domingo, 17 de outubro de 2004

Mais quatro anos, não!

Sem surpresa, o prestigiado New York Times apoia expressamente John Kerry na corrida à presidência dos Estados Unidos. Mesmo se esperado, o editorial que justifica o «apoio entusiástico» ao senador merece uma leitura, quanto mais não seja pelo fundamentado requisitório contra Bush. Mais um «mandato desastroso», não!

O Inverno



Aproxima-se o Inverno, os dias pequenos e de luz coada. O sol é menos quente e menos frequente. Desaparecem as esplanadas dos cafés. Nas ruas, anda menos gente. As janelas fecham-se nas casas.
Poderíamos fazer contra-corrente. Guardar a cor e a luz no que vestimos. Deixar a loucura criativa de Galliano inspirar as nossas opções. Mas não. No Inverno, domina o preto ou o cinzento, nas roupas e nos sapatos. As montras tornam-se mais tristes. Só nos resta esperar que o Verão regresse. E depressa, por favor.

Afinal, este Governo é igual aos outros?

Em aparente tentativa de apaziguar as pouco discretas provocações de Santana Lopes, o Presidente da República declarou, em entrevista à Antena 1 (muito fala agora o Presidente!...), que o actual governo "não está em diferentes condições do que outros no que respeita à sua apreciação [pelo Presidente]". Ora, para além de não ter havido nenhum governo acerca de cuja nomeação o Presidente tivesse hesitado tanto tempo, também foi a primeira vez que ele achou necessário estabelecer publicamente exigências de continuidade de políticas essenciais em relação ao governo anterior, o que obviamente aumenta a necessidade de escrutínio presidencial.
Com esta declaração do PR, em que ficamos? Belém acha afinal que este governo é igual a qualquer outro saído directamente de eleições parlamentares?

Os argumentos discutem-se, as pessoas não

Ao contrário do que acusa Gabriel Silva no Blasfémias, eu não chamo nomes às pessoas. Posso desqualificar (por vezes indevidamente...) ideias, posições e argumentos, mas não desconsidero os autores.

Confederação sindical europeia pela Constituição

Qualificando-a como um «claro progresso em relação aos actuais tratados da UE», a Confederação Europeia de Sindicatos manifestou o seu apoio à Constituição Europeia. A decisão foi aprovada por grande maioria, somente com um voto contra (a FO francesa, tradicionalmente hostil à integração europeia) e algumas abstenções, entre as quais a CGT francesa e a CGTP portuguesa.
Sabendo-se que a força política mais influente na central sindical nacional, o PCP, é militantemente contra o novo tratado constitucional (o mesmo sucedendo com o BE), a abstenção adoptada em Bruxelas não deixa de ser uma posição prudente. Resta saber que atitude é que a organização presidida por Carvalho da Silva vai tomar no debate interno sobre o assunto, designadamente no previsto referendo.

sábado, 16 de outubro de 2004

Portucaliptal


Citado pelo Expresso de hoje, com base num jornal regional de Aveiro, o secretário de Estado das Florestas, Luís Pinheiro (que deve mudar o nome para Luís Eucalipto...), anunciou uma política de apoio à expansão do eucaliptal em Portugal, tendo em conta o abastecimento de matéria prima da indústria de celuloses. Ou seja: a política florestal hipotecada aos interesses particualres de uma indústria, apesar dos enormes prejuízos para o património florestal e o ambiente, sem esquecer a devastação dos fogos florestais! O que é bom para a Portucel é bom para o País...
Por que é que em Portugal o secretário de Estado das Florestas há-de aparecer sempre como comissário das empresas da pasta de papel? E os movimentos ecologistas, ficam silenciosos, porquê?

Fanatismo de mercado

Se se quiser uma amostra de fundamentalismo liberal em matéria económica, a posição de João Miranda sobre o limite do número de operadores de televisão de sinal aberto é exemplar. O dogma reza: não deve haver barreiras artificiais à entrada de novos "players" no mercado; logo, todo a limitação é sempre má por definição, mesmo que, como ocorre no caso, esteja em causa a utilização de um bem do domínio público, que só pode ser usado mediante licença pública, precedida de concurso, não podendo haver por definição liberdade de acesso nessa esfera e podendo haver razões assaz compreensíveis para limitar o número de operadores e para assegurar a estabilidade do quadro televisivo (desde logo, por exemplo, para não estar a repetir concursos para as vagas resultantes da falência recorrente de operadores excedentários...).

