segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

Eleições parlamentares 2022 (7): Lamentável

Não dá para entender como é que, no debate com André Ventura, Rui Rio não tenha excluído liminarmente a eventualidade de instituir a prisão perpétua entre nós, acabando mesmo por deixar a questão em aberto. 

Se, ao arrepio de quase meio século de enfática proibição constitucional de tal pena e da tradição de humanismo penal do PSD, Rio é capaz de fazer uma concessão desse jaez ao pedestre populismo do Chega, que outras não estará ele disponível para fazer, a fim de disputar o eleitorado daquele? E que barreira resta para impedir um acordo de governo entre os dois partidos!?

É com posições levianas como esta, pondo em causa um dos mais arraigados consensos democráticos e constitucionais entre nós, que o líder do PSD vai criando dúvidas sobre a solidez e confiabilidade das suas posições políticas

Disgusting!

Adenda 
Um leitor argumenta que a prisão perpétua existe em quase todos os países europeus, o que é verdade (embora muitos admitam a sua interrupção mediante liberdade condicional). O que não faz sentido é restaurá-la num país em que ela foi abolida há quase 140 anos, ainda na monarquia liberal, sem que nem a ditadura do chamado "Estado Novo" tenha ousado ressuscitá-la. Que Ventura queira ultrapassar o "Estado Novo" pela direita, já é elucidativo; que Rio não exclua tal ideia à partida, é deveras comprometedor.

Adenda 2
Outro leitor junta um argumento importante: não é por terem, e eventualmente aplicarem, a pena de prisão perpétua que esses países têm taxas de criminalidade menos elevadas do que Portugal -, o que não sucede, em muitos casos.

Adenda 3 (5/1)
Um leitor pergunta o que quero dizer com a "tradição de humanismo penal do PSD"? Refiro-me designadamente às posições de eminentes militantes do PSD, desde a Assembleia Constituinte até à academia, como os professores J. Figueiredo Dias e M. da Costa Andrade.