1. No meio da tensão criada pela pandemia, há o risco de medidas precipitadas, insuficientemente justificadas e debatidas, só para corresponder a queixas de grupo.
Tal me parece ser o caso da recente lei do perdão genérico de penas de prisão (e outras medidas de saída da prisão). Não tendo a lei um preâmbulo justificativo, que devia ter, temos de nos basear na justificação dada pelos proponentes da lei, que invocam a necessidade de poupar os presos ao risco de contágio da pandemia.
2. Ora, para além das dúvidas não especificadas do Presidente da República quanto a algumas soluções concretas, ao promulgar a lei, a minha dúvida tem a ver com a própria lógica da lei.
A questão é a seguinte, ecoando um bem argumentado artigo de opinião: não era mais fácil defender os presos da pandemia dentro da prisão, mediante testes generalizados e pronto isolamento e tratamento dos eventuais casos de contágio, do que enviá-los para fora, aliás sem testes prévios, sujeitando-os ao risco do contágio familiar ou comunitário, sendo certo que alguns deles nem sequer têm família para onde regressar?
3. Parece-me haver um incongruência de base, entre sujeitar o país a confinamento domiciliário generalizado, e depois "desconfinar" justamente aqueles que estão mais confinados, enviando-os para ambientes muito menos restritivos, onde correm mais riscos do que na prisão.
Era preciso uma justificação mais sólida para afastar as possíveis acusações malévolas daqueles que podem argumentar que esta medida foi sobretudo uma boa ocasião de aliviar a sobrelotação das prisões entre nós...