segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Eleições (7)

Ao contrário quase tudo correu mal no PS.
E não foi somente a retoma económica e do consumo privado, que ajudou a direita, e a radicalização à esquerda, que ajudou o PCP e o BE. Também não foram somente o "fator Sócrates" e o "fator Seguro", mais a cena do cartazes que perturbaram a campanha.
A meu ver, a principal falha do PS nestas eleições foi não ter aprendido a lição da derrota do Labour há uns meses no Reino Unido. Também aí a oposição de esquerda centrou a sua campanha na crítica radical da austeridade orçamental, negando a retoma em curso, e num programa alternativo despesista e confuso, facilitando ao Governo erigir como fator decisivo o risco político de uma vitória do Labour.
Como aqui fui assinalando (por exemplo, aqui e aqui), o PS deveria ter combatido decididamente o suposto "risco da vitória do PS", tranquilizando convincentemente o eleitorado flutuante do centro sobre a estabilidade financeira e a estabilidade política. O PS não só não o fez como agravou a situação, insinuando a possibilidade de uma aliança de governo com a extrema-esquerda, só tendo corrigido o tiro tardiamente. Aliás, isso não atenuou, antes pelo contrario, a extraordinária agressividade do BE e do PCP contra o PS, como se este fosse o Governo e fosse o inimigo principal a abater.
Ao tentar competir com a extrema-esquerda pelo voto radical, o que se revelou infrutífero (os radicais preferem o original...), o PS enfraqueceu a sua capacidade de disputar o voto do centro, que é onde se ganham as eleições. Perdeu a batalha em ambos os tabuleiros.
Neste contexto, de pouco valeu a convicção, seriedade, determinação e combatividade de António Costa e a o empenho de quase todo o Partido. Há lutas inglórias, assim.
[revisto]

Eleições (6)

É preciso tentar compreender os resultados eleitorais.
Quanto à coligação de direita, tudo lhe correu bem. Teve ajuda decisiva de fatores externos, como a retoma da economia da zona euro, a baixa de juros provocada pelo BCE, a enorme descida do preço do petróleo, etc. Utilizou sem escrúpulos a máquina do Estado e o dinheiro público na campanha eleitoral, com centenas de milhões despejados sobre alguns setores-chave (colégios privados, produtores de leite, pessoal do SNS, etc.). Teve a seu favor a generalidade da comunicação social e um exército de editorialistas e de comentadores combativos. Não escassearam recursos nem meios durante a campanha.
Mas não podemos desvalorizar-se os méritos políticos da própria campanha da direita, bem organizada, bem focada e bem sintonizada. E acima de tudo, estrategicamente centrada sobre um argumento que provou ser decisivo, que foi o da segurança e estabilidade na saída da crise oferecida pela coligação contra o risco e o perigo de regresso atrás imputados ao PS.

Eleições (5)

Esta manhã procuro nos sites dos órgãos de informação a nova composição da AR discriminada por partidos, que são quem propõe candidatos e elege deputados. Em vão. Continuam a apresentar os "deputados da PaF", sem discriminação entre os deputados do PSD e os do CDS. Ora, as coligações eleitorais extinguem-se com as eleições e a AR é composta por partidos.
É isto o jornalismo que temos!

Eleições (4)

1. Tendo a coligação PSD+CDS ganho as eleições, embora sem maioria absoluta, e sendo o PSD o maior partido parlamentar, vamos ter mais um governo minoritário da direita (o que já não sucedia há trinta anos), dado estar fora de causa um acordo de governo com o PS assim como uma coligação de governo alternativa do PS com os partidos à sua esquerda, como o líder do PS bem expôs.
O que há de original é o facto de ser o primeiro governo minoritário de coligação.
O Presidente da República vai ter de esquecer a sua ideia de um governo com apoio parlamentar maioritário, que aliás já tinha convenientemente omitido na sua mensagem pública nas vésperas das eleições.

