1. Em 2015, a direita nacional e os comentadores com ela alinhados passaram semanas a denunciar, urbi et orbi, como "antidemocrática" a solução de governo da "Geringonça" - liderada pelo PS com apoio parlamentar dos demais partidos à sua esquerda -, por ela afastar do Governo a coligação eleitoral que tinha vencido as eleições (PSD+CDS) e o partido com maior representação parlamentar (o PSD). E ainda hoje há quem insista em recordar esse "pecado original" do atual Governo, para o tentar deslegitimar.
Embora sem sufragar politicamente a solução governativa, não me cansei de argumentar que a fórmula governativa em nada bulia com as regras de uma democracia parlamentar como a nossa, quer no plano constitucional, quer no plano democrático. Quem ganha as eleições sem maioria absoluta não goza de nenhum "direito potestativo" a governar.
2. Desde então não faltaram por esse mundo fora situações semelhantes de formação de governos de "coligação dos vencidos" contra o maior partido parlamentar, como, por exemplo, na Nova Zelândia, na Espanha e, possivelmente, na Suécia.
Agora, aqui bem pertinho, também na Andaluzia, o PSOE, vencedor das recentes eleições parlamentares regionais, vê-se afastado do governo regional, que sempre deteve, por uma coligação das direitas, incluindo o apoio do extrema-direita do Vox.
Por concidência, retiro esta noticia do Observador, que em 2015 foi um dos órgãos de comunicação mais agueridos na denúncia do "golpe antidemocrático" perpetrado pelo PS em aliança com a esquerda radical, mas que agora não vê (e bem) nenhum problema democrático na formação de uma "geringonça" andaluza, incluindo a direita radical, contra o PSOE. Mudam-se os protagonistas, muda-se a opinião...