1. Gouveia e Melo incorre num escusado excesso retórico, quando fala numa «perigosa oligarquia política» alegadamente liderada por Marques Mendes, e constituída por uma «casta política» que se julga «dona da democracia».
Mas tem toda a razão quando denuncia a tentativa - ensaiada por uma parte do comentariado e pelos candidatos oriundos dos partidos, em particular por Marques Mendes - de lhe retirar legitimidade política para ser Presidente, seja pela sua origem militar, seja pelo facto de não ter carreira nem experiênca política.
Na verdade, o cargo presidencial não está vedado a nenhuma categoria de cidadãos nem é reserva dos diplomados em prática política, com exclusão dos "leigos".
2. A meu ver, para desempenhar bem as funções que incumbem ao PR no nosso sistema constitucional - de representação institucional, de moderação da conflitualidade política e de garantia do regular funcionamento das instituições - a carreira militar não é um handicap e a experiência política, embora podendo ser uma mais-valia, não é seguramente uma condição necessária.
Mais importantes do que isso para a magistratura presidencial são seguramente cinco outros requisitos: (i) compromisso incondicional com os valores constitucionais (democracia, Estado de direito, Estado social, autonomia local e regional, etc.); (ii) perceção clara do papel do Presidente no sistema constitucional de separação de poderes, especialmente quanto aos limites dos seus poderes; (iii) estrita imparcialidade partidária, como representante unitário de toda a coletividade nacional; (iv) adesão firme ao princípio republicano da separação entre interesse público e interesses particulares ou de grupo; (v) prudência, ponderação, recato institucional e elevação nas suas decisões e declarações, qualidades que devem ser timbre dos inquilinos de Belém.
Não vejo porque é que Gouveia e Melo há de ser excluído à partida de fazer prova, tal como os demais candidatos, de preenchimento destes requisitos.