domingo, 24 de outubro de 2021

Assim vai a política (9): O fim de uma ilusão

1. Depois das substanciais cedências adicionais do Governo, o PCP só pode manter o seu propósito de chumbar o orçamento, se já o tinha decidido antecipadamente, qualquer que ele fosse, e só manteve a aparência de negociações com "reserva mental" (o BE, esse, desde cedo que se pôs de fora...).

Em qualquer caso, o PCP será o grande vencedor do processo orçamental: viabilizando o orçamento, obtém importantes ganhos políticos, impensáveis à partida, impondo um claro revés político ao Governo, que sairá debilitado desta provação, vencido pela chantagem política comunista; chumbando o orçamento, derruba inexoravelmente o Governo e pode alterar o xadrez político nacional, abrindo um ciclo de imprevisível instabilidade política.  

Depois de ter sido o grande derrotado das recentes eleições autárquicas, acelerando o seu declínio, o PCP torna-se inesperadamente o principal protagonista da vida política naci0nal. Chapeau!

2. Em qualquer caso, quem perde sempre é o País. 

Havendo orçamento nos termos oferecidos ao PCP, teremos mais despesa pública e mais rigidez do mercado laboral, sacrificando a consolidação das contas públicas e  a competitividade da economia, respetivamente, e isto sem contar com as novas alterações que a votação na especialidade pode trazer. 

Havendo rejeição do orçamento, teremos crise política e convocação de eleições antecipadas, com uma prolongada fase de governação com capacidade política e orçamental diminuída, incapaz de fruir plenamente do Programa de Recuperação e de Resiliência, até à formação de novo Governo (não se sabe com que base partidária e com que orientação política) e à aprovação de novo orçamento (não se sabe com que maioria), num prazo incerto.

Se é de evitar a incerteza política imediata da segunda opção, não podem, porém, desvalorizar-se os custos duradouros de um mau orçamento. 

3. Em qualquer das hipóteses, tudo parece indicar o fim da solução governativa de governo minoritário do PS, baseada na aliança privilegiada com os partidos da sua esquerda parlamentar, incluindo em matéria orçamental, prescindindo de alianças de geometria parlamentar variável, como era tradicional nos governos minoritários do PS antes da experiência da "Geringonça" de 2015. 

Se as divergências político-ideológicas de fundo (União Europeia, alianças internacionais, economia de mercado, disciplina das finanças públicas, etc.) impedem uma verdadeira coligação de governo do PS com os partidos da "esquerda da esquerda", esta provação orçamental vem mostrar que uma tal aliança também não é possível em termos de gestão económica e orçamental sustentável, frustrando a tentativa de os trazer para o "arco da governação". 

Ao optar, à partida, por negociar exclusivamente com a sua esquerda parlamentar, o Governo tornou-se inapelavelmente refém do seu sectarismo doutrinário e do seu oportunismo político, expondo a sua própria vulnerabilidade política. 

Adenda 
No parecer do Conselho das Finanças Públicas sobre a proposta do orçamento lê-se que «uma comparação com o ano de 2019 revela que mesmo removendo da despesa os efeitos das one-off, o impacto do PRR e as “medidas de emergência”, a despesa primária prevista para 2022 situar-se-á 3,4 p.p. do PIB acima do valor pré-pandemia.» Ora, com a despesa adicional resultante das cedências do Governo ao PCP, o excesso será ainda maior. Um tal ritmo de crescimento da despesa primária, em grande parte despesa corrente, é pura e simplesmente insustentável.

sexta-feira, 22 de outubro de 2021

Ai o défice (15): O sorvedouro do SNS

1. Penso que entre as piores cedências que o Governo pode fazer para tentar assegurar a passagem do orçamento para 2022 estão as que aumentam estruturalmente a despesa pública, comprometendo orçamentos futuros, como é o caso da criação de novas carreiras nos serviços públicos, nomeadamente a carreira de "técnico auxiliar de saúde" no SNS, a instância do BE, com toda a despesa pública adicional que isso comporta, sem nenhuma avaliação prévia da necessidade dessa nova carreira.

Surpreende-me que o Ministro das Finanças tenha validado essa cedência, mesmo que conte limitar os seus efeitos financeiros no ano que vem. O problema é o que vem depois. Duvido que esta medida avançasse com Mário Centeno...

2. Conto-me entre os que entendem que os problemas do SNS são menos os do seu sempre referido subfinanciamento do que os problemas de organização e de gestão que não permitem utilizar os recursos disponíveis de forma eficiente, desde logo por falta de mecanismos de avaliação de desempenho de profissionais e de instituições e de remuneração de acordo com o desempenho.

Seria bom acreditar nas palavras da Ministra da Saúde quando declara que «cada euro investido no SNS significa mais cuidados de saúde». A verdade é que não parece haver correspondência direta entre o avultado aumento do orçamento do SNS desde 2015 e um acréscimo côngruo de prestações de saúde (consultas, exames, cirurgias, etc.). O SNS não tem deixado de perder quota de cuidados de saúde para a medicina privada.

Julgo, por isso, que se justifica um profundo spending review do SNS, com vista a identificar os fatores de ineficiência e a inventariar os possíveis ganhos de eficiência. Despejar mais milhões de euros, mantendo tudo na mesma, não constitui solução.

3. Também não percebo por que é que é preciso criar uma nova categoria remuneratória, sob o título enganador de "dedicação plena",  para assegurar que os médicos do SNS não podem desempenhar cargos de direção em instituições de saúde privados e para limitar o envolvimento de médicos com responsabilidades de direção no SNS nas instituições privadas em que acumulam. 

Tais incompatibilidades há muito deveriam estar instituídas por lei, como decurso normal do óbvio conflito de interesses que elas envolvem, em prejuízo do SNS. Pagar para as assegurar, aliás incompletamente, é um contrassenso!...

Adenda
Um leitor comenta que a redução do horário semanal de trabalho para 35 horas, decidida pelo Governo do PS em 2015, foi altamente prejudicial para o SNS, não somente pelo aumento de custos em novo pessoal e em horas extraordinárias para compensar essa medida, mas também por ter facilitado a acumulação do pessoal do SNS com tarefas privadas, onde são remunerados em função do desempenho. Não podia concordar mais, como tenho dito desde o início (por exemplo, AQUI e AQUI).

Adenda (2)
Outro leitor denuncia aquilo que qualifica como o "cinismo institucionalizado" do elogio oficial do SNS, quando a adesão generalizada à ADSE (um subsistema público paralelo ao SNS...) e a seguros de saúde privados, apesar de ambos serem financiados pelos utentes, revela uma "fuga generalizada" ao SNS por parte de quem tem meios para o fazer, o que, a prazo, pode levar muita gente, que deixou de depender do SNS, a rebelar-se contra o fardo fiscal do seu elevado custo orçamental. Penso que é um risco real.

quinta-feira, 21 de outubro de 2021

Sim, mas (7): O mau exemplo da ANACOM

1. António Costa tem toda a razão quando denuncia publicamente o escandaloso arrastamento do concurso sobre as redes de telecomunicações de 5G,  mal lançado e mal gerido pela ANACOM, que ameaça deixar o país como lanterna vermelha na implementação desta revolução tecnológica na UE, em prejuízo dos operadores e utentes e da economia em geral

Mas o PM já não tem razão, quando invoca este caso para questionar a própria noção de regulação independente, que se tornou dominante na Europa, importada dos Estados Unidos, desde os anos 90 do século passado, como parte integrante dos conceitos de "economia de mercado regulada" e de "Estado regulador", em substituição do precedente "Estado intervencionista".

