que comprometem a coerência política sem apelo nem agravo?
Não dá simplesmente para entender!
Adenda
Um leitor sugere que Rio só tem uma saída para a alhada em que se meteu: não impor disciplina de voto na votação final no plenário e deixar que uma parte dos deputados do PSD se abstenham e deixem chumbar a lei...
E como é que é possível que Rio não tenha antecipado que a reação de Costa poderia mesmo ser a que foi, forte e firme (como aqui se tinha defendido já ontem), lançando sobre o PSD, com toda a credibilidade pública, o principal ónus da crise política, por ter querido ignorar que há alianças espúrias que comprometem a coerência política sem apelo nem agravo?
Não dá simplesmente para entender!
Adenda
Um leitor sugere que Rio só tem uma saída para a alhada em que se meteu: não impor disciplina de voto na votação final no plenário e deixar que uma parte dos deputados do PSD se abstenham e deixem chumbar a lei...
Geringonça (19): O fim
Publicado por
Vital Moreira
Se o PS fez tudo para aguentar a Geringonça até ao fim, concessão após concessão, apesar dos seus custos orçamentais e das golpadas dos parceiros da pseudoaliança parlamentar (sobretudo do BE), desta vez as coisas ultrapassaram todas as linhas vermelhas, quando os ditos aceitam o apoio eleitoralmente oportunista da direita para impor uma medida que, além de não constar deliberadamente do programa do Governo nem dos acordos interpartidários e de se traduzir numa enorme injustiça distributiva na função pública - o que é indigno da esquerda -, inflige ao Governo a maior derrota política da legislatura, numa das suas mais essenciais orientações políticas (a consolidação orçamental, a redução do peso da dívida pública e a contenção do aumento da despesa pública permanente).
Se na política não há lugar para gratidão, resta sempre a exigência de um módico de leadade política entre as partes num parceria política contratualizada.
Adenda
Penso que o melhor modo de lidar com o maximalismo político dos seus "parceiros" (!?) de esquerda é mesmo confrontá-los com uma moção de confiança baseada na importância decisiva da consolidação orçamental e com o desafio de apoiarem o Governo ou juntarem-se à direita para o derrubar.
Adenda 2
António Costa preferiu jogar pelo seguro e clarificar desde já as águas, anunciando a demissão do Governo, caso a lei seja definitivamente aprovada, jogando toda a responsabilidade sobre a leviandade e o oportunismo das oposições. Conversa acabada, portanto!
Se na política não há lugar para gratidão, resta sempre a exigência de um módico de leadade política entre as partes num parceria política contratualizada.
Adenda
Penso que o melhor modo de lidar com o maximalismo político dos seus "parceiros" (!?) de esquerda é mesmo confrontá-los com uma moção de confiança baseada na importância decisiva da consolidação orçamental e com o desafio de apoiarem o Governo ou juntarem-se à direita para o derrubar.
Adenda 2
António Costa preferiu jogar pelo seguro e clarificar desde já as águas, anunciando a demissão do Governo, caso a lei seja definitivamente aprovada, jogando toda a responsabilidade sobre a leviandade e o oportunismo das oposições. Conversa acabada, portanto!
SNS, 40 anos (17): Fetichismo ideológico
Publicado por
Vital Moreira
1. É estranha a fixação da esquerda na questão das PPPs - que continuam a ser excecionais -, quando é indesmentível que a verdadeira "privatização" do SNS está noutro lado, a saber:
- no volume crescente de cuidados de saúde subcontratados pelo próprio SNS a prestadores privados, por défice de capacidade daquele;
- no volume crescente de cuidados de saúde prestados à margem do SNS, quer através de seguros privados de saúde, quer através da ADSE (gerida pelo próprio Estado!).
O fetichismo ideológico quanto às PPPs obscurece o emagrecimento progressivo da quota do SNS na prestação global de cuidados de saúde entre nós. Ora, os hospitais PPP, esses continuam integrados no SNS, não à margem dele!
2. Há quem se preocupe apenas em saber onde é que o dinheiro público destinado à saúde é gasto, querendo significar que deve ser sempre gasto na gestão pública e nunca na gestão delegada a privados.
Penso, mais uma vez, que se trata de uma perspetiva desfocada: o que deve preocupar é saber onde é que o dinheiro público rende mais, em termos de cuidados de saúde prestados e de utentes servidos. Como contribuinte, desejo que o dinheiro público seja utilizado da forma mais eficiente possível também no SNS, em termos de value for money.
Ora, se, em virtude de uma maior eficiência, se demonstrar que a gestão privada delegada pode produzir mais com o mesmo dinheiro, sem perdas de qualidade (como mostram os indicadores disponíveis sobre as PPPs), não vejo porque é que se há-de preferir sempre a gestão pública, com menores resultados. Só por sectarismo doutrinário ou por masoquismo tributário!
- no volume crescente de cuidados de saúde subcontratados pelo próprio SNS a prestadores privados, por défice de capacidade daquele;
- no volume crescente de cuidados de saúde prestados à margem do SNS, quer através de seguros privados de saúde, quer através da ADSE (gerida pelo próprio Estado!).
O fetichismo ideológico quanto às PPPs obscurece o emagrecimento progressivo da quota do SNS na prestação global de cuidados de saúde entre nós. Ora, os hospitais PPP, esses continuam integrados no SNS, não à margem dele!
2. Há quem se preocupe apenas em saber onde é que o dinheiro público destinado à saúde é gasto, querendo significar que deve ser sempre gasto na gestão pública e nunca na gestão delegada a privados.
Penso, mais uma vez, que se trata de uma perspetiva desfocada: o que deve preocupar é saber onde é que o dinheiro público rende mais, em termos de cuidados de saúde prestados e de utentes servidos. Como contribuinte, desejo que o dinheiro público seja utilizado da forma mais eficiente possível também no SNS, em termos de value for money.
