Eis mais umn contributo para a óbvia justeza desse lema: «Portugal é o país da OCDE onde menos alunos ficam sem comer por falta de dinheiro».
Nem as pensam!
Blogue fundado em 22 de Novembro de 2003 por Ana Gomes, Jorge Wemans, Luís Filipe Borges, Luís Nazaré, Luís Osório, Maria Manuel Leitão Marques, Vicente Jorge Silva e Vital Moreira
Eis mais umn contributo para a óbvia justeza desse lema: «Portugal é o país da OCDE onde menos alunos ficam sem comer por falta de dinheiro».
Nem as pensam!
[Fonte da imagem: AQUI]
1. Sendo uma universidade pública, e por isso obrigada a respeitar o princípio constitucional da separação entre o Estado e a religião - que obviamente proíbe as instituições públicas de praticar ou apoiar atos religiosos -, a Universidade de Coimbra persiste, porém, em afrontá-lo todos os anos, ao organizar oficialmente duas missas, uma pela "padroeira", em 8 de dezembro, e outra pela dia solene da Universidade, a 22 de fevereiro.
Ora, tal como o Estado, a UC só pode ser neutra em matéria religiosa, não podendo adotar nem privilegiar qualquer religião.
2. Além de um inaceitável abuso de poder, estes atos religiosos oficiais associam indevidamente toda a comunidade académica a essa reiterada violação da neutralidade religiosa do Estado, afrontando não somente os professores, investigadores, funcionários e estudantes que não são crentes católicos, mas também todos aqueles que, independentemente da sua crença, ou falta dela, não querem ver a sua universidade identificada com nenhuma religião.
A poucos anos do cinquentenário do 25 de Abril de 1974 e da Constituição de 1976, que restaurou o princípio republicano da laicidade do Estado - que o "Estado Novo" reduzira a nada -, é inadmíssivel que a UC continue a colocar-se ostensivamente à margem da Constituição da República.
1. No quadro acima, colhido AQUI, Portugal fica na primeira metade da grandeza da carga fiscal, em percentagem do PIB, dos países da OCDE (15º lugar em 36 paises).
A verdade, porém, é que não faz muito sentido comparar países com estrutura de despesa pública muito distintos. Com efeito, se retirarmos da lista os onze países não-europeus da OCDE, que, em geral, têm baixo nível de despesa social (prestações sociais e pensões), Portugal não fica assim tão mal colocado, pelo contrário, passando a ser a sexta carga fiscal mais baixa nos 21 países europeus.
O Estado social, que é uma opção político-constitucional europeia, custa muito dinheiro.
2. Todavia, mesmo com essa "reclassificação", há vários motivos pelos quais o nível da carga fiscal em Portugal deve suscitar preocupação, mesmo fora de uma perspetiva neoliberal.
Primeiro, Portugal tem uma carga fiscal mais elevada do que vários países de PIB aproximado, ou até mais elevado; segundo, enquanto em muitos países da OCDE a carga fiscal está a ser reduzida, entre nós ela continua a subir; por último, mas não menos importante, há razões para pensar que há vários serviços publicos em que o elevado nível de despesa pública não produz os resultados devidos, como é manifestamente o caso da saúde.
Com um Estado mais eficiente, os mesmos ou melhores resultados poderiam ser obtidos com menor despesa pública e, logo, com menor carga fiscal.
1. É lastimável que o Governo se tenha apressado a ratificar politicamente o revoltante relatório sobre a localização do novo aeroporto, que conseguiu o prodígio, não somente de dar prioridade a Alcochete - apesar do seu elevado custo para os contribuintes (quanto mais não seja quanto aos acessos), do abate de uma norme quantidade de sobreiros e dos custos acrescidos de transporte para grande parte dos seus futuros utentes a norte do Tejo -, mas também de desqualificar Santarém - que não padecia de nenhuma dessas pechas e que libertava o novo aeroporto do explorador monopólio da Vinci -, com o fútil argumento da incompatibilidade com a base aérea de Monte Real.
A decisão da CNI é, antes do mais, económica e socialmente irracional.
2. Como desde o início aqui fui denunciando (AQUI, AQUI e AQUI), a chamada CN"I" não passou de uma delegação formal do poderoso lobby pró-Alcochete, com uma liderança há muito comprometida com essa solução, selecionada pelo Governo em manifesto conflito de interesses. Provavelmente na história das grandes infraestruturas nacionais não terá havido nenhum caso de captura do Estado por poderosos interesses privados tão obviamente consentida (se não promovida...) pelo próprio Estado.
