"O Primeiro-ministro veio vangloriar-se de ter alcançado um bom resultado para Portugal no Conselho Europeu da semana passada, sobre o orçamento plurianual da UE para o período 2014-2020. Disse ele: "num contexto de descida generalizada, melhoramos a nossa posição relativa no seio da UE e no conjunto da coesão e da agricultura".
Durão Barroso também considerou que para Portugal este foi um "excelente acordo", muito embora tivesse também dito que era o "acordo possível" para a Europa, muito aquém do proposto pela Comissão Europeia.
Todos os membros deste Governo, apoiantes e avençados da Coligação, designadamente nos media, embarcaram na tese optimista e de auto-congratulação.
Mas eu penso que a realidade é diferente.
Passos Coelho pode proclamar que ganhou, mas de facto os portugueses perderam, todos os cidadãos europeus perderam.
Por estar em crise, Portugal deveria ser mais ajudado, mas, ao invés, vai de facto receber menos 10% no envelope financeiro que há de vir da UE nestes 7 anos, segundo o acordado no Conselho Europeu: menos 10% nos fundos da "política de coesão" (2.300 milhões); e menos 8 por cento (670 milhões) nos fundos da "política agrícola comum". Sendo que os fundos destinados ao "desenvolvimento rural", que são os mais importantes para impulsionar as indústrias agro-alimentares, vão levar uma talhada de 13,4% face ao actual quadro financeiro.
São resultados muito aquém daqueles que tinham sido alcançados no Parlamento Europeu, graças à perseverante e conhecedora negociação conduzida pelo meu colega eurodeputado Capoulas Santos.
Nessa negociação, Capoulas Santos conseguiu apagar aquilo que Passos Coelho deixou ficar. E que é muito penalizador para Portugal: é que a aplicação dos fundos para o "desenvolvimento rural" fica sujeita à taxa de execução do orçamento actual, que é muito baixa. O risco de Portugal vir ainda a sofrer um corte neste fundo é real.
Mas o mais preocupante de tudo é que o Governo de Passos Coelho não acautelou, não combateu e tem desvalorizado – nem sequer fala no assunto – o risco para Portugal de perder todos os fundos estruturais se não cumprir a chamada "condicionalidade macro-económica". Isto é, se não cumprir as metas orçamentais que, nos termos da "regra de ouro" agora inserida no recente Pacto Orçamental, pode fazer-nos perder a totalidade dos fundos atribuídos, e em condições que ainda não estão sequer definidas. Por exemplo, se não respeitar certos indicadores de desequilibro económico, como o referente à balança comercial, Portugal pode perder metade dos fundos que lhe estão atribuídos. Isto é gravíssimo: só afundará mais Portugal na crise, quando era o momento, justamente, dos parceiros europeus mostrarem solidariedade. Este risco foi levantado pelos eurodeputados numa reunião com o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, em Bruxelas, nos finais de Janeiro: o Governo estava alertado. Mas ninguém sabe em Portugal o que fez o Governo para afastar este perigoso condicionalismo.
Eu disse também que os portugueses vão perder a dobrar com o orçamento aprovado pelo Conselho Europeu, porque também vão perder tudo aquilo que perdem os cidadãos europeus no seu conjunto.
Porque este orçamento é tudo menos um orçamento de solidariedade, de coesão, não tem ambição, nem visão estratégica para a Europa, não tem sequer capacidade de tirar a União Europeia da crise. Veja-se que é o primeiro orçamento da história da UE que é inferior ao anterior. E representa uma percentagem mínima da riqueza gerada na UE, apenas cerca de 1% do PIB dos 27 Estados membros. Nos anos 60 quando se falava ainda apenas de união monetária, previa-se que viesse a exigir um orcamento entre 5 a 7 % do PIB; nos EUA, o orçamento federal corresponde a 20% do PIB; aqui, nesta Europa em crise, o orçamento não passará de 1 % do PIB e continuará a afectar 40 % para a agricultura, deixando para trás áreas decisivas para o crescimento económico e a criaçao de emprego: investimento na investigação, na inovação, nas redes europeias de comunicação e transporte, etc...àreas em que Portugal tem de ser inteligente e activo, para saber ir buscar dinheiro para investir na sua própria recuperação e desenvolvimento económico.
Neste Conselho Europeu vimos os chamados líderes sucumbirem à chantagem do primeiro-ministro britânico a exigir cortes orçamentais. Sem sequer cuidar de assegurar dotações suficientes para os compromissos identificados. Temos, assim, um Conselho Europeu que proíbe aos Estados défices nos orçamentos nacionais, mas acaba de aprovar um orçamento com défice para a União!
É um "orçamento ilegal", como logo disse Martin Schultz, o Presidente do Parlamento Europeu, porque o Tratado de Lisboa não permite um orçamento europeu com défice.
E é um orçamento que deve ser chumbado no Parlamento Europeu, como foi logo dito pelos líderes das 4 famílias politicas mais importantes no Parlamento Europeu, condenando um acordo que não corresponde às ambições da UE e chamando a atenção para que "agora é que vai começar a verdadeira negociação".
Com o PE. Pois, nos termos do Tratado de Lisboa, não há orçamento plurianual para os 7 anos (2014-2020) sem acordo do Parlamento Europeu. E em diversas resoluções, o Parlamento Europeu já provou que tem ambição e não quer mais destas "noites de facas longas" em que os Governos se digladiam entre si.O Parlamento Europeu quer "recursos próprios" para o orçamento europeu, como por exemplo um IRC comum, que abranja as transacções financeiras, que faça pagar o sector financeiro que tanta responsabilidade tem por nos ter lançado na crise.
Esta é uma negociação que vai implicar tremendas responsabilidades para os eurodeputados, como eu própria. Os governos vão pressionar-nos. E por isso poderemos votar por voto secreto, para fugir a essas pressões.
Se não obtiver melhorias significativas neste quadro orçamental para os sete anos, o Parlamento Europeu vai chumbar este orçamento. E a UE fica obrigada a viver de duodécimos, até que um novo acordo, que inclua o PE, tudo resolva. O que em nada prejudicará os interesses de Portugal."
Conselho Superior, ANTENA 1, dia 12 de Fevereiro de 2013