quarta-feira, 27 de junho de 2018

Gostaria de ter escrito isto (22): "Haja esperança na saúde"

«Está tudo mais embrulhado [no SNS]. Se queremos construir os novos hospitais de Lisboa, Seixal, Évora e Algarve, só lá iremos com PPP, ao menos para o investimento; se anulamos as taxas moderadoras veremos os serviços submersos por procura desnecessária ou pelo menos adiável; se proibirmos os hospitais de recorrer a pessoal e a meios de diagnóstico privados deterioramos a sua resolutividade, alongando listas de espera e erguendo múltiplos calvários para quem não os merecia; se não criarmos uma forma de pagar ao pessoal por desempenho não alcançaremos a desejada exclusividade, nivelaremos por baixo e promoveremos a saída dos melhores para o privado; se não responsabilizarmos as gestões premiando as boas e expulsando as más, gastaremos muito mais que o necessário. Estas são medidas de fundo, difíceis mas necessárias.»
(A. Correia de Campos, no Público de hoje)

terça-feira, 26 de junho de 2018

+ Europa (10): Um nova família política europeia?

1. O acordo, agora anunciado, entre o partido no poder em França (En Marche, do Presidente Macron) e o partido espanhol, Ciudadanos (na oposição, mas bem colocado nas sondagens eleitorais), no sentido de estabelecerem uma frente comum para concorrer às próximas eleições europeias, no ano que vem, traduz-se na criação de uma nova família política europeia e previsivelmente na formação de uma nova bancada parlamentar no Parlamento Europeu.
Com esta decisão, os dois partidos afastam-se dos Liberais europeus do ALDE (onde atualmente se integram, porém, os dois eurodeputados do Ciudadanos) e defendem a criação de uma nova força "liberal e progressista", para combater os partidos populistas e nacionalistas.

2. Resta saber em que outros países vão encontrar parceiros, sendo certo que a formação de um grupo parlamentar no PE exige pelo menos 25 deputados de sete países. Foi noticiado o encontro do En Marche com o Partido democrático italiano (social-democrata), mas não se conhece a eventual disposição do segundo para aderir ao novo movimento político, o que não deixaria de ser uma surpresa e mais uma perda importante para a debilitada esquerda social-democrata europeia.
Em todo o caso, este novo desenvolvimento político testemunha a grande mudança na paisagem partidária europeia nos últimos anos, com a perda de protagonismo das duas famílias políticas tradicionais europeias, a democracia cristã e a social-democracia, em alguns casos com perdas dramáticas, como em França.

segunda-feira, 25 de junho de 2018

III Congresso Portugal Brasil de Direitos Humanos (II)

Eis o edital de call for papers para o III Congresso Internacional de Direitos Humanos de Coimbra, já anteriormente referido aqui no Causa Nossa.
Mais informações AQUI.

sexta-feira, 22 de junho de 2018

O poder do eucalipto

Eis a abertura do meu mais recente artigo no Dinheiro Vivo, sobre o casamento entre o poder político e o lóbi da fileira agro-industrial do eucalipto.
O que defendo é que, se temos de conviver com a invasão do eucaliptal, então que a indústria celulose e as florestas que a alimentam assumam os custos das "externalidades negativas" que elas geram, a começar pela proteção civil, ao abrigo do principio beneficiário-pagador, em vez de recaírem sobre a generalidade dos contribuintes. Daí a minha proposta de criação uma contribuição de proteção civil na esfera da produção florestal.

segunda-feira, 18 de junho de 2018

III Congresso Portugal-Brasil de Direitos Humanos

1. Aqui está o anúncio do III Congresso Internacional de Direitos Humanos de Coimbra (anteriormente designado como Congresso Internacional de Direito Público), mais uma vez organizado e acolhido pelo Ius Gentium Conimbrigae / Centro de Direitos Humanos (Universidade de Coimbra), em parceria com duas instituições universitárias brasileiras. Sou um dos coordenadores do evento, na minha qualidade de presidente do IGC/CDH.
Mais informações AQUI.

2. Sucede que esta 3ª edição ocorre quando Portugal celebra os 40 anos da sua vinculação internacional aos direitos humanos, em 1978 (depois da sua vinculação doméstica dos direitos fundamentais, com a CRP de 1976), incluindo a publicação oficial da Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948, e a ratificação dos dois Pactos de Direitos Humanos das Nações Unidas, de 1966, e da Convenção Europeia de Direitos Humanos, de 1950.
O programa oficial das comemorações, de que sou comissário, vai ser anunciado no próximo dia 2 de julho, em Lisboa.

domingo, 17 de junho de 2018

Praça da República (4): Contribuições parafiscais municipais?

