O mais doloroso nos primeiros meses de 2003 foi ouvir a Administração Bush e Tony Blair a chantagear o mundo, declarando que as Nações Unidas arriscavam tornar-se irrelevantes se não dessem luz verde à invasão do Iraque.
Ao fim de três anos, são os EUA e o Reino Unido que arriscam tornar-se irrelevantes no Médio Oriente e além dele, de tão atolados que estão no marasmo iraquiano, de tão acossadas que tornaram as forças internacionais no Afeganistão (onde os Talibans recuperaram à conta da distracção iraquiana e do narco-tráfico); de tão descredibilizada que está a sua legitimidade e de tão desmascarado que está o seu modelo de «democratização» à bomba.
As Nações Unidas, essas, nunca foram mais legítimas e mais indispensáveis.
Senão, vejamos:
em apenas vinte dias, entre 11 e 31 de Agosto, o Conselho de Segurança das ONU (esse órgão tantas vezes acusado - e às vezes justamente - de soft e appeaser, incapaz de acção decisiva) adoptou três resoluções que podem vir a aumentar em 50% as operações de paz lideradas pela ONU:
. a Resolução 1701 sobre o Líbano, adoptada dia 11 de Agosto, aumenta a UNIFIL de cerca de 2.000, para 15.000 efectivos;
. a Resolução 1704 sobre Timor-Leste, adoptada a 25 de Agosto, cria uma missão nova (UNMIT) composta por 1.608 polícias e 34 oficiais militares de ligação;
. a Resolução 1706 sobre o Darfur, adoptada a 31 de Agosto, acrescenta 17.300 tropas e 5.300 polícias à Missão das Nações Unidas no Sudão (UNMIS), que já tem 10.000 elementos no sul daquele país.
Claro que estes números não indicam a dimensão actual dos contingentes no terreno, mas sim a capacidade máxima, o tecto, que eles podem atingir. E as assimetrias, políticamente carregadas, abundam. Por exemplo, enquanto, ao fim de muitos anos de esforços, a Missão da ONU no Congo (MONUC) tem 18.094 soldados no terreno, numa capacidade autorizada de 18 316, à Missão das Nações Unidas no Haiti (MINUSTAH) continuam a faltar mais de 1.000 elementos para chegar ao tecto autorizado de 9.151 (números de Julho de 2006).
Tudo isto demonstra que, na verdade, as Nações Unidas, longe de se terem tornado irrelevantes, estão a ser cada vez mais utilizadas - incluindo pela Administração Bush - para legitimar intervenções militares em missões seja de manutenção, seja de imposição da paz.