PS
- Eu não disse nada contra as estações regionais de televisão. Só defendi que o pluralismo "externo" delas resultante não poderia servir de "compensação" para a eventual falta de pluralismo "interno" a nível das estações de âmbito nacional.

Buttiglione

Ao contrário de José Manuel Fernandes, que ontem subscreveu no Público um editorial de apoio a Rocco Buttiglione, o polémico comissário europeu designado, entendo que faz sentido a posição da comissão de liberdades do Parlamento Europeu, que o reprovou. O problema não é a personalidade do comissário que Barroso escolheu para a pasta da justiça nem os valores morais/religiosos que ele defende. O problema é a inadequação entre eles e a pasta para que foi designado. Nenhum problema se levantaria se se tratasse do pelouro da agricultura e das pescas, por exemplo. Mas provavelmente nem no Governo de Berlusconi, a que ele ainda pertence (Assuntos Europeus), seria pacificamente aceito na pasta da justiça.
De facto, Buttiglione é um fundamentalista religioso com opiniões fortemente reaccionárias em matéria de casamento, contracepção, homossexualidade, aborto, etc., o que seria o menos. Mas os fundamentalistas religiosos tendem geralmente a impor os seus valores religiosos a todos por via de lei (como é fácil ver no caso da punição penal do aborto), pelo que as declarações em contrário de Buttiglione são tudo menos tranquilizadoras. De facto, na Convenção Europeia já se opôs ao princípio da não discriminação por razões de orientação sexual. Para além disso, como amigo e ministro de Berlusconi, Buttiglione também não dá nenhumas garantias de fazer avançar a cooperação judiciária a nível da UE, que Berlusconi tem torpedeado sistematicamente, por razões pessoais, estando a Itália em falta na implementação de várias medidas comunitárias nesta área. Buttiglione não está, portanto, à altura de suceder a António Vitorino nessa sensível pasta. Por isso parece-me que Barroso faria bem em mudá-lo de pelouro.

PS. Como efeito fácil, JMF apoda de modernos "torquemadas" os críticos de Buttiglione. É uma evocação infeliz. Torquemada foi sim um antepassado da família religiosa de Butiglione. Ao contrário, os seus críticos de hoje não pretendem fazê-lo abjurar das suas "heresias", muito menos queimá-lo vivo...

sexta-feira, 15 de outubro de 2004

O "derby"

Quem ouvir o relato do que se passou hoje com jogo entre o Benfica e o FCP acreditará que organizámos o Euro, há tão poucos meses, com indiscutível e reconhecido sucesso?
Parece que só nos excitam os grandes desafios. Ganhamos à Rússia mas não ao Liechtenstein. Fazemos o Euro, mas corremos o risco de falhar num mero jogo da Liga!

Os da Causa, fora dela

Notícia de textos publicados por autores do Causa Nossa noutros média:
- Luís Nazaré no Jornal de Negócios de ontem, sobre o regresso do tema do papel do Estado nas sociedades contemporâneas;
- Vicente Jorge Silva no Diário Económico de hoje sobre o caudilhismo jardinista na Madeira.
Ambos vão ser coligidos no Aba da Causa (link aqui ao lado, na coluna da direita).

Pedido de desculpas

(com publicidade subliminar)

Tenho andado arredio da postagem aqui no Causa. Tenho pena mas ando atarefado com diversas porcarias e alguns prazeres trabalhosos como este. A estreia é hoje às 21h30. Todos os meus companheiros de blogue estão convidados - é só mandar um mail a este que vos pede desculpa e promete voltar às responsabilidades brevemente. Um abraço, e não se esqueçam de passar no vizinho do lado. As URGÊNCIAS estão aí.

clube do pulmão

Duas da manhã, num extra. Tenho o tabaco mas falta-me o fogo. Desespero. Só existem isqueiros azuis com o símbolo do Futebol Clube do Porto. Hesito. Pergunto por fósforos. Por seixos. Por paus secos. Não há nada, só pequenos acendedores com o FCP carimbado. Pago 90 cêntimos para possuir o fogo e acendo o cigarro mais envergonhado de sempre. Afinal, não sou do Benfica. O meu clube é o tabaco.