2. Esta situação governativa vai ser especialmente exigente para o PS, que vai ter de conjugar uma oposição forte mas responsável com a resistência às pressões do PCP e do BE para um derrube conjunto do Governo. Como mostrei aqui, sendo impossível um governo da pretensa "maioria de esquerda",  o PS sabe que só pode permitir-se derrubar o governo quando esteja em condições de ganhar as eleições que inevitavelmente se seguiriam.

Eleições (3)

Os resultados demonstraram as virtudes das coligações eleitorais, como aqui se assinalou, permitindo transformar derrotas previsíveis em vitórias,
Por um lado, tendo em conta que a coligação de direita só teve uma vantagem de 6 pp sobre o PS e que o CDS vale mais do que isso, parece seguro concluir que, se ambos tivessem concorrido separados, o PSD teria ficado atrás do PS, que teria ganho as eleições. Por outro lado, a junção dos votos permitiu uma majoração do número de deputados eleitos, que podemos cifrar sem nenhum exagero num boa meia dúzia de deputados a mais do que teriam os dois partidos somados se tivessem concorrido separados, permitindo ao PSD surgir com a maior representação parlamentar.
Chapeau!

Eleições (2)

A multiplicação de partidos candidatos às eleições não trouxe uma correspondente fragmentação da representação parlamentar.
Sem grande surpresa, como aqui se foi antecipando, tanto o Livre/TdA como o PDR ficaram pelo caminho, verificada a sua inanidade política e a falta de espaço político próprio.
Surpresa é a eleição de um deputado do PAN (Pessoas, Animais, Natureza), o que vai permitir colocar na agenda política questões como a eucaliptização galopante do país e as touradas. Bem-vindos!

Eleições (1)

1. Como a generalidade das sondagens indicavam, a Coligação PSD/CDS ganhou folgadamente as eleições, com cerca de 38% dos votos e cerca de 6 pp de vantagem sobre o PS, mas longe da maioria absoluta com que chegou a sonhar, com base em sondagens ou previsões pouco sérias. Mercê dessa vantagem o PSD é também o partido com maior representação parlamentar, o que afasta a questão por mim suscitada caso a Coligação ganhasse as eleições sem que o PSD tivesse mais deputados do que o PS.

2. Com menos de 33% dos votos o PS fica muito aquém dos seus objetivos eleitorais, ficando mesmo abaixo da média do partido nas eleições parlamentares realizadas atá agora (33,32%). Claramente, parafraseando um dito camoniano, o PS não ganhou o centro por amor à esquerda e não ganhou a esquerda por amor ao centro.

3. Em relação às eleições de 2011, os partidos de direita perdem 13 pp e o PS ganha 4,5 pp. Quem beneficia da diferença é sobretudo a esquerda à esquerda do PS (com relevo para o BE), que em conjunto alcança cerca de 18,5% e que sobe uns 6 pp em relação a 2011, ultrapassando o seu melhor resultado histórico.
Um feito que traduz a acrescida radicalização política trazida pela recessão e pela crise social dos últimos quatro anos.
[revisto]

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

As aparências iludem

1. Os círculos políticos e mediáticos afetos à direita conseguiram apresentar as sondagens eleitorais como uma surpreendente "vitória da coligação" e uma inesperada "derrota do PS". Mas as coisas podem não ser bem assim. Um pouco de história eleitoral dá outra perspetiva.

2. De facto, quanto ao primeiro aspeto, mesmo que a coligação tivesse os 37,7% que as últimas sondagem lhe dão em média, esse seria de longe o segundo pior resultado dos dois partidos somados desde sempre (só fizeram pior em 2005), além de perderem de mais de 13 pp desde 2011!
Quanto à surpresa da "derrota"  do  PS, também é de assinalar que em todas as 13 eleições até agora realizadas o PS só teve mais votos e deputados do que os dois partidos da direita em três delas (1995, 1999 e 2005), tendo ganho outras três com menos votos e deputados do que a soma dos dois (1976, 1983, 2009). Importa também referir que três das seis vitorias do PS foram obtidas com menos de 37% dos votos, sendo uma delas com 34,87% (1976), não muito acima do que as sondagens agora lhe dão e com os dois partidos da direita a somar mais de 40% (muito acima do que se prevê que tenham agora).

