1. A proposta de nomeação do Governador do Banco de Portugal pelo Presidente da República é constitucional e politicamente desassisada.
É constitucionalmente inepta porque os poderes do Presidente da República (de nomeação e outros) são apenas os enunciados na Constituição, onde não consta este. Ai do sistema constitucional, se os poderes constitucionais do PR pudessem ser precipitadamente ampliados por via de lei! É politicamente despropositada, porque não existe nenhuma razão séria para dar ao Presidente da República um poder de veto sobre a nomeação do órgão executivo de uma entidade pública administrativa como o banco central.
Não valem neste caso as razões especiais que justificam a nomeação presidencial (sob proposta do Governo) do PGR, das chefias militares e dos embaixadores (todas elas previstas na Constituição). A legitimidade do governador do BP deve resultar da vontade política do Governo, sob controlo da AR, como é próprio de um sistema de base parlamentar como o nosso, e não do PR, que não é eleito para governar. Ao contrário do Governo, o PR não é sancionável politicamente pelos seus atos.
2. Essa proposta já tinha sido adiantada anteriormente, sem ter vingado. O que seria estranho era vê-la agora perfilhada e aprovada por um Governo do PS, ao arrepio da sua tradicional rejeição firme de modificar o sistema de governo em favor de Belém.
Mesmo que fosse de equacionar essa solução numa futura revisão constitucional, isso só seria de aceitar no quadro de um "trade-off" com outros poderes do PR, de modo a preservar o atual equilíbrio político-constitucional. Dar esse novo poder ao PR de forma "gratuita" envolve uma concessão presidencialista que não se espera do PS. Mário Soares e Nunes de Almeida (que em 1982 negociou a revisão constitucional que definiu meticulosamente o quadro institucional do poder político que perdurou até agora) devem mexer-se no túmulo, de surpresa e incómodo, se esta imprudente solução for para a frente.
Não dá para entender! Questões deste gabarito deveriam estar imunes a manobras de oportunismo político conjuntural sem princípios, reveladoras de um preocupante défice de cultura política e de conhecimento da história constitucional nacional.