E a Madeira, não tem direito também?

Tal como já tinha sucedido com M. Rebelo de Sousa e com Santana Lopes em anteriores visitas, também Morais Sarmento foi aos Açores defender a vitória da coligação de direita nas eleições regionais em nome da alternância democrática, vistos os 8 anos de governo que leva o PS na Região. Será que não lhes ocorre ir a correr à Madeira defender, por maioria de razão, a vitória do PS, para realizar a mesma alternância democrática na Região onde o PSD governa ininterrupta e hegemonicamente há quase 30 anos (o que é um pouco mais de 8...), sem paralelo em regimes democráticos?

Referendos e demagogia

«Quando diz -- "Por natureza, há sempre um risco de instrumentalização demagógica dos referendos. Os referendos com objecto demasiado amplo ou indefinido só potenciam esse risco" --, isto não será verdade apenas pela forma e pelo método que os políticos nos habituaram, ao longo destes anos de democracia(?), a debater as questões? Ou melhor dizendo, a não debater as questões. Ou porque não lhes interessa, ou porque pensam que o povo coitadinho (meros mortais) não consegue perceber o porquê das coisas!
Basta ver, olhar para trás neste último ano, que campanha (estou a falar de campanha a sério: nas escolas, nas universidades, nos municípios, pelo país fora, etc.) foi feita para apresentar e discutir em detalhe a questão da constituição [europeia], sequer a sua conveniência ou não? Não considera que a "instrumentalização demagógica" de que fala é esta precisamente: falar do referendo precisamente quando a maioria da população, como é óbvio, não sabe nada do conteúdo em causa; para depois com base nesta desculpa de que os "meros mortais" nada sabem vir questionar o seu futuro "sim" ou o seu "não" e condicionar assim a(s) própria(s) questões?»

(João Carvalho)

Pluralismo de opinião e regulação

Respondendo a João Miranda no Blasfémias:
1. O "numerus clausus" de estações de televisão por via hertziana têm a ver, segundo creio, não somente com os limites do espaço radioeléctrico mas também com a insustentabilidade comercial de mais canais. A futura televisão digital não supera esta segunda limitação.
2. Os canais regionais não são alternativa aos canais nacionais em termos de pluralismo de opinião. Este deve aferir-se face aos mesmos auditórios. Uma rádio de Alguidares de Baixo não concorre com a TSF.
3. O pluralismo de opinião deve ser assegurado ao nível de cada meio ou plataforma, especialmente na televisão, e não entre plataformas diferentes, permitindo monopólios de opinião em cada plataforma.
4. A televisão de sinal aberto continua a ser, por enquanto, o meio mais universal de acesso à opinião. Não temos 100 nem 200 canais: temos quatro, dois públicos e dois privados. Se fosse livre o domínio dos dois canais privados por uma corrente de opinião, isso significaria uma severa limitação do pluralismo de opinião.
5. Não está provado que os órgãos de comunicação privados tendam a ser «antipoder». O contrário é que é verdade. O caso do despedimento de MRS pela TVI aí está para provar o seguidismo dos privados em relação ao poder do momento. Isso seria impossível numa estação pública (só que nesta ele não estaria sozinho...)
6. Uma das justificações fundamentais para o serviço público de rádio e televisão é justamente assegurar um mínimo básico de pluralismo de opinião face ao perigo de captura dos órgãos privados pelas opiniões favoráveis ao poder económicoe e ao poder político do momento.
7. Já existe actualmente regulação e regulador dos media, incluindo a televisão. O novo regulador não tem funções essencialmente distintas do que já existe. As diferenças dizem respeito ao formato orgânico e aos seus poderes. Um das suas funções é garantir o pluralismo lá onde ele deve existir constitucionalmente e legalmente. O regulador implementa o regime constitucional ou legal, não o cria.
8. Mesmo que o pluralismo de opiniões das estações públicas tendesse a limitar-se ao espectro político-ideológico "oficial" da AR, é preciso lembrar que é nos partidos nela representados que se revê a opinião pública que vota. O pluralismo de opinião faz parte da igualdade de oportunidades das forças políticas.
9. Nem as estações públicas nem a regulação limitam a participação de comentadores independentes, alheios ao arco partidário. Todos os nomes citados tiveram ou têm acesso frequente ou permanente às estações de televisão públicas ou privadas.
10. Dizer que se as estações privadas de sinal aberto tiverem de ser minimamente plurais por efeito da regulação, o pluralismo diminui, isso é um óbvio contra-senso.
11. Não existe nenhum país, incluindo os Estados Unidos, onde não haja regulação dos meios de comunicação, a começar pela televisão. Tal como o mercado em geral, não há "mercado livre de opiniões" sem regulação que assegure um mínimo de iguladade no acesso a esse mercado. Só defende o contrário quem beneficia de posições dominantes no mercado desregulado.
12. É preferível mais pluralismo de opinião do que menos.

