sábado, 21 de janeiro de 2017

Viragem

1. A tese de que, mercê da aliança de esquerda, "o PS nunca mais vai voltar a precisar da direita para governar" parece-me assaz temerária, e não é somente porque o futuro é, por definição, longo e imprevisível.
De facto, o PS vai precisar do PSD em várias situações : (i) sempre que queira tomar medidas que no nosso sistema constitucional carecem de uma maioria de 2/3 (e não são poucas); (ii) se quiser recuperar algumas das reformas que estavam no seu programa eleitoral e que foram "metidas na gaveta" por causa da oposição da extrema-esquerda parlamentar; (iii) sempre que estiver em causa aquilo que afasta decididamente o PS do PCP e do BE e o aproxima do PSD, que é afinal crucial (integração europeia, disciplina orçamental e dívida pública, política externa, incluindo política comercial, política económica, etc.).

2. A ideia de confinar ad aeternum a ação do PS a um frentismo de esquerda (aliás pouco consistente como se vê) e a um maniqueísta confronto esquerda-direita representa uma viragem estratégica que não se enquadra no património doutrinário nem na prática política do PS, tal como herdados de Mário Soares. O PS sempre se considerou como a trave-mestra central de um sistema partidário com três áreas políticas, entre a direita e a extrema-esquerda.
Não há, por isso, nenhuma razão para transformar em salvífica solução definitiva para o futuro a atual aliança de esquerda, que foi gerada num certo contexto político e ainda não passou o teste do tempo.