1. Todas as sondagens sobre o referendo constitucional italiano no próximo dia 4 indicam que o primeiro-ministro Renzi vai sofrer uma pesada derrota política.
Se tal se verificar, confirmam-se mais uma vez dois riscos dos referendos. Primeiro, quando versam sobre temas complexos, eles são decididos com baixo conhecimento geral sobre as questões colocadas à decisão popular (calcula-se que só um entre 10 italianos conhece com algum rigor o que está em causa); segundo, há a tendência para os cidadãos votarem em questões políticas diferentes das que estão a votos, tornando os referendos em plebiscitos contra o governo em funções, independentemente do mérito das questões submetidas a referendo.
2. Não é a primeira vez que exprimo as minhas objecções contra referendos sobre questões complexas, que não são suscetíveis de uma opção "sim" ou "não", ou a referendos realizados em situações de instabilidade política ou social, em que a paixão política conjuntural tende a primar sobre a razão.
Mas depois do Brexit e do referendo italiano, é de sublinhar que o referendo constitui uma derrogação da democracia representativa, que devia ser excecional, não podendo tornar-se num instrumento de fuga dos governos e dos parlamentos às suas responsabilidades políticas nem, muito menos, de triunfo de populismos conjunturais.
3. A confirmar-se a derrota do referendo, ela redunda numa vitória da direita berlusconiana e da Liga Norte e da pseudo-esquerda populista do movimento "5 estrelas", podendo abrir uma caixa de Pandora política em Itália e, por extensão, na UE.
Cumprindo a sua imprudente ameaça, Renzi pode ser tentado a demitir-se, abrindo uma crise política. Mesmo que o não faça, as condições de governo vão deteriorar-se, até por causa das divisões na maioria de centro-esquerda, com consequências negativas sobre a situação económica e a estabilidade política e financeira do País.
Entre Cila e Caribdis, entre o populismo de direita e o de esquerda, como evitar um naufrágio político em Roma?