3. Mais importante do que isso é saber que a eventual vitória eleitoral da coligação não dá ao PSD automaticamente uma maioria de deputados, havendo que descontar os do CDS. Se o PS, mesmo com menos votos do que o PSD e o CDS juntos, tiver mais deputados do que o PSD, o partido vencedor das eleições é afinal o PS, como maior partido parlamentar, como sucedeu no passado nas três referidas situações.

"Asfixia democrática"

Ao longo desta campanha eleitoral foi-se tornando claro que a Coligação de direita não era composta só pelos dois partidos que a formaram mas também por um outro poderoso parceiro, a comunicação social, sobretudo através dos seus editorialistas e comentadores, esmagadoramente alinhados com as suas posições.
Com exceção da televisão e da rádio públicas e pouco mais, a generalidade dos media mandou a imparcialidade e a isenção política às urtigas e tomou partido contra o PS, embora sem ter a coragem de o assumir explicitamente, como é norma em alguns países. Na televisão de sinal aberto em especial, a confusão entre "comentador político" e "comentador de direita" tornou-se uma tautologia, como alguém disse certeiramente. Os dois comentadores mais mediáticos, por coincidência ex-presidentes e ex-ministros do PSD, não tiveram escrúpulos políticos em manter o seu programa durante a campanha eleitoral e em saltar do estúdio para o comício e vice-versa. Duvido que isso ocorra em algum outro país democrático.
A democracia liberal supõe um "mercado livre de ideais e de opiniões". Mas como sucede com o mercado de bens e serviços, é precisa uma concorrência efetiva que impeça monopólios no acesso e abusos de posição dominante no debate político nos meios de comunicação, sob pena de se cair na "asfixia democrática" que há anos um dirigente político da direita denunciou com muito menos fundamentos do que hoje.


Voto radical

Um dos pontos interessantes a observar é a votação nos partidos à esquerda do PS, nomeadamente PCP e BE.
As sondagens revelam um crescimento dos dois partidos em relação a 2011, o que traduz o aumento do voto radical resistente à lógica do voto útil no PS. Resta saber se o PCP e o BE vão superar em conjunto o score de 2009 (17% e 31 deputados), mesmo assim longe dos resultados das primeiras eleições do regime democrático, em que esse setor, nessa altura hegemonizado pelo PCP, ultrapassou os 18% e chegou aos 44 deputados (1983).
Incerta também é a possibilidade de o Livre / TPA eleger deputados, havendo indicações de que ele pode estar a ser esvaziado pela pressão do voto útil no PS e pela dinâmica revelada pelo BE.

Manigâncias


1. A ideia de criar um grupo parlamentar conjunto do PSD e do CDS, caso a coligação eleitoral entre ambos tinha mais votos mas o PSD tenha menos deputados do que o PS  constitui uma canhestra manobra política em que só os seus autores podem acreditar. Além de não resolver nada, a ideia é estúpida.
Primeiro, não resolve nada, porque o PSD continuaria a não ser o primeiro partido na AR. O grupo parlamentar conjunto não daria ao PSD os deputados que lhe faltem. Os deputados do CDS não se podem transferir para o PSD, pois perderiam o mandato.
Segundo, seria um solução estúpida, pois os dois partidos deixariam de ser considerados separadamente para efeitos de composição da mesa da AR, de composição e repartição das presidências das comissões parlamentares, de tempos de intervenção, de número de interpelações, etc. Não é por acaso que nunca houve nenhum grupo parlamentar conjunto até agora em quatro décadas de regime constitucional entre nós.

