1. Esta rotunda afirmação de que «o Brexit mostra que para a UE a cidadania europeia não significa nada» é duplamente falsa: (i) quanto à suposta responsabilidade da União e (ii) quanto à suposta irrelevância da cidadania da União.
Quanto à primeira, o Brexit é uma decisão unilateral soberana da Grã-Bretanha, que a União fez tudo para evitar, ao fazer concessões a Cameron (aliás excessivas, a meu ver), antes do fatídico referendo. Ora, quem sai da União deixa obviamente de poder beneficiar do estatuto de cidadão europeu e não há nada a fazer acerca disso. Foram os britânicos que votaram nesse sentido.
No entanto, o acordo de saída entre Bruxelas e Londres prevê que tanto os cidadãos europeus não britânicos atualmente residentes no Reino Unido como os cidadãos britânicos residentes na União mantenham os direitos de cidadania europeia (o que prova que a União os considerou como "direitos adquiridos"). Infelizmente, Londres não consegue fazer aprovar esse acordo em Westminster, mais uma vez apesar da disponibilidade da União.
Portanto, a tese da culpa da União carece de qualquer fundamento.
2. Não é menos infundada a acusação da irrelevância da cidadania da União.
A prova de que isso não é assim (pelo contrário!) decorre sem margem para dúvida desta mesma entrevista de uma cidadã alemã a trabalhar na Grã-Bretanha. Sendo hoje uma cidadã da União a residir num Estado-membro diferente do seu, passaria a ser uma estrangeira como os outros, quando o Brexit se consumar, se o tal acordo não for aprovado. Muitos britânicos, além dos que votaram contra o Brexit, também vão sentir a diferença, não apenas quando quiserem viajar, trabalhar e estabelecer residência num país da União, mas também quando a Grã-Bretanha deixar de beneficiar dos programas de mobilidade europeia (desde a mobilidade de negócios à universitária).
Afinal, a cidadania europeia conta, e muito! Infelizmente, há coisas que só valorizamos quando as perdemos...