1. Discordo desta proposta legislativa de admitir a criação de contribuições parafiscais pelos municípios, além do poder que já têm de criar taxas pelos serviços que prestam.
Parece evidente que essa alteração visa "legalizar" a impropriamente chamada "taxa de proteção civil" criada por alguns municípios (Lisboa, Setúbal, etc.), que o Tribunal Constitucional declarou desconformes com a Constituição, por não se tratar de uma taxa e por os municípios não terem poder para criar impostos nem contribuições parafiscais, como era o caso (analisado AQUI).
No entanto, por mais justificada que seja tal contribuição (ou outras), a solução proposta, atribuindo aos municípios um poder tributário "em branco", não é apropriada.

2. É certo que a Constituição permite a atribuição, por via de lei, de "poderes tributários" às autarquias locais, sem limitação quanto à sua espécie. Mas este preceito constitucional tem de ser conjugado com outros, nomeadamente o que reserva a criação de impostos para lei parlamentar (ou decreto-lei parlamentarmente autorizado) e o que faz a mesma reserva legislativa parlamentar para o "regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas". A lógica constitucional é de que, em matéria de tributos, cabe à lei criá-los (impostos) ou, pelo menos, definir o seu regime jurídico geral (taxas e contribuições parafiscais).
Por conseguinte, só pode haver contribuições parafiscais municipais, se criadas por lei em seu favor (como sucede com os impostos municipais) ou se criadas pelos municípios nos termos do tal "regime geral" previamente estabelecido por lei, que, porém, não existe. Não pode haver  atribuição dessa competência aos municípios sem essa intermediação legislativa, como pretende precipitadamente a referida proposta de alteração da Lei das Finanças Locais.

sexta-feira, 15 de junho de 2018

Fictícia democracia associativa

Eis o meu artigo no Dinheiro Vivo do fim-de-semana passado, sobre a mudança do sistema de governo das grandes associações mutualistas, através da instituição de uma assembleia representativa permanente, em substituição do tradicional modelo de fictícia democracia direta, através de assembleias gerais, em que um pequeno número de associados de Lisboa decidem os destinos de instituições nacionais com dezenas ou centenas de milhares de membros, como é o caso do Montepio.

Sanções administrativas

Em todas as áreas de intervenção da Administração - trânsito, ambiente, impostos, relações de trabalho, concorrência e regulação económica, etc. -, ela goza de poderes sancionatórios para punir as infrações à lei, quer através de sanções pecuniárias (coimas e "sanções pecuniárias compulsórias"), quer através de sanções acessórias.
Tal é o objeto deste importante colóquio, promovido pelo CEDIPRE, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.

quinta-feira, 14 de junho de 2018

Perder o comboio

1. A distância direta entre Lisboa e Madrid é aproximadamente a mesma que entre Madrid e Barcelona, um pouco mais de 500 quilómetros. Todavia, como se vê no mapa junto, a viagem de comboio entre a capital portuguesa e a capital espanhola demora mais de três vezes a duração da viagem entre Madrid e Barcelona, 10:10 contra 2:45!
A nova ligação ferroviária Lisboa-Madrid pelo corredor sul, via Évora e Elvas, em bitola ibérica, vai naturalmente encurtar a distância e o tempo de viagem, mas sem ganhos suficientes para tornarem a opção ferroviária competitiva para passageiros, como sucedeu na ligação Madrid-Barcelona.

2. Ao abandonar o projeto do TGV - vítima da crise de 2008, sem reversão à vista -, Portugal perdeu o comboio do moderno transporte ferroviário, continuando no século XIX, em matéria de velocidade e de comodidade ferroviária. Ganham os automóveis e os aviões, e ganham a as emissões de CO2.
Decididamente, Portugal decidiu ficar para trás...

terça-feira, 12 de junho de 2018

Portugal insólito

O que é que justifica a manutenção em funcionamento, com os elevados custos que isso implica - material circulante, pessoal, combustível, sinalização, etc. -  de uma linha férrea decrépita, onde o comboio marcha (?) a 10km/hora, quase sem utentes nem nenhuma função de serviço público, como é o caso do troço que resta da linha do Vouga, entre Sernada e Espinho, tal como a descreve o jornal Público?
Como forma de desperdício de recursos públicos, não está mal. Pelos vistos, a CP abunda em dinheiro! Seguramente, uma solução de minibus (preferivelmente elétrico) serviria em muito melhores condições e com custos muito inferiores os ocasionais utentes da linha.
Por muito menos foram encerradas muitas outros linhas, por esse país fora. Será por esta linha ficar situada no litoral e não no interior, onde já teria sido obviamente fechada?...