Ora, se, em virtude de uma maior eficiência, se demonstrar que a gestão privada delegada pode produzir mais com o mesmo dinheiro, sem perdas de qualidade (como mostram os indicadores disponíveis sobre as PPPs), não vejo porque é que se há-de preferir sempre a gestão pública, com menores resultados. Só por sectarismo doutrinário ou por masoquismo tributário!
quinta-feira, 2 de maio de 2019
Eleições no horizonte (6): Para grandes males...
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Vital Moreira
Além do injusto privilégio que confere aos beneficiários, o oportunista acordo entre o PSD (!?) e os partidos à esquerda do PS para a recuperação retroativa integral do tempo de progressão congelado aos professores durante a crise é de uma gravidade sem paralelo na gestão financeira desta legislatura, arruinando os laboriosos esforços para a consolidação orçamental, além do efeito de arrastamento que vai ter sobre outras carreiras afins.
Entendo que, apesar de ter deixado arrastar indevidamente este dossiê sem provocar atempadamente a sua clarificação definitiva, o Governo não pode aceitar passivamente este triunfo do mais pedestre eleitoralismo das oposições coligadas, que lesa irremediavelmente a credibilidade orçamental externa do País e a justiça distributiva na função pública. Não pode valer tudo em vésperas de eleições.
Eu, se fosse chefe do Governo, dramatizaria a leviandade das oposições e apresentaria a demissão, pedindo ao PR a convocação de eleições antecipadas e solicitando a arbitragem dos contribuintes.
Adenda
Um leitor pergunta se não é melhor impugnar constitucionalmente a medida. Mas os dislates orçamentais não são necessariamente inconstitucionais e, sobretudo, trata-se de uma questão essencialmente política, que não pode aguardar o improvável desfecho de uma problemática fiscalizição da constitucionalidade. A questão essencial é a de saber se um Governo minoritário deve "engolir" um golpe eleitoralmente oportunista das oposições coligadas, que vai contra o programa e a orientação do Governo e que deixa uma pesada herança orçamental para o Governo seguinte, aumentando subtancialmente a despesa permanente do Estado, e abrindo uma "caixa de Pandora" em relação a carreiras semelhantes da função pública. Pergunto-me quem é que aceita ser ministro das finanças nestas condições...
Adenda (2)
Sob o ponto de vista constitucional, a objeção mais relevante, no meu entender, tem a ver com o princípio da igualdade, na medida em que esta solução estipula a contagem retroativa de todo o tempo de serviço prestado durante o período de congelamento geral das progressões, o que se traduz num privilégio nas carreiras como a dos professores, que é uma carreira plana e em que a progressão depende essencialmente do tempo de serviço, quando comparada com o regime geral das carreiras com vários níveis e com acesso por concurso ou equivalente, as quais, por natureza, não podem recuperar a progressão que perderam durante o congelamento.
Adenda (3)
Uma hipótese alternativa seria uma solução em duas vertentes cumulativas: (i) por um lado, apresentar uma moção de confiança à AR, como base numa declaração política focada na disciplina orçamental, confrontando o Bloco e o PCP com o desafio de apoiarem o Goveno ou juntarem-se à direita para o derrubar e abrirem uma crise política; (ii) solicitar expressmente ao PR que suscite a fiscalização preventiva da constitucionalidade da lei (o que ele nunca fez...), com base designadamente na violação do princípio da igualdade, como exposto acima.
Entendo que, apesar de ter deixado arrastar indevidamente este dossiê sem provocar atempadamente a sua clarificação definitiva, o Governo não pode aceitar passivamente este triunfo do mais pedestre eleitoralismo das oposições coligadas, que lesa irremediavelmente a credibilidade orçamental externa do País e a justiça distributiva na função pública. Não pode valer tudo em vésperas de eleições.
Eu, se fosse chefe do Governo, dramatizaria a leviandade das oposições e apresentaria a demissão, pedindo ao PR a convocação de eleições antecipadas e solicitando a arbitragem dos contribuintes.
Adenda
Um leitor pergunta se não é melhor impugnar constitucionalmente a medida. Mas os dislates orçamentais não são necessariamente inconstitucionais e, sobretudo, trata-se de uma questão essencialmente política, que não pode aguardar o improvável desfecho de uma problemática fiscalizição da constitucionalidade. A questão essencial é a de saber se um Governo minoritário deve "engolir" um golpe eleitoralmente oportunista das oposições coligadas, que vai contra o programa e a orientação do Governo e que deixa uma pesada herança orçamental para o Governo seguinte, aumentando subtancialmente a despesa permanente do Estado, e abrindo uma "caixa de Pandora" em relação a carreiras semelhantes da função pública. Pergunto-me quem é que aceita ser ministro das finanças nestas condições...
Adenda (2)
Sob o ponto de vista constitucional, a objeção mais relevante, no meu entender, tem a ver com o princípio da igualdade, na medida em que esta solução estipula a contagem retroativa de todo o tempo de serviço prestado durante o período de congelamento geral das progressões, o que se traduz num privilégio nas carreiras como a dos professores, que é uma carreira plana e em que a progressão depende essencialmente do tempo de serviço, quando comparada com o regime geral das carreiras com vários níveis e com acesso por concurso ou equivalente, as quais, por natureza, não podem recuperar a progressão que perderam durante o congelamento.
Adenda (3)
Uma hipótese alternativa seria uma solução em duas vertentes cumulativas: (i) por um lado, apresentar uma moção de confiança à AR, como base numa declaração política focada na disciplina orçamental, confrontando o Bloco e o PCP com o desafio de apoiarem o Goveno ou juntarem-se à direita para o derrubar e abrirem uma crise política; (ii) solicitar expressmente ao PR que suscite a fiscalização preventiva da constitucionalidade da lei (o que ele nunca fez...), com base designadamente na violação do princípio da igualdade, como exposto acima.
Ai, o défice (9): "Viver acima das possibilidades"
Publicado por
Vital Moreira
1. Em mais um dos seus estimulantes artigos no Público (acesso condicionado), Luís Aguiar-Conraria afirma ter sido um erro ter utilizado a expressão "viver acima das possibilidades", pela carga moral negativa que ela implica para tanta gente que vive com baixos rendimentos.