A favor do referendo directo da Constituição europeia

«(...) Não estou completamente de acordo consigo em relação a um tema específico: o do referendo à Constituição Europeia. (...) Nunca concordei com a proibição constitucional de referendar [directamente] leis ou tratados internacionais. É verdade que estes têm frequentemente elementos técnicos específicos que escapam à generalidade dos eleitores. Contudo, parece-me exagerado crer que, por exemplo, um deputado à Assembleia da República, quando vota uma determinada lei na generalidade, compreenda totalmente o conteúdo técnico do texto legislativo que aprova ou reprova. (...) No fundo, mesmo ao votar o respectivo diploma, estará a votar aquilo que interpreta serem as grandes opções do diploma: a escolha das grandes opções do diploma não deverão ser restringidas desde logo na pergunta do referendo, mas sim escolhidas pelo próprio eleitor consoante um debate de razão pública.
O elemento democrático do nosso regime misto monárquico-presidencial-aristocrático-democrático (é assim que o interpreto) deve ser também um misto de democracia representativa e democracia directa. Não há que ter medo das votações populares aos diplomas, mas sim da manipulação do debate público: o coarctar do poder decisório livre de cada um é sim o grande problema a combater.»

(André dos Santos Campos)

quinta-feira, 14 de outubro de 2004

Ensaio Geral

Amanhã, toda a gente às Urgências.

Bush v Kerry

Dos três debates públicos entre Kerry e Bush, este não ganhou nenhum e perdeu inequivocamente dois deles (o primeiro, sobre política externa, e o terceiro, realizado ontem, sobre política interna), em que Kerry triunfou em toda a linha. Perante a patente superioridade do candidato democrata, os eleitores norte-americanos serão estúpidos?

Até quando?

A passividade passada, se não compreensão implícita, em relação às formas violentas de protesto estudantil em Coimbra (incluindo frequentes encerramentos da Porta Férrea a cadeado, impossibilitando a entrada nas instalações a estudantes, professores e funcionários) culminou ontem com a invasão da sala grande dos actos da Universidade, por um pequeno grupo de estudantes, interrompendo tumultuosamente a cerimónia solene de abertura de aulas. O clima de impunidade em relação à violência de minorias extremistas só favorece mais violência.
Tendo considerado "muito grave e condenável" a invasão, seria desejável que a Reitoria passasse aos actos, promovendo a respectiva condenação e punição. Ou será que na UC continua a haver estudantes que, só por o serem, gozam de um estatuto de total imunidade disciplinar e penal?
(revisto)

Acima da lei

Seguindo o triste exemplo dos seus colegas de Coimbra nos últimos anos, os estudantes de Évora fecharam a sua Universidade a cadeado. Uns heróis! Imagine-se que eram trabalhadores a encerrarem à força a sua empresa, para impedirem outros de entrar nas instalações: alguém toleraria?
Por que é que há grupos sociais privilegiados que pensam que estão acima da lei..., e estão mesmo!?