Um mau regulador não basta para matar a regulação independente.

2. Antes de mais, as autoridades reguladoras independentes são autoridades puramente administrativas, pelo que só têm os poderes que lhe são confiados por lei (ou decreto-lei) e têm de respeitar as opções de política regulatória setorial definidas pelo Governo. 

Ora, no caso concreto, começa por ser questionável se, à face da lei das telecomunicações de 2004, o concurso das redes 5G era da competência da ANACOM ou do Governo, sendo certo que na sua Resolução de 2020 sobre o assunto, o atual Governo remeteu essa competência para a autoridade reguladora, sem questionar.

Acresce que o Governo poderia ter acautelado a questão da celeridade do concurso, na tal Resolução que precedeu o Regulamento da ANACOM, o que não fez. E também não se conhece nenhuma objeção ou advertência levantada pelo Ministério competente aquando da consulta pública do referido Regulamento, o que é tanto mais estranho, quanto é certo que este desrespeitava em vários aspetos a referida Resolução governamental, por exemplo quanto ao calendário e à cobertura da implantação das redes de 5G e quanto à não discriminação dos concorrentes, o que, aliás, tem gerado a contestação judicial do concurso.

Por conseguinte, há em todo este processo uma manifesta incúria governamental na definição e imposição da política regulatória para o setor, deixando "à solta" um regulador incompetente.

3. Há três boas razões para desaconselhar a condenação sumária das autoridades reguladoras independentes (ARI) por parte de um Governo do PS. 

Em primeiro lugar, os governos socialistas têm sido consistentemente responsáveis por essa "revolução regulatória", desde os governos de António Guterres (1995 e 1999), tendo a ANACOM sido criada nessa época como autoridade reguladora independente das telecomunicações (e dos serviços postais), então em vias de liberalização e de privatização.

Em segundo lugar, as autoridades reguladoras independentes fazem parte integrante dos instrumentário da UE para integrar as antigas utilities públicas no "mercado interno" da União, submetendo-as à liberdade de entrada e à concorrência, mas sujeitas à regulação pública necessária para corrigir as "falhas de mercado" e para salvaguardar a sua natureza como "serviços de interesse económico geral" (SIEG).

Por último, este ataque do Governo às ARI corre o risco de dar mais um argumento à direita, no sentido de que os governos socialistas convivem mal com instâncias do poder público que fogem ao controlo governamental, mesmo quando se trata de autoridades estritamente administrativas, que, por definição, só podem atuar no quadro da lei e da política regulatória definida pelos governos.

Cabe, alíás, dizer que este mau exemplo da ANACOM não constitui regra na conduta das ARI entre nós, pelo que não deve servir de pretexto para condenação geral destas. 

Adenda 
Um leitor pergunta se o Governo pode destituir a direção da ANACOM. Nos termos da lei, só pode haver destituição em caso de «falta grave, [de] responsabilidade individual ou coletiva, apurada em inquérito devidamente instruído, por entidade independente do Governo, e precedendo parecer do conselho consultivo, quando exista, da entidade reguladora em causa, e da audição da comissão parlamentar competente». Ora, embora o desrespeito da RCM de 2020 possa ser considerada como motivo justificado, é óbvio que se trata de um processo complexo, litigioso e moroso

Adenda (2)
É certo que, como recorda um leitor, o PS votou contra a lei-quadro das entidades reguladoras de 2013, junto com os demais partidos da esquerda parlamentar. Mas depois não manteve nenhum discurso político ou doutrinário contra ela e não tomou nenhuma iniciativa para a revogar ou reformar, desde que é Governo (2015), havendo maioria parlamentar para o fazer.

Adenda (3)
Sobre o racional das ARI, a que tenho dedicado alguma investigação académica, remeto para um anterior texto AQUI no CN.

domingo, 17 de outubro de 2021

Sim, mas (6): O alerta do Presidente

Não tenho dúvidas sobre a consequência de um eventual chumbo do orçamento, que seria a convocação eleições antecipadas, visto não haver condições políticas nem orçamentais para experimentar um segunda tentativa de fazer passar um novo orçamento nem para manter o País a viver indefinidamente em duodécimos do orçamento em vigor, sobretudo por causa da execução do PRR; e também estou de acordo com os claros alertas do Presidente da República acerca da situação, de modo que ninguém poderá ter dúvidas sobre a referida consequência.

O problema está, porém, em que, sendo de prever que o PS ganhe de novo as eleições sem maioria absoluta (e com menor diferença sobre o PSD), não é fácil antever o tempo que demoraria para formar novo Governo capaz de passar na AR (com que apoios?) e para preparar e fazer aprovar novo orçamento (com que maioria?). O mais provável é que o País tivesse de viver efetivamente sem Governo em plenitude de funções e sem orçamento aprovado por tempo imprevisível, com todos os prejuízos daí resultantes para a recuperação económica e social da crise da pandemia. Penso que esse risco também deveria ser incluído explicitamente no alerta presidencial.

quarta-feira, 6 de outubro de 2021

Ai o défice (14): Desbunda da despesa?

1. O Governo prevê agora que em 2022 a economia cresça 5,5%, bem acima dos 4,9% previstos no programa de estabilidade publicado em abril, mas não mexe na meta do défice, que se mantém em 3,2%, tal como antes. 
Há qui algo que não bate certo: se a economia vai crescer mais, isso quer dizer mais receita pública (impostos e contribuições) e menos despesa (encargos sociais), pelo que, ao manter o défice orçamental, e não estando na agenda uma descida de impostos, o Governo encara agora a realização mais despesa do que antes

 2.  Seria de esperar ao menos que o aumento de despesa que a manutenção da meta do défice indicia contemplasse o investimento público e não a despesa corrente, tanto mais que o fim da crise do COVID liberta o orçamento da despesa extraodinária que ela importou. 

Mas, a ter em conta a experiência desde 2015, é de recear que a nova folga na despesa se destine a cobrir mais generosamente os custos da viabilização do orçamento pelo BE e pelo PCP, o que, como é habitual, se traduz em geral num agravamento da despesa corrente (salários, pensões, prestações sociais, etc.), à custa do investimento público, que tem sido a primeira vítima das célebres "cativações" da despesa orçamentada.

Em qualquer caso, não deixa de ser um exagero um tal défice orçamental com a economia a crescer de forma tão robusta, o que torna redundante qualquer estímulo orçamental à economia, tanto mais que há que contar com a cornucópia extraordinária dos fundos do PRR. 

terça-feira, 5 de outubro de 2021

Praça da República (56): Reordenar as ordens profissionais

1. Existe finalmente uma iniciativa legislativa destinada a reordenar o regime jurídico das ordens profissionais, cujos principais objetivos são quatro: 

- combater a atávica tendência das ordens, tanto para limitar o acesso à profissão (malthusianismo profissional), sobretudo através de exames e estágios à entrada na profissão, como para expandir a esfera das atividades profissionais reservadas aos seus membros (monopólio profissional)

- admitir a prestação integrada de diferentes serviços profissionais (por exemplo, advocacia e consultoria financeira, economia e engenharia), através de escritórios multidisciplinares;

autonomizar e reforçar a função pública de regulação, supervisão e disciplina das ordens, através de uma reformulação da composição e das competências do conselho de supervisão, que o regime vigente já prevê; 

- reforçar os direitos dos destinatários dos serviços profissionais contra abusos ou más práticas profissionais, através da obrigatoriedade do provedor do utente.