Mas eu penso que isso não é razão para não ser apropriado utilizá-la, justamente com essa carga moral e política, em relação ao País (Estado, empresas e particulares), quando gastava sistematicamente mais do que produzia, acumulando uma montanha de dívida externa (com o resultado conhecido), e a tantos portugueses que faziam levianamente o mesmo.
2. Também tenho defendido aqui várias vezes a necessidade de aumentar a poupança nacional, não somente como almofada para as famílias, mas também para reduzir a dependência do capital externo para efeitos de investimento.
Tendo, porém, concluído que os portugueses não são naturalmente dados ao aforro, já só desejo que não regressem ao endividamento excessivo (o que parece que muitos estão novamente a fazer, a crer nos números do crédito aos particulares...). De resto, o mesmo se passa com as empresas, que distribuem pingues dividendos (por vezes mais do que os lucros!), para depois se endividarem para investir.
Continuo a pensar que endividamento em período de vacas gordas arrisca acabar em privação severa em período de vacas magras (como sucedeu durante a crise)...
Mas eu penso que isso não é razão para não ser apropriado utilizá-la, justamente com essa carga moral e política, em relação ao País (Estado, empresas e particulares), quando gastava sistematicamente mais do que produzia, acumulando uma montanha de dívida externa (com o resultado conhecido), e a tantos portugueses que faziam levianamente o mesmo.
2. Também tenho defendido aqui várias vezes a necessidade de aumentar a poupança nacional, não somente como almofada para as famílias, mas também para reduzir a dependência do capital externo para efeitos de investimento.
Tendo, porém, concluído que os portugueses não são naturalmente dados ao aforro, já só desejo que não regressem ao endividamento excessivo (o que parece que muitos estão novamente a fazer, a crer nos números do crédito aos particulares...). De resto, o mesmo se passa com as empresas, que distribuem pingues dividendos (por vezes mais do que os lucros!), para depois se endividarem para investir.
Continuo a pensar que endividamento em período de vacas gordas arrisca acabar em privação severa em período de vacas magras (como sucedeu durante a crise)...
Não concordo (11): Lamentável censura
Publicado por
Vital Moreira
Lamento profundamente a censura imposta pelo New York Times a esta caricatura - uma "charge" ao seguidismo de Trump em relação ao Governo de direita de Israel na sua ofensiva antipalestina -, invocando que ela consubstancia um episódio de antissemitismo -, o que é um disparate.
Na verdade, o facto de Israel se autoqualificar como "Estado judaico" não o torna imune à crítica das suas opções e orientações políticas, como qualquer outro Estado, sem que isso implique qualquer sentimento antijudaico. Era o que faltava, que a natureza étnico-religiosa de que se reclama o Estado israelita o tornasse imune à crítica e condenação pela sistemática violação do direito internacional em relação aos territórios palestinos ocupados (incluindo Jerusalém) e de repressão, expropriação e deslocação maciça dos seus moradores, de segregação dos cidadãos árabes israelitas, etc.
De resto, estas críticas são compartilhadas por muitos intelectuais judeus, dentro e fora de Israel, nomeadamente nos Estados Unidos. Ao censurar a caricatura de um seu colaborador regular, o New York Times cede cinicamente ao poderoso lobby político e empresarial pró-israelita em Washington e não honra os seus pergaminhos de defesa intransigente da liberdade e independência jornalística.
Na verdade, o facto de Israel se autoqualificar como "Estado judaico" não o torna imune à crítica das suas opções e orientações políticas, como qualquer outro Estado, sem que isso implique qualquer sentimento antijudaico. Era o que faltava, que a natureza étnico-religiosa de que se reclama o Estado israelita o tornasse imune à crítica e condenação pela sistemática violação do direito internacional em relação aos territórios palestinos ocupados (incluindo Jerusalém) e de repressão, expropriação e deslocação maciça dos seus moradores, de segregação dos cidadãos árabes israelitas, etc.
De resto, estas críticas são compartilhadas por muitos intelectuais judeus, dentro e fora de Israel, nomeadamente nos Estados Unidos. Ao censurar a caricatura de um seu colaborador regular, o New York Times cede cinicamente ao poderoso lobby político e empresarial pró-israelita em Washington e não honra os seus pergaminhos de defesa intransigente da liberdade e independência jornalística.
quarta-feira, 1 de maio de 2019
Bloquices (9): Irresponsabilidade qualificada
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Vital Moreira
Não pode passar sem registo este vídeo da manifestação do 25 de abril em que uma deputada do Bloco (aparentemente secundada pela líder e pela eurodeputada do mesmo partido) desejam ao Presidente do Brasil, Bolsonaro, o mesmo destino que o de Salazar (que, ao contrário daquele, não chegou ao poder por via de eleições nem nunca se submeteu a elas na sua longa ditadura). Ora, por metafórica que tenha sido a cantilena bloquista, não há desculpa para tal irresponsabilidade política, mais própria de grupelho anarco-populista do que de dirigentes qualificados de um partido representado na AR, e que aspira a governar o País.
Tivessem sido dirigentes de outro partido, esta indesculpável leviandade política ao mais alto nível teria provocado um coro de justa reprovação nos média e na opinião pública. Tratando-se do BE, porém, o lastimável episódio foi em geral ignorado e retirado da esfera pública, mostrando mais uma vez o protecionismo de que o grupo goza na comunicação social (já escrevi uma vez que, se as eleições fossem nas redações dos média, o Bloco ganhava...).
Adenda
Um leitor objeta que o vídeo foi retirado do site do Bloco logo que se verificou a sua inconveniência, mas eu penso que o facto de ter sido aí publicado só mostra que não se tratou de uma "gaffe" imponderada na manisfestação, o que agrava as coisas. Além disso, tendo depois retirado o vídeo, pela sua "inconveniência" política, o Bloco nem se retratou do lamentável episódio nem pediu desculpa por ele.