2. Mas esta manobra mostra até que ponto a direita pode ir no desrespeito pela democracia parlamentar na sua ânsia de manter o poder a todo o custo.
Numa democracia representativa de base partidária, as eleições servem para medir a representatividade dos partidos, que são os únicos dramatis personae de uma demoracia parlamentar. O facto de alegadamente os dois partidos terem feito um acordo para governarem em comum só os vincula a eles e só tem efeitos se o PSD for chamado a formar governo, para o que só é elegível à partida se for o maior partido parlamentar.
Não há golpe de secretaria que supere o eventual défice de representatividade parlamentar do PSD.

Adenda
Afinal, a peregrina ideia do grupo parlamentar conjunto viola explicitamente o próprio acordo de coligação eleitoral entre o PSD e o CDS. Lá se vai a precipitada manigância!

Manipulação (quase) absoluta


A campanha militante e descarada dos média a favor da coligação de direita - que é um dos traços marcantes destas eleições - atinge em alguns casos foros da mais ostensiva manipulação informativa, como nesta manchete do Sol de hoje.
Primeiro, o semanário atribui uma média de 41% à coligação nas sondagens; ora, as sondagens referidas pelo próprio semanário não dão essa média e as três sondagens ontem publicadas (muito próximas entre si) dão uma média inferior a 38%. Mesmo com esse bónus superior a 3%, a coligação de direita não atinge a maioria absoluta (a não ser que agregasse os três deputados imaginados para o PDR!...), pelo que a manchete a subentender o contrário é pura manipulação.
Segundo, no diagrama do hipotético parlamento resultante dessa previsão, é apresentada a soma dos deputados do PSD e do CDS, sem discriminação do número de cada um, como se a coligação se mantivesse depois das eleições, o que, como se sabe, não é verdade. Ora, mesmo com o generoso bónus que o semanário dá aos dois partidos em conjunto, o PSD tem somente mais seis deputados do que o PS, o que deixa entender que com os resultados bem inferiores das sondagens de ontem para a coligação de direita os socialistas poderiam ter o maior grupo parlamentar, o que poria em causa a legitimidade do PSD para formar governo.

É viável uma coligação de governo à esquerda?


Eis a introdução da minha coluna semanal de ontem no Diário Económico, ou por que é que não é viável uma coligação do PS com o PCP nem com o BE.

Adenda
António Costa já veio dizer que não está a pensar num governo de coligação mas sim num governo do PS com entendimentos de geometria variável com outros partidos. Parece-me, porém, que esse esclarecimento, que a meu ver é crucial, precisa de maior difusão.

O que está em causa

As três sondagens eleitorais ontem divulgadas -- com resultados muito próximos entre si -- permitem duas conclusões. Por um lado, embora continuem a colocar a coligação PSD+CDS à frente, com uma média de 37,7% , ela está em perda, longe dos 40% que chegou a atingir há dias (e com menos 13 pp do que em 2011!). Por outro lado, o PS, com uma média de 32,5%, fica acima de anteriores sondagens e encurta a distância para a coligação, agora de cerca de 5 pp.
A serem estes os resultados finais - o que pode não ser o caso se se confirmar a perda de força da Coligação -, a conclusão mais óbvia é que se esfumou definitivamente a miragem da maioria absoluta que perpassou pelas hostes da direita. Além disso, se se verificar uma redução da margem sobre o PS para baixo dos 5%, então é provável que o PSD nem sequer seja o partido com mais deputados, perdendo então qualquer legitimidade para formar governo.
E é isso que está em causa!

