1. Importa refletir sobre esta lista de «reformas [no SNS] que façam reduzir os tempos de espera no acesso, o excesso de urgências ou o desperdício crónico de recursos (de pessoas mas, sobretudo, de instalações e equipamentos subutilizados)», da autoria de um conhecido administrador hospitalar com um longo currículo (além de ter sido secretário de Estado da Saúde no 1º Governo de António Costa), endereçada à ministra da Saúde neste novo mandato governativo, agora num Governo com maioria absoluta.
Mesmo sem ser surpreendente, o elenco das causas apontadas de ineficiência e desperdício no SNS não deixa de impressionar, desde o constrangimento no acesso aos cuidados primários e o congestionamento das urgências até às carências na saúde mental, passando pela escandalosa insuficiência dos sistemas de informação e pela utilização a meio tempo de instalações e equipamentos. Um retrato preocupante!
2. Entre as soluções aventadas pelo autor (que, porém, não deixou grande registo reformista quando foi governante...) não constam naturalmente algumas que terá considerado fora da equação política dominante - herdeira dos acordos no seio da "Geringonça" -, nomeadamente a reabertura da gestão de hospitais do SNS a "parcerias público-privadas" (que a Lei de Bases do SNS praticamente baniu) e um sistema credível de avaliação de desempenho de gestores e profissionais (desde a assiduidade ao output), com consequências na remuneração e na carreira.
Mas não se vê como é que é possível velar pela eficiência de qualquer organização, sem uma séria avaliação de desempenho.
3. Em contrapartida, o autor insiste na proposta de envolver as ordens profissionais do setor na reforma do SNS, o que vai no sentido contrário ao que deve ser seguido, que é de reconduzi-las estritamente à sua missão legal de regulação, disciplina e deontologia profissional, qualquer que seja o enquadramento profissional dos seus membros (SNS ou clínica privada), sem qualquer intervenção nas relações laborais ou na organização dos serviços em que estes exercem a sua profissão.
Como expressão do mais retinto corporativismo profissional ("malthusianismo" profissional, defesa de interesses de grupo à margem do interesse público, etc.), as ordens são naturalmente inimigas de qualquer reforma tendente a conferir maior eficiência ou equidade ao SNS. Contar com elas é um contrassenso.