É fácil ver que esta iniciativa legislativa ataca os principais pontos críticos da atual regulação jurídica das ordens e das más práticas de quase todas elas, colocando-as ao serviços do interesse público que as justifica. 

É de saudar e de sufragar, portanto, esperando a sua aprovação parlamentar.

2. Todavia, com o tempo, tenho-me tornado cada vez mais crítico da solução tradicional das ordens profissionais, propendendo cada vez mais para suprimir as suas funções corporativas de representação e defesa de interesse profissionais, reduzindo-as a entidades de regulação e disciplina da profissão, em substituição do Estado. 

Entendo que que num Estado de direito liberal, baseado na separação entre o Estado e a sociedade civil, não compete a entidades públicas, como as ordens são, a tarefa de representação e defesa oficial e unicitária de interesse profissionais, a qual deve caber exclusivamente a sindicatos e associações profissionais de livre iniciativa dos interessados.

Não existe nenhuma razão para conferir a certas profissões o privilégio de ter a representação de defesa dos seus interesses profissionais a cargo de entidades públicas, de inscrição e quotização obrigatórias e de representação unicitária, quando as outras profissões têm de recorrer a sindicatos e associações voluntárias, desprovidas de estatuto e de poderes públicos.

Sem enveredar por essa revolução, é evidente que esta iniciativa legislativa, pelo menos, autonomiza e reforça a função de supervisão e de disciplina profissional,  atenuando o risco da sua captura pela função corporativa paralela das ordens. Um enorme progresso!

Adenda
Concordando com a reforma proposta, um leitor comenta que "o que está em causa é assegurar a confiança dos consumidores dos serviços profissionais (advogados, médicos, etc.) quanto ao cumprimento das obrigações deontológicas e das boas práticas profissionais, pelo que é essencial acreditar que as ordens supervisionam efetivamente os seus membros e os punem devidamente quando incorrerem em qualquer violação daquelas regras".
Nem mais! Trata-se de serviços profissionais em geral caracterizados pela "assimetria de informação" entre quem os presta e quem os recebe, pelo que tem de haver confiança dos segundos em que as ordens se encarregam de impedir abusos e de punir os que ocorram.

Adenda 2
Uma das linhas de ataque das ordens ao projeto de reforma consiste em acusá-lo de «retirar às Ordens a competência para a defesa dos interesses gerais dos beneficiários dos serviços». Trata-se, porém, de uma acusação de todo infundada, pela simples razão de que as ordens nunca tiverem tal poder. Nada na lei confere, por exemplo à Ordem dos Médicos, o poder de efetuar inspeções aos serviços de saúde públicos ou privados, como por vezes tem sucedido, à margem da lei. As ordens têm, sim, o poder (e o dever) de defender os direitos dos destinários de serviços profissionais contra eventuais abusos dos próprios profissionais. Acontece que, perante a passividade do Governo e do Ministério Público, algumas ordens têm preferido usurpar poderes que não têm, em vez de exercerem os poderes que legalmente têm a abrigação de exercer e que justificam a suaa criação pelo Estado. 

Adenda 3 

Outro argumento na "cruzada" das ordens contra a projetada reforma consiste em acusá-la de instituir a "ingerência" do Governo nas ordens, sacrificando a sua independência e a sua autonomia. Também aqui, sem razão. De facto, o projeto não agrava em nada a tutela governamental sobre a ordens nem prevê qualquer outro tipo de ingerência governamental suscetível de pôr em risco o autogoverno e a autonomia funcional das mesmas. Trata-se de lançar areia para os olhos da opinião pública. Mas não deixa de ser curioso que quem denuncia infundadamente um alegado propósito de ingerência governamental nas ordens seja quem pretenda manter uma ilegítima ingerência destas na esfera administrativa do Governo, a pretexto da defesa dos direitos dos cidadãos. Trata-se de "fazer o mal e a caramunha".

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

Sim, mas (5): Tiro pela culatra

1. Parece que, no âmbito das medidas orçamentais para conquistar o voto do PCP, o Governo vai propor o englobamento dos rendimentos patrimoniais, ou pelo menos de alguns deles (nomeadamente os dividendos), para efeitos de cálculo do IRS, deixando de estar sujeitos à "taxa liberatória" de 28% (aliás, comparativamente elevada).

A ideia é atraente sob o ponto de vista dos princípios da equidade fiscal. Mas é de questionar a sua eficácia e os seus "efeitos colaterais". 

2. Como mostra esta reflexão de um especialista e antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais no anterior Governo de António Costa, a tributação desses rendimentos pode ter um efeito contrário, pela migração desses rendimentos para a tributação em IRC ou pela sua deslocação para o exterior, além do aumento da evasão fiscal (no caso do arrendamento), levando assim à perda de receita no IRS, e não ao seu aumento.

Ao que se deve acrescentar o provável efeito negativo sobre o mercado de arrendamento e sobre o investimento na bolsa de valores de Lisboa, um e outro a precisarem de estímulo, mais do que de novos encargos...

3. Por último, a ideia de englobar somente alguma espécie de rendimentos patrimoniais, estabelecendo uma discriminação quanto aos demais, leva seguramente a uma distorção na alocação da poupança nacional (por exemplo, entre imobiliário, ações e obrigações), cuja justificação deve ser politicamente explicada e assumida.

[Declaração de interesses: tenho alguns rendimentos provenientes de rendas e de  dividendos, todos devidamente declarados.]

Adenda
Um leitor comenta, com toda a pertinência, que é vergonhosa a passividade do Governo e da Autoridade Tributária perante a grande evasão do IRS quanto às rendas, distorcendo a informação sobre o mercado de arrendamento e penalizando os contribuintes que cumprem as suas obrigações fiscais. Se não houvesse tanta evasão, poderia haver um alívio fiscal para os cumpridores, sem perda de receita.

Adenda 2
Um leitor contesta que a "taxa liberatória" sobre os dividendos entre nós seja "relativamente elevada", argumentado que vários países europeus têm taxas de 35% e 40%. Mas não tem razão. Como se pode ver aqui < https://taxfoundation.org/dividend-tax-rates-europe-2020/ >, a taxa média de imposto sobre dividendos nos países da OCDE é de 23.5%, bem inferior aos nossos 28%. Nos países do sul da Europa, a taxa é de 24% na Espanha, 26% na Itália e 10% na Grécia, sempre inferior à taxa portuguesa.



domingo, 3 de outubro de 2021

Praça da República (55): Irracionalidade política

1. Os resultados das eleições locais em vários municípios do País, a começar por Lisboa, revelam à evidência a irracionalidade do sistema de governo municipal em vigor, em que executivo municipal (câmara municipal) é eleito diretamente em voto de lista e segundo um método proporcional, sendo o presidente da CM  automaticamente o primeiro nome da lista vencedora, qualquer que seja a sua percentagem.

