1. Poucas vezes na História o centenário de uma grande revolução social e política terá suscitado tão poucos motivos de celebração e tão escasso entusiasmo como a Revolução Russa.
Tendo prometido o início da definitiva emancipação humana - e tendo alcançado inicialmente profundos avanços no desenvolvimento económico e nos direitos sociais -, a Revolução acabou por instaurar, sob a égide do estalinismo, um regime de servidão e de repressão política e ideológica. O desmoronamento do mundo soviético há um quarto de século não deixou saudades e a triste sobrevivência dos poucos países que ainda se reclamam da ortodoxia comunista não suscitam o entusiasmo sequer do poucos seguidores que restam no Mundo.
A histórica promessa de "libertação da exploração capitalista" acabou por degenerar irremissivelmente na institucionalização de uma economia de Estado, de uma ditadura política do partido oficial e de expropriação da liberdade individual e da democracia política.
2. O único grande êxito duradouro da Revolução Russa e da experiência comunista foi indireto e consistiu, afinal, no subsequente processo de "domesticação" do capitalismo, perante o receio da revolução, mediante o reconhecimento dos direitos dos trabalhadores a partir da I Guerra Mundial (criação da OIT logo no Tratado de Versalhes de 1918 e aparecimento da primeira "constituição do trabalho" na Constituição alemã de Weimar, de 1919), a construção do "Estado social" depois da II Guerra Mundial e a institucionalização de um "Estado regulador" apostado na correção das "falhas do mercado".
Não foi pouco, bem entendido, e nesse aspeto todos somos "herdeiros da Revolução Russa". Mas ironicamente, o grande triunfo duradouro do comunismo foi testar a resiliência do capitalismo e fortalecer a sua legitimidade social e política. Não era esse propriamente o objetivo!