Tivessem sido dirigentes de outro partido, esta indesculpável leviandade política ao mais alto nível teria provocado um coro de justa reprovação nos média e na opinião pública. Tratando-se do BE, porém, o lastimável episódio foi em geral ignorado e retirado da esfera pública, mostrando mais uma vez o protecionismo de que o grupo goza na comunicação social (já escrevi uma vez que, se as eleições fossem nas redações dos média, o Bloco ganhava...).
Adenda
Um leitor objeta que o vídeo foi retirado do site do Bloco logo que se verificou a sua inconveniência, mas eu penso que o facto de ter sido aí publicado só mostra que não se tratou de uma "gaffe" imponderada na manisfestação, o que agrava as coisas. Além disso, tendo depois retirado o vídeo, pela sua "inconveniência" política, o Bloco nem se retratou do lamentável episódio nem pediu desculpa por ele.
terça-feira, 30 de abril de 2019
Free & fair trade (9): Um nova era na justiça internacional sobre o investimento estrangeiro
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Vital Moreira
1. O Tribunal de Justiça da União Europeia acaba de decidir que o tribunal internacional de litígios de investimento previsto no acordo comercial com o Canadá (conhecido pela sigla CETA) não é incompatível com o direito constitucional da União, pelo que pode avançar a sua criação.
Trata-se de um importante triunfo da Comissão Europeia, que investiu muito capital técnico e político nesta solução, e dos que, como eu, apostaram nela.
Com esta decisão fica também aberto o caminho para a ratificação dos acordos com Singapura e com o Vietname, que consagram igual solução judicial. Foi igualmente validada a opção da Comissão Europeia (e da União) para criar ulteriormente um tribunal multilateral de investimento, de jurisdição obrigatória, que abranja todos os países que o desejem.
Do que se trata, portanto, é de submeter os litígios internacionais de investimento, por alegada violação de acordos internacionais de investimento, a uma verdadeira justiça internacional.
2. Lembremos que este sistema de tribunal internacional de investimento (investment court system, ICS) foi a solução encontrada para substituir o sistema tradicional da arbitragem internacional ad hoc dos litígios entre investidores estrangeiros e os Estados de investimento (conhecida pela sigla ISDS - investor to state dispute settlement), que não resistiu à forte contestação pela opinião pública, tendo sido afastada pelo Parlamento Europeu.
Ao contrário desta - em que o investidor tem direito a nomear um dos árbitros e a acordar no terceiro árbitro -, o novo sistema consiste na criação de um tribunal permanente, constituído por juízes independentes, nomeados de comum acordo pelos Estados envolvidos, sem nenhuma intervenção dos investidores interessados. Além disso, o novo sistema prevê um tribunal de recurso, o que não existe no ISDS. Por último, a nova solução salvaguarda explicitamente o "direito a regular" (right to regulate) dos Estados (ou da União, sendo caso disso) em defesa do ambiente, da saúde, etc. - o que prevalece sobre os direitos dos investidores.
Além de inovador, trata-se também de um regime assaz equilibrado!
Trata-se de um importante triunfo da Comissão Europeia, que investiu muito capital técnico e político nesta solução, e dos que, como eu, apostaram nela.
Com esta decisão fica também aberto o caminho para a ratificação dos acordos com Singapura e com o Vietname, que consagram igual solução judicial. Foi igualmente validada a opção da Comissão Europeia (e da União) para criar ulteriormente um tribunal multilateral de investimento, de jurisdição obrigatória, que abranja todos os países que o desejem.
Do que se trata, portanto, é de submeter os litígios internacionais de investimento, por alegada violação de acordos internacionais de investimento, a uma verdadeira justiça internacional.
2. Lembremos que este sistema de tribunal internacional de investimento (investment court system, ICS) foi a solução encontrada para substituir o sistema tradicional da arbitragem internacional ad hoc dos litígios entre investidores estrangeiros e os Estados de investimento (conhecida pela sigla ISDS - investor to state dispute settlement), que não resistiu à forte contestação pela opinião pública, tendo sido afastada pelo Parlamento Europeu.
Ao contrário desta - em que o investidor tem direito a nomear um dos árbitros e a acordar no terceiro árbitro -, o novo sistema consiste na criação de um tribunal permanente, constituído por juízes independentes, nomeados de comum acordo pelos Estados envolvidos, sem nenhuma intervenção dos investidores interessados. Além disso, o novo sistema prevê um tribunal de recurso, o que não existe no ISDS. Por último, a nova solução salvaguarda explicitamente o "direito a regular" (right to regulate) dos Estados (ou da União, sendo caso disso) em defesa do ambiente, da saúde, etc. - o que prevalece sobre os direitos dos investidores.
Além de inovador, trata-se também de um regime assaz equilibrado!
"Dinheiro Vivo" (13): O "capital humano" também deve ter direito aos lucros das empresas?
Publicado por
Vital Moreira
Aqui está o cabeçalho do meu habitual artigo de sábado passado no Dinheiro Vivo (suplemento de economia do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias), desta vez sobre a prática de algumas empresas de distribuírem uma parte dos seus lucros pelos seus trabalhadores.
Sendo uma prática relativamente frequente em diversos países, ela não tem muitos exemplos entre nós, apesar dos fortes argumentos a seu favor.
Sendo uma prática relativamente frequente em diversos países, ela não tem muitos exemplos entre nós, apesar dos fortes argumentos a seu favor.
segunda-feira, 29 de abril de 2019
Terra brasilis (6): Quando o Governo "compra" os deputados
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Vital Moreira
1. No Brasil, o Governo de Bolsonaro acaba de prometer um bónus orçamental de 10 milhões de reais por ano (2,3 milhões de euros), durante os próximos quatro anos, aos deputados que aprovem a reforma previdenciária (segurança social), a somar à verba orçamental normal de mais de 15 milhões de reais anuais a que já têm direito os parlamentares (através de "emendas" orçamentais), para investimento nos seus territórios eleitorais.
