terça-feira, 13 de janeiro de 2004

Carta de um (autoqualificado) fascista

1. «De cara ao sol e braço ao alto»
Não resisto a publicar, por inteiro (omitindo só o nome do autor), o seguinte e-mail que há pouco recebi:

«Exmo Sr. Dr.,
Li no blogue onde escrevinha, a sua resposta à carta do Tenente-Coronel piloto-aviador Brandão Ferreira [ver aqui o meu post] e juro-lhe que não queria acreditar no que estava a ler!!!
De facto como diz um grande amigo meu "quem sabe nunca esquece". Então o senhor pelo facto de não concordar com a prosa do Sr. Tenente-Coronel, ATREVE-SE a qualificar o texto do mesmo de "despautério", "discurso revoltante", "inacreditável", e mais grave do que toda esta adjectivação, é o facto do senhor perguntar-se como é que este texto "PODE ser escrito e publicado".
Eu digo-lhe porque é que este texto pode ser escrito e publicado, é porque graças a bons portugueses, entre os quais evidentemente não se incluem nem o senhor nem os seus companheiros de blogue, as vossas doutrinas marxistóides não triunfaram neste rectângulo à beira mar plantado.
O facto do senhor e outros como você terem abandonado o PCP pode enganar os incautos ou os distraídos, mas a pessoas como eu não engana o Sr. Dr.
Vossa Exe. continua a ser o que sempre foi, um marxistóide revoltado, autoritário e arrogante que como todo o lixo oriundo dessas paragens não admite que o contrariem. Nos bons velhos tempos talvez metendo uma "cunha" ao camarada Cunhal ainda conseguisse que o Tenente-coronel Brandão Ferreira fosse passar uma temporada nalguma "estância de férias" siberiana, como infelizmente para si os tempos mudaram agora até já é obrigado a ler artigos de "fascistas" em jornais de referência, é de facto inacreditável, ai, que saudades do Zé dos bigodes!!!!
Pois meu caro Doutor vá-se habituando, e desde já lhe digo, que por muitos "saltos de indignação-e de revolta" que o senhor e o seu amigo Joãozinho dêem, vão ter mesmo que levar connosco, os fascistas.
Apesar da constituição nojenta e vergonhosa que temos, e que proíbe os fascistas de serem cidadãos, a nós ninguém nos cala, desde 1945 que tentam e nós ainda cá andamos, altivos e orgulhosos, de cara ao sol e braço ao alto!!!
Passar mal [sic],»
[RP]

2. A liberdade dos fascistas em regime democrático
Além do mais, que é obvio, há duas outras coisas que me distinguem do autor desta carta: 1ª - eu não ataco nem insulto pessoas, critico e refuto ideias ou argumentos; 2º - eu não condenei o facto de o texto citado ter sido publicado, mas sim o facto de isso ter sucedido num jornal como o "Público", que a meu ver não surgiu propriamente para dar guarida a ideias fascistas ou afins.
A CRP proíbe organizações fascistas mas não proíbe ideias fascistas nem a sua expressão pública. Esteja portanto descansado o autor da missiva e os seus correlegionários. No regime democrático não existe censura para proibir os seus escritos, nem Pide para os prender pelas ideias, nem tribunais plenários para os condenarem por isso à prisão e à interdição profissional. E tudo isto está garantido na tal odienta Constituição que deputados constituintes como eu aprovámos em 1976.
Sinta-se portanto o autor da carta livre para ser e se comportar verbalmente como fascista, como nesta sua carta, desde que não passe aos actos... Isso de termos de "levar" com eles já fia mais fino. Alto aí! O regime democrático pode ser condescendente, mas não pode ser tolo!

Vital Moreira