1. Não dá compreender a ideia de que, se o PS ganhar as eleições sem maioria parlamentar, dará prioridade a um entendimento à sua esquerda, ou seja, com o BE e/ou o PCP.
Há dois argumentos contra essa opção de partida para as próximas eleições:
- primeiro, depois das fundas divergências que motivaram o "chumbo" do orçamento que levou a esta crise política, não é sério admitir que um acordo de legislatura com esses dois partidos seria possível, sem cedências suscetíveis de pôr em causa o crescimento económico e a consolidação das finanças públicas;
- em segundo lugar, uma aliança parlamentar com a extrema-esquerda implica necessariamente, como estes seis anos testemunharam, o seu veto a imprescindíveis reformas institucionais e políticas, desde a lei eleitoral ao SNS, passando pela justiça e pela economia, cujo adiamento penaliza o futuro do País.
Ou seja, mesmo que não fosse politicamente impossível, uma nova "geringonça" seria politicamente nociva.
2. Acresce que essa estratégia antecipadamente anunciada em favor de uma aliança pós-eleitoral à esquerda só prejudica as perspetivas eleitorais do PS, quer porque o priva do argumento do voto útil em relação ao eleitorado de esquerda, quer porque o pré-anúncio dessa preferência afasta o eleitorado de centro - que decide as eleições! -, que associa uma reedição da "Geringonça" a aumento contínuo da despesa pública corrente, carga fiscal elevada, medíocre crescimento económico, salário médio baixo e congelamento das necessárias reformas.
Com uma mensagem destas, ao mesmo tempo que desiste implicitamente da luta pela maioria absoluta, o PS arrisca-se a dar sentido ao voto na extrema-esquerda e a alienar para a abstenção ou, mesmo, para o PSD muitos votos suscetíveis de serem atraídos por uma aposta convicta numa vitória robusta capaz de assegurar a estabilidade governativa de que o País precisa para a superação sustentada dos estragos da crise pandémica.