1. A proposta presidencial de revisão constitucional em Angola inclui muitas alterações positivas, mas há pelo menos duas delas especialmente negativas:
- a que retira a qualidade de "órgãos de soberania" a todos os tribunais de 1ª e de 2ª instância, o que é impróprio do Estado de Direito;
- a que adia para incertas calendas a institucionalização do poder local, como se pudesse haver Estado democrático sem autonomia do poder local.
Lamentável é igualmente que a proposta esteja a seguir um procedimento em marcha acelerada, sem a devida ponderação parlamentar nem o necessário envolvimento das instituições e da opinião pública.
2. Ao contrário de alguns outros países africanos, Angola dispõe de condições razoáveis - quanto a pluralismo político, liberdade de imprensa, quadros jurídicos, etc. - para ser um Estado de direito constitucional decente.
É pena que iniciativas desequilibradas e precipitadas como estas comprometam essas expectativas. Não precisava de ser tã0 árduo o caminho para democracia constitucional em Angola...
[Agradeço ao Prof. Melo Alexandrino ter-me chamado a atenção para este assunto.]
Um leitor angolano pergunta a que propósito me "intrometo nas questões internas" do seu país. A minha "intromissão" tem dois fundamentos: (i) as questões constitucionais de Angola dizem respeito a todos os constitucionalistas que se interessam pelo progresso democrático do país, como é o meu caso; (ii) orgulho-me de, juntamente com o Professor Canotilho, ter contribuído, há três décadas, a convite das autoridades angolanas, para a transição democrático-constitucional que lançou Angola na difícil senda de um Estado de direito constitucional. Eis as minhas credenciais.