1. Pronunciando-se sobre o primeiro dos indicadores da crise de justiça enunciado no "Manifesto dos 50 pela reforma da Justiça" (de que sou cossubscritor), que é a sua inaceitável morosidade, sobretudo na justiça administrativa e na investigação penal, a Ministra da Justiça, além de imputar as culpas para os governos precedentes - como se o problema não tivesse décadas! -, aduziu entre os fatores a falta de magistrados.
Mas não tem nenhuma razão. Se pode haver eventualmente défice de funcionários, tal não sucede com os magistrados, pelo contrário: comparativamente, estamos na média europeia quanto aos juízes e a acima dela quanto aos procuradores, como se pode ver aqui. O problema está noutras causas: deficiente gestão das magistraturas, falta de avaliação do seu desempenho, incluindo quanto ao seu output, e uma atitude predominante de laxismo, incluindo quanto ao cumprimento de prazos processuais.
Em vez de aumentar desnecessariamente o número de magistrados, o Governo deveria começar, sim, por uma avaliação externa independente da eficiência do sistema judiciário.
2. O que surpreende também entre nós é a complacência com que a imprensa e a opinião pública encaram a falta de resposta da justiça. Enquanto os atrasos e as falhas no sistema de ensino ou no sistema de saúde são implacavelmente denunciados (e bem!) e podem levar à demissão dos respetivos responsáveis políticos, o mesmo não sucede com o sistema judiciário. Ora, a justiça não é um serviço público menos essencial do que aqueles para vida dos seus destinatários e da coletividade em geral.
Por um lado, embora estatisticamente só uma minoria seja diretamente afetada pela justiça, ninguém pode dizer que "daquela água não beberei". Por outro lado, a justiça é fundamento essencial do Estado de direito, na garantia dos direitos privados, na punição penal, na justiça administrativa e constitucional.
Decididamente, temos de ser coletivamente mais exigentes com a justiça.