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Aventureirismo político

O Livre /TPA veio propor um pacto pré-eleitoral entre todas as forças de esquerda comprometendo-se antecipadamente a negociar entre eles uma solução governativa pós-eleitoral e a "chumbar" um eventual governo minoritário da direita.
Assim se revela a compulsiva tendência de algumas esquerdas para o aventureirismo suicidário. Um pacto desses seria uma benção para a coligação PSD-CDS, não somente porque traduziria uma confissão de derrota antecipada do PS mas principalmente porque arruinaria as suas hipóteses de disputar o eleitorado indeciso do centro, que não anseia propriamente por um governo de todas as esquerdas. Em segundo lugar - sob pena de repetir o disparate de 1997, em que o PS alinhou irresponsavelmente no derrube do Governo minoritário de Cavaco Silva sem ter uma alternativa, assim abrindo caminho à primeira maioria absoluta cavaquista -, o PS não pode nunca comprometer-se antecipadamente no derrube de um eventual governo minoritário da direita sem dispor concretamente de uma alternativa de governo maioritário credível e sólida.
O PS é um partido de esquerda mas é um partido responsável e de governo. O PS não pode portanto alinhar em aventuras destas. A prioridade do PS deve continuar a de lutar por eleger mais deputados e ter direito a formar governo e não a de especular sobre o que fazer se for a direita a ganhar as eleições.
Decididamente, com potenciais aliados como este, o PS não precisa de adversários!

"Plano B"

Portas desafia Costa a esclarecer como vai governar se o PS ganhar sem maioria absoluta. Mas é evidente que ele deveria começar por responder ele mesmo justamente a esse mesmo desafio: como vão o PSD e o CDS governar se forem eles a ganhar sem maioria absoluta?
Ora, como tem argumentado, com razão, António Costa, será mais fácil ao PS encontrar apoios à sua esquerda e à sua direita (conforme os temas), visto que se encontra no centro do espetro político e parlamentar, do que a uma eventual coligação PSD-CDS, que está acantonada à direita do leque político-parlamentar, não tendo ninguém com quem negociar desse lado.
Além disso, enquanto o PS tem uma larga experiência de governar sem maioria parlamentar (e até conseguiu cumprir uma legislatura inteira nessas condições -- o I Governo Guterres, 1995-1999), a direita só tem a longínqua experiência do efémero Governo Cavaco Silva I (1985-1987).
Portanto, no campeonato dos governos sem maioria absoluta, o PS ganha claramente, não é?

Formação do Governo

1. Um leitor pergunta-me se o Presidente da República pode estabelecer condições prévias à escolha do primeiro-ministro depois das eleições e se isso pode levar à nomeação de um primeiro-ministro que não seja o líder do partido com maior representação parlamentar (seja o PSD ou o PS).

2. No nosso sistema político-constitucional, a formação de um novo Governo depois das eleições parlamentares ocorre em duas fases.
Primeiro, há a indigitação do primeiro-ministro e a sua nomeação, que naturalmente deve recair no líder do partido com maior representação parlamentar, mesmo sem maioria absoluta; trata-se do único critério objetivo compatível com a Constituição (e assim sucedeu sempre). Depois, há a sujeição do Governo à apreciação parlamentar, só podendo ser rejeitado por uma maioria absoluta dos deputados. Este sistema permite a "investidura por inércia" de governos minoritários, que "passam" sem ser explicitamente  rejeitados, ou porque nem sequer houve proposta de rejeição ou porque ela não obteve a referida maioria.
Ao longo destas quatro décadas, nenhum dos vários governos minoritários saídos de eleições foi rejeitado na sua passagem pelo Parlamento. Mas nada garante que assim continue a ser.

3. Respondendo agora à questão concreta: pode o PR estabelecer condições prévias à nomeação do Primeiro-Ministro? A reposta é: pode, desde que sejam condições objetivas e não discriminatórias. Assim, se o maior partido não dispuser de maioria parlamentar absoluta, o PR pode exigir a garantia de apoio parlamentar maioritário, mediante coligação governativa ou acordo formal de sustentação parlamentar (tal como anunciado várias vezes por Cavaco Silva).
Desse modo, se o primeiro indigitado primeiro-ministro não conseguir satisfazer essa condição, poderá ser nomeado primeiro-ministro outro candidato que o consiga.