Portucaliptal (29): "Os arquitetos da eucaliptização"

Promete dar que falar - se os novos "donos dito tudo" não impuserem o silêncio mediático -, este livro de João Camargo e Pulo Pimenta de Castro, Portugal em Chamas: Como Resgatar as Florestas - de que o Público prepublicou uma amostra -, sobre os "arquitetos" do projeto político-económico que nas últimas três décadas levou a transformar o país num imenso eucaliptal - e por vezes num braseiro assassino, como no ano passado -, incluindo a "porta giratória" entre o poder político, a academia e os interesses empresariais da celulose.
É tempo de pôr fim a uma escandalosa situação em que a hiperlucrativa fileira agro-industrial da celulose não somente não paga as enormes "externalidades negativas" que descarrega sobre a coletividade - em custos ambientais, incêndios, proteção covil, etc. - como ainda recebe nutridas ajudas financeiras do Estado, de todos os governos.

segunda-feira, 11 de junho de 2018

Gostaria de ter escrito isto (22): "República de funcionários"

«(...) Manter uma república pletórica de funcionários, sempre insuficientes à luz das necessidades definidas por uma insaciável lógica burocrática – e muitos deles mal pagos, é certo –, tem custos exorbitantes que nenhum Orçamento poderá pagar se quisermos ter recursos para investir em tudo aquilo que se exige, justamente, do Estado. Faz cada vez mais falta um discurso pedagógico que mobilize a nossa consciência colectiva e nos liberte das fixações corporativas em que, para além das justas expectativas do funcionalismo, nos deixamos enredar.»
(Vicente Jorge Silva, "A insustentável república de funcionários", no Público de ontem)

Fundações não são empresas

1. A nova Presidente do Centro Português das Fundações tem razão, nesta entrevista ao Diário de Notícias, quando critica implicitamente a Lei-quadro das fundações de 2012, por colocar no mesmo pé, sob o ponto de vista legal, as fundações privadas, instituídas por afetação de um património pelos fundadores, e as fundações públicas, que no seu entender (e no meu), não são verdadeiras fundações, por não terem por substrato, na maior parte dos casos, nenhum património de cujo rendimento possam viver, pelo que não passam, em geral, de uma modalidade de institutos públicos.
De resto, acrescento eu, ao abolir injustificadamente as fundações públicas de direito privado, a referida Lei não se limitou a reduzir as fundações públicas a uma modalidade de institutos públicos; também enjeitou a principal vantagem da figura das fundações no âmbito da Administração pública. Se há empresas públicas e associações públicas de direito privado, não se compreende porque é que a lei haveria de excluir as fundações públicas de direito privado, existentes desde há muito. Mistérios insondáveis do legislador...

2. Já não tem razão a presidente do CPF, porém, quando defende o reconhecimento automático das fundações, sem intervenção administrativa prévia, à imagem de que sucede com as empresas (e, já agora, as associações).
Não é, manifestamente, a mesma coisa. Primeiro, enquanto a liberdade de iniciativa e de investimento privado está constitucionalmente reconhecida como direito fundamental (tal como sucede com a liberdade de associação), o mesmo não sucede com as fundações, que são instituídas nos termos da lei. Segundo, a instituição de fundações depende legalmente de requisitos específicos (nomeadamente, o património e os fins da fundação), cuja verificação importa verificar previamente, a fim de garantir a segurança jurídica, que seria abalada se o preenchimento desses requisitos só viesse a ser verificado posteriormente, em processo de anulação do ato fundacional. Por último, tratando-se no essencial de um controlo de legalidade, o reconhecimento governamental não põe em causa a vontade do instituidor, se conforme à lei.
Por conseguinte nada justifica, pelo contrário, a dispensa do reconhecimento individual das fundações, como aliás sucede nos países que nos são mais próximos quanto à cultura jurídica e fundacional.

domingo, 10 de junho de 2018

Antologia do oportunismo político

Em entrevista ao DN, o dirigente do PSD, Castro Almeida, veio dizer que «Cumprir a promessa aos professores [quanto às progressões] vale mais do que umas décimas do PIB».
Ora, para além de não ter havido nenhuma promessa governamental de recuperar inteiramente o tempo de congelamento das progressões dos professores, ou de quaisquer outros funcionários públicos, a referida declaração revela uma inadmissível leviandade política em matéria de consolidação orçamental por parte do dirigente de um partido de vocação governativa que teve a seu cargo a parte mais dura do saneamento das contas públicas (incluindo o congelamento das progressões na função pública), mas que agora, estando na oposição e à vista de eleições, por razões de puro oportunismo político, passa a alinhar com a extrema-esquerda na defesa de insustentáveis privilégios profissionais e na irresponsável desvalorização da disciplina orçamental que tantos sacrifícios custou ao País.
Lamentável!

