1. Nesta entrevista, Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros e candidato a deputado, vem corroborar o que António Costa sempre fez questão de clarificar desde o início: estas eleições são para escolher, entre ele e Rui Rio, entre o PS e o PSD, quem deve governar o País.
Pela primeira vez, porém, ASS vem admitir explicitamente que, em caso de vitória por maioria relativa (hipótese mais do que provável), a solução de estabilidade governativa pode estar num "acordo de cavalheiros" negociado entre PS e PSD, assegurando ao governo minoritário do outro condições para governar.
2. Isto só pode dizer uma coisa, que já resultava obviamente das palavras de Costa e do seu compromisso de se demitir da liderança do PS caso perdesse as eleições: o PS só equaciona ser governo se sair vencedor das eleições, mesmo na hipótese de uma maioria conjunta das esquerdas. Por conseguinte, as coisas não poderiam ser mais claras para os eleitores à esquerda: só haverá governo de esquerda com a vitória eleitoral do PS.
Ao contrário das pretensões do Bloco e do espantalho político agitado por Rui Rio, o cenário da "Geringonça" de 2015 não está, nem nunca esteve, em cima da mesa nestas eleições - felizmente, direi eu.
Adenda
O que ainda nenhum dos dois partidos esclareceu é se só está disponível para viabilizar um governo minoritário do outro, se este não negociar o apoio parlamentar com outro(s) partido(s) da sua banda do espectro político, ou seja, se for um "acordo de exclusividade", o que quer dizer que o PS teria de escolher entre um acordo com o PSD ou com os partidos à sua esquerda e o PSD teria de optar entre um acordo com o PS ou com os partidos à sua direita. É o que faz sentido político...
Adenda 2
Um leitor pergunta se tenho a certeza de que Rui Rio, mesmo perdendo as eleições, não cairia na tentação de repetir a "Geringonça" dos Açores, se houvesse maioria das direitas, tal é a sede de poder e o ódio anti-PS que se nota na direita política e doutrinária (vide Observador). Por um lado, penso que a hipótese de uma maioria das direitas sem vitória do PSD é ainda mais improvável do que vitória eleitoral deste. Segundo, uma tal solução implicaria necessarimente um acordo com o Chega, pelo menos de apoio parlamentar, o que Rio tem terminantemente negado. Por último, mesmo que resistíssemos a tomar por bons os compromissos dos líderes partidários, não se vê como é que o PSD poderia equacionar uma solução governativa que implicaria ficar refém do Chega.
Adenda 3
Teoricamente, vencendo com maioria relativa, Costa tem aparentemente mais opções de governação do que teria Rui Rio - a saber:
(a) negociar apoio parlamentar com os partidos à sua esquerda (+PAN);
(b) negociar apoio parlamentar com o PSD;
(c) governar à vista, com acordos pontuais à direita e à esquerda ("à Guterres" e à "Costa II") -, enquanto Rio só teria duas hipóteses, dada a exclusão do Chega da equação governativa. Todavia, como tenho argumentado várias vezes (por exemplo,
AQUI), não vejo que haja condições para um acordo de legislatura entre o PS e os partidos à sua esquerda (mesmo que fizessem maioria), pelo que
também o PS está realmente limitado às opções (b) e (c) acima referidas.