1. Julgo que a pandemia e a crise económica e social que lhe vem associada não justificam que o Presidente da República assuma poderes que constitucionalmente não tem, e que são do Governo, como o de fixar critérios de desconfinamento e de - no discurso de tomada de posse - estabelecer as prioridades políticas da governação nos próximos anos.
A Constituição é clara: é o Governo, e só ele, «o órgão de condução da política geral do País» (e, por maioria de razão, das políticas setoriais), desde logo porque é politicamente responsável por ela perante a AR. Ora, no seu juramento de posse o Presidente jura «cumprir a Constituição», desde logo quanto aos limites dos seus poderes e quanto à autonomia política do Governo....
2. O facto de o PS ter apoiado oficiosamente a reeleição de MRS e de contar com o seu apoio institucional em prol da estabilidade política não o deve inibir de reclamar o escrupuloso respeito da separação de poderes estabelecida na Constituição - que é a chave do sistema de governo constitucional -, e que não vale somente para o caso de Presidentes hostis, até porque os precedentes podem ser usados no futuro por outros protagonistas...
O governo do País não é um condomínio entre Belém e São Bento.
[revisto]