Na verdade, essas verbas orçamentais cativas a favor dos deputados e senadores constituem uma das razões para o verdadeiro "mercado parlamentar" existente em Brasília, quer para atrair partidos para o lado "governista" da câmara, quer para atrair os próprios deputados para as bancadas "governistas", mudando de partido (visto que no Brasil é admitida a mudança de partido por "justa causa", definida em termos assaz imprecisos). Pelos vistos, no Brasil o "mandato livre" dos parlamentares vai ao ponto de o transformar em mercadoria política!
2. Em Portugal ficou célebre o episódio do "orçamento limiano" (ou "orçamento do queijo limiano"), em que o segundo Governo minoritário de Guterres (1999-2002) "comprou" o voto de um deputado da oposição (CDS) para aprovar os orçamentos do Estado de 2000 e 2002, a troco de investimentos públicos no seu município (Ponte de Lima). Essa insólita experiência parlamentar conta-se, porém, como um momento menos feliz na nossa história política, não tendo voltado a ocorrer.
De resto, em Portugal o transfuguismo parlamentar é proibido pela própria Constituição (os deputados podem deixar o partido por que foram eleitos, mas não podem inscrever-se noutro partido nem juntar-se a outro grupo parlamentar, sob pena de perda do mandato) e a prática política é caracterizada pela estrita disciplina de voto na votação do orçamento (e noutras votações que possam pôr em causa a subsistência do Governo), como é norma num sistema de governo de natureza parlamentar. No caso do "orçamento limiano" o deputado em causa foi suspenso pelo CDS.
Por conseguinte, embora livre de qualquer mandato vinculado em relação aos eleitores (como é próprio de uma democracia representativa), o mandato dos deputados é essencialmente (embora não absolutamente) vinculado às orientações partidárias. De resto, ao contrário do que sucede no Brasil, em Portugal os cidadãos votam primariamente em partidos, não nos candidatos individualmente considerados.
Na verdade, essas verbas orçamentais cativas a favor dos deputados e senadores constituem uma das razões para o verdadeiro "mercado parlamentar" existente em Brasília, quer para atrair partidos para o lado "governista" da câmara, quer para atrair os próprios deputados para as bancadas "governistas", mudando de partido (visto que no Brasil é admitida a mudança de partido por "justa causa", definida em termos assaz imprecisos). Pelos vistos, no Brasil o "mandato livre" dos parlamentares vai ao ponto de o transformar em mercadoria política!
2. Em Portugal ficou célebre o episódio do "orçamento limiano" (ou "orçamento do queijo limiano"), em que o segundo Governo minoritário de Guterres (1999-2002) "comprou" o voto de um deputado da oposição (CDS) para aprovar os orçamentos do Estado de 2000 e 2002, a troco de investimentos públicos no seu município (Ponte de Lima). Essa insólita experiência parlamentar conta-se, porém, como um momento menos feliz na nossa história política, não tendo voltado a ocorrer.
De resto, em Portugal o transfuguismo parlamentar é proibido pela própria Constituição (os deputados podem deixar o partido por que foram eleitos, mas não podem inscrever-se noutro partido nem juntar-se a outro grupo parlamentar, sob pena de perda do mandato) e a prática política é caracterizada pela estrita disciplina de voto na votação do orçamento (e noutras votações que possam pôr em causa a subsistência do Governo), como é norma num sistema de governo de natureza parlamentar. No caso do "orçamento limiano" o deputado em causa foi suspenso pelo CDS.
Por conseguinte, embora livre de qualquer mandato vinculado em relação aos eleitores (como é próprio de uma democracia representativa), o mandato dos deputados é essencialmente (embora não absolutamente) vinculado às orientações partidárias. De resto, ao contrário do que sucede no Brasil, em Portugal os cidadãos votam primariamente em partidos, não nos candidatos individualmente considerados.
domingo, 28 de abril de 2019
Puerta del Sol (5): Não vai ser fácil
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Vital Moreira
1. Marcadas pela folgada vitória eleitoral dos socialistas espanhóis e pelo desastre eleitoral do PP - como se vê neste quadro tirado do El Pais -, estas eleições parlamentares espanholas revelam também um país mais profundamente dividido, como se mostra pela surpreendente irrupção dos nacionalistas do Vox e pela vitória, pela primeira vez, das forças independentistas da Catalunha numas eleições nacionais, mercê do excelentes resultados da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), que ganhou claramente o prélio catalão.
Apesar da destacada liderança eleitoral do PSOE e da derrota da direita dividida, a cena política espanhola tornou-se mais fragmentada e mais extremada.
2. Para complicar tudo, não se afigura nada fácil para o PSOE a negociação da solução governativa.
Longe da maioria absoluta, com os seus 29% e 123 deputados em 350, e afastada uma coligação com o Ciudadanos, por causa da recusa deste em aliar-se aos socialistas, resta a Sánchez uma coligação de esquerda com o Unidas Podemos (que entra no Governo, apesar do seu revés eleitoral), o que todavia não chega para uma maioria parlamentar, necessitando por isso do apoio de outros partidos. Ora, se tiver de depender dos independentistas catalães (como sucedeu no Governo cessante), o reforço eleitoral destes vai tornar mais exigente o seu apoio.
Fácil é antecipar que pode não haver novo Governo tão depressa na Moncloa
Apesar da destacada liderança eleitoral do PSOE e da derrota da direita dividida, a cena política espanhola tornou-se mais fragmentada e mais extremada.
2. Para complicar tudo, não se afigura nada fácil para o PSOE a negociação da solução governativa.
Longe da maioria absoluta, com os seus 29% e 123 deputados em 350, e afastada uma coligação com o Ciudadanos, por causa da recusa deste em aliar-se aos socialistas, resta a Sánchez uma coligação de esquerda com o Unidas Podemos (que entra no Governo, apesar do seu revés eleitoral), o que todavia não chega para uma maioria parlamentar, necessitando por isso do apoio de outros partidos. Ora, se tiver de depender dos independentistas catalães (como sucedeu no Governo cessante), o reforço eleitoral destes vai tornar mais exigente o seu apoio.