Isso permite que, em caso de vitória com maioria relativa - o que sucede com relativa frequência -, o presidente eleito tenha contra si uma maioria de vereadores da oposição, além de ficar em minoria no "parlamento" municipal.

Como é bom de ver, não serão as melhores as condições de governabilidade desses municípios, estando o presidente da CM sob o risco de veto das oposições ou, até, de coligações contrárias ao seu programa de governo municipal.

2. Ora, não há nenhuma razão para a eleição direta do executivo municipal, para mais sendo um órgão colegial.

A solução mais razoável seria adotar o mesmo sistema de governo das freguesias, em que só a assembleia é diretamente eleita. Quanto à junta de freguesia, ela é composta pelo presidente, indiretamente eleito - pois é o primeiro nome  da lista vencedora para a assembleia de freguesia  -, sendo os vogais eleitos pela assembleia, sob proposta do presidente. Caso o presidente não disponha de maioria na assembleia de freguesia, terá naturalmente de tentar uma coligação com outra força política para obter a eleição dos vogais e o necessário apoio político à sua governação.

Transportado esse sistema para o plano municipal, seria abolida a eleição da CM, a qual seria presidida pelo primeiro nome da lista vencedora para a AM e sendo os vereadores eleitos pelo parlamento municipal sob proposta do presidente.

O confronto entre o governo municipal e a oposição deixaria de travar-se dentro da CM, transferindo-se para a assembleia municipal - a qual teria de ser dotada de meios de que hoje não dispõe  - , como sucede no sistema político a nível nacional e nas regiões autónomas.

3. Ora, o exótico regime em vigor, que vem desde 1976, deixou de ser obrigatório desde a revisão constitucional de 1997, há quase um quarto de século, que permitiu a reforma do sistema de governo municipal, a qual não foi efetuada até agora porque não foi possível um entendimento político-legislativo capaz de obter uma maioria de 2/3 na AR, ou seja, um acordo entre PS e o PSD.

Um tal acordo chegou a ser fechado há umas duas décadas, mas depois foi abandonado pelo PSD, não tendo havido nova tentativa de o reeditar desde então. Parece que ambos os partidos estão mais interessados em controlar por dentro as câmaras municipais alheias do que em dar maior racionalidade política e mais eficácia ao sistema de governo municipal.

Quando volta a falar-se em nova revisão da Constituição e em reforma do sistema político, seria conveniente explorar as reformas que a RC de 1997 veio permitir e que até agora ficaram na gaveta.

Adenda
Um leitor discorda da solução acima proposta, defendendo a opção entre um sistema presidencialista (em que o presidente da CM seria pessoalmente eleito, podendo depois escolher livremente a sua equipa) e um sistema parlamentar, em que o presidente da CM e a sua equipa seriam oriundos do partido ou coligação com maioria na assembleia municipal). Sucede, porém, que nenhuma dessas alternativas é consentida pelo atual regime constitucional.

sábado, 2 de outubro de 2021

Outras causas (5): "Tratar o bife como o carvão"

Nesta peça do The Economist desta semana, mostra-se que a produção de carne de vaca é de longe a que mais CO2 produz entre os alimentos (de origem animal ou vegetal), pelo que deveria ser tratada como o carvão na luta contra as alterações climáticas, ou seja, ser abandonada.

Declaração de interesse: não como habitualmente carne de vaca há um quarto de século (desde a crise das "vacas loucas"), mas todos os dias bebo leite, o que é quase tão mau como o bife em termos ambientais.

sexta-feira, 1 de outubro de 2021

Não concordo (23): Contra a "presidencialização" do regime

1. Entre as propostas de Rui Rio para a reforma do sistema político, conta-se a de transferir para o Presidente da República a competência para a nomeação do Governador do Banco de Portugal e dos presidentes das autoridades reguladoras, que são entidades tipicamente administrativas, aliás de criação governamental.

Ora, não há nenhuma justificação para entregar ao PR tarefas administrativas, que devem continuar a caber exclusivamente ao Governo, como órgão superior da Administração Pública, o qual responde perante o Parlamento pelo exercício dessa competência, como estabelece a Constituição. Ora, além do seu mandato longo, o PR é politicamente irresponsável.

Não faz sentido acrescentar ao atual "poder moderador" do PR tarefas de índole político-administrativa, à custa da capacidade do Governo para executar o seu programa.

2. Por razão diversa, também não vejo nenhuma razão para dar ao Presidente o poder de nomeação de alguns juízes do Tribunal Constitucional, desequilibrando a engenhosa solução encontrada em 1982, com a concordância do PSD, e que tem funcionado bem.

Com a solução proposta, a composição e a orientação do Tribunal Constitucional passariam a depender decisivamente do PR em funções.

3. Espero que o PS não dê o seu acordo a nenhuma destas soluções.

Por minha parte, proporia, aliás, algumas limitações dos atuais poderes presidenciais. nomeadamente as seguintes:

- declaração do estado de sítio e do estado de emergência sob proposta do Governo (que é quem tem o poder de os implementar), em vez da atual consulta;

- extinção da promulgação presidencial de decretos regulamentares e da assinatura de outros decretos governamentais (que são atos administrativos ou políticos próprios do Governo);

- sujeição do veto político de leis da AR a parecer prévio do Conselho de Estado, dificultando decisões imponderadas;

- permitir a superação do veto político das leis da AR por maioria a de 3/5, em vez da atual maioria de 2/3;

- submeter a ratificação de tratados e a assinatura de acordos internacionais ao mesmo regime das promulgação / veto dos diplomas legislativos;

- acabar com o indulto e comutação de penas criminais, um resquício do Antigo Regime.

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Um pouco mais de rigor (70): Narrativa infundada

1. Variados comentadores, incluindo Marques Mendes, erigiram a suposta promessa de uma nova maternidade em Coimbra, que António Costa teria feito numa sessão de campanha eleitoral nessa cidade, em caso exemplar de abuso de promessas eleitorais pelo Governo nas eleiçoes autárquicas. Mas é um mau exemplo.

Sucede, de facto, que a construção da nova maternidade - que visa substituir as duas existentes na cidade - está decidida há muito pelo Governo e só não tem avançado por divergência, que se mantém pelo menos há três anos,  entre o Ministério da Saúde e a Câmara Municipal de Coimbra quanto à sua localização. O que Costa fez na referida sessão pública foi instar Machado, na perspetiva da sua reeleição, a superar essa divergência rapidamente, para a obra poder ser concretizada.

É de supor, aliás, que os demais investimentos públicos que o líder do PS tem referido noutros lugares também já estão previstos, nomeadamente no PRR nacional. Nem se compreenderia que o líder do partido de Governo andasse a prometer ad hoc novos investimentos públicos sem financiamento assegurado. 

A realidade não corresponde, portanto, à narrativa dos apressados comentadores políticos. 

2. A Comissão Nacional de Eleições resolveu contribuir para essa narrativa, ao aprovar uma "advertência" contra o o líder do PS (que é também primeiro-ministro) por estar alegadamente a pôr em causa a "neutralidade" dos órgãos do Estado nas disputas eleitorais, prescindindo, porém, de citar exemplos (estranhamente, a CNE não publica, como devia, as suas decisões no seu site).