E assim que se vai esvaindo a confiança pública nas instituições políticas, em proveito do populismo, contribuindo para a preocupante erosão em curso da democracia liberal.
1. Não convence a tese de MRS de que no chamado caso das "gémeas brasileiras" se comportou de forma «neutral» e se limitou ao que usa fazer em casos semlhantes, ou seja, reendereçar o pedido ao Governo.
Primeiro, o pedido vinha do seu próprio filho - que num caso destes não é, manifestamente, um «cidadão como qualquer outro» -, o qual obviamente visava obter o endosso paterno do PR para reforçar a sua "cunha", o que não deveria ter recebido; segundo, além do envio do pedido ao Governo, o MRS deu instruções aos serviços da Presidência para contactarem o Hospital de Santa Maria sobre o assunto, o que não deve ser norma na Presidência, pois os serviços de saúde dependem exclusivamente do Governo (tal como toda a Administração pública...), pelo que não devem ser interpelados diretamente por Belém.
Separação de poderes oblige!
2. Não havendo obviamente na conduta presidencial nada de penalmente ilícito, o mesmo não se pode dizer do respeito da ética republicana, que não é obviamente compatível com a promoção de privilégios de tratamento nos serviços públicos. Ora, parece indiscutível que a intercessão presidencial deve ter ajudado as duas cidadãs a ter acesso, em tempo imbatível, a um tratamento superdispendioso, ao qual um cidadão comum só acederia (se acedesse de todo...) com bem maior demora e diligência.
Sendo MRS o primeiro magistrado da República, esta incúria, ainda que benévola, não lhe fica bem.
Amanhã, dia 6 de dezembro, pelas 18:00, na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra (BGUC), vou participar, junto com a minha colega da Nova de Lisboa, Profª. Tereza Pizarro Beleza, neste colóquio sobre os 75 anos da Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH), aprovada pelas Nações Unidas em 1948, três anos após o fim da II Guerra Mundial, cuja tragédia humana (Holocausto à cabeça) motivou a sua aprovação.
A DUDH inaugurou politicamente o processo de universalização dos direitos e liberdades fundamentais, que veio a ser seguido, ao longo das décadas seguintes por numerosas convenções internacionais de direitos humanos, quer de âmbito global (ao nível das Nações Unidas), quer de âmbito regional (a primeira das quais foi a Convenção Europeia de Direitos Humanos, CEDH, de 1950).
Mercê do bom desempenho orçamental do Governo, Portugal sai do clube dos "países periféricos" da zona euro quanto à fiabilidade da sua dívida pública e entra no clube dos países com juros mais baixos.
Como é bom de ver, esta subida de divisão não se traduz somente num acesso mais fácil ao mercado da dívida, caso seja necessário, mas sobretudo numa substancial poupança nos custos da dívida, cativando menor fatia da despesa pública e proporcionando maior liberdade orçamental aos governos.
Esta notícia é seguramente a melhor resposta ao sectário e infundado ataque do antigo PR, Cavaco Silva, à política orçamental do Governo. Como se vê, as "contas certas" rendem vantagens efetivas para o País!
1. O magno compromisso de Montenegro para estas eleições era a reiterada garantia de que não faria um acordo de governo com o Chega, o que ele proclamou de forma inequívoca: «não é não». Sucede, porém, que outro membro qualificado do PSD já veio reduzir a nada tal compromisso, ao dizer que «nos Açores não houve nenhum acordo com o Chega»!
Portanto, acordos com o Chega são uma questão de semântica e só existem quando o PSD os definir como tal. É demais, realmente.
2. Igualmente, o outro tonitruante compromisso, de só governar se ganhar eleições, também já foi "para as urtigas", quando Montenegro veio dizer que, afinal, «não quer acorrentar o Partido a uma decisão minha», pelo que não vale nada. Também este compromisso ruiu face às sondagens que continuam a colocar o PSD atrás do PS, apesar das atribulações por que este passa.
Por mim, penso que o PSD, em geral, e Montenegro, em especial, entendem que não podem perder esta oportunidade de voltar ao poder, depois de oitos anos de jejum, pelo que farão tudo o que for preciso para isso, incluindo "ir para a cama com o Chega" e depois negar a evidência.
