Especular sobre o futuro é especular sobre nós próprios, especular sobre os anos que nos restam, sobre os anos que restam aos que mais amamos, sobre os objectos que nos fazem sentido ou, sendo mais exacto, sobre tudo o que nos ajuda ou ajudou à construção do nosso sentido. Especular sobre o futuro do país em muitas das suas variantes é, também, especular sobre as portas que se abrem e fecham dentro de cada um de nós.
É nessa perspectiva que gostaria de desafiar os companheiros de Causa Nossa. Desafiá-los no sentido de procurar dentro das nossas contradições e ambiguidades, mas também dentro das nossas grandezas e ideais, razões para continuar a acreditar no nosso destino enquanto indivíduos e, obviamente, no nosso destino enquanto portugueses. Parece-me que uma coisa não invalida a outra. Portugal deve realizar-se na soma de cada um dos nossos sonhos ou na soma dos nossos fracassos arruinar-se enquanto país.
Assim, gostaria que este novo Blog pudesse ser um espaço onde tudo isto fosse passível de discussão sem qualquer constrangimento. Tudo isto e talvez mais alguma coisa. Que este blog anunciasse objectivos a forma de os concretizar, que falasse sobre a natureza dos sonhos possíveis e impossíveis, sobre os pesadelos futuros e, também, sobre a identificação de cada um com o país que todos somos. Esta é uma discussão que tem de passar por uma certa ideia de Esquerda. Recolocar o debate político na questão do indivíduo e não do consumidor é algo de muito importante; recolocá-lo no domínio das ideias, da cultura e da filosofia penso ser decisivo.
Num tempo em que o discurso político e os políticos estão desacreditados é mais do que altura de chegar às pessoas, de as reconquistar. Certamente que sem esse objectivo conseguido, dentro de alguns anos a Democracia terá contornos inimagináveis.
Somos um país com gente excessiva. Depressivos num dia, exaltantes e optimistas no outro. Esse tem sido o nosso devir psicanalítico, o nosso pequeno e limitativo detalhe "genético". Assim, qualquer discussão sobre o nosso futuro passará, inevitavelmente, por dar conta dos nossos detalhes, porque esses pormenores estruturantes têm, para o bem e para o mal, determinado o nosso destino. Temos razão para estar deprimidos? Temos razão para temer o futuro? Que detalhes teremos de esconder para nos adaptarmos a um Novo Mundo que, todos os dias, se revela mais ameaçador? Ainda faz sentido pensar à Direita ou à Esquerda? E que sentido oferece a cada um de nós um ponto de vista de Direita ou de Esquerda? Que conquistas podemos ter? Quais as derrotas que se anunciam? E será que as derrotas podem transformar-se em vitórias? E como é que isso se consegue?
Reinventar a palavra Utopia no discurso de cada um de nós é uma ideia romântica, mas o romantismo está mais ao nosso alcance do que a prosperidade económica ou militar. Ousar tentar o impossível e ter desígnios que nos motivem enquanto soma de individualidades, que nos motivem enquanto país é uma possibilidade viável. Só nos reinventando, só redescobrindo a nossa identidade podemos passar a ponte sem risco de perder a noção do caminho de volta. Portugal soube dar-se aos outros, soube despojar-se para os outros, agora talvez seja tempo de nos darmos aos outros de uma outra forma... Tempo de passarmos a ponte para o exterior com a certeza de que as coordenadas são fortes e inquebrantáveis.
No futuro precisamos de um desígnio. Mas que desígnio? Cultural? Científico? Desportivo? Que rumo estratégico deve ser seguido? Mais ou menos Estado? Será inevitável o desenvolvimento sustentado na mão de obra barata? Tantas e tantas perguntas que podem ser feitas.
Dentro de vinte anos teremos de saber o caminho de regresso de olhos fechados, porque se abrirmos os olhos poderemos não conseguir encontrar nada do que fomos. A globalização pode trazer o esquecimento, mas só o trará se não soubermos sobreviver por nós próprios. Enquanto colectivo, mas sobretudo enquanto indivíduos e portugueses.
Luís Osório