Ora, não consta que alguma das intervenções de António Costa na campanha eleitoral tenha sido feita na capacidade de chefe do Governo ou que as deslocações tenham sido efetudas com meios do Estado, e seria totalmente despropositado e ilegítimo que o líder do PS, enquanto tal, visse diminuída a sua capacidade de intervenção na campanha eleitoral e de defesa das cores do seu partido, pelo facto de ser o primeiro-ministro.

Por um lado, nas eleições locais não se joga somente o ranking dos partidos políticos no poder local, visto que elas têm sempre uma leitura nacional em relação ao Governo em funções (dois governos demitiram-se em consequência de eleições locais). Por outro lado, como já aqui escrevi, AC tem toda a legitimidade para alertar os atuais candidatos ao poder local, nomeadamente os socialistas, para os novos poderes e os novos desafios que vão ter no próximo mandato, em virtude, respetivamente, da lei da descentralização e do PRR.

Em suma, a CNE não tem razão e interferiu indevidamente na campanha eleitoral, desrespeitando, ela sim, o dever qualificado de imparcialidade que se lhe impõe em relação às forças políticas em disputa nas eleições...

sábado, 18 de setembro de 2021

Estado social (9): "Aumento brutal" da despesa

1. A informação do Ministério da Educação de que a despesa por aluno da escola pública (ensino básico e secundário) cresceu 30% desde 2015 não deixa de suscitar inquietação, mesmo para quem defende (como é o caso desta tribuna) um Estado social robusto, assim como a importância crucial da educação para o nível de vida e para o desempenho económico. 

Com efeito, parecendo evidente que o grande fator foi o aumento da despesa com pessoal docente e outro -  sobretudo em consequência da precipitada redução do tempo de trabalho da função pública para as 35 horas, do fim do congelamento da carreira docente (sem ser acompanhado da necessária revisão do sistema de avaliação de desempenho) e de um reforço geral do pessoal das escolas (apesar da redução da população escolar) -, justifica-se saber se essa maior despesa se traduziu em ganhos de desempenho e de qualidade da escola pública, condição essencial para travar a drenagem de alunos para as escolas privadas, sem o que ela pode vir a tornar-se o destino de quem não tem recursos para frequentar o ensino privado.

Ora, o pior inimigo do Estado social é o descontrolo do seu financiamento.

2. É certo que o Ministério das Finanças continua a inscrever regularmente nos orçamentos anuais a ideia de avançar com uma spending review, ou seja, análise da despesa pública, sob ponto de vista da sua justificação, racionalidade e eficiência na realização das respetivas de políticas públicas. 

Todavia, como recorda o Conselho de Finanças Públicas na sua recente atualização das perspetivas económicas e financeiras para 2021-2025, tal objetivo tem ficado no essencial por concretizar. Ora, sem tal exame, a despesa pública tende a crescer desmesuradamente, sem beneficiar dos ganhos de eficiência que uma melhor gestão e um melhor desempenho dos serviços públicos pode proporcionar

3. Nos próximos anos o maná financeiro do PRR financiado pela UE pode dar a ilusão de que não há limites para a despesa pública. Mas o aumento da despesa pública estrutural, sobretudo com remunerações e pensões, é por definição permanente, permanecendo depois de aquele se esgotar. Então, somente o aumento de impostos e a redução da despesa de investimento pode cobrir aqueles gastos, com os previsíveis efeitos nefastos sobre o desempenho económico do País, a contração da receita fiscal e a consequente dificuldade em financiar a despesa pública estrutural. 

É por isso que em tempos de "vacas gordas" financeiras, como os que aí vêm, o desleixo na vigilância sobre a despesa pública pode ser um perigo para o próprio Estado social num futuro não muito longínquo.

sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Unten den Linden (1): O puzzle governativo alemão

1. Tudo indica que as próximas eleições parlamentares na Alemanha  - previsivelmente ganhas pelo PSD, segundo todas as sondagens - vão gerar um problema bicudo quanto à possível coligação governamental delas emergente, excluindo à partida um governo minoritário.

Segundo uma sondagem referida AQUI, nenhuma das possíveis soluções governativas (excluindo obviamente a extrema-direita) obtém aprovação na opinião da maioria dos alemães. Mas a que suscita menos rejeição é a dos social-democratas do SPD com os Verdes e Liberais (FDP), enquanto que a que colhe maior hostilidade é a coligação das esquerdas, ou seja, SPD + Verdes + Esquerda, obviamente por causa da inclusão desta última. 

Se eu fosse alemão, compartilharia destas posições.

2. Trata-se, portanto, de uma difícil equação política a resolver por Scholz (caso se confirme a sua vitória eleitoral), o qual, embora não tendo nenhuma simpatia pela solução "vermelho-verde-vermelho" - por isso,  assaz improvável -, sabe bem a dificuldade que vai ter em harmonizar Verdes e Liberais numa solução governativa coerente, dadas as óbvias divergências programáticas entre eles (ambiente, integração europeia, comércio externo, etc.).  

Em todo o caso, tudo indica que não vamos ter novo Governo em Berlim a curto prazo e que a chancelerina Merkel vai ter de manter-se em funções de gestão durante mais tempo do que gostaria, depois de quatro mandatos governativos sucessivos. Dado o peso da Alemanha na UE, todos nós, europeus, estamos interessados na solução.  A aguardar...

quinta-feira, 16 de setembro de 2021

Assim vai a política (8): Intrumentalizar a UE

1. Não faz nenhum sentido esta crítica do eurodeputado Paulo Rangel, em pleno Parlamento Europeu, contra um alegado aproveitamento político do Plano de Recuperação da UE por António Costa na campanha eleitoral autárquica em curso em Portugal.

De facto, AC tem quatro boas razões para invocar o PRR: (i) o Governo português esteve na primeira linha do projeto de lançamento deste fundo; (ii) é mérito seu que o PRR português tenha sido dos primeiros a ser aprovados em Bruxelas e que o financiamento tenha já começado a ser recebido; (iii) as autarquias locais vão ter um importante papel na implementação do PRR, em especial no âmbito das novas competências de que os municípios vão passar  a dispor, em virtude da descentralização de tarefas, em que AC se empenhou,  que entra em vigor para todos os municípios no próximo ano; (iv) pelo menos nos próximos dois anos, incumbe ao Governo socialista velar pela boa execução do PRR, incluindo na parte que cabe aos municípios. 

Justifica-se, por isso, plenamente mobilizar os municípios e os novos autarcas agora eleitos para os novos meios de que vão dispor e para as novas responsabilidades que vão assumir. 

2. É evidente que Rangel não espera que a sua crítica, de tão carecida de fundamento, encontre o mínimo eco no PE ou na Comissão Europeia, parecendo óbvio que ele não falou para o auditório europeu, mas sim para o auditório nacional  do PSD, procurando reforçar a sua posição como challenger do poder no seu partido, na perspetiva da próxima disputa pela liderança "laranja", provavelmente precipitada por mais uma pesada derrota eleitoral do PSD.