Pluralismo de opinião interno

É indiscutível que a insólita extensão e proeminência que tinha o comentário político de Marcelo R de Sousa na TVI em nada justifica nem o abstruso "direito ao contraditório" reivindicado pelo Governo (por um ministro do mesmo partido do comentador!...) nem muito menos legitima o "saneamento" do comentador pela estação, quando ele se tornou incómodo para os seus interesses, tenha havido ou não pressão governamental directa ou indirecta. No entanto, à margem disso, o programa de MRS levantava um problema que não deve ser escamoteado no justo protesto contra o ataque e afastamento de que foi vítima o político-comentador.
Quem tiver alguma familiaridade com as questões da liberdade de opinião nos meios de comunicação social sabe da distinção entre pluralismo externo -- aquele que se observa entre uma pluralidade de órgãos de comunicação social, cada um deles podendo ter a sua linha de orientação própria -- e pluralismo interno, ou seja, aquele que deve existir dentro de cada órgão de comunicação social. Os órgãos de comunicação social públicos estão obviamente obrigados a um reforçado pluralismo de opinião interno (sendo essa uma das razões para a sua existência), sendo obrigados a dar expressão às diversas correntes de opinião relevantes, o que não se impõe aos órgãos de comunicação privados, onde existe sempre a liberdade de criação de novos órgãos.
No entanto, o pluralismo interno também se deve considerar imperativo para os órgãos de comunicação privados como as televisões de sinal aberto, visto que utilizam um bem público (o espectro hertziano) mediante uma licença pública, desde logo porque o seu número é muito limitado e não existe liberdade de criação de novas estações.
Ora parece evidente que existe uma infracção deste princípio quando uma televisão confere a uma determinada corrente de opinião política, por meio de um seu representante qualificado, um lugar manifestante privilegiado, sem contrapartida equitativa para outras correntes. Tal era manifestamente o caso da TVI com o programa de MRS, com a agravante de que o programa ia para o ar mesmo em períodos eleitorais, durante os quais a obrigação de isenção e de pluralismo interno mais se justifica.

Referendo sobre a Constituição Europeia (2)

1. Pergunta de um leitor
«Tendo ainda presente a fundamentação que apresentou para a s/ "proposta" de pergunta para o referendo [link para o post espectivo] e as críticas que recebeu nalguns blogs sobre a "opacidade" da redacção, que para um não constitucionalista me pareceram pertinentes, como comenta que mesmo aqui ao lado seja possível um acordo tão amplo para uma pergunta tão simples:
"¿Aprueba usted el proyecto de Tratado por el que se establece una Constitución para Europa?"»
(JME)

2. Resposta
É simples: os espanhóis não têm as limitações constitucionais do referendo que nós temos e que não permitem o voto popular directo sobre leis ou tratados. Para fazer entre nós um referendo com uma pergunta como a espanhola, é preciso rever a nossa Constituição sobre esse assunto.
O que eu continuo a duvidar é se tem sentido em termos democráticos fazer um referendo com tal amplitude. Quem vai ler as centenas de artigos do Tratado? As pessoas vão determinar o seu voto por que factores?
(Vital M)

3. De novo o leitor
«Quando formulei a dúvida confesso que não tinha ainda lido o seu artigo de hoje [3ª feira] no "Público"....
(...) Não sendo então possível fazer uma pergunta simples sem rever a Constituição, se bem entendi, acolhida a sua proposta hoje expressa para se rever a Constituição, não de forma "ad hoc" para este problema mas sim de forma geral, também não seria democraticamente desejável fazer o referendo com a tal pergunta simples porque uma resposta em consciência subentende a capacidade do votante de compreender um texto complexo como o Tratado para a Constituição...etc. (confesso que só posso concordar com esta objecção sobretudo recordando a experiência de ter tentado ler o Tratado de Maastrich para me esclarecer sobre o que aí vinha...), parece que estamos perante uma círculo lógico (e político?) difícil de quebrar, um problema sem solução.
Não vejo no entanto nas suas palavras a conclusão implícita: é um erro, a que acresce a "imprevidência referendária" a que hoje alude, a realização do referendo em si mesmo! (...) Pelo contrário, interpreto a proposta do referendo como uma prudente obtenção de legitimidade para a viabilização de um processo que necessariamente envolve perda de soberania, uma forma de derrotar os eurocépticos de vários matizes e ancorar solidamente Portugal na Europa.
Termino assim com uma nova dúvida (...): como poderia este objectivo ser obtido de outra forma, com o melhor dos dois mundos, isto é, sem atropelos constitucionais mas com a legitimidade democrática que um referendo acrescenta?»

