quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

E os mexilhões pagaram mesmo uma pesada fatura

O Relatório da Comissão Europeia sobre Portugal hoje publicado é particularmente crítico sobre o impacto social negativo da recessão e do programa de ajustamento tal como aplicado pelo Governo Português, nomeadamente sobre os cortes nas prestações sociais. Tal como eu próprio referi aqui, o fundamentalismo governamental levou ao enfraquecimento da rede de proteção social dos mais vulneráveis, reduzindo a capacidade de contrariar a crise social.
O Governo insiste em sublinhar o sucesso do programa de resgate quanto aos seus objetivos diretos (regresso aos mercados da dívida pública, redução do défice orçamental e do défice comercial externo, fim da recessão, etc.), aliás com resultados tardios e incompletos em muitos aspetos como a Comissão sublinha neste relatório. Mas o que está em causa é saber se os mesmos resultados não poderiam ter sido alcançados com menores custos, desde logo quanto à profundidade da crise social, se o Governo não tivesse optado à cabeça por ir "além da troika" em matéria de austeridade e por não poupar nos cortes das prestações sociais básicas (rendimento social de inserção, subsídio de desemprego, prestações familiares, etc.).
É essa responsabilidade política que está por apurar. O Governo não pode levar a mérito seu o que correu bem e "chutar" para troika os custos sociais da austeridade orçamental. Esta não justifica tudo, muito menos as opções que cabiam na discricionariedade política do Governo quanto à sua implementação.

Adenda
O Tribunal Constitucional acaba de declarar inconstitucional (e bem) uma norma deste Governo, de 2012, que retirava o rendimento mínimo aos portugueses que morassem em Portugal há menos de um ano. Já em 2003, o então governo Durão Barroso tentara retirar o direito ao RMG aos jovens com menos de 21 anos. Decididamente, a direita não gosta do RMG (contra o qual votou em 1996, quando ele foi criado pelo Governo PS), que é uma espécie de rede de última instância contra a pobreza.