4. Note-se, no entanto, que entre nós o PR não tem meios de forçar os indigitados primeiros-ministros a formar governos com apoio parlamentar maioritário, pois não dispõe do poder de ameaçar com a convocação imediata de novas eleições (inconsequentemente a Constituição proíbe a dissolução da AR nos primeiros seis meses depois de uma eleição).
Ora, como o PR tem de nomear efetivamente um novo Governo (pois o Governo cessante perdeu legitimidade política e está em simples funções de gestão), o PR pode ter de abandonar a sua condição de governo maioritário numa segunda ronda e conformar-se com um governo minoritário do partido com maior representação parlamentar (eventualmente tornado menos minoritário mediante aliança com outro).
E se este for rejeitado na AR, o PR tem de voltar ao princípio, até haver um Governo em plenitude de funções.

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Vodka com laranja


Esta revelação do Expresso explica a extraordinária agressividade da campanha eleitoral comunista contra o PS, muito mais virulenta do que contra a própria coligação de direita, como se fosse aquele e não esta que esteve no governo estes quatro anos.
É evidente o interesse objetivo da direita em que o PCP não perca votos para o PS. O que já surpreende é que essa aliança objetiva se transforme numa cumplicidade subjetiva...

A inventona do "risco de uma vitória do PS"


A coligação da direita passou a sua campanha a agitar com êxito o espantalho do "risco de uma vitória do PS" para as contas públicas e para a economia (a que infelizmente o PS não soube opor-se eficazmente).
Este conhecido gestor, que se situa no centro-direita e que não é dado a hipocrisias, coloca as coisas no seu devido pé. Uma voz de sensatez.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Rigor orçamental


Eu também quero crer que o rigor orçamental (o que não é bem a mesma coisa que austeridade orçamental) veio para ficar, quem quer que ganhe as eleições. Mas é indesmentível que há pessoas que receiam que uma vitória do PS posso trazer de novo o descontrolo das contas públicas, pondo em causa a estabilidade financeira do País. Por isso, penso que o PS deveria afastar decididamente esse receio, sob pena de alienar ingloriamente o apoio desses eleitores.

Assimetria


O Jornal de Notícias revela uma coisa óbvia, a saber que as coligações eleitorais favorecem os partidos coligados, os quais, pela junção dos respetivos votos, elegem mais deputados em conjunto do que elegeriam separadamente.
De resto, os dois partidos da direita só fizeram a coligação justamente para esconder ou atenuar a sua previsível derrota (pelo menos na altura da sua constituição) e para maximizar o número de deputados eleitos. Teoricamente o PSD e o CDS podem eleger mais deputados do que o PS mesmo que tenham menos votos.
Enquanto a direita se entende e concentra forças, à esquerda prevalece a fragmentação (ainda maior do que usualmente). O resultado é o desperdício de muitos votos à esquerda e o menor custo eleitoral dos deputados da direita...

Treinador de bancada

Sempre sob dois fogos cruzados - atacado pela direita por uma suposta "guinada à esquerda" e pela esquerda radical por alegadas "políticas de direita" -, o PS hesita entre competir com a coligação de direita pelo voto do centro ou competir com o PCP e o Bloco pelo voto de esquerda, tentando não desguarnecer nenhum dos flancos.
Há quem defenda que, sendo profundo o descontentamento popular com o Governo, o PS deve privilegiar a atração do voto à esquerda. Não estou convencido. Não recordo nenhuma vitória eleitoral (do PS ou do PSD) sem cativar a maioria do eleitorado flutuante do centro (que, por definição, não é adepto de mudanças radicais nem do risco político). É aí que se decidem sempre as eleições.