(JME)

4. Comentário
Eu defendo, desde o início, um referendo sobre a Constituição europeia. Mas continuo a pensar que, tal como os demais referendos, ele deve incidir sobre as principais opções de fundo do tratado, concretamente identificadas, o que permite aos cidadãos saber exactamente o que estão a decidir, e não genericamente sobre o texto globalmente considerado, dada a sua extensão e complexidade, que o tornam inacessível à generalidade dos mortais, permitindo responder sim ou não pelas razões mais díspares, e logo politicamente inconclusivas (o que é o contrário da decisão democrática). Por natureza, há sempre um risco de instrumentalização demagógica dos referendos. Os referendos com objecto demasiado amplo ou indefinido só potenciam esse risco.

Vital Moreira

quarta-feira, 13 de outubro de 2004

Referendo sobre a Constituição Europeia

«No seu artigo de hoje [3ª feira] no Público estranhei o destaque dado a uma proposta defendida publicamente por Alberto Costa quando faz silêncio absoluto sobre o facto de o PCP nas três últimas revisões ter apresentado essa proposta, que viu aliás ser rejeitada.
Em pesquisa na NET, encontrei na página do PCP um artigo de Vítor Dias que aborda o tema do seu artigo (com um ponto de vista contrário) e recupera alguma da memória que alguns gostam de perder.»

(Júlio Ventura)

terça-feira, 12 de outubro de 2004

A 72 horas da estreia

24 horas depois do ensaio de imprensa.

«Risco de crise profunda»

O ainda comissário europeu António Vitorino, que teve um papel de relevo na preparação da Constituição Europeia, manifestou preocupação com a sua instrumentalização pelas questões de política doméstica e pelas questões de equilíbrio institucional da União, com o risco de potenciar a sua rejeição nos referendos nacionais previstos em vários países (link para as suas declarações).
Só podemos compartilhar da sua preocupação e do seu alerta. Entre nós, porém, continua a prevalecer o alheamento da questão.

O referendo excepcional

No meu artigo de hoje no Público (também coligido como habitualmente no Aba da Causa: link na coluna da direita) discuto a ideia de alterar de novo a CRP para permitir, excepcionalmente, um referendo directo da Constituição europeia. (Aproveito para corrigir um lapso no texto publicado: no penúltimo período do 6º parágrafo deve ler-se: «Ao contrário do que muitas vezes se vê escrito, não existe nenhum tratamento discriminatório dos tratados em relação às leis».)
Não será altura de começarmos a discutir a sério a Constituição europeia e o previsto referendo?

O drama de Darfur (3)



Campo de Iridimi, Abéché, no Chade. Refugiados de Darfur no hospital de campanha dos "Médecins sans Frontieres", enfermaria das crianças mal-nutridas, dia 6/9/04. (Foto e legendas de Ana Gomes).
(Pode ver a foto em tamanho maior clicando sobre ela.)

O drama de Darfur (2)



Campo de Iridimi, Abéché, no Chade. Refugiadas de Darfur no hospital de campanha dos "Médecins sans Frontieres", enfermaria das crianças mal-nutridas, dia 6/9/04. (Foto e legenda de Ana Gomes).
(Pode ver a foto em tamanho maior clicando sobre ela.)

O drama de Darfur (1)



Campo de Iridimi, Abéché, no Chade- refugiada de Darfur, dia 6/9/04. (Foto e legenda de Ana Gomes).
(Pode ver a foto em tamanho maior clicando sobre ela.)

Há alguma sinceridade nisso?

Entre as pérolas de duvidosa sinceridade da comunicação do primeiro-ministro de ontem consta a «não aceitação» da concentração dos meios de comunicação.
Primeira dúvida: sabendo-se que (i) a Constituição impõe expressamente medidas específicas contra essa concentração e que (ii) as leis gerais de defesa da concorrência podem não ser bastantes para a impedir (desde logo porque têm em conta somente o aspecto empresarial), será de esperar que este Governo faça aprovar um instrumento legislativo especialmente dedicado a esse objectivo?
Segunda dúvida: o Governo condiderará, ou não, uma operação de concentração inaceitável a falada aquisição da TVI pelo grupo de comunicação da PT, aliás notoriamente dominado hoje por personalidades do PSD, incluindo o inenarrável Luís Delgado?