1. Num curioso artigo do Público, intitulado Lénine e Nós, o sociólogo Boaventura de Sousa Santos, por vezes apontado, com alguma razão, como "patrono intelectual" do Bloco de Esquerda, vem invocar a obra do revolucionário russo de há cem anos, "Esquerdismo, doença infantil do comunismo", para censurar severamente a recente posição do Bloco de Esquerda contra o orçamento, elogiando em contrapartida a atitude e a capacidade de negociação do PCP, que conseguiu importantes ganhos políticos a troco da sua abstenção.
BSS absteve-se, aliás, de sublinhar que o Bloco manteve caprichosamente o seu voto contra, mesmo depois de a sua principal reivindicação - a rejeição de injeção de dinheiro no Novo Banco através do Fundo de Resolução - ter sido aprovada com o voto oportunista e irresponsável do PSD...
2. É, porém, de duvidar se a amistosa admoestação tutelar de BSS vai ter algum efeito na posição do Bloco em relação ao Governo. Não consta, de resto, que ao longo destes cem anos a lição de Lénine tenha servido para levar algum partido esquerdista a moderar a sua visceral hostilidade ideológica em relação à social-democracia e a adotar um módico de flexibilidade política tática.
Está-lhe "na massa do sangue", vindo de onde vem. A não ser que as sondagens de intenção de voto antecipem uma acentuada punição política, desde logo castigando a sua candidata presidencial em janeiro próximo, ou que o risco de disputar eleições antecipadas em posição vulnerável morigere o seu atávico dogmatismo...