1. É de aplaudir a proposta do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, numa entrevista ao Expresso, de redução substancial dos preços dos passes nos transportes coletivos em Lisboa e em toda a área metropolitana. O que não é de aplaudir, pelo contrário, é que seja o orçamento do Estado, alimentado pelos contribuintes de todo o país, a financiar as dezenas de milhões de euros que o programa custaria.
Não faz sentido financiar benesses locais com impostos nacionais. Os contribuintes do resto do País já financiam os respetivos transportes locais. É um despautério exigir-lhes que contribuam também,
indevidamente, para financiar os investimentos e a gestão dos transportes urbanos de Lisboa e do Porto, bem como os custos do seu endividamento.
2. Há décadas que defendo a transferência dos transportes locais de Lisboa e do Porto
para responsabilidade municipal ou intermunicipal, como é regra no País, aliás em obediência ao princípios constitucionais da subsidiariedade e da descentralização territorial. Mas essa transferência
só foi feita recentemente em relação aos transportes de superfície, Carris e STCP - mesmo assim deixando nas mãos do Estado as suas dívidas -, continuando os metropolitanos a consumir dezenas de milhões de euros anuais ao orçamento do Estado.
Acrescentar a esse financiamento indevido o subsídio adicional da baixa do preços dos passes sociais dos transportes de Lisboa (ou do Porto) seria agravar a iniquidade financeira já existente.
3. É provável que, para salvar a face da proposta, haja quem sugira que o Estado financie uma redução correspondente do preço dos passes de todos os transportes urbanos do país.
Mas seria "rabo escondido com o gato de fora". Por um lado, há muitas localidades onde não existem transportes urbanos, pelo que os contribuintes dessas localidade financiariam o que eles próprios
nem sequer podem usufruir. Em segundo lugar, existe uma enorme desproporção entre o custo dos passes sociais nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e o custo correspondente nos transporte urbanos de Braga, Aveiro ou Coimbra e outras cidades do País.
Decididamente, é tempo de cessar esta filosofia de Robin Hood ao contrário, ou seja, as regiões mais pobres do País a subsidiarem as mais ricas. Quanto tanto se fala em valorizar o interior e na descentralização territorial, esta inversão da lógica orçamental é inadmissível.
Adenda
Como acima se antecipou, não tardou a surgir o estratagema de estender a medida supostamente a todo o país para tentar esconder o nutrido subsídio do Estado a Lisboa e ao Porto. Vale tudo!...