Fácil é antecipar que pode não haver novo Governo tão depressa na Moncloa
Memórias acidentais (6): A crise académica de 1969
Publicado por
Vital Moreira
1. A foto à esquerda, já aqui evocada anteriormente, testemunha o apoio de um grupo de docentes da Faculdade de Direito, entre os quais me conto (primeiro a contar da esquerda), à luta académica de Coimbra em 1969, há meio século.
Se volto a publicá-la é porque ela e outra semelhante foram incluídas no livro de José Veloso, A Crise Académica de 1969: Uma reportagem fotográfica, que acaba de de sair (publicadas na p. 46), mas onde aparecem mal referenciadas quanto à data e à circunstância, sendo erradamente referidas a 17 de abril, dia do desencadeamento da crise, quando elas foram efetivamente tiradas cinco dias depois, quando o grupo se dirigia Assembleia Magna de 22 de abril, no ginásio da AAC, que decretou o luto académico e a greve às aulas (e onde intervieram os Professores Paulo Quintela e Orlando de Carvalho).Na verdade, apesar de tiradas ao fundo das escadas monumentais, as referidas fotos retratam a nossa curta deslocação desde a Clepsidra, situada pouco atrás (que tinha sido inaugurada pouco tempo antes, em março), até à entrada superior das instalações da AAC, por onde se acedia ao amplo ginásio.
2. Não foi esse, aliás, o primeiro passo do nosso envolvimento direto na luta académica. Logo no dia 18 de abril, havíamos aprovado uma moção coletiva de apoio à luta estudantil numa reunião de assistentes da Faculdade de Direito, tendo-me cabido anunciá-la publicamente, desde o topo das escadas centrais de acesso à Via Latina, aos muitos estudantes nessa manhã reunidos no pátio dos Gerais (em reação à prisão do Presidente da AAC nessa madrugada), no que foi a minha primeira intervenção pública na luta contra a ditadura.
Esses e outros episódios haveriam de fundamentar a minha exoneração sumária em setembro (junto com J. M. Correia Pinto) pelo Ministro da Educação, Hermano Saraiva, na ressaca da crise académica. (Voltaria a ser recontratado meio ano depois pelo novo Ministro, Veiga Simão, que viria a substituir, em janeiro de 1970, o exonerado ministro salazarista, que acabou vítima da sua intransigência "ultra" na repressão da luta de Coimbra.)
Conferências & colóquios (2): Cidadania europeia
Publicado por
Vital Moreira
No próximo dia 16 de maio, na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, vou intervir neste colóquio sobre o que significa ser cidadão da UE (e, correspondentemente, o que singnifica deixar de o ser ...), um debate assaz oportuno, tendo em conta o Brexit e os movimentos nacionalistas em vários outros Estados-membros da União, que contestam a dimensão política da integração europeia, cujo fundamento é justamente a cidadania da União.
sábado, 27 de abril de 2019
Campos Elísios (3): As reformas democráticas de Macron
Publicado por
Vital Moreira
1. Na sua conferência de imprensa de anteontem, o Presidente Macron deu a conhecer as suas propostas de reforma política em várias áreas, incluindo das instituições democráticas francesas, sendo de salientar os seguintes pontos:
- redução do número de deputados em 20-30% (a Assembleia Nacional tem 577 deputados, a que há a acrescentar os 348 membros do Senado);
- introdução de uma quota de proporcionalidade na eleição dos deputados (cerca de 20%), instituindo, portanto um sistema eleitoral misto;
- proibição da acumulação do mandato parlamentar com outros cargos públicos;
- introdução da iniciativa popular de legislação e de referendo junto do parlamento, mediante petição de um milhão de cidadãos;
- criação de um "conselho de participação cívica", junto do Conselho Económico e Social, composto por 150 cidadãos tirados à sorte, com poder de debate e de recomendação de medidas (a assumir depois em projeto de lei ou de referendo).
Em contrapartida, o Presidente rejeitou algumas reivindicações emblemáticas da agenda política do "coletes amarelos", nomeadamente as seguintes:
- o referendo de iniciativa popular vinculativa (dispensando resolução parlamentar);
- a revogação de mandatos políticos por votação popular (recall);
- o reconhecimento da relevância do voto em branco;
- o voto obrigatório.
2. Vistas de Portugal, nenhuma das propostas defendidas por Macron é especialmente inovadora, salvo a do "conselho de participação cívica" (ver o meu post anterior sobre este tema), E quanto às propostas rejeitadas, elas também não existem em Portugal (nem estão na agenda política).
Todavia, no caso da França as propostas constituem uma significativa reforma da democracia representativa - que vai implicar uma revisão cosntitucional -, tanto pela instituição do sistema eleitoral misto como pelas medidas de democracia participativa introduzidas.
A França entra assim no movimento geral de resposta aos desafios colocados hoje em dia à democracia representativa. Mas, rejeitando o referendo de iniciativa popular vinculativa e o reconhecimento do voto em branco, Macron resiste, e bem, às sereias populistas que ameaçam a democracia representativa. Uma coisa é reformar a democracia representativa para a reforçar, outra coisa é claudicar perante a vaga populista contra ela.
- redução do número de deputados em 20-30% (a Assembleia Nacional tem 577 deputados, a que há a acrescentar os 348 membros do Senado);
- introdução de uma quota de proporcionalidade na eleição dos deputados (cerca de 20%), instituindo, portanto um sistema eleitoral misto;
- proibição da acumulação do mandato parlamentar com outros cargos públicos;
- introdução da iniciativa popular de legislação e de referendo junto do parlamento, mediante petição de um milhão de cidadãos;
- criação de um "conselho de participação cívica", junto do Conselho Económico e Social, composto por 150 cidadãos tirados à sorte, com poder de debate e de recomendação de medidas (a assumir depois em projeto de lei ou de referendo).
Em contrapartida, o Presidente rejeitou algumas reivindicações emblemáticas da agenda política do "coletes amarelos", nomeadamente as seguintes:
- o referendo de iniciativa popular vinculativa (dispensando resolução parlamentar);
- a revogação de mandatos políticos por votação popular (recall);
- o reconhecimento da relevância do voto em branco;
- o voto obrigatório.