Secessão


Embora sem maioria absoluta de votos, os partidos independentistas catalães obtiveram uma maioria absoluta de deputados no parlamento regional (fonte da imagem: El País), o que consubstancia mais um passo no sentido de secessão catalã. A intransigência negocial do PP espanhol e a incapacidade de ter avançado a tempo com uma solução federal - única via para salvar a unidade de Estados plurinacionais - arrisca tornar o processo separatista irreversível.
Quanto à relação de forças entre os partidos nacionais, o Cidadãos (25 deputados) supera de longe o PP (11) mas o Podemos (11) não conseguiu ultrapassar os socialistas (mesmo assim reduzidos a 16 deputados). Resta saber se estes resultados dizem alguma coisa quanto às eleições parlamentares nacionais, a realizar em novembro próximo.

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Esperança


Lentamente, as touradas - essa barbárie ibérica que nos envergonha no mundo - vão recuando em Espanha, como mostra este mapa publicado pelo El País, incluindo a proibição pura e simples (Canárias, Catalunha, Palma de Maiorca, etc.) e o fim das subvenções municipais. Referendos sobre a proibição estão marcados em várias cidades. Apesar do poderoso lóbi tauromáquico, a história da decência humana avança.
Em Portugal, dada a existência de "aficionados" da tortura animal em todos os partidos, não é provável que algum tome uma iniciativa contra as touradas. Por isso, para quando um referendo sobre o assunto?

Abuso de autoridade

Foi com este mesmo título, abuso de autoridade, que desde o início qualifiquei a atrabiliária condução do processo contra Sócrates, começando pela detenção em pleno aeroporto e continuando no injustificado prolongamento da prisão preventiva e da proibição de acesso ao processo (enquanto a acusação ia destilando seletivamente para a "imprensa amiga" os materiais que lhe interessavam).
Agora o Tribunal da Relação vem dar razão a Sócrates e acusar o Ministério Publico e o juiz de instrução de violação dos seus direitos no caso especifico da manutenção desde 2013 do chamado "segredo de justiça interno", ou seja, de interdição de acesso da defesa ao processo.
O que é que o Ministério Público e o juiz de instrução procuravam esconder tão prolongadamente vai agora finalmente saber-se.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

O Secretário de Estado não tem nenhuma razão

1. Pedro Lomba, Secretário de Estado no atual Governo, apressou-se a contestar no Público o meu artigo de hoje no Diário Económico (ver meu post anterior) sobre a irrelevância das coligações eleitorais para efeitos de formação de governos. Mas a pressa e a fidelidade governativa são maus conselheiros. É ele que não tem razão nenhuma. Se a Coligação de direita não tem melhores argumentos, é melhor desistir deste ponto.

2. É evidente que o que conta é o número de mandatos saídos das eleições -- fui eu que o disse. Mas, ao contrário do que ele afirma, os mandatos são dos partidos, não das coligações. Os candidatos são dos partidos, os deputados são dos partidos. A coligação eleitoral é uma simples barriga de aluguer, que só serve para tirar vantagem da concentração eleitoral para eleger mais deputados do que os partidos elegeriam separadamente.

3. P. Lomba contesta que as coligações eleitorais terminem com a eleição.
Mas isso não é matéria de opinião. Elas caducam com a eleição porque assim o estipula o art. 22º da lei eleitoral - norma que manifestamente ele ignora (o que arruína toda a sua argumentação) - e porque a simples lógica assim o impõe, uma vez esgotada a missão da coligação eleitoral. Isso vale para a PaF e para a CDU, com valeu para todas as coligações eleitorais anteriores.
É evidente que os partidos de uma coligação eleitoral podem depois formar nova coligação para outros efeitos, mas isso não ressuscita a anterior coligação eleitoral. Por isso, é impossível estabelecer a continuidade ou um nexo político entre uma coligação eleitoral e uma posterior coligação governamental.