Quatro décadas da Constituição de 1976

No próximo dia 21 vou apresentar o livro coordenado por Marina Costa Lobo, nome cimeiro da ciência política entre nós, sobre a evolução CRP ao longo das suas primeiras quatro décadas, numa perspetiva comparada com a evolução de sistemas políticos próximos de nós.

sábado, 9 de junho de 2018

"Livres e Iguais": Comemorações dos 70 anos da DUDH e dos 40 anos da adesão de Portugal à CEDH (1)

Eis o primeiro ato público depois da minha nomeação como comissário destas comemorações, como referi AQUI. Só podia ser na sede por excelência da representação política nacional.

sexta-feira, 8 de junho de 2018

Privilégios ilhéus


Eis o cabeçalho da minha coluna de opinião da semana passada no Dinheiro Vivo - o suplemento económico do DN e do JN -, sobre o bodo dos contribuintes do Continente à Madeira. Como é fácil governar com dinheiro dos outros!

Adenda
O Jornal da Madeira noticiou que eu critiquei a Madeira por beneficiar das ajudas do orçamento da República, mas não tem razão. Quem eu critiquei foram os governos de Lisboa que não hesitam em instrumentalizar o orçamento nacional para obterem ganhos políticos na Madeira. Os governos regionais limitam-se a explorar em seu benefício a prodigalidade oportunista de Lisboa, à custa dos contribuintes do Continente. Seja como for, ninguém ousou contestar os dados em que assentou a minha análise critica.

domingo, 3 de junho de 2018

O "Código de Seabra"

1. No próximo dia 6, quarta-feira, vou apresentar na Biblioteca da Assembleia da República a biografia do Visconde de Seabra (António Luís de Seabra, 1798 - 1895), um dos mais notáveis homens públicos do século XIX e do constitucionalismo liberal, da autoria de Manuel Maria Cardoso Leal. Magistrado judicial (tendo chegado a juiz-conselheiro do STJ), deputado em muitas legislaturas e par do reino, duas vezes ministro, reitor da Universidade de Coimbra, Seabra ficou porém a dever a sua fama histórica à elaboração do nosso primeiro Código Civil, de 1867, que esteve em vigor quase um século (até ser substituído pelo Código Civil de 1966, no final da Ditadura do "Estado Novo"). Por isso, o Código ficou conhecido por "Código de Seabra".

2. Quanto ao Autor da biografia, M. M. Cardoso Leal, depois de uma licenciatura em Economia, obteve o doutoramento em História Moderna, sendo investigador em especial do nosso liberalismo oitocentista.
Antes de biografia do Visconde de Seabra já tinha publicado, em 2013, a biografia de José Luciano de Castro (1834-1914), outro importante político e homem de Estado da monarquia constitucional, tendo sido líder do Partido Progressista, a esquerda liberal no sistema da Carta Constitucional.
De comum aos dois ilustres biografados a sua ligação à Bairrada e a Anadia, condição de que também compartilham tanto o biógrafo como o autor destas linhas. Bairradinos somos!

sábado, 2 de junho de 2018

Contra a barbárie tauromáquica (6): Dinheiro tingido de sangue

Fica a saber-se por esta notícia que várias Misericórdias são donas de praças de touros e que se associaram a organizações tauromáquicas para melhor explorar o cruel negócio.
É lastimável saber que as obras de beneficência das Misericórdias são financiadas com dinheiro resultante da bárbara tortura sangrenta de animais para gáudio público, assim lhe conferindo um arremedo de justificação moral. Seguramente que há destinos mais rendosos e menos condenáveis para os investimentos das Misericórdias.
Benemerência com dinheiro tingido de sangue de seres inocentes é uma contradição nos termos!

