Uma das vencedoras socialistas nas eleições regionais francesas do passado domingo, Ségolène Royal, mais célebre do que outras, pelo seu curriculum e por ter ganho no círculo do próprio Primeiro-ministro, Pierre Raffarin, anunciou que vai desenvolver na sua região novos métodos de gestão e participação locais, como o do "orçamento participativo".
É sabido que esta é uma experiência importada do Sul, tendo sido pela primeira vez desenvolvida em Porto Alegre, no Brasil, no início da década de 90. Poderá resultar em França, ou não.
É contudo importante que o Norte não cometa os mesmos erros que o Sul tem cometido tantas vezes: o de transplantar sem mais leis e organizações cuja eficácia depende de condições locais, não se preocupando em verificar se elas podem resultar fora do seu contexto originário ou se, pelo menos, necessitam de adaptações prévias para que o sucesso possa ser repetido.
Este caso permite ainda verificar com satisfação que os “transplantes” têm agora duas direcções e não apenas uma. Há ventos que sopram do sul. Há iniciativas do sul que se reproduzem para o norte e não apenas o contrário.
Lembrei-me, a propósito, que, quando o então Ministro da Justiça, António Costa, quis criar os julgados de paz, foi também ao Brasil e à Argentina que mandou uma equipe do seu Ministério estudar as experiências semelhantes que aí estavam a funcionar.
Por essa altura, trabalhava eu em Moçambique, num projecto sobre as reformas do sistema judicial. Quando se pretendia enterrar as experiências dos Tribunais Comunitários ainda em funcionamento – uma forma de justiça de proximidade para pequenos litígios, relativamente desformalizada e pouco dispendiosa – lembro-me de lhes termos recomendado que não deitassem fora aquilo que nós, no Norte, estamos a ter de reinventar. Tanto quanto vou sabendo, é isso que está a acontecer.
Maria Manuel Leitão Marques