O "mantra" justificativo dos adeptos da cerimónia de celebração do 25 de abril na AR, em formato de clube seleto, é que o estado de emergência "não suspendeu a democracia". Trata-se, porém, de desconversar, levianamente.
Em primeiro lugar, ninguém imagina que se mantivesse, por exemplo, a realização de eleições que estivessem marcadas para este período; é óbvio que teriam de ser suspensas e adiadas, como já sucedeu em vários países. Em segundo lugar, a emergência suspendeu direitos individuais e coletivos que impedem os cidadãos comuns de celebrar publicamente o 25 de abril e que se deviam aplicar aos deputados, fora das reuniões de trabalho estritamente necessárias. Por último, pobre da democracia, se ela se reduzisse a gestos vazios de "democracia celebratória" da elite oficial, à margem dos cidadãos.
Adenda
A mais que previsível ausência de Jorge Sampaio da cerimónia e a provável ausência de outros eminentes convidados pela mesma razão mostra, só por si, a imprevidência da iniciativa em plena crise de Covid. Resta aos promotores o comentário darwinisticamente "macho" de que "vem quem pode" e sobre quem não pode, "azar deles". A "democracia celebratória" passa bem sem velhos e doentes... Disgusting, digo eu!
Adenda (2)
«E não aceito que um ritual seja transformado na verdadeira linha vermelha que separa os democratas dos outros. Não aceito que discordar de uma festa faça de mim uma hipócrita ou pessoa de mau gosto, como diria Manuel Alegre, sem respeito pela democracia.» (Sónia Sapage, hoje no Público). Nem mais!
Adenda (3)
Tal como a AR, também muitos municípios faziam questão de organizar cerimónias públicas no 25 de abril. Felizmente, que eu saiba, nenhum deles achou que a democracia ficaria em falta, se este ano não houvesse tais cerimónias e, pelo contrário, terão pensado que seria uma provocação aos seus munícipes, fechados em casa. E também não me consta que tenha havido zelosos abaixo-assinados de democratas-mais-democratas-do-que-outros a reivindicá-las.