1. Perguntam-me porque, sendo um observador interessado da vida política e posicionando-me politicamente na esquerda moderada, não tomo posição na disputa em curso para a liderança do PS, mas a resposta é simples e óbvia: porque ela não me diz pessoalmente respeito e não sou chamado a participar na sua decisão.
De facto, não sendo filiado e sendo simples simpatizante (por vezes assaz crítico), não faria sentido tomar partido numa disputa que só diz respeito aos membros do Partido, correndo o risco de ver a minha ingerência mal interpretada. De resto, embora o meu distanciamento crítico possa variar, a minha condição de simpatizante e de votante habitual do PS, há mais de três décadas, não depende da sua liderança: os líderes passam, e o Partido fica.
2. Acresce que tenho de constatar que, apesar das diferentes sensibilidades políticas dos candidatos, próprias de um partido plural, como é o caso, nenhum deles sufraga, nos programas que apresentaram, quase nenhuma das propostas que, ainda há pouco tempo, considerei como deverem integrar um programa político do PS.
É certo que algumas delas são claramente disruptivas das corporações e interesses de grupo com significativo peso político. Mas, se não for o PS a adotá-las, como alimentar a esperança de um cidadão de esquerda de alguma vez as ver implementadas?
Esta fake news integra a falsa narrativa política de Montenegro, segundo a qual, com os governos do PS, o país teria entrado num "ciclo de empobrecimento" -, o que aquele e outros dados desmentem de todo em todo. Pelo contrário, se o critério eleitoral fosse somente o desempenho económico e social deste Governo, o PS deveria ter a vitória assegurada.
O que surpreende é como o PSD não se dá conta de que só perde credibilidade com tal tentativa de mistificação da realidade, e que o descrédito político só ajuda a consolidar a estagnação eleitoral que as sucessivas sondagens lhe atribuem, sem conseguir tirar partido (pelo contrário!) das presentes atribulações do PS.
[Eliminada uma "adenda", que foi convertida em post autónomo.]
1. Em mais uma das suas ousadas posições sobre a UE, o antigo presidente do BCE e ex-PM italiano veio declarar que a União precisa de se tornar em Estado, para poder enfrentar e vencer os novos desafios com que se depara.
Na verdade, a UE já apresenta grande parte das características típicas dos Estados de tipo federal - nomeadamente os "três elementos" da "teoria geral do Estado" (território, cidadania e poder político próprio), a aplicabilidade direta do direito da União aos seus cidadãos e a primazia sobre os direitos nacionais, a representação diplomática externa, etc. -, faltando-lhe, porém, dois elementos decisivos: a integração da política de defesa e da política externa e, sobretudo, a capacidade para definir as suas próprias atribuições (Kompetenz Kompetenz), sem necessidade do consentimento unânime dos Estados-membros.
2. Nos Estados Unidos, a passagem da confederação (associação de Estados) à federação (Estado federal) demorou apenas dez anos (1777-1787), sob impulso da guerra de independência contra a Grã-Bretanha. Passadas mais de seis décadas desde a sua fundação (Roma, 1957), a UE encontra-se ainda a meio caminho, depois dos grandes avanços de Maastricht (1991) e de Lisboa (2007).
Resta saber se vão ser necessárias outras tantas décadas para completar o caminho. A declaração de Draghi, com o peso político que ele tem, pode significar que o processo pode precisar de ser acelerado (embora não necessariamente com todos os atuais EEMM).
Saúdo vivamente este artigo de J. Pacheco Pereira no Público de hoje, com o qual concordo inteiramente, desde logo porque ele empresta a voz de um colunista consagrado e respeitado à luta contra o irresponsável e impune legal warfare do Ministério Público contra a "classe política" - transformando a investigação penal em arma de perseguição política -, que venho denunciando há muito, praticamente sozinho na área socialista (por último, AQUI e AQUI), e para o qual já apresentei propostas concretas (por exemplo, AQUI).
O processo Influencer, em que o MP se ultrapassou a si mesmo no manifesto abuso de poder arbitrário, configurando um verdadeiro golpe de Estado (como mostrei AQUI), não pode deixar de ter uma resposta das instituições em defesa da democracia. Julgo que um dos temas prioritários que deve figurar nos necessários "acordos de regime" entre os dois "partidos de governo" nacionais para reforçar o regime democrático deve ser justamente o de extirpar este cancro institucional que há muito corrói os princípios da separação de poderes e da responsabilidade política, inerentes ao Estado de direito democrático.
