1. Tenho as maiores reservas acerca da submissão ao foro penal de alegadas ofensas pessoais por imputação de factos ou de posições políticas.
Uma coisa é a defesa dos políticos contra ofensas ou imputações difamatórias de caráter pessoal, outra coisa é a defesa contra acusações ou imputações de natureza política, por atos ou afirmações no exercício de funções públicas.
Se no primeiro caso se justifica de todo manter a proteção penal, pois os políticos não perdem o direito à honra e à reputação pessoal, já no segundo caso convém manter os litígios no plano estritamente político, deixando o veredicto à opinião pública.
2. Para além da dificuldade da prova em muitos casos (afirmação contra afirmação) e da jurisprudência leniente do TEDH nestes casos, não vejo nenhuma vantagem, pelo contrário, na judicialização do combate político, que tenderá a arrastar a politização da justiça.
À política o que é do foro político...
Adenda
Um leitor pergunta se sou a favor da revisão do Código Penal para eliminar tais crimes, como alguns defendem. Decididamente não, porque penso que a honra pessoal e integridade moral merecem proteção penal, sem excecionar os políticos. E também não defendo a tese de que a liberdade de imprensa, só por si, justifica a impunidade dos jornalistas quando acusados de tais crimes. As minhas objeções têm a ver somente com a conveniência e vantagem política da judicialização das ofensas políticas.
Adenda 2
A este propósito tenho uma história pessoal muito instrutiva. Em 1975 ou 76, sendo eu um proeminente deputado do PCP, um jornal de extrema-direita publicou com destaque uma notícia, segundo a qual eu teria recebido poucos anos antes do 25 de Abril o "prémio Salazar" pela minha tese de mestrado na FDUC, o que era uma acusação altamente lesiva da minha honorabilidade política. Sucede que tal prémio me tinha sido efetivamente atribuído, mas que eu o recusara expressamente, apesar de já ser assistente na Faculdade. Tendo decidido acionar judicialmente o jornal e sido comprovados os factos, o juiz optou, porém, pela absolvição, por entender que o combate político e a liberdade de imprensa poderiam justificar a publicação de acusações não confirmadas. Aprendi a lição e nunca mais recorri aos tribunais em situações semelhantes enquanto mantive atividade política, poupando trabalho aos tribunais e despesa e "chatices" a mim mesmo...
Adenda 3 (17/1)