1. E vai mais um governante constrangido a demitir-se, perante o massacre público subsequente à notícia de que estava sob investigação e perante a posterior acusação formal (conhecida pelo próprio pelos jornais!), por alegadas ilegalidades em anterior cargo público.
Repetiu-se a história, a que me referi já em post anterior: (a) o Ministério Público recebe uma denúncia contra um membro do Governo e inicia uma investigação, como lhe compete, mas a primeira coisa que faz, se o magistrado responsável não gostar do Governo da hora, é deixar sair a notícia para a imprensa, como não lhe compete; (b) a imprensa faz o seu papel, os partidos da oposição juntam-se ao coro e o visado acaba julgado e condenado na praça pública, sem provas nem direito a defesa, sentindo-se obrigado a demitir-se, para não pôr em causa o Governo a que pertence; (c) como tantas vezes tem sucedido, o caso pode vir a dar em nada, por nem sequer haver acusação, ou por o acusado vir ser ilibado e absolvido em tribunal, mas a pena já está aplicada e cumprida, sem apelo nem agravo.
Dificilmente, se alguma vez, a vítima pode vir a recuperar integralmente o seu bom nome e reputação política.
2. Perante mais esta situação, três perguntas se impõem:
- quanto é o PGR abre procedimento disciplinar contra a abusiva divulgação de abertura de investigações, antes da eventual acusação, com evidentes objetivos políticos, sabendo que isso vai acarretar a demissão do visado?
- quando é o PSD deixa de explorar politicamente estas situações, sabendo que, como partido de vocação governamental, também virá a ser vítima delas, quando chegar a sua vez de ser Governo?
- quando é que os primeiros-ministros decidem negar ao Ministério Público o "poder potestativo" de desfazer os seus governos, recuperando o seu inalienável poder de decidir sobre a composição dos seus governos e o momento da sua recomposição?
Sem dúvida, os governos devem pagar pelas malfeitorias dos seus membros, incluindo em anteriores cargos públicos, mas os políticos, só por o serem, não podem ser privados de direitos fundamentais básicos como a não perseguição penal por motivos políticos, a reserva judicial da punição penal (mesmo por "crimes de responsabilidade" política), o direito de defesa dos acusados e a presunção de inocência até à condenação. Num Estado de direito constitucional, não pode valer tudo, mesmo contra os malqueridos políticos.