1. Como se esperava, o acordo comercial entre a UE e o Reino Unido, concluído in extremis, mantém o comércio de produtos entre ambas as economias (incluindo indústria, agricultura e pescas) isento de tarifas aduaneiras e de restrições quantitativas, como antes (mas agora sujeitos a controlos fronteiriços).
Todavia, o que há de inovador no acordo não é a sua amplitude pouco ambiciosa (que tem pouco cobertura quanto aos serviços), mas sim aquilo que se veio a designar nas negociações como level playing field, ou seja, a proibição de as partes degradarem os seus padrões laborais e ambientais e de recorrerem a ajudas de Estado para aumentarem artificialmente a sua competitividade recíproca nas trocas comerciais entre eles.
Nunca se tinha ido tão longe nesta preocupação. Como mostrei anteriormente, Londres não poderia gozar de melhores condições de acesso ao mercado interno da União depois de sair do que antes.
2. Note-se, no entanto, que desde há duas décadas, os acordos comerciais da União já incorporavam uma cláusula laboral e ambiental, com o mesmo objetivo. A diferença estava em que até agora essas cláususlas eram desprovidas de mecanismos de enforcement, pelo que a sua violação não era suscetível de sanção, nomeadamente através da aplicação de tarifas aduaneiras compensatórias ou retaliatórias.
Há muito que eu criticava esta falha da política de comércio externo da União, designadamente no meu livro de 2014 sobre o assunto (capa em epígrafe). Apraz-me verificar que, finalmente, essa falha foi corrigida, sendo de esperar que a solução encontrada passe a ser uma regra em todos os futuros acordos comerciais da União.