1. Não alinho na campanha pública que por aí vai contra a UE em geral, por alegada insuficiência de medidas de financiamento do combate à pandemia e aos seus efeitos económicos e sociais, nem na diabolização de certos Estados-membros, apontados como especiais culpados por essa insuficiência, nomeadamente a rejeição dos chamados eurobonds (obrigações de dívida mutualizada).
Mesmo se a UE devesse fazer mais, como penso, não se justificam os excessos críticos, com alguma pulsão populista pelo meio. E quanto aos referidos alvos especiais, Países Baixos à cabeça, provavelmente faríamos o mesmo, se tivéssemos os constrangimentos políticos, sociais e culturais que eles têm. Em todo o caso, numa união política, baseada na confiança recíproca, as campanhas públicas condenatórias de uns contra os outros fazem mais mal do que bem. As reuniões das instituições da União são o local apropriado para terçar armas.
2. Se achamos que a União nos está a desamparar, experimentemos só pensar como seria a nossa situação, se estivéssemos fora da União e da zona euro.
Estando dentro, beneficiamos do enorme programa de compra de dívida pública do BCE e dos empréstimos a baixo juro e com condicionalidade limitada do Mecanismo Europeu de Estabilidade financeira, assim como de financiamento suplementar do Banco Europeu de Investimentos, instrumentos que, somados, devem cobrir a maior parte das necessidades de financiamento adicionais resultantes da crise pandémica. Se a isto juntarmos os programas da Comissão Europeia, financiados pelo orçamento da União, é assaz desproporcionado o aranzel crítico que por aí vai.
Se Portugal estivesse fora da União e da zona euro, neste momento os seus custos de acesso ao mercado da dívida já teriam disparado e o País poderia ver-se na emergência de ter de recorrer ao FMI, como está a suceder com vários países, com juros elevados e condicionalidade intensa.
3. Penso que a pandemia poderia ser uma ocasião oportuna para lançar, a título experimental e em escala reduzida, um fundo de dívida mutualizada ao nível da União, para financiar diretamente programas de resposta dos Estados-membros, sem passar pelo seu orçamento nem pela sua dívida.
Mas não posso deixar de compreender a oposição de princípio dos países que entendem que, não sendo a UE uma união orçamental nem tendo recursos fiscais próprios, as obrigações europeias seriam um instrumento de "transferência financeira" transfronteiriça, com elevado "risco moral", o que seria "invendável" ao seus contribuintes. E não me impressiona a aparente mudança de posição da Alemanha a este respeito, provavelmente mais cínica do que sincera, contando com o eventual chumbo do Tribunal Constitucional Alemão.
Adenda (15/4)
Revejo-me em geral neste artigo no Público de hoje.