1. Parecendo obviamente afastada a hipótese de o partido vencedor das próximas eleições alcançar maioria absoluta, e não estando excluída a hipótese de o campo político adversário somar uma maioria no parlamento, que soluções governativas são de encarar?
Há muito tempo que tenho por boas as seguintes duas teses:
- o partido vencedor das eleições, mesmo com escassa maioria relativa (seja o PS ou o PSD), tem prioridade em ser chamado a formar Governo pelo PR e a submetê-lo ao escrutínio parlamentar; embora tal regra não resulte diretamente da Constituição, ela sempre foi seguida até aqui, sem exceção;
- caso esse partido não desista de formar Governo e se apresente perante a AR, o outro "partido de Governo" só deve votar contra ele e impedi-lo de assumir funções, se tiver conseguido negociar um Governo alternativo com maioria parlamentar; foi o que sucedeu em 2015, tendo António Costa declarado, logo que conhecidos os resultados eleitorais, que só votaria contra um Governo PSD-CDS, se houvesse uma solução de Governo alternativa.
2. Pode objetar-se, contra a segunda tese, que se trata de uma espécie de "moção de censura construtiva" de tipo alemão - em que uma moção de censura tem de ser acompanhada necessariamente de uma proposta de governo alternativo acordada entre os partidos proponentes da mesma -, a qual já foi proposta várias vezes em revisões constitucionais, mas nunca foi acolhida.
O facto de não estar prevista na Constituição não impede que os dois partidos de Governo a sigam nas relações entre si, pelo menos na fase de formação dos governos, ou seja, na votação parlamentar do programa de governo. Além da prática constitucional até agora - pois desde 1982, o único governo minoritário rejeitado na apresentação ao parlamento ocorreu em 2015, tendo sido acompanhado da formação de novo Governo -, há um argumento político crucial a favor dessa regra, que é o facto de, constitucionalmente, não poder haver dissolução parlamentar senão passados seis meses, o que sujeitaria o País a um "governo de gestão", aliás rejeitado na AR, por pelo menos mais oito meses.
Penso, por isso, que ambos os "partidos de governo" se deviam comprometer a respeitar essas duas regras, em prol da responsabilidade política própria e da previsibilidade do sistema político. Aqui fica o desafio!
1. Um dos muitos "intelectuais orgânicos da direita" que enchem o espaço mediático veio explicar como é que Montenegro deve vir a ser chefe do Governo, mesmo se não vencer as eleições, mas houver maioria parlamentar das direitas, apesar de o líder do PSD ter reiterado publicamente o compromisso de só governar se ganhar as eleições e que não fará acordos de Governo com o Chega.
Entre os seus argumentos insinua-se o alegado precedente de que António Costa teria feito o mesmo em 2015. Mas não é verdade: não somente Costa não assumiu nenhum compromisso semelhante, como foi deixando indícios claros antes das eleições de que poderia fazer o que veio a ser a "Geringonça" (como mostrei AQUI e importa recordar). Na intervenção dos intelectuais no combate político não vale, pelo menos, falsificar a história.
2. Pelos vistos, o coro dos intelectuais orgânicos de direita que em 2015 achavam um gravíssimo "atentado democrático" "política e moralmente ilegítimo", um "verdadeiro golpe de Estado" (cito frases da altura) o facto de um partido que não tinha ganhado as eleições formar governo, com o apoio parlamentar de "partidos radicais", prepara-se agora, não somente para se mudar de armas e bagagens para a defesa de tal solução, mas também para instruir o líder do PSD a renegar os seus inequívocos compromissos políticos perante os eleitores - isso, sim, um qualificado atentado democrático, que descredibiliza a democracia parlamentar.
Um pouco mais de escrúpulos políticos, sff.
1. Depois de o líder do PSD ter vindo, irresponsavelmente, defender a recuperação de todo o tempo de serviço dos professores não contado durante a intervenção financeira externa (2011-205) para efeito de antiguidade, era difícil esperar que o provável próximo líder do PS não avançasse no mesmo sentido, subindo, aliás, a parada e estendendo a benesse a todos os funcionários públicos.
E de facto, mesmo quando se trata de dar vantagens, há que respeitar o princípio da igualdade, abrangendo todos os que se encontram na mesma situação.
