Acha Mário Soares que a solução do problema da dívida pública do País está em deixar de a pagar e refere o exemplo da Argentina que "pregou o calote" aos credores no final de 2001, «sem nada lhe ter sucedido».
O exemplo argentino não procede, porém. A Argentina ficou obvimente sem acesso aos mercados da dívida externos; as contas em dólares (que era moeda na Argentina junto com o peso) foram convertidas forçadamente em pesos, com perdas de mais de 1/3; o peso desvalorizou 80%. A Argentina pôde correr esse risco porque: (i) não faz parte de uma união monetária e por isso podia desvalorizar a moeda; (ii) não está integrada numa união económica e por isso podia controlar os movimentos externos de capitais e a importação de bens e serviços; (iii) tem recursos naturais (energia) e económicos (commodities agrícolas) que lhe permitem aguentar a balança de transacções com o exterior sem ter de pedir dinheiro ao estrangeiro.
Portugal não compartilha de nenhuma dessas condições. Um calote unilateral cortaria o acesso ao crédito externo ao Estado e às empresas, arrastando falências em série; tornaria obrigatória, tal como na Argentina, a conversão forçada dos euros na nova moeda nacional desvalorizada, com o correspondente confisco parcial; implicaria a saída do euro e quase inevitavelmente a saída da União Europeia; obrigaria a uma enorme desvalorização da nova moeda nacional, com a consequente inflação galopante e o inevitável empobrecimento generalizado. Sobretudo, tornaria Portugal um país sem nenhuma credibilidade externa e pouco digno de ser frequentado.
Não duvido que não é esse o futuro que Mário Soares deseja para Portugal...