quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Pandemia (42): Prorrogação do estado de emergência

1. Como se esperava, o Presidente da República propõe-se prolongar o estado de emergência por mais duas semanas, para combater a segunda onda da pandemia, afetando o exercício de vários direitos fundamentais, em termos a concretizar pelo Governo. Embora com a oposição irresponsável dos partidos do costume, a prorrogação deve obter de novo um amplo respaldo parlamentar - e ainda bem!

Talvez para responder à crítica dirigida à anterior declaração do estado de emergência, segundo a qual não se previa nenhuma suspensão de direitos fundamentais, mas apenas a sua restrição - para o que, em princípio,  não é necessário declarar o estado de exceção constitucional -, o Presidente vem agora prever a «suspensão parcial» dos mesmos direitos fundamentais.

E desta vez há de facto suspensão verdadeira e própria de alguns direitos fundamentais .

2. No entanto, a expressão «suspensão parcial» não é especialmente feliz neste contexto, para abarcar todas as medidas previstas, visto que, por um lado, onde há suspensão de direitos, trata-se de suspensão integral (nomeadamente a suspensão do direito à liberdade pessoal, no caso de confinamento compulsivo, e da liberdade de empresa, no caso de encerramento administrativo de empresas); por outro lado, noutros casos, continua a tratar-se de meras restrições e não de suspensão de direitos (como é o caso das limitações à liberdade de deslocação e à liberdade económica), pois, embora intensas, elas não derrogam o "conteúdo essencial" dos direitos afetados.

Em situações de exceção constitucional, a clareza conceptual é um valor em si mesma, em prol da segurança jurídica.

Adenda
Curiosamente, desta vez não se prevê nenhuma suspensão nem restrição da liberdade de reunião e de manifestação, nem sequer nos municípios mais problemáticos, apesar do manifesto risco acrescido de contaminação dos ajuntamentos. Terá pesado aqui o desejo de não perturbar o congresso do PCP. Manifestamente, mesmo quando está em causa a saúde pública e o direito à saúde, "valores mais altos se alevantam" (nomeadamente a aprovação do orçamento de Estado)...

Adenda (2) 
Em relação à adenda anterior, um leitor objeta que tanto o PR como o Governo têm de respeitar a Lei do Estado de Sítio e do Estado de Emergência, segundo a qual «as reuniões dos órgãos estatutários dos partidos políticos, sindicatos e associações profissionais não serão em caso algum proibidas, dissolvidas ou submetidas a autorização prévia». Tem razão; descuido meu. Todavia, trata-se de um preceito manifestamente excessivo quanto às reuniões de congressos, que vai muito além da Constituição e que pode prejudicar gravemente os objetivos do estado de exceção constitucional. Aliás, ainda há dias a DGS pronunciou-se contra a reunião da assembleia dos beneficiários da Caixa de Previdência de Advogados e Solicitadores (CPAS), sem que se tivesse levantado alguma objeção dos interessados. O que se não compreende é que o PCP não tenha espontaneamente adiado o Congresso e que a DGS o não tenha desaconselhado.