O certo é que, nesta ocorrência, não é António Costa, mas sim o próprio Rangel que está a instrumentalizar as instituições europeias para fins de política partidária interna.

quarta-feira, 15 de setembro de 2021

Lisbon first (25): Lamentável

1. Lamentável e despropositado é o parecer do Tribunal Constitucional justificando a sua oposição à mudança da sede do Tribunal para fora de Lisboa (concretamente para Coimbra, que, aliás, foi a primeira capital de Portugal...), o que consideram "desprestigiante". 

Assaz desprestigiante, porém, é a opinião de que o prestígio institucional do Tribunal depende de estar sediado na capital (e não somente da qualidade e autoridade das suas decisões), quando é certo que prestigiadíssimos tribunais constitucionais estrangeiros - como os da Alemanha e da África do Sul - têm a sua sede fora da capital dos seus países!

2. Aliás, sendo a principal função do TC a de controlar a conformidade constitucional da ação do poder político, convém mesmo que haja algum distanciamento em relação à localização deste. 

A proximidade institucional e pessoal do poder político corre o risco de criar cumplicidades, sendo de suspeitar que a oposição do Tribunal à saída da capital tenha menos a ver com o seu alegado prestígio (que em nada seria beliscado) do que com o próprio status pessoal dos seus membros como convivas da elite do poder central nacional. "Portugal é Lisboa e o resto é paisagem" - reza o atavismo centralista entre nós...

Em todo o caso, entre os muitos poderes constitucionais e legais do Tribunal não consta o de determinar a sua própria localização, nem de vetar o que o poder legislativo houver por bem decidir soberanamente a esse respeito.

Adenda (17/9) 
A aprovação parlamentar, hoje, em primeira votação, da deslocação do Tribunal Constitucional para fora de Lisboa, concretamente para Coimbra, constitui - a não ficar pelo caminho, pois precisa de maioria absoluta na votação final - a primeira grande derrogação da concentração das instituições nacionais em Lisboa, implantada com a instauração da monarquia absoluta a partir do século XVI e que nem a monarquia constitucional nem a I República (nem obviamente a Ditadura do chamado Estado Novo) pensaram em reverter. 
Basta isso para ser saudada!

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

+ Europa (57): Boa conjunção astral

No seu último número, a revista britânica The Economist especula sobre uma possível conjunção astral no governo da União Europeia, se na Alemanha os social-democratas de Scholtz vencerem as próximas eleições parlamentares (como as sondagens indicam), se no ano que vem Macron conseguir renovar o seu mandato presidencial na França e se na Itália Draghi tiver consolidado o seu Governo, contra a tradicional instabilidade e incapacidade italiana para adotar reformas.

Com efeito, teríamos os governos das três maiores potências da UE, agora libertas do travão britânico, essencialmente alinhadas em três vetores fundamentais de reforma da União (para além do seu alinhamento quanto à "economia social de mercado", fundamento da constituição económica e social comunitária): revisão das regras orçamentais a respeitar pelos Estados-membros e sobre o financiamento da União, aprofundamento da integração europeia e "autonomia estratégica" da União no plano internacional. 

Seria, sem dúvida, uma excelente conjunção astral! A superação em curso da pandemia e da crise económica e social que a acompanhou, assim como o impacto positivo do ambicioso plano de recuperação financiado pela União, podem ser uma boa ajuda à sua concretização.

sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Jorge Sampaio (1939-2021): A República perde um dos seus melhores

Homem de valores e de convicções humanistas e progressistas, culto, tolerante, paciente, emotivo, politicamente corajoso quando necessário, Jorge Sampaio emprestou competência, elevação, dignidade e dedicação republicana à causa pública a todas as missões políticas em que se empenhou ao longo da vida, desde dirigente estudantil contra a ditadura, passando pelo militante e dirigente partidário, pela presidência da CM de Lisboa, pela Presidência da República, pelas várias causas humanitárias internacionais a que se dedicou depois de deixar Belém. 

Uma vida cheia e bem-sucedida.

A República perde um dos seus melhores. Ele merece o nosso reconhecimento.

quinta-feira, 9 de setembro de 2021

O que o Presidente não deve fazer (28): O "comentador-mor do Reino"

1. Estas duas opiniões de dois credenciados comentadores políticos (AQUI e AQUI), ambas assaz críticas (e justificadamente o são) da última incursão presidencial no seu papel de compulsivo comentador político - que mais uma vez fez manchete no Expresso, canal habitual das opiniões inoficiais de Belém - mostram que deixei de estar sozinho na tarefa de expor e criticar os excessos de MRS. Ainda bem!

Na verdade, considero incompatível com a função presidencial o papel  adicional de comentador político - sem precedente entre nós e sem paralelo noutras repúblicas não presidencialistas -, sobretudo quando os comentários versam sobre a vida interna ou as orientações dos partidos, no Governo ou na oposição, e quando visam influenciá-las, como é evidente neste caso. 

Não cabe ao Presidente enveredar pela especulação ou pela intriga político-partidária. O PR deve pautar-se pela discrição e pela imparcialidade em matéria partidária.

2. Acresce que, em qualquer caso, quando deseje tornar conhecidas as suas opiniões políticas, o PR as deve assumir plenamente perante o público em declarações on the record, em vez do recurso ao velho truque da sua transmissão por uma suposta fonte não identificada ("fonte de Belém", "colaboradores do Presidente", etc.), o que não honra nem o comentador nem o veículo por ele privilegiado (é disso que se trata).

Parecendo evidente que nesta missão o Expresso não passa de "ventríloquo" direto de Belém, de duas uma: ou o semanário imputa as opiniões presidenciais diretamente a declarações expressas da seu real fonte, ou identifica a sua suposta fonte intermediária em Belém. De facto, a deontologia jornalística exclui fontes anónimas em matéria de opinião. 

Nem MRS nem o semanário saem bem nesta fotografia, aliás demasiadas vezes encenada.

Outras causas (4): O meu café

 Do meu Facebook, não aberto ao público:



terça-feira, 7 de setembro de 2021

Bicentenário da Revolução Liberal (34): Ferreira Borges

Acaba de ser publicado o último volume da trilogia sobre a Revolução Liberal de que sou coautor (junto com José Domingues), desta vez dedicado à vida e obra política de José Ferreira Borges, eminente protagonista da Revolução: cofundador do Sinédrio, estratego operacional da sublevação de 24 de agosto, membro do governo provisório, deputado às Cortes Constituintes. 

O livro vem colmatar uma importante lacuna historiográfica, pois, além de recuperar a biografia política de FB - desde o vintismo (1820-23), passando pela adesão ao cartismo (1826), a luta contra a usurpação miguelista (1828-32) e a rejeição do setembrismo (1836) -, colige e analisa os seus principais escritos políticos e político-constitucionais até ao fim prematuro da sua vida em 1838. 

Sem paralelo em nenhum outro revolucionário vintista, a vida e obra de Ferreira Borges testemunha não somente o atribulado e penoso processo de implantação do constitucionalismo liberal em Portugal, mas também a coragem, o denodo e a persistência dos que lhe deram origem.

Praça da República (54): Alhos e bugalhos

Segundo esta notícia, há bancos que pretendem invocar o recente Acórdão do Tribunal Constitucional - sobre a necessidade de autorização judicial para o acesso à correspondência (postal e eletrónica) na investigação do chamado cibercrime - para impugnarem a pesada coima com que foram punidos pela Autoridade da Concorrência, alegadamente com base justamente no correio eletrónico dos bancos em causa.

Mas é evidente que os advogados dos bancos fingem esquecer duas diferenças essenciais: 

- primeiro, a correspondência das empresas não goza da proteção constitucional da correspondência pessoal;

- segundo, a investigação e a punição das contraordenações (que não são punidas com prisão) não estão sujeitas aos constrangimentos constitucionais do processo penal.

quinta-feira, 2 de setembro de 2021

Stars and Stripes (7): A herança trumpista


1.
Trump foi derrotado nas eleições presidenciais e a direita trumpista perdeu o poder, na Casa Branca e no Capitólio. Mas não no Supremo Tribunal (na imagem) - que também exerce as funções de tribunal constitucional -, onde Trump conseguiu consolidar uma maioria de juízes de direita conservadora (melhor dizendo: reacionária).

O Supremo Tribunal acaba de assestar um profundo golpe num dos pilares da jurisprudência constitucional liberal nos Estados Unidos, a histórica decisão Roe v Wade, de 1973, que reconheceu às mulheres americanas o direito de aborto até à data da "viablidade fetal" (6 meses de gestação). Agora, embora sem se pronunciar diretamente sobre a constitucionalidade da lei, o Supremo Tribunal invocou razões processuais para não impedir a entrada em vigor de uma lei do Texas que proíbe o aborto em qualquer caso para além das seis semanas, tornando-o muito mais difícil, se não inviável, em muitos casos, passando a ser de longe a lei mais restritiva nos Estados Unidos. 

2. Com esta decisão, outros estados de maioria republicana vão sentir-se encorajados para adotar leis semelhantes e não tardará o momento em que há de chegar ao Tribunal a impugnação das leis do aborto dos estados mais liberais, havendo o risco de reverter definitivamente a decisão de 1973, objetivo último da direita evangélica e dos movimentos pro life, que pautam a ideologia iliberal em matéria de aborto nos Estados Unidos.

Para piorar as coisas, são escassas as possibilidades de alterar a composição política do Tribunal, visto que os juízes são vitalícios e os magistrados de direita são na sua maioria relativamente jovens.

Uma pesada, e duradoura, herança trumpista.

quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Não concordo (21): Contra a corrente

1. Parece que sou a única pessoa a não aplaudir o recente acórdão do Tribunal Constitucional que se pronunciou pela inconstitucionalidade de uma alteração aprovada no Parlamento à chamada lei do cibercrime, a qual vinha permitir a apreensão de correio eletrónico por decisão do Ministério Público, porém sujeita a posterior validação do juiz. 
De facto, a conclusão da inconstitucionalidade parece-me assaz formalista

2. Não estando em causa nem a possibilidade de apreensão do correio eletrónico nem a necessidade de intervenção judicial, não vejo qual é a diferença substancial, sob o ponto de vista da proteção dos direitos fundamentais em causa, entre a apreensão do correio eletrónico "suspeito" ser logo determinada pelo MP (para assegurar a sua preservação) e depois sujeita a validação (ou não) pelo juiz e o caso de o MP solicitar previamente ao juiz autorização para apreender o correio previamente identificado por aquele e só depois proceder à sua apreensão (se ele ainda existir...). 
Mesmo no primeiro caso, a apreensão só subsiste e se torna processualmente relevante se houver validação judicial, não havendo nenhuma consequência se o juiz a desautorizar. O nº 4 do art. 34º da CRP, que autoriza tal restrição do sigilo da correspondência em processo penal, não refere nenhuma reserva de autorização judicial... 

3. Ora, o excesso de garantismo processual desequilibra o necessário compromisso entre a eficácia punitiva do processo penal e as liberdades individuais, podendo pôr em risco a obrigação punitiva do Estado e gerar a descrença social nas instituições penais, um dos alimentos preferidos do populismo político, sobretudo quanto estão em causa crimes da gravidade destes.

Note-se que mesmo a privação da liberdade para efeitos penais, que afeta o próprio direito à liberdade, pode ocorrer sem prévia decisão judicial (caso da detenção em flagrante delito e da detenção para interrogatório), o que só ocorre posteriormente. Não se vê porque é que o sigilo de correspondência há de merecer mais exigente proteção processual.

Sim, mas... (4): Quando tudo corre de feição

1. Dificilmente as coisas poderiam correr melhor para o PS e o seu governo: a grande pandemia controlada, retoma económica em bom ritmo, crescimento do emprego, cornucópia dos fundos europeus a chegar, PSD sem rumo e fragmentação da direita, extrema-esquerda conformada. Nenhuma nuvem no horizonte. 

As sondagens eleitorais refletem essa condições favoráveis. O recente congresso partidário exprimiu esse estado de bem-aventurança política.

2. E, no entanto, as condições e perspetivas favoráveis não deviam fazer esquecer os problemas estruturais do país, nomeadamente o défice de competitividade económica, a excessiva dívida pública, a desigualdade social, a ineficiência da Administração pública, a concentração de recursos em Lisboa e as assimetrias regionais, o risco demográfico, o desafio climático, etc.

Sintomaticamente, no autocongratulatório congresso do PS mal se ouviu falar destes temas.

Stars and Stripes (6): Uma mudança estratégica

Penso que foi uma decisão acertada a retirada americana do Afeganistão, que se tinha tornado há muito um atoleiro sem solução à vista e, para mais, dispendioso. Os Estados Unidos têm novos desafios estratégicos em que empenhar os seus recursos políticos, nomeadamente a competição com a China.

Se há uma lição a tirar, é a de que não compete a nenhuma potência impor a outro país manu militari um regime político ou um modo de vida

quarta-feira, 14 de julho de 2021

O que o Presidente não deve fazer (27): "Contempt of the Court"

1. O acórdão do Tribunal Constitucional de hoje que, a pedido do Governo, e como se esperava, declara a inconstitucionalidade dos célebres diplomas parlamentares que aumentaram a despesa pública em apoios sociais, à revelia do Governo, não constitui somente uma salutar reafirmação do valor da estabilidade orçamental assegurada pela chamada lei-travão, mas também se traduz numa óbvia derrota política das oposições que aprovaram tais diplomas numa oportunista coligação antigovernamental, assim como do Presidente da República, que as promulgou, com base numa abstrusa "interpretação conforme à Constituição" da sua lavra, sem nenhuma consistência, num exercício fútil de "ficção constitucional".

2. Lamentável é a despropositada reação do Presidente da República a este acórdão, que não só insiste na sua posição rotundamente "chumbada" pelo Tribunal, mas também clama uma "vitória política", com base no argumento de que, mercê da salvaguarda dos efeitos entretanto produzidos pelas referidas leis, decretada pel0 TC (como é usual), conseguiu o que desejava com a promulgação abusiva dos diplomas, ou seja, fazer realizar a referida despesa pública adicional, assim sobrepondo o seu juízo político ao do Governo em matéria de políticas públicas, à custa do atropelo da Constituição. Uma dupla falta!

Ora, no nosso sistema constitucional, quem governa é o Governo e não a AR, nem, muito menos, o PR

Adenda
Há uma questão a que o Presidente não se deveria furtar: depois desta incontornável decisão do TC, em futuros casos semelhantes vai ele suscitar a questão preventiva da constitucionalidade ou vai continuar a promulgar tais diplomas, como fez neste caso?

Adenda (2)
Pior que Belém só o BE, que diz que o "acórdão não tem efeito". Quanto a efeitos práticos, assim é, mas por causa da salvaguarda, pelo TC, dos efeitos entretanto produzidos e do facto de o Governo ter assumido a realização da despesa envolvida, como estava no seu poder. Mas a pergunta impõe-se: depois de o TC ter consolidado o entendimento constitucional de que a AR não pode aumentar a despesa pública durante a execução do orçamento, vai o Bloco continuar a propor e a aprovar medidas dessas, afrontando o TC?

segunda-feira, 12 de julho de 2021

No bicentenário da Revolução Liberal (33) - A primeira lei da liberdade de imprensa

Como anunciava o Borboleta Constitucional de 25 de julho de 1821, foi em 12 de julho desse ano, faz hoje 200 anos, que foi promulgada a primeira Lei da liberdade de imprensa entre nós (incluindo o Brasil), que tinha sido aprovada poucos dias antes pelas Cortes Constituintes, dando cumprimento ao artigo 9º das Bases da Constituição, aprovados em março.

Peça fundamental da Revolução Liberal, a liberdade de imprensa, abolindo a censura prévia das publicações, não era somente uma das liberdades individuais básicas constitucionalmente reconhecidas, mas também um esteio primacial da cidadania e da liberdade política.

Sendo desde então uma instituição essencial do Estado Constitucional, a liberdade de imprensa só foi duradouramente suspensa, com reintrodução da censura administrativa prévia e da proibição de publicações, durante a longa ditadura do chamado "Estado Novo" (1926-1974), para ser restaurada logo após o 25 de Abril, quando o País se reencontrou com a tradição liberal iniciada há dois séculos.

sábado, 19 de junho de 2021

Pandemia (61): Confusionismo deliberado

1. A crónica de hoje de J. M. Tavares no Público sobre a alegada inconstitucionalidade da proibição de entrada e saída da Grande Lisboa e a suposta "desautorização" do Presidente da República é um exercício de confusionismo deliberado

A saber: (i) a referida medida tem cobertura legal na Lei da Proteção Civil, ao abrigo do "estado de calamidade" declarado nos termos dessa lei; (ii) essa medida não implica suspensão da liberdade de circulação, mas somente a sua restrição, pois os residentes continuam a poder deslocar-se dentro da área delimitada; (iii) para restringir direitos não é necessário declarar o estado de emergência, desde que se trate de restrições previstas em lei, como é o caso; (iv) o estado de emergência foi declarado várias vezes para permitir a efetiva suspensão de vários direitos fundamentais (confinamento domiciliário, encerramento de estabelecimentos, proibição de atos de culto, de reuniões e manifestações, etc.) ou autorizar restrições não previstas em lei. 

Por conseguinte, embora haja quem pense diversamente, entendo que a medida em causa não é constitucionalmente ilegítima. De resto, a referida lei não foi constitucionalmente impugnada até agora.

2. É evidente que essa medida se traduz num recuo no processo de desconfinamento, tal como inicialmente programado pelo Governo, a quem compete geri-lo. 

Todavia, tal eventualidade sempre esteve em aberto, tendo o Governo tido o  cuidado de declarar o "estado de calamidade", para manter todas as hipóteses disponíveis, como lhe compete. De resto, medida idêntica já tinha sido aplicada em Odemira.

Por conseguinte, contra o que defende apressadamente J.M.T., a decisão governamental não implica nenhuma «desautorização» do Presidente da República, desde logo porque não lhe compete comandar o processo de desconfinamento. Pelo contrário: travar a retoma de uma fase aguda da pandemia em pleno verão constitui uma obrigação imperativa do Governo para assegurar que o Presidente não é obrigado a reconsiderar a sua garantia pública de que, no que dele dependesse, não se voltaria atrás quanto à declaração de novo estado de emergência, que só ele pode emitir.

Adenda
Um leitor observa que a questão da "desautorização" nasceu da formulação equívoca da garantia de "não recuo" por parte do Presidente da República, pois este não precisou que se referia ao estado de emergência, cuja declaração lhe compete, e não ao desconfinamento, que é competência do Governo. Tem razão. Mas o Primeiro-Ministro também podia ter evitado referir o Presidente na sua declaração sobre o recuo no desconfinamento; e este, por sua vez, bem podia e (devia) ter evitado a despropositada declaração de que o Presidente nunca é "desautorizado" pelo Governo, pois tal não era o caso. Imprudentes quiproquós verbais! No exercício dos seus poderes políticos e administrativos, o Governo só pode desautorizar o Presidente, se este indevidamente se intrometer na esfera de competência daquele.

sábado, 12 de junho de 2021

Não dá para entender (29): Demasiado grave

Não dá para entender como é que se criou na Câmara Municipal de Lisboa a prática de comunicar a embaixadas estrangeiras os dados pessoais dos promotores de reuniões e manifestações, quando nacionais de outros países (ou pelo menos de alguns deles). 

Para além de tal prática não ter nenhuma base legal (nem poderia tê-la, de tão absurda que é!), surprende como é que ela pôde ser instaurada e continuada sem que ninguém envolvido tenha tido um sobressalto de dúvida nem suscitado um alerta à CM.

Impõe-se que a averiguação independente já ordenada pelo presidente da CML seja concluída sem demora e que com base nela sejam efetivadas as responsabilidades disciplinares e políticas que se justificarem. Demasido grave para ficar impune!

Adenda
Também não sei porque é que se invoca a este propósito a lei que rege a liberdade de reunião e de manifestação, a qual, apesar de ser anterior à Constituição de 1976 (Decreto-Lei nº 406/74, de 29 agosto de 1974), nunca foi revista, tendo regulado satisfatoriamente durante 47 anos o exercício dessa liberdade em Portugal. É verdade que ela requer um "aviso" prévio à câmara muncipal territorialmente competente assinado por três promotores da reunião ou manifestação, o que bem se comprende, para efeito de segurança e de responsabilidade pela reunião ou manifestação. Mas não mais do que isso!

Adenda 2
A confirmar-se esta notícia de que  dois emails dirigidos por queixosos ao MAI e ao MNE sobre o assunto não tiveram seguimento, o caso torna-se ainda mais deprimente sobre o estado do Estado de direito em Portugal.

quarta-feira, 9 de junho de 2021

Pandemia (60): Melhor do que o esperado

Ao contrário do que se temia há um ano, a pandemia, apesar das sua gravidade e duração na Europa e nos Estados Unidos (e não só), teve efeitos menos gravosos sobre o comércio internacional do que se antecipava e a sua recuperação da queda do ano passado está a ser mais rápida do que o esperado - assim o mostram as estatísticas da Organização Mundial do Comércio. No caso da Europa prevê-se um crescimento de 8,3% este ano do comércio de bens, o que supera a quebra de 8% no ano passado.

Embora seja provável que o comércio internacional de serviços tenha tido um desempenho menos positivo, desde logo por causa da profunda quebra no turismo, é de admitir que também este venha a recuperar rapidamente.

São boas perspetivas para a recuperação económica mundial, que depende muito do comércio internacional.

Ao contrário do que AQUI se receou, a primeira pandemia global não pôs em causa a globalização económica. Ainda bem!