2. Contudo, além de deverem apresentar a conta precisa dos encargos financeiros que essas promessas envolvem, o que ambos os líderes partidários vão ter de explicar aos cidadãos em geral, e aos contribuintes em especial, é como se propõem financiar esse dispendioso compromisso eleitoral: cortando noutras despesas públicas (e quais?) ou voltando de novo ao défice orçamental e à dívida pública, com os óbvios efeitos sobre o custo desta?
Numa democracia responsável, os candidatos dos "partidos de governo", como o PS e o PSD, têm obrigação de esclarecer, antes das eleições, onde vão buscar o dinheiro para pagar os aumentos significativos de despesa pública que propõem.
1. O comentador político e politólogo André Freire sustenta - suponho que na 1ª qualidade - que o Governo ainda em funções comprova a sua tese de que os governos de maioria absoluta (de um só partido) são por natureza «uma coisa má». Não concordando com a tese em concreto (como defendi AQUI), tampouco a subscrevo em abstrato -, pelo contrário.
Para começar, os governos maioritários têm condições para governar de forma mais previsivel e com mais estabilidade do que os governos minoritários ou de coligação, aqueles porque ficam sempre reféns das oposições e dos grandes grupos de interesse, e os últimos porque o partido "sénior" da coligação fica refém dos partidos "juniores", pelo que ambos os tipos de governo tendem sempre a adiar reformas e a aumentar a despesa pública, para comprar apoios políticos.
A primeira grande diferença está, portanto, em serem mais coerentes e mais estáveis politicamente, na base do mandato político correspondente ao programa eleitoral submetido aos cidadãos eleitores.
2. Em segundo lugar, os governos de maioria absoluta também são mais reformistas, porque conseguem levar de vencida as corporações instaladas: não é por acaso que, com exceção do Governo de Passos Coelho, sob intervenção externa (2011-2015), os governos mais reformistas desde 1976 foram indubitavelmente os governos maioritários de Cavaco Silva (1997-1995) e de Sócrates (2005-2009).
Por último, mas de primeira importância, os governos maioriários são também mais responsáveis politicamente perante os cidadãos, porque no final do mandato não podem desculpar as suas falhas ou o incumprimento do seu programa nem com a falta de apoio parlamentar nem com os parceiros de coligação.
Além da instabilidade governativa que lhes é inerente (poucos chegaram ao fim), os governos minoritários e os de coligação tendem também a fugir à responsabilidades política pelo seu falhanço, à margem de um dos grandes princípios da teoria republicana do governo.
3. Além disso, dada a inviabilidade política de soluções de "bloco central" entre nós, as maiorias absolutas tornam-se o único antídoto eficaz contra a tentação de acordos de governo, expressos ou implícitos, dos dois tradicionais partidos de governo (PS e PSD) com os partidos radicais, à sua esquerda ou à sua direita, respetivamente.
Não tenho dúvidas em afirmar que é preferível um governo maioritário do PS a um governo de coligação PS-PCP-BE, ou um governo minoritário dependente desses dois partidos (como foi a chamada "Geringonça"), tal como é melhor ter um governo maioritário do PSD do que um governo de coligação PSD-IL ou PSD-Chega, ou um governo minoritário dependente deles. Ou seja, ao contrário de A. Freire, eu penso que os governos de maioria absoluta são, em princípio, uma "coisa boa".
O problema é que, em sistemas proporcionais como o nosso, trata-se de um produto com pouca oferta no mercado eleitoral, e parece que destinado mesmo a desaparecer. Ainda haveremos de o lamentar...
1. Embora entenda que o princípio da laicidade do Estado - ou seja, a separação entre o Estado e a religião - pode ser tolerante com o uso de vestes ou símbolos religiosos pelos servidores públicos, admito, porém, que, numa atitude mais consequente, as autoridades públicas podem estabelecer a sua proibição, nomeadamente na escola pública, a fim de assegurar uma estrita neutralidade religiosa dos serviços públicos, desde logo perante os cidadãos, como acaba de decidir o Tribunal de Justiça da UE.
Ponto é que tal proibição não seja discriminatória, nem na lei nem na prática, devendo abranger os símbolos de qualquer religião, e não especialmente, como sucede por vezes, os símbolos islâmicos, a começar pelo lenço de cabeça.
2. Em contrapartida, continuo a entender que não há nenhuma justificação para estender tal proibição aos próprios utentes dos serviços públicos (como os alunos das escolas públicas), como sucede em França, ao abrigo de uma conceção fundamentalista da laicidade do Estado (como AQUI critiquei).
