1. Num longo documento de 235 páginas, o PS veio apresentar o seu programa eleitoral, que, por isso, pouco gente vai ler, ficando pelas leituras seletivas dos jornais, nem sempre equilibradas.
Entre as ideias que merecem atenção estão a atribuição a cada nova criança de um pé-de-meia em certificados de aforro, a redução faseada do horário semanal de trabalho para as 37 horas e meia, ou a participação dos trabalhadores na gestão das grandes empresas (o que defendo há muitos anos).
Quanto às várias propostas de aumento de prestações e de serviços sociais (por exemplo, no SNS e no abono de família) e outras tantas de redução de encargos tributários (como a isenção do IVA nos produtos alimentares e de eliminação das propinas no ensino superior), não se compreende que um partido de vocação governamental responsável como o PS não apresente uma estimativa dos custos orçamentais do programa.
De pouco vale jurar pelo equilíbrio das contas públicas e depois apresentar medidas que, muito provavelmente, o poriam em risco.
2. Em todo o caso, não posso sufragar algumas das medidas propostas, como as já referidas quanto à eliminação do IVA sobre produtos alimentares ou das propinas do ensino superior, por não compreender porque é que se deve beneficiar toda a gente, independentemente dos meios económicos, isentando também os mais ricos do seu pagamento.
Pelo contrário, como muitas vezes já argumentei, a solução mais justa é manter essa receita pública e depois aproveitar o IVA e as propinas pagos pelos mais ricos para subsidiar o rendimento dos mais pobres, mais do que compensando as importâncias pagas por estes. Além disso, no caso das propinas não está em causa somente financiar mais bolsas de estudo, mas também sustentar a autonomia financeira das instituições de ensino superior públicas, sobretudo as do interior, que não usufruem dos contratos de investigação e de prestação de serviços de que tiram partido as instituições de Lisboa e do Porto.
Beneficiar seletivamente somente as pessoas de menores rendimentos fica mais barato, tem menos impacto sobre as contas públicas e é socialmente mais justo.
3. Uma proposta que acho de todo injustificável é a de continuar a abolir portagens em autoestradas, como se prevê em relação a vários troços, incluindo em zonas das mais prósperas do País, como é o caso do segmento da A25 entre Aveiro e Albergaria.
Para além de não comprender a isenção de pagamento de serviços de valor acrescentado, como este, que devem ser pagos pelos seus beneficiários (sob pena de serem os contribuintes em geral a pagá-los, mesmo os que não beneficiam deles), não entendo a lógica de embaretecer o transporte rodoviário, incluindo de mercadorias, apesar das pesadas "externalidades negativas" que ele tem sobre o ambiente. Não seria melhor pensar em reduzir as "portagens" de uso das linhas ferroviárias, a fim de embaretecer o transporte ferroviário, e torná-lo mais competitivo?
Um pouco mais de coerência política em matéria de transportes e embiente era bem-vinda.
[Acrescentado o nº 3.]