1. Merece aplauso este oportuno artigo da Professora Maria de Lurdes Rodrigues - coautora do Manifesto dos 50 para a reforma da Justiça - contra o sentimento de medo inspirado pelos abusos do MP, que o processo disciplinar contra a magistrada Maria José Fernandes, por ter ousado criticar publicamente os abusos praricados, revela.
Com efeito, um dos traços do poder absoluto sem escrutínio externo é o silenciamento da crítica interna e o desterro de quem ouse divergir.
2. Mas não são somente os críticos internos que têm razão para ter medo, mas também os alvos preferidos do lawfare do MP: os titulares de cargos públicos, tendo a própria autora sido vítima da acusação do famigerado crime de prevaricação pelo Ministério Público quando foi Ministra da Educação, de que veio a ser judicialmente absolvida.
Destaco esta passagem do referido artigo:
«Hoje, quem ocupa cargos públicos tem medo de ser transformado em alvo do Ministério Público. E não vale aqui o popular ditado “quem não deve não teme”. Pelo contrário, o que retiramos da reiterada incapacidade de finalizar dezenas de processos com anos, ou de arquivamento ou prescrição [ou absolvição] de outros tantos, é que para temer não é preciso dever».
A receita é conhecida: uma denúncia oportuna de corrupção ou prevaricação, mesmo que patentemente malévola, uma manchete no Correio da Manhã soprada de dentro do MP, o imediato julgamento nas redes sociais, o arrastar da investigação por tempo indefinido, até ao arquivamento ou a absolvição judicial, epílogos quase sempre escassamente noticiados, quando o são, pela mesma imprensa que animou a sumária condenação pública sem defesa.
Ou seja, uma profunda subversão do Estado de direito constitucional (presunção de inocência, segredo de justiça, necessidade e proporcionalidade na restrição de direitos, julgamento em prazo razoável, etc.). Quando ninguém responde por estes abusos do MP, há de facto razão para ter medo.