(Foto: Visão)
1. Esta proposta de reconhecimento e valorização de "votos contra" em eleições uninominais (ou por lista) não faz nenhum sentido.Nas eleições vota-se, ou não, nos candidatos em liça, não a favor ou contra eles, como sucede nos plebiscitos pessoais, próprios de regimes autoritários e/ou populistas. Mesmo nos referendos vota-se sim ou não a certa solução política ou legislativa colocada à decisão dos cidadãos; não se vota em pessoas, nem a favor ou contra elas. Importa manter clara esta distinção.
Nas eleições, os modos de exprimir discordância ou rejeição política de todos os candidatos são o voto branco e o voto nulo, mas estes não contam para a eleição, ou não, do(s) candidatos, salvo se houver uma norma eleitoral que exija o voto favorável de uma certa percentagem mínima de votantes (ou até de eleitores). Na falta de tal norma expressa, numa eleição uninominal é eleito o candidato com mais votos (maioria relativa), independentemente da percentagem em relação ao número de votantes.
Numa eleição com um só candidato, por não se terem apresentado outros, é juridicamente indiferente o número de votos expressos válidos e o número de votos brancos e/ou nulos. O elevado número de votos brancos ou nulos pode afetar a legitimidade e autoridade política do eleito, não o resultado nem a validade da sua eleição. Os votos brancos não apagam outros tantos votos expressos, nem os votos nulos anulam outros tantos votos válidos.
2. Pela mesma razão, também discordo absolutamente da ideia, por vezes apresentada de modo pouco avisado, de reconhecer valor eleitoral aos votos brancos / ou nulos nas eleições parlamentares, deixando por atribuir um número de mandatos proporcional à taxa desses votos.
A democracia representativa visa representar quem participa na escolha dos seus representantes, não quem se recusa a tê-los, que muitas vezes é um voto contra a própria democracia representativa. Os "brancosos" e "nulosos" não devem ter "representação" virtual no parlamento, através de cadeiras vazias, justamente porque se recusam a participar na escolha de representantes.
Numa democracia liberal, quem não está satisfeito com a oferta eleitoral que lhe é apresentada deve promover o seu alargamento, sendo embora evidente que não pode haver tantos partidos quantas as preferências individuais privativas de cada eleitor, como por vezes parece ser a exigência. Mesmo num sistema, como o nosso, em que só os partidos políticos podem apresentar candidaturas, a verdade é que é relativamente fácil criar um novo partido (como, aliás, teria de ser, sob pena de excessiva restrição democrática), como tem mostrado a nossa história constitucional e é confirmado pelo registo de partidos no Tribunal Constitucional (neste momento, existem 22!).
Adenda
Um eleitor pergunta quantas vezes recorri ao voto branco ou nulo. A reposta é nunca, e também nunca me abstive. Mas se me exigisse a concordância com todas as propostas dos partidos/candidatos em que votei, nunca teria deixado de votar em branco! Suponho que se passa com muitos outros cidadãos: só concordaremos em absoluto com o nosso próprio partido uninominal! Mas isso não há...