4. Na nossa democracia parlamentar quem forma os governos são os partidos representados no parlamento e não as eventuais coligações eleitorais pretéritas. Quando o Presidente da República tiver de iniciar a constituição de novo governo, os seus únicos interlocutores são os líderes dos partidos representados na AR e não alegados lideres de uma dissolvida coligação eleitoral (que aliás nunca teve uma liderança única, por não ter identidade própria).
Seria aliás politicamente inaceitável numa democracia representativa que um partido político valesse não pelo número de mandatos que tem no parlamento mas sim pelo número dos seus deputados... e dos de outro partido. Um partido não pode "majorar" ou "aditivar" a sua representação parlamentar com os deputados de outro partido. Cada partido vale por si!

5. Em conclusão, como sempre, o PSD só pode vir a formar governo e reconstituir uma eventual coligação de governo com o CDS (ou com outro partido!) se for o partido com mais mandatos populares e não por ter tido mais votos (ou ter mais deputados) junto com outro. É assim a democracia parlamentar!

Ao contrário das aparências


Eis a introdução da minha coluna semanal de hoje no Diário Económico, sobre um tema em que as aparências podem enganar: se a Coligação PSD-CDS ganhar as eleições, isso quer dizer automaticamente que o PSD é o partido vencedor e tem direito a formar governo, mesmo que não seja o partido com mais deputados na AR?

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Farsantes

Um dirigente do PSD resolveu ensaiar uma pedestre intriga, inventando alegados  «distanciamentos de figuras do PS como Francisco Assis, Vital Moreira ou Jaime Gama» em relação à campanha eleitoral do PS.
No que me diz respeito trata-se de uma pura ficção, como é notório para quem lê este mesmo blogue. Decididamente, em disputa eleitoral a direita não conhece regras nem respeita factos.

O mal maior

Para os eleitores de esquerda que têm reservas em relação ao PS (por "não ser suficientemente de esquerda"), a questão a que têm de responder nas eleições consiste mais uma vez no seguinte:
-- é preferível votar no PS para vencer a direita e permitir um governo de esquerda, mesmo que moderada?
-- ou é preferível votar nas esquerdas à esquerda do PS para reforçar as forças de protesto, mas facilitando uma vitória da direita e a manutenção do atual Governo?
Para as pessoas que se consideram à esquerda do PS e que não estão vinculados a outros partidos, um governo PS deveria sr preferível a um governo de direita, ou pelo menos um "mal menor" (basta ter em conta a construção do Estado social entre nós). Mas a história das eleições mostra que há quem prefira o mal maior.

Adenda
Para além da questão geral acima enunciada há ainda a questão do voto inútil nos círculos eleitorais (e são a maioria) onde os partidos à esquerda do PS não têm possibilidade de eleger nenhum deputado. Aí, a única possibilidade efetiva de contribuir para a vitória da esquerda e para uma derrota da direita é mesmo votar no PS.

Treinador de bancada

A meu ver, apesar de falso, o principal argumento eleitoral da coligação de direita -- "custou muito pôr as contas públicas em ordem (e os resultados positivos começam a aparecer), não deixem agora o PS voltar a estragar tudo com o seu compulsivo despesismo público" -- está a obter sucesso em setores do voto flutuante do centro (que é aquele que decide as eleições), que prezam a segurança e têm aversão ao risco político.
Em vez de se concentrar em negar a primeira parte do argumento, como tem feito, o PS devia preocupar-se em desmentir a segunda parte, assumindo e sublinhando compromissos estritos quanto a disciplina da despesa pública, rigor das contas públicas e cumprimento imperativo das metas do défice orçamental (aliás estabelecidas no programa eleitoral). Anular convincentemente o argumento do medo e do "risco PS" que a direita está a martelar devia ser uma prioridade. Não basta dizer que é um espantalho agitado pela direita (os espantalhos não votam mas assustam os eleitores menos informados).
[revisto]