1. Foi obviamente por engano que recebi um pedido para subscrever este manifesto a favor da reedição de uma aliança do PS com o BE e o PCP para fins governativos a seguir às próximas eleições.
É sabido que discordei dessa solução governativa desde o início em 2015 e que ao longo dos seis anos da sua vigência fui registando regularmente as suas duas principais consequências negativas, a saber: (i) o excessivo aumento da despesa pública corrente, sacrificando o investimento público e a redução da dívida pública, assim como o risco de crise orçamental no caso de ocorrência de crise económica e / ou de subida acentuada os juros da dívida; (ii) a paralisação de qualquer reforma institucional (sistema eleitoral, SNS, sistema de justiça, sistema fiscal, etc.), por causa do veto político de um daqueles partidos ou de ambos.
A esses fatores impeditivos da repetição da experiência soma-se a circunstância de esses partidos terem friamente provocado a queda do Governo do PS, com a irresponsável rejeição do orçamento para 2022, em "coligação" negativa com a direita parlamentar. O PS não pode permitir-se ficar de novo refém de parceiros inconfiáveis.
2. A verdade é que a tentativa de chamar o PCP e o BE para dentro do "arco da governação" através de um acordo de governo com o PS estará sempre destinada a falhar, enquanto subsistir o fosso político e doutrinário entre a esquerda moderada do PS e a esquerda radical daqueles partidos.
Para além de alguma convergência sobre o Estado social (direitos do trabalhadores, proteção social, SNS, escola pública), é manifesto que a "esquerda da esquerda" não compartilha dos valores do PS quanto à economia de mercado e ao papel do Estado na economia, à democracia liberal, à integração europeia, à disciplina orçamental, ao comércio internacional, às alianças estratégicas.
Entre o PS e os partidos à sua esquerda não pode haver mais do que entendimentos pontuais e conjunturais. Insistir em que a união das esquerdas é solução para um governo estável constitui um equívoco, que a morte da chamada "Geringonça" não aconselha a repetir.