2. Vistas de Portugal, nenhuma das propostas defendidas por Macron é especialmente inovadora, salvo a do "conselho de participação cívica" (ver o meu post anterior sobre este tema), E quanto às propostas rejeitadas, elas também não existem em Portugal (nem estão na agenda política).
Todavia, no caso da França as propostas constituem uma significativa reforma da democracia representativa - que vai implicar uma revisão cosntitucional -, tanto pela instituição do sistema eleitoral misto como pelas medidas de democracia participativa introduzidas.
A França entra assim no movimento geral de resposta aos desafios colocados hoje em dia à democracia representativa. Mas, rejeitando o referendo de iniciativa popular vinculativa e o reconhecimento do voto em branco, Macron resiste, e bem, às sereias populistas que ameaçam a democracia representativa. Uma coisa é reformar a democracia representativa para a reforçar, outra coisa é claudicar perante a vaga populista contra ela.
sexta-feira, 26 de abril de 2019
"Dinheiro Vivo" (12): Um acordo de conveniência?
Publicado por
Vital Moreira
Eis o cabeçalho da minha habitual coluna de sábado passado no "Dinheiro Vivo" - o suplemento de economia do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias -, que versa sobre a abertura de negociações para um acordo comercial entre a União Europeia e os Estados Unidos, que em muitos aspetos foge à norma dos acordos comerciais da União, desde logo quanto ao facto de Bruxelas se dispor a negociar com Washington na pendência de tarifas aduaneiras abusivamente impostas por Trump contra a UE e contra outros países, a pretexto de razões de "segurança nacional"!
Euro-eleiçoes 2019 (12): Os portugueses e a UE
Publicado por
Vital Moreira
1. É francamente animadora a atitude dos portugueses perante a União, tal como decorre dos resultados da sondagem da agência Pitagórica, hoje trazida a público pela TSF e pelo JN (de onde foi tirada a gravura junta).
Assim:
- quase 90% são favoráveis à permanência de Portugal na União, com apenas 7% a favor da saída (que corresponde essencialmente ao eleitorado do PCP na mesma sondagem);
- quase 80% são favoráveis à manutenção de Portugal no euro, com apenas 17% contra (o que corresponde ao eleitorado do PCP e do BE).
Tendo Portugal sido poupado até agora à afirmação de movimentos nacionalistas, a oposição à UE e ao euro continua confinada maioritariamente à esquerda do PS (aliás com maior expressão do que na generalidade dos países da União).
2. É também muito expressivo o apoio às posições mais integracionistas em relação à generalidade dos temas da agenda europeia, nomeadamente os seguintes:
- 90% a favor da diminuição da dívida pública;
- 80% a favor do cumprimento das metas do défice;
- 72% a favor da harmonização fiscal;
- 65% a favor de maior investimento em defesa;
- 64% a favor de um exército europeu.
Se estas posições fossem compartilhadas pelos demais cidadãos europeus, as próximas eleiçõs europeias dariam uma confortável maioria aos partidos mais europeístas e a vida da União estaria bem mais facilitada do que está.
Assim:
- quase 90% são favoráveis à permanência de Portugal na União, com apenas 7% a favor da saída (que corresponde essencialmente ao eleitorado do PCP na mesma sondagem);
- quase 80% são favoráveis à manutenção de Portugal no euro, com apenas 17% contra (o que corresponde ao eleitorado do PCP e do BE).
Tendo Portugal sido poupado até agora à afirmação de movimentos nacionalistas, a oposição à UE e ao euro continua confinada maioritariamente à esquerda do PS (aliás com maior expressão do que na generalidade dos países da União).
2. É também muito expressivo o apoio às posições mais integracionistas em relação à generalidade dos temas da agenda europeia, nomeadamente os seguintes:
- 90% a favor da diminuição da dívida pública;
- 80% a favor do cumprimento das metas do défice;
- 72% a favor da harmonização fiscal;
- 65% a favor de maior investimento em defesa;
- 64% a favor de um exército europeu.
Se estas posições fossem compartilhadas pelos demais cidadãos europeus, as próximas eleiçõs europeias dariam uma confortável maioria aos partidos mais europeístas e a vida da União estaria bem mais facilitada do que está.
Vontade popular (2): Uma inovação democrática
Publicado por
Vital Moreira
1. São conhecidas várias experiências de envolvimento de "assembleias de cidadãos" convocadas ad hoc para o debate de certas questões políticas, como recentemente na Irlanda, no debate sobre a despenalização do aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
A comunidade belga de língua alemã (no Leste da Bélgica, junto à fronteira alemã) - que é dotada de autogoverno no âmbito do federalismo belga -, acaba de dar um passo em frente nesta experiência de democracia participativa, instituindo por lei uma estrutura permanente, constituída por um Conselho de Cidadãos, de 24 membros, o qual, por sua vez, convoca assembleias de cidadãos temáticas, de 50 membros. Num e noutro caso, os membros são escolhidos por sorteio, de acordo com determinadas regras de representação (território, género, grupo etário, minorias, etc.).
As recomendações das assembleias são obrigatoriamente consideradas pelo parlamento da Comunidade.
2. Quando, por toda a parte, o populismo explora a alienação política dos cidadãos e a suas desconfiança em relação às elites políticas, este experiência de institucionalização de formas não eletivas de democracia, envolvendo cidadãos comuns, selecionados por sorteio, na governação da coletividade podem ser uma parte da reposta, contornando também o risco da "seletividade ativista" da intervenção das formas inorgânicas de democracia participativa (consultas populares, petições, iniciativa legislativa popular, etc.).
Tal como a experiência do orçamento participativo, também esta nova experiência começa a institucionalizar-se a nível local, como convém.
Adenda
Entre as medidas de reforma democrática agora lançadas pelo Presidente Macron em França conta-se justamente a criação de um conselho nacional de partipação cívica, composto por 150 cidadãos tirados à sorte, para funcionar junto do Conselho Económico e Social, com a missão de debater e fazer recomendações sobre as principais questões sociais, começando pela questão ambiental.
