No Público de ontem, Isabel Arriaga e Cunha, num artigo acerca das candidaturas a presidente da Comissão Europeia em vista das eleiçoes europeias do próximo ano, afirma que "segundo o Tratado de Lisboa, o presidente da Comissão Europeia (...) é escolhido pelos líderes da UE, tendo em conta o resultado das eleições [para o Parlamento Europeu]" e que "o sucessor de Barroso deve ser escolhido na cimeira de líderes de Junho de 2014, devendo entrar em funções em Novembro, depois de obter a confirmação do Parlamento Europeu".
As coisas, porém, não são bem assim, nem constitucional nem politicamente. Depois do Tratado de Lisboa, o presidente da Comissão é eleito (e não propriamente "confirmado") pelo Parlamento Europeu, sob proposta (e não depois da "escolha") do Conselho Europeu. Este limita-se a apresentar um candidato ao cargo (e não uma escolha ou nomeação já feita). É certo que o PE não pode eleger senão um candidato proposto pelo Conselho Europeu, mas pode rejeitar o(s) candidato(s) proposto(s), até que algum obtenha maioria (e a nomeação) no Parlamento.
O normal será o Conselho começar por propor o candidato a presidente da Comissão que tenha sido apresentado pelo partido europeu mais votado nas eleições para o PE; caso ele não seja eleito, terá de ser proposto o candidato indicado por outro partido, que possa reunir essa maioria.
Por conseguinte, o Conselho Europeu "escolhe" ainda menos o presidente da Comissão Europeia do que entre nós o Presidente da República "escolhe" o primeiro-ministro. No primeiro caso, o acto decisivo da nomeação do chefe do "governo" europeu é a sua eleição pelo Parlamento Europeu, sob proposta do Conselho Europeu; no caso do primeiro-ministro em Portugal, o acto decisivo é a sua nomeação pelo Presidente da República, que prevalece salvo se AR o rejeitar por maioria absoluta (não havendo nenhuma eleição parlamentar). No primeiro caso só há presidente da Comissão depois da sua eleição pelo PE; no segundo caso, há primeiro-ministro logo depois da sua nomeação pelo PR, embora com poderes limitados até à "confirmação" parlamentar.
Neste aspecto, o sistema de governo da União é mais caracterizadamente parlamentar do que o sistema de governo parlamentar imperfeito da CRP.