sexta-feira, 1 de junho de 2018

Albergue espanhol

1. O novo Governo de Madrid, resultante da "moção de censura construtiva" do PSOE contra o primeiro-ministro Mariano Rajoy - a primeira a ser aprovada em 40 anos de democracia espanhola - é uma "geringonça" política ainda mais insólita do que a de Lisboa.
De comum o facto de se tratar de um Governo minoritário do segundo partido mais votado nas últimas eleições, com apoio parlamentar de vários outros que lhe asseguraram o afastamento do Governo em funções e lhe proporcionam uma maioria absoluta no Congresso dos Deputados. Mas é um Governo monopartidário ainda mais minoritário - pois o PSOE conta menos de 1/4 dos deputados -, ficando dependente do apoio de nada menos de 8-oito-8 partidos, onde se contam, além do Podemos, quase todos os partidos autonomistas, desde o País Basco às Canárias, passando pela Catalunha e por Valência, incluindo alguns partidos de direita. Um verdadeiro "albergue espanhol".
Além disso, não tendo havido nenhuma negociação do programa do novo Governo, também não há sequer "posições conjuntas" separadas, como houve entre nós.

2. Como é que este Governo vai aguentar-se em bases políticas tão frágeis e tão heteróclitas, é o que resta saber, tendo em conta os custos orçamentais em favor de tantos parceiros, nomeadamente o Podemos, e os custos políticos do apoio dos separatistas catalães.
Com a economia a crescer robustamente, nos 3%, não deve faltar margem orçamental para "comprar" o necessário apoio parlamentar, mesmo à custa do ritmo da consolidação orçamental. Mais complicadas vão ser seguramente as inevitáveis concessões políticas aos partidos separatistas catalães, ameaçando romper a "frente constitucionalista" até agora mantida pelo PSOE em relação à Catalunha, com o PP e com o Ciudadanos, tanto mais que a maioria dos partidos que oportunisticamente apoiaram o repto de Sánchez são a favor das teses referendárias sobre a independência da Catalunha.
Imprevisíveis, e preocupantes, vão ser os próximos tempos políticos em Espanha. O melhor seria mesmo devolver a palavra aos eleitores, em eleições antecipadas, coisa que, porém, Sánchez não fará.

Capital predador

Aqui fica notícia da minha coluna no Dinheiro Vivo do fim de semana passado, acerca das empresas que distribuem dividendos em montante superior aos resultados e dos acionistas que tiram proveito dessa generosidade e logo a seguir reduzem a sua participação no capital da empresa.

Imprevisível Itália

Tenho sérias dúvidas não apenas sobre a prudência política mas também sobre a conformidade constitucional da decisão do Presidente da República italiana de rejeitar o ministro das finanças e da economia do Governo inicialmente proposto pela coligação Liga + 5 Estrelas, que levou à renúncia do indigitado primeiro-ministro e à nomeação de um "governo técnico" pelo Presidente, que seria obviamente rejeitado pelo Parlamento, onde aqueles dois partidos dispõem de maioria absoluta.
A Itália é uma democracia parlamentar típica, em que a legitimidade e a sustentação dos governos dependem exclusivamente do Parlamento e em que o Presidente não é diretamente eleito e não tem nenhuma função constitucional autónoma. Num tal sistema de governo, os partidos que têm maioria parlamentar têm o direito de governar, não competindo ao chefe o Estado julgar o seu mérito ou sobrepor a sua posição à vontade dessa maioria, por mais bem-intencionada que seja a sua intervenção.
A Itália não é seguramente um sistema "semipresidencialista", em que a nomeação e a subsistência dos governos dependam da confiança presidencial.Quando muito, em caso de fundamental discordância com o Governo proposto, o Presidente poderia dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, poder de que dispõe segundo a Constituição italiana. Coisa bem diferente é a nomeação de um governo de "iniciativa presidencial", em confronto com a maioria parlamentar, como o Presidente ensaiou.

Adenda
Afinal, a exótica fórmula de "governo técnico" de iniciativa presidencial não avançou e os dois partidos que ganharam as eleições apresentaram uma nova solução de governo, com a polémico ministro eurófobo na pasta... dos Assuntos Europeus! Decididamente, só na Itália!

Adenda 2
Um leitor mostra-se surpreendido por eu criticar o Presidente Matarela por ter tentado impedir a formação do Governo de coligação entre a extrema-direita da Liga e o populismo do 5 Estrelas. Mas é fácil explicar: (i) numa democracia parlamentar, quem tem maioria tem o direito de formar governo; (ii) a recusa do Governo levaria a novas eleições imediatas, que só reforçariam os dois partidos; (iii) é melhor deixá-los governar e falhar (porque obviamente vão falhar!) do que dar-lhes capital de queixa contra a democracia representativa. Neste ponto estou de acordo com este editorial do New York Times.