A comunidade belga de língua alemã (no Leste da Bélgica, junto à fronteira alemã) - que é dotada de autogoverno no âmbito do federalismo belga -, acaba de dar um passo em frente nesta experiência de democracia participativa, instituindo por lei uma estrutura permanente, constituída por um Conselho de Cidadãos, de 24 membros, o qual, por sua vez, convoca assembleias de cidadãos temáticas, de 50 membros. Num e noutro caso, os membros são escolhidos por sorteio, de acordo com determinadas regras de representação (território, género, grupo etário, minorias, etc.).
As recomendações das assembleias são obrigatoriamente consideradas pelo parlamento da Comunidade.
2. Quando, por toda a parte, o populismo explora a alienação política dos cidadãos e a suas desconfiança em relação às elites políticas, este experiência de institucionalização de formas não eletivas de democracia, envolvendo cidadãos comuns, selecionados por sorteio, na governação da coletividade podem ser uma parte da reposta, contornando também o risco da "seletividade ativista" da intervenção das formas inorgânicas de democracia participativa (consultas populares, petições, iniciativa legislativa popular, etc.).
Tal como a experiência do orçamento participativo, também esta nova experiência começa a institucionalizar-se a nível local, como convém.
Adenda
Entre as medidas de reforma democrática agora lançadas pelo Presidente Macron em França conta-se justamente a criação de um conselho nacional de partipação cívica, composto por 150 cidadãos tirados à sorte, para funcionar junto do Conselho Económico e Social, com a missão de debater e fazer recomendações sobre as principais questões sociais, começando pela questão ambiental.
quinta-feira, 25 de abril de 2019
Comemorando o 25 de abril, hoje como sempre
Publicado por
Vital Moreira
Mexendo em velhas fotografias, encontrei esta de um desfile comemorativo do 25 de abril, descendo a Avenida da Liberdade em Lisboa, em 1981.
Das pessoas que identifico na primeira fila, conto, da esquerda para direita, Pezarat Correia, Maria de Lurdes Pintasilgo, Sá Borges, Alda Nogueira, Henrique de Barros, Jose Magalhães Godinho e Vasco Lourenço.
Das pessoas que identifico na primeira fila, conto, da esquerda para direita, Pezarat Correia, Maria de Lurdes Pintasilgo, Sá Borges, Alda Nogueira, Henrique de Barros, Jose Magalhães Godinho e Vasco Lourenço.
quarta-feira, 24 de abril de 2019
Bloquices (8): "Ir à lã..."
Publicado por
Vital Moreira
1. Num golpe a que já nos habituou, o Bloco tinha-se precipitado a anunciar publicamente, em conferência de imprensa e tudo, um alegado acordo com o PS, no âmbito da lei-quadro do SNS, para a abolição da possibilidade de concessão privada da gestão de hospitais públicos (em regime de PPP), tendo o PS imediatamente desmentido qualquer acordo firme nessa questão.
Além de não confirmada, a alegada cedência do PS era acima de tudo insensata, como aqui se mostrou (e como o PR também assinalou publicamente).
Tudo se esclarece agora, quando o grupo parlamentar do PS apresentou as suas propostas de alteração à proposta de lei governamental, em que se mantém a possibilidade de recorrer a PPP em relação a estabelecimentos do SNS a título subsidiário, acrescentando somente um requisito de fundamentação caso a caso.
Resultado da operação: Sensatez política - 1, radicalismo político - 0. O Bloco foi à lã e ficou tosquiado.
2. Resta saber agora se, por causa dessa frustrada tentativa de forçar a mão do PS, o BE retira o seu apoio à lei, pondo em perigo a aprovação desta, apesar do óbvio progresso que ela trás em relação à lei-quadro existente, incluindo quanto à afirmação da natureza essencialmente pública do SNS, revogando a norma que obriga o Estado a apoiar o setor privado em concorrência com o setor público, como se aquele também integrasse o serviço público de saúde.
Sabendo-se o que a casa gasta, bem capazes disso são eles...
Adenda
O Governo nunca desmentiu a existência de um "documento de trabalho", a admitir a abolição das PPP (que agora veio a público); o que desmentiu imediatamente foi que tivesse sido firmado um acordo com o BE nessa base, derrogando a sua própria proposta de lei nesse ponto crucial. Mas é evidente agora que tal "documento de trabalho" nunca devia ter existido e que o PS devia ter-se mantido fiel à proposta de lei do Governo. A tentação de cedência à agenda bloquista só pode dar maus resultados...
Além de não confirmada, a alegada cedência do PS era acima de tudo insensata, como aqui se mostrou (e como o PR também assinalou publicamente).
Tudo se esclarece agora, quando o grupo parlamentar do PS apresentou as suas propostas de alteração à proposta de lei governamental, em que se mantém a possibilidade de recorrer a PPP em relação a estabelecimentos do SNS a título subsidiário, acrescentando somente um requisito de fundamentação caso a caso.
Resultado da operação: Sensatez política - 1, radicalismo político - 0. O Bloco foi à lã e ficou tosquiado.
2. Resta saber agora se, por causa dessa frustrada tentativa de forçar a mão do PS, o BE retira o seu apoio à lei, pondo em perigo a aprovação desta, apesar do óbvio progresso que ela trás em relação à lei-quadro existente, incluindo quanto à afirmação da natureza essencialmente pública do SNS, revogando a norma que obriga o Estado a apoiar o setor privado em concorrência com o setor público, como se aquele também integrasse o serviço público de saúde.
Sabendo-se o que a casa gasta, bem capazes disso são eles...
Adenda
O Governo nunca desmentiu a existência de um "documento de trabalho", a admitir a abolição das PPP (que agora veio a público); o que desmentiu imediatamente foi que tivesse sido firmado um acordo com o BE nessa base, derrogando a sua própria proposta de lei nesse ponto crucial. Mas é evidente agora que tal "documento de trabalho" nunca devia ter existido e que o PS devia ter-se mantido fiel à proposta de lei do Governo. A tentação de cedência à agenda bloquista só pode dar maus resultados...
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