1. Discordo desta proposta legislativa de admitir a criação de contribuições parafiscais pelos municípios, além do poder que já têm de criar taxas pelos serviços que prestam.
Parece evidente que essa alteração visa "legalizar" a impropriamente chamada "taxa de proteção civil" criada por alguns municípios (Lisboa, Setúbal, etc.), que o Tribunal Constitucional declarou desconformes com a Constituição, por não se tratar de uma taxa e por os municípios não terem poder para criar impostos nem contribuições parafiscais, como era o caso (analisado AQUI).
No entanto, por mais justificada que seja tal contribuição (ou outras), a solução proposta, atribuindo aos municípios um poder tributário "em branco", não é apropriada.
2. É certo que a Constituição permite a atribuição, por via de lei, de "poderes tributários" às autarquias locais, sem limitação quanto à sua espécie. Mas este preceito constitucional tem de ser conjugado com outros, nomeadamente o que reserva a criação de impostos para lei parlamentar (ou decreto-lei parlamentarmente autorizado) e o que faz a mesma reserva legislativa parlamentar para o "regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas". A lógica constitucional é de que, em matéria de tributos, cabe à lei criá-los (impostos) ou, pelo menos, definir o seu regime jurídico geral (taxas e contribuições parafiscais).
Por conseguinte, só pode haver contribuições parafiscais municipais, se criadas por lei em seu favor (como sucede com os impostos municipais) ou se criadas pelos municípios nos termos do tal "regime geral" previamente estabelecido por lei, que, porém, não existe. Não pode haver atribuição dessa competência aos municípios sem essa intermediação legislativa, como pretende precipitadamente a referida proposta de alteração da Lei das Finanças Locais.