Não sendo os utentes dos serviços públicos representantes nem servidores do Estado, não se vê como é que é que se pode restringir a sua liberdade religiosa a pretexto da separação entre o Estado e a religião.
Ao fim de 7-anos-7, o Ministério Público veio ilibar das suspeitas que tinham sido levantadas contra nada menos de 4-Ministros-4 do então Governo PS, por supostos crimes na adjudicação de contratos públicos, investigação que na altura foi obviamente explorada politicamente pelos media que servem de megafone às operações de legal warfare do Mº Pº contra o mundo político.
Sete anos para concluir pela inocência de políticos cujo bom-nome e reputação - direito constitucionalmente protegidos - foram manchados pela leviandade ou má-fé do Ministério Público? Haverá quem se não revolte contra esta irresponsável prepotência ?
Tal é o título de uma bela reportagem do jornal francês Figaro, sobre a Universidade de Coimbra.
Mesmo sendo eu interessado (por ser a minha alma mater), mas conhecendo muitas universidades, por esse mundo fora, julgo que o jornal tem razão!
A anunciada cavalgada que em poucos meses haveria de culminar na reconquista do própria Crimeia, acabou em desilusão, apesar dos meios maciços empenhados na operação. com a assistência militar e técnica ocidental. Pior do que isso, é a Rússia que retomou a ofensiva em vários trechos da linha de combate, com o risco de a Ucrânia perder ainda mais território.
Como várias vezes aqui se antecipou, a mais provável era o congelamento das posições de cada beligerante e evolução para uma "guerra de atrito", sem perspetivas de solução militar para o conflito.
2. Neste quadro sem mudança à vista, a guerra torna-se num sorvedouro inglório de soldados, de armamento e de dinheiro (este proporcionado em grande parte pelos contribuintes da UE).
A questão do "cansaço da guerra", que a primeira-ministra italiana deixou cair inadvertidamente há algum tempo, não é uma questão de "se", mas de quando é que se tornará um problema político incontornável. Acresce que, enquanto a Ucrânia estiver em estado de guerra, a questão da sua adesão à UE e à NATO também tem de ser adiada indefinidamente.
Por isso, não será altura de alguém com coragem política na UE invocar a patente exaustão da solução militar do conflito e propor uma pausa bélica, que abra caminho a uma solução política, mediada por terceiros países aceites por ambos os beligerantes, por mais difícil que ela se apresente?
1. Num sistema de governo de base parlamentar como o nosso, em que a legitimidade política do Governo decorre das eleições parlamentares, estas são, antes de mais, um julgamento do Governo cessante, e o critério decisivo deve ser naturalmente o seu desempenho.
Ora, quanto a este Governo, e apesar das minhas várias críticas quanto a várias políticas concretas e das dificuldades em algumas áreas (como a saúde e a habitação, embora centradas na capital), entendo que o saldo é globalmente muito positivo: combate eficaz às sequelas da pandemia, especialmente a inflação, crescimento económico acima da média da UE, aumento do emprego e dos rendimentos (pensões, salário mínimo, remunerações em geral), reforço do Estado social (prestações sociais, creches gratuitas, reforma decretada do SNS), excedente orçamental e redução do peso da dívida pública (com melhoria geral do rating externo), reforma das ordens profissionais (uma "reforma estrutural" há muito devida), avanço nos processos de localização do novo aeroporto e de arranque do TGV, descentralização territorial, novo programa Simplex de desburocratização da Administração, prestígio do País nas instituições da UE, etc.
A meu ver, só o mais acrítico sectarismo político pode desqualificar o desempenho geral deste III Governo de António Costa, cujo mandato foi insensatamente interrompido pelo PR.
2. Em condições normais, o PS deveria ganhar folgadamente estas eleições.
Sucede, porém, que, a fazer fé nas sondagens, não é bem esse o juízo da maioria dos cidadãos nesta fase, visto que mais de um quarto dos eleitores que há dois anos deram uma inesperada maioria parlamentar absoluta ao PS não parecem disponíveis para renovar esse mandato de confiança política.
Há três factores que podem explicar essa perda de apoio eleitoral: (i) a inesperada demissão do Governo, na sequência de uma investigação penal - incluindo dois ministros, um dos quais já se demitiu, embora protestando a sua inocência -, a qual, apesar de essencialmente esvaziada pela decisão do juiz de instrução, continuará a afetar negativamente a confiança no partido, enquanto não for encerrada; (ii) a saída de António Costa da liderança do PS, e estar ainda em aberto a sua sucessão e a escolha do aspirante a primeiro-ministro socialista; (iii) a incerteza quanto à política de alianças pós-eleitorais do partido, designadamente quanto à eventual repristinação da chamada "Geringonça" com os partidos à esquerda do PS.
Acaba de sair do prelo o 2º volume da História Constitucional Portuguesa, da minha coautoria com o Prof. José Domingues, no âmbito da Universidade Lusíada Norte (Porto), dedicado ao estudo da nossa primeira Lei Fundamental da era constitucional moderna, ou seja, a Constituição de 1822, resultante da Revolução Liberal de 1820 e aprovada em Cortes Constituintes eleitas nesse mesmo ano.
Apesar da sua breve vigência, de menos de oito meses, a Constituição de 1822 veio a deixar um legado incontornável na história político-constitucional nacional, repercutindo-se ainda na CRP de 1976. Por isso, estudar a Constituição "vintista" é ir às raízes profundas do constitucionalismo liberal-democrático em Portugal.
1. Começou a vertigem das promessas eleitorais, e o PSD colocou-se claramente à frente no seu recente Congresso, prometendo tudo a toda a gente e conseguindo o prodígio de ir simultaneamente ao encontro da IL, com a promessa de substancial redução de impostos (IRS, IRC e o mais que vier), e ultrapassando o PS pela esquerda, fazendo suas propostas do PCP e do Bloco, como o aumento substancial das pensões e reposição do tempo de serviço aos professores.
PSD = IL+PCP/BE. É obra, este casamento de contrários!
2. Mas é evidente que - a não ser que estas promessas escondam um programa paralelo de corte a sério noutras despesas públicas essenciais do Estado social, como o SNS ou a escola pública - conjugar um grande aumento da despesa corrente com uma substancial redução da receita fiscal só pode dar no regresso ao défice orçamental e ao aumento da dívida pública (e ao agravamento do seu custo), contrariando todo o historial doutrinário do PSD quanto à contenção da despesa pública e ao equilíbrio das contas públicas.
Uma enorme cambalhota política!
3. A verdade é que nada disto tem suficiente credibilidade, não somente por ir contra o ADN do partido quanto à contenção da despesa pública, mas também porque o PSD sabe que, mesmo que ganhe as eleições, não terá condições para governar sozinho, tendo de aliar-se à sua direita, nomeadamente à IL.
Ora, sendo conhecido o fundamentalismo deste partido sobre a redução da carga fiscal e consequente diminuição da despesa pública, a possibilidade de este dar luz verde a um aumento substancial da despesa social é igual a zero. Ou seja, o PSD coopta as referidas propostas "à esquerda", sabendo antecipadamente que não vai executá-las, graças ao veto político do parceiro de coligação.
Um perfeito exercício político de "reserva mental"!
[Alterada a rubrica]
O nosso MNE diz que não percebe os objetivos políticos da invasão de Gaza por Israel.
Mas as dúvidas parecem-me inteiramente descabidas: a pretexto da erradicação do Hamas e da liquidação da resistência palestina à opressão israelita - objetivos inatingíveis, enquanto esta perdurar (porque é ela-mesma que gera a resistência palestina) -, Israel está a matar milhares e milhares de palestinianos inocentes e a aniquilar as mais elementares condições de vida na pequena faixa territorial, numa operação de punição coletiva de crueldade sem precedentes desde a II Guerra Mundial, destinada a consolidar irreversivelmente a anexação territorial e a inviabilizar definitivamente um Estado palestino.
O que não se percebe é porque é que a UE, Portugal incluído, não condena sem ambages a revoltante matança israelita em curso, atitude cúmplice de que só os PM belga e espanhol ousaram demarcar-se - honra lhe seja!
1. Como é que uma imputação penal tão estúpida como esta pôde sequer ter sido dirigida pelo MP contra a presidente da CM de Matosinhos (e também presidente da ANMP), como se a contratação de uma chefe de gabinete não fosse por definição um cargo de confiança pessoal e de escolha livre, mesmo se a denúncia viesse travestida de alegada "troca de favores", para a qual não havia nenhum fundamento!?
Ficamos a saber que o caso acaba de ser arquivado. Mas ninguém apaga o dano moral causado à visada pelo enxovalho da suspeita pública a que foi submetida, pelas buscas na CMM, pela apreensão do seu telemóvel e cópia do seu conteúdo. E porque é que o MP demorou vários anos a arquivar o caso, sem que tenha ocorrido qualquer diligência posterior, só para manter a arguida em suspensão quanto ao seu estatuto?
Se isto não é um caso exemplar de legal warfare do MP contra os políticos, façam o favor de dizer o que é!
2. As operações mais banais de "assédio judiciário" a políticos e outras pessoas publicamente expostas obedecem sempre ao mesmo guião: 1º - desencadear uma investigação por qualquer denúncia, por mais infundada que seja, como esta; 2ª - avançar imediatamente para buscas e exames altamente intrusivos, por mais desproporcionados que sejam; 3º - vazar o caso para os media, violando o segredo de justiça, para causar imediatamente um dano profundo aos suspeitos na opinião pública; 3º - mesmo que o caso não tenha nenhuns pés para andar, como neste exemplo, demorar o máximo tempo possível para o arquivar, mantendo os suspeitos em sofrimento quando ao desfecho.
Para além dos intoleráveis danos reputacionais causados aos visados, do desperdício de recursos humanos e técnicos públicos (do próprio MP, da PJ, etc.) e do alimento que se dá à narrativa populista da "corrupção generalizada", não há ninguém que responda pelo descrédito institucional que casos destes - claramente à margem dos princípios do Estado de direito democrático - lançam sobre o MP em geral e sobre a PGR em especial?
No próximo dia 6 de dezembro, vou participar neste colóquio sobre a Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH) de 1948, aprovada pelas Nações Unidas.
A DUDH inaugurou politicamente o processo de universalização dos direitos e liberdades fundamentais, que veio a ser seguido, ao longo das décadas seguintes por numerosas convenções internacionais de direitos humanos, quer de âmbito global (ao nível das Nações Unidas), quer de âmbito regional (a primeira das quais foi a Convenção Europeia de Direitos Humanos, CEDH, de 1950).
1. Penso que, independentemente de poder vir a avançar para um acordo de governo com o PCP e o BE depois das eleições, o PS não tem nenhuma vantagem em anunciar uma preferência por tal solução de governo antes delas.
Pelo contrário, penso que apostar antecipadamente numa coligação à sua esquerda encerra um forte risco eleitoral para o PS, numa dupla vertente: por um lado, abandona o argumento do "voto útil" à esquerda, uma vez que o voto no PCP e no BE também passa a contar à partida como voto num governo de esquerda, não sendo necessário votar PS; por outro lado, tende a alienar uma parte do voto centrista, que não sufraga um governo de frente de esquerda, tanto mais que, ao contrário do que sucedeu em 2022, com Rui Rio, desta vez o líder do PSD afasta enfaticamente a hipótese de coligação com o Chega.
2. Tenho por evidente que, em 2022, foi a recusa de António Costa de equacionar na campanha eleitoral qualquer reedição da "Geringonça", proporcionando a confluência do voto útil de esquerda e do voto centrista anti-Chega, que deu ao PS a inesperada maioria absoluta que obteve então.
Poderá argumentar-se que, mesmo sem nenhuma dessas "majorações" da sua votação, ainda é possível o PS vencer as eleições a 10 de março, desde logo pelo legado positivo do Governo, pela falta de "appeal" político do PSD de Montenegro e, também, por efeito do crescimento do Chega, à custa dele.
No entanto, naquelas condições, a eventual vitória socialista torna-se bem mais arriscada e, a acontecer, seguramente menos expressiva.
Não sendo membro da maçonaria (nem de qualquer outra irmandade, fraternidade ou simples confraria), nunca tinha visitado o Museu Maçónico do Grande Oriente Lusitano, ao Bairro Alto, em Lisboa.
Ontem, porém, aproveitando a sessão de apresentação do livro de um eminente maçon do século XIX, José Liberato, a que me referi no post anterior, aceitei o convite do Grão-Mestre para visitar o museu. Sabendo que o espólio histórico de mais de um século da maçonaria tinha sido destruído pelo assalto fascista da Legião em 1935 e pelo subsequnte confisco do palácio maçónico até 1974, foi para mim uma agradável surpresa encontrar um notável acervo documental, iconográfico, bibliográfico, entretanto reunido, testemunhando o contributo decisivo da maçonaria para as três grandes revoluções políticas dos últimos dois séculos em Portugal: a revoluação liberal (1820), a revolução republicana (1910) (como mostram as duas imagens acima) e a revolução democrática (